Distrito 11 escrita por esa


Capítulo 1
A Colheita


Notas iniciais do capítulo

primeiro capítulo, espero que gostem e comentem, bla bla bla



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                Abro os olhos. Tudo ainda está escuro, o sol ainda está escondido atrás das densas nuvens que circundam o Distrito 11, as persianas fechadas mostram o arroxeado tom que o céu apresenta. Viro-me, caindo para o chão, não que isto faça alguma diferença pois o fino colchonete que uso como cama não é tão mais confortável que o frio chão de pedra.

                Mark¹ e Ellie estão chorando à plenos pulmões, minha mãe está na cama com Tennence e Lish, as três de olhos fechados e cenhos franzidos. Me levanto. O cômodo no qual vivemos não tem espaço o suficiente para perambular. Pulo o berço dos pequenos e dirijo-me até o tanque que usávamos como pia. Molho as pontas dos dedos finos e desembaraço meus compridos cabelos louros. O barulho da chuva ricocheteando nas janelas. Visto as calças, a blusa e a jaqueta, calço as botas e prendo o cabelo em um apertado coque.

                O vento castiga, atingindo meu rosto com tamanha força que é difícil manter os olhos abertos. As ruas estão vazias, o relógio no topo da catedral marca 4h30. Os pomares não passam de longínquos pontinhos coloridos ao horizonte. As lojas fechadas, as janelas cobertas por cortinas grossas e robustas. Portas trancadas, todas elas. Nenhum espírito em sã consciência estaria nas ruas, não naquele dia.

                Aperto o passo, torcendo para não fazer muito barulho, para não chamar a atenção daqueles que estão enclausurados em suas próprias casas, encolhidos em suas camas rezando por seus filhos, ou rezando por eles mesmos. Hoje é o dia da colheita, um dia que não é bom para ninguém, principalmente para mim.

                Corro o máximo que minhas pernas permitem, os pomares cada vez mais próximos ao meu alcance, quando uma mão me puxa para baixo, derrubando-me em meio à minha arrancada. Caio sobre minha perna, uma dor toma conta de meu joelho, provavelmente o deslocara.

                -- Sinto muito. – ele murmura ajudando-me à levantar. Nosso olhar se cruza e percebo a preocupação que seus olhos verdes carregam.

                Os cabelos pretos caindo sobre a testa que sempre o irritavam, as mãos grandes e quentes ao redor de meu pulso direito, os olhos assustados como os dos coelhos que invadem o pomar e matamos para nossa própria sobrevivência.

                -- O que há de errado? – pergunto notando que as coisas não estão bem.

                Ele olha ao redor, os olhos assustados vasculhando o perímetro, obviamente não poderiam escutar o que está prestes à revelar, então agarra minha mão e começa à puxar-me consigo. Adentramos um beco escuro e mal cheiroso e então ele solta seu aperto.

                -- Estou preocupado, April. – ele sussurra, e percebo que não é consigo mesmo. Faço menção de falar, então ele continua. – Vi um aerodeslizador hoje, perto dos pomares, e então ouvi o grito de uma garota. Provavelmente está morta agora. Não é mais seguro nos arriscarmos.

                Cruzo os braços e fecho a cara, tentando demonstrar à ele que não estava satisfeita, e não era apenas pelo sermão, mas sim por ter me chamado de April. Tudo bem, este é meu nome, um dia terei de aceitar, mas nunca irei perdoar minha mãe por dar-me este nome! Em um ímpeto de loucura romântica, como diz minha mãe, quando nasci ela nomeou-me April, em homenagem ao mês no qual ela e meu pai casaram. Meu pai era um bom pai, até minha mãe ficar grávida dos gêmeos. Quando contou à ele que estava grávida de Ellie e Mark ele simplesmente sumiu, nunca mais foi visto, deixando apenas um pequeno bilhete com a desculpa de que não aguentaria sustentar à tantas bocas famintas. Isso já faz dois anos.

                -- Não me chame assim! – advirto-o estendendo o dedo e apontando-o em direção ao seu nariz. – Quanto ao aerodeslizador, não se preocupe, somos bem cuidadosos.

                Ele continua me encarando, quando faço menção de sair andando em direção aos pomares ele agarra meu pulso e me puxa de volta. Sei que está preocupado, e sei que tem razão em estar, a Capital não perdoa quem a enfrenta, mesmo que escondido, pois de qualquer maneira, eles dão um jeito de descobrir. Mas tinha minha mãe, os gêmeos, Tennence, Lish e à mim para alimentar!

