Capítulo Dezessete

Coreográfia com roupa de mulher?

“As sem-razões do amor
Eu te amo porque te amo,
Não precisas ser amante,
e nem sempre sabes sê-lo.
Eu te amo porque te amo.
Amor é estado de graça
e com amor não se paga.
Amor é dado de graça,
é semeado no vento,
na cachoeira, no eclipse.
Amor foge a dicionários
e a regulamentos vários.
Eu te amo porque não amo
bastante ou demais a mim.
Porque amor não se troca,
não se conjuga nem se ama.
Porque amor é amor a nada,
feliz e forte em si mesmo.
Amor é primo da morte,
e da morte vencedor,
por mais que o matem (e matam)
a cada instante de amor”

  (Carlos Drummond de Andrade)

Anne.

Anne decreta.

Anne decreta ódio.

Anne decreta ódio ao.

Anne decreta ódio ao sábado!

Esse é o pior dia de todos para por alguns motivos:

1 – Não ter ovos para jogar nas pessoas;

2 – Perder do anão na competição;

3 – O pai ligou e disse que irão chegar daqui duas semanas;

4 – Ir à festa e campeonato de Penélope Moore;

5 – Ter que aguentá-la se gabar por ter vencido.

E apenas não é decretado ódio eterno porque sua família não vem nesse dia, não há a Charlotte nem Ashley envolvidas nisso e Robertha não irá nessa festa. Porém, infelizmente, são 8h da manhã e ainda tem mais 16h para aguentar até dar meia-noite.

Sendo que segunda, terça, quarta, quinta e sexta-feira em dias que sua mãe está e não são férias é decretado ódio eterno, isso significa que logo isso ocorrerá. E o pior de tudo: Charlotte se fingindo de santa e usando roupas comportadas enquanto visita frequentemente a casa da prima.

A morena saiu de seu quarto enquanto esfregando os olhos e seu mau humor aumentou quando ouviu uma música que há um tempo não escutava. Seria hoje o fim do mundo? Nada mais justo.

— Ethan, Anne e James, vêm aqui ver o novo sucesso. — gritou Max de forma esbaforida.

Então a guria seguiu os corredores com o pensamento de sufocá-lo com um travesseiro. Está confirmado: Não há pessoa mais idiota que o loiro. Abriu a porta do aposento dos três e o viu dançando a música que dizia ser inédita.

“Ai se eu te pego” do Michel Teló estava tocando enquanto ele piscava para a Anne e imitava a coreografia. Os dois chegaram logo depois e começaram a rir do que ele fazia, e até a garota entendia o porquê. Estava ridículo com aquele shorts de laicra e blusa – que parecia um top nele.

Então a morena percebeu que aquelas roupas eram dela e correu em sua direção para depois batê-lo com toda a sua força. E ainda era o conjunto preferido dela, até porque usava muito em casa. Estava até separado na noite passada para colocá-las depois de tomar banho.

— Você entrou no meu quarto ontem à noite Max? — urrou.

Seus olhos então se arregalaram de forma assustado, para depois dar um sorriso malicioso. Daqueles que dão a entender de que a pessoa irá aprontar.

— Sim, foi no momento em que Ethan entrou lá para te roubar um selinho.
— declarou, olhando com escárnio para o moreno.

Realmente isso ocorreu? E Anne novamente sentiu seu coração batendo a mil. Ela não gostava daquela sensação, não mesmo. Só ouviu um “cala a boca” do gênio enquanto saia rapidamente do local.

— Devolva a roupa onde estava e espero que esteja na minha cama quando voltar ao meu quarto. — comentou antes de entrar no banheiro.

Ela não queria acreditar, ter que ir naquele campeonato e em uma festa, dada por Penélope, depois disso. E a morena só rezava para a garota fosse desclassificado na primeira fase da competição. Infelizmente não ocorria em apenas um dia. Colocou sua toalha e foi em direção ao seu guarda-roupa, notando que Max a estava esperando.

— Sai. — berrei, fazendo com que o loiro a obedecesse prontamente.

A pequena então rolou os olhos por descobrir o quão medroso era. Ao pegar a roupa suspirou por saber que não poderia usá-la ao saber que há que sair e pelo guri ter esticado suas vestes.

E mesmo com tudo isso a garota não esquecia o selo que recebera.

☮

Cavalos, rainha, rei, bispo, pião e torres. Não, isso não é nem de longe uma convenção sobre a idade média, mas sim um campeonato de xadrez. E, com toda a certeza, nunca seria dos melhores para Anne. Principalmente porque sua rival estava ganhando. O único aspecto positivo disso é que o curso será mais conhecido se a nossa escola vencer.

A morena estava usando a roupa do uniforme, porém Max fez questão de fazê-la complementar a vestimenta com um novo acessório. E ela nunca entenderia a necessidade de ter que usar uma faixa no cabelo escrito “eu amo a PM – Penélope Moore” sendo que isso não é verdade.

— Eu sei que irá vencer meu amor. — comentou o loiro de forma gritante.

“Ninguém merece”. Pensou Anne.

E a garota apenas deu um sorrisinho fraco como resposta. E se confirma mais uma vez o quanto o garoto é idiota, até porque está estampado no rosto da jogadora que ela não o corresponde. Porém sabe-se também que o loiro é deveras exagerado e talvez também nada sinta por ela.

E depois de quase dormir pela demora dos dois competidores, até porque se deve pensar muito para que uma peça seja movimentada, Max a acordou confirmando que a Penélope havia ganhado – para a sua desgraça. E com isso finalmente pode ir embora, mas não antes de ser barrada pelo fofão. E pasmem com uma linda garota ao seu lado.

— O quer comigo ser inútil? — questionou de maneira tediosa.

— Só vim avisar que não é para correr mais atrás de mim, tenho uma namorada agora. Anne essa é a Feliciana. — respondeu.

Claro, ela tinha que ter um defeito.

— Eu não... — mas era tarde, eles já tinham ido.

A morena só queria rebatê-lo, já que quem a queria era ele. E enquanto ficou um tempo para pensar no que ocorreu ali, seus inquilinos a chamaram para sair dali. Entretanto ela tinha conhecimento de que o dia não tinha acabado e teria que comparecer a festa.

Eles vão sofrer muito nas mãos dela por causa disso.

☮

Anne vestiu sua blusa de paetê dourada e saia de franja preta, colocou uma maquiagem forte, delineador, rímel e sombra das mesmas cores da vestimenta. O sapato preto, a bolsa prata, pulseiras, brincos e colar complementou o look. Já no cabelo passou baby liss nas pontas, fazendo com que ficasse um pouco diferente do normal.

Ao passar pelo corredor viu James sair de seu quarto com um terno preto e gravata amarela, provavelmente para combinar com a roupa de Anne. Quando virou para a direção da garota sorriu, caminhando até onde estava.

— Tenho certeza que vais ser a mais linda da festa. — começou.

Esses guris e seu extinto galanteador, que mesmo sendo mentira anima um pouco as mulheres. Menos ela, que era indiferente quanto a isso.

— Eu sei. — respondeu simplesmente.

Então o ruivo apenas deu um sorriso fraco, daqueles desanimadores.

— Vai ser minha acompanhante na festa, não? — declarou.

— Em que época está? É apenas uma festa, não um baile em que somos obrigados a ir com um par. Eu fico contigo se eu quiser. — rebateu mal humorada.

Já com o que recebera como resposta seu sorriso murchou.

— Sei que errei, mas foi ela que me beijou. E além do mais, tu nem me esperaste e me deu um bolo ontem. Quer dizer que estamos quites, não? — questionou.

Tolo!

— Nunca, isso é para aprender a não ficar se aproveitando das situações em que uma vadia se esfrega em você. — retrucou mais furiosa ainda.

— Mas eu... — foi cortado.

— Adeus James. — despediu-se dele e ao se afastar um pouco mandou um beijo. — Aliás, arranje com quem ir, porque comigo tu não vais.

Após finalizar a frase colocou o fone de ouvido para não ouvir as reclamações de seu ainda noivo, odiando-se por ouvir o gênio. Ao descer as escadas viu os dois a esperando, porém passou por eles empinando o nariz.

— Vocês não iram comigo. — declarou ao parar na porta.

— Por quê? — questionou o loiro de forma abobada.

Até porque ele, sendo homem, notou o quanto ficou magnífica.

— Max, meu querido, eu não quero estar acompanhada da pessoa que me obrigou a ir a festa, campeonato e ainda usar aqueles acessórios para torcer pela Penélope. — declarou enquanto contava nos dedos os motivos.

Então o loiro apenas assentiu, afastando-se com o celular na mão. Com isso Anne sorriu, indo em direção ao moreno de forma lenta. Ele nada havia falado até agora, parecia sem fala, ar ou expressão. A morena então ao se aproximar dele colocou a mão nos ombros dele, ficando na ponta dos pés para sussurrar algo em seu ouvido.

— E eu não quero estar acompanhada de alguém que a qualquer momento pode roubar um beijo meu, isso foi muito cafajeste de sua parte Ethan. — declarou de forma baixa, gargalhando no mesmo tom ao vê-lo corar.

O garoto nada fez, ficou estático no lugar enquanto a via se afastar. Enquanto ela pensava como teve a coragem para dizer isso para ele.