                -- Jose, eu entendo que esteja preocupado, mas como viveremos sem...

                -- Shh! Não diga aqui, alguém pode te ouvir! Vamos parar, por um tempo, ok? Uma semana, que tal? – como se para ele fosse como para mim!

                Jose, com quinze anos, um irmão, uma mãe e um pai não tem tantas necessidades quanto eu. Ambos pais trabalham, o que torna à Jose quase desnecessário fazer o que fazemos. Não é como se estivéssemos roubando, ou melhor, ele nunca roubou, apenas eu, mas o furto é punido com a morte, então evitamos ao máximo fazê-lo. Bem, se você considerar pegar os restos de pães e frutas que jogaram nas lixeiras furtos, é claro. Todos os dias acordamos cedo, mais cedo que muitos dos cidadãos do Distrito 11, então atravessamos os pomares e chegamos à uma área ampla e quase vazia, onde caçamos, colhemos raízes e frutas, que usamos em nossas casas, nossa base de sobrevivência.

                -- Parece que as pessoas estão começando a levantar, vamos logo sair daqui, antes que...bem, você me entendeu. – um rubor tomou conta de suas bochechas, e sim, eu o havia entendido.

                Ultimamente as pessoas apontavam para nós e davam risinhos quando passávamos. Eu e Jose. Jose de longe era um dos garotos mais bonitos de nosso Distrito, mas eu não o via como mais que um amigo, talvez um irmão, já que nos conhecíamos à tanto tempo. Porém não nego que já me peguei imaginando coisas que eu não deveria imaginar, principalmente porque todas as garotas me invejavam por ser tão próxima à ele. E ele nunca demonstrou interesse em mim, o que nos colocava no mesmo lugar. Éramos amigos, nada mais.

                -- Você não está nervoso? – pergunto mexendo em minhas unhas, tentando tirar a camada preta de sujeira que as habita.

                -- Não muito, quero dizer, meu nome estará lá apenas 4 vezes. – se comparado ao tanto que o meu estará na bola de vidro, realmente não é nada.

                Jose não pega tésseras, nenhuma, sua família não permite. Eu, por vez, não tenho ninguém que me impeça. Minha mãe conversou comigo, mentiu que não era necessário pegar as tésseras, mas eu sabia que era, na época as coisas não estavam tão ruins como estão hoje, então nunca pude negar pegá-las. Este ano, meu nome estará inscrito 85². Nunca peguei tésseras para meu pai, ele não permitia, mas quando fugiu me deixando com minha mãe, que tinha um trabalho cujo mal sustentava metade de nossa família, e minhas duas irmãs com os gêmeos a caminho, meu ódio por ele só foi reforçado.

                Ainda está longe de o relógio bater as 14h00 horas, mas mesmo assim corro pra casa, tenho de dar banho nos gêmeos e em Tennence, arrumá-los, esperar que Lish tome banho e se apronte, que minha mãe faça o mesmo e então me aprontar para a colheita. Ellie e Mark não dão trabalho, coloco-os juntos na pequena banheira e começo à ensaboá-los, as pequenas mãozinhas espirrando água para todos os lados. Seco os dois e então faço-os vestir suas melhores roupas. Apronto o cabelo de Ellie e penteio com os dedos a franja de Mark. É a vez de Tennence, que bate o queixo com a água fria. Coloco o vestido nela e faço duas trancinhas em seus cabelos alaranjados.

                Lish se joga na banheira, deixando as lágrimas rolarem por suas bochechas. É o primeiro ano em que seu nome estará nas bolas, e eu não permiti que ela pegasse nenhuma téssera. Quando acaba o banho ela veste seu vestido branco com bordados azuis, então faço uma trança única em seus cabelos. Ela me lança um olhar triste, então seus braços magrinhos envolvem minha cintura.

                -- Não se preocupe, seu nome não será escolhido. Confie em mim. – eu sussurro em seu ouvido.

                -- Você promete? – sua voz está abafa e sei que seus grandes olhos mel estão enchendo-se de lágrimas rapidamente.

                -- Sim. – eu digo e então ela me solta, permitindo que eu entre na banheira.

                A água está fria, mas ignoro e afundo a cabeça, certificando-me de que meus cabelos fiquem submersos. Me lavo rapidamente, e então me enrolo em uma toalha. O vestido que está sobre minha cama não me parece nem um pouco confortável, mas mesmo assim o coloco. O busto está apetado, o comprimento um pouco acima dos joelhos. O vestido com certeza não é novo, mas não me lembrava de possuir tal peça em nosso guarda-roupa. Prendo os cabelos em um rabo alto e calço as sapatilhas.

                Um barulho na porta e então minha mãe entra aos tropeços. Corre para o banheiro, que fica no fundo da pequena casa e então afunda na banheira. Escuto a porta batendo. Alguns minutos depois ela está pronta, vestindo um vestido de um verde clarinho, com flores azuladas, os cabelos loiros presos em uma trança. Já são quase 13h00 quando saímos de casa.

                A praça, onde os nomes serão lidos está abarrotada. Minha mãe fica ao longe, com Tennence e os gêmeos, encorajando à mim e Lish à seguir em frente. Lish não quer ir, obviamente, pois sabe que seria morta caso lessem o seu nome, mas faço com que ela prossiga. Separam-nos e então vejo que as três cadeiras no palco já estão ocupadas: o prefeito, que não demonstra nenhum interesse em estar ali, Zen Tash, último vencedor do Distrito 11 e por fim, Dawn Kimberln, um homem musculoso, de pele escura e olhos verdes, tatuagens prateadas e roupas coloridas que fazem os olhos arderem.

                -- Bem vindos, bem vindos! – ele nos salda com seu notável sotaque da Capital, o ânimo em sua voz tão forçado que me enoja. – Sejam bem vindos à décima quarta edição dos Jogos Vorazes, e que a sorte esteja sempre à seu favor!

                Todos os anos aquele mesmo discurso entediante, todo aquele bla bla bla que precedia os nomes que seriam escolhidos como tributos. Olhei ao redor, Lish encolhida em meio à todas aquelas garotinhas mirradas e magrelas. Meu olhar cruzou-se com o de Jose, que não parecia tão calmo quanto antes.

                Dawn caminhou até uma das enormes bolas de vidro cheia de pequenos papeis, nunca sentira tamanho medo, meu nome estaria lá, e um pressentimento terrível fazia com que os cabelos de minha nuca se eriçassem.

                -- Primeiro as damas, não? – ele perguntou brincalhão, afundando os dedos em meio ao amontoado de nomes. Cruzei os dedos. Fez-se um completo silêncio, todos olhavam-no fixamente. – April Jonery.

                Minha boca abriu, meus olhos se arregalaram. Um arrepio desceu por minha espinha. Era eu. Haviam sorteado meu nome. Não havia nada que eu pudesse fazer para mudar aquilo, obviamente, e ninguém se voluntariaria como tributo em meu lugar. Era concreto, eu participaria dos terríveis Jogos. Uma multidão de meninas de pele escura e sedosa abriu-se, dando-me passagem para ir ao palco. Pacificadores armados apontando suas armas para mim e mandando-me ir mais depressa. Palmas explodiram de alguns cantos, mas a maioria da população estava quieta.

                -- Olá, querida! Seja bem vinda, muito bem vinda! – ele depositou os grossos dedos em meu queixo, sorrindo debilmente. Então ele caminhou até a bola que guardava os nomes dos garotos, e repetiu o gesto, afundando a mão ali. – Jose Prodt.

                Mais silêncio. Aquilo não podia estar acontecendo, não podia estar acontecendo. Busquei os olhos de Jose, que estavam opacos e sem reação. Lish estava mais encolhida que nunca, lágrimas rolando pelas bochechas agora brancas devido seu espanto.

                -- Agora sim, hum? Temos os dois tributos do Distrito 11! Feliz Jogos Vorazes, e que a sorte esteja sempre à seu favor! – dito isto dois Pacificadores nos empurraram para dentro do Edifício da Justiça.

                -- Jose... – comecei a sussurrar quando estávamos dentro do recinto, minhas mãos tremiam debilmente. Ele as segurou e então me puxou para mais perto, envolvendo minha cintura com seus braços, apertando-me em um abraço.

                -- Vai ficar tudo bem. – essas foram as últimas palavras que o escutei dizer antes dos Pacificadores nos separarem, jogando cada um em uma sala para receber a visita dos familiares e amigos.


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Notas finais do capítulo

¹ - os nomes tão terríveis, eu sei, mas foi o melhor que eu pra criar!
² - eu não tenho certeza se é exatamente isso, mas foi o que eu consegui somar e fazer, então se estiver errado não me crucifiquem!
bem, é isso ai, espero que vocês gostem, comentem, divulguem e todas aquelas coisas
beijos e até a próxima



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