Suspirei tristemente. Eu sabia que tinha dito mais que aquilo, e foi então que eu notei que o momento que eu mais tentei evitar desde que cheguei a Forks havia chegado. Era à hora de contar a Edward que James me estuprou.

Ele ainda me olhava com preocupação, esperando que eu dissesse alguma coisa, mas parecia haver um caroço em minha garganta que me impedia de falar. Eu não precisava do poder de Jasper para sentir a tensão que girava ao redor do quarto, ela era quase palpável.

Respirei fundo diversas vezes, inutilmente. Respirar não era necessário, eu estava fazendo isso na esperança de que esse ato tão humano me acalmasse, mas não tive resultado. Fiquei alguns minutos fazendo qualquer coisa, menos olhar para ele. Eu pensei que talvez assim eu pudesse pensar em uma forma melhor de contar a ele, sem incluir toda a tortura que eu havia passado, eu poderia manter isso dele, não poderia?

- Bella. – Edward não estava me chamando. Ele estava suplicando. E por mais que eu não quisesse reviver aquela época terrível, eu sabia que não poderia esconder nada dele. Eu não queria esconder.

Eu fechei meus olhos e ponderei por alguns momentos como eu começaria. Abri a boca para começar, mas as palavras ficaram presas em minha garganta. E então, antes que eu pudesse me parar, as palavras saíram de meus lábios.

- Eu conto tudo a você, mas tem me prometer uma coisa em troca. – eu falei séria. Eu estava com tanto medo.

- Qualquer coisa! – ele respondeu firme e segurou minha mão na sua.

- Promete... que não vai me deixar depois que souber?

Eu não conseguia encarar seu olhar, eu tinha medo do que veria ali. Mas eu tinha mais medo ainda de sua resposta.

Então, ele segurou meu rosto em suas mãos, me forçando a olhar para ele e assim eu pude encontrar seu olhar.

- Eu nunca vou deixar você. Pensei que já tinha deixado isso bem claro! – Edward suspirou – Não importa o que seja, meu amor por você é infinito. – ele me beijou.

Não havia qualquer duvida ou qualquer hesitação em suas palavras, ele realmente quis dizer cada palavra e isso fez um leve sorriso brotar em meus lábios. Nesse momento, eu sabia que não poderia ocultar absolutamente nada da minha história. Edward tinha todo direito de saber e então, ele decidiria se ficaria comigo ou não.

Afastei-me de suas mãos, que ainda estavam em meu rosto e as segurei nas minhas. Fechei os olhos por um momento e comecei.

- Você já sabe que não tive uma relação boa com a minha mãe e que alguém me levou para longe de casa. – ele assentiu – James. – Era doloroso simplesmente dizer o nome dele.

 – Eu estava no balanço em frente a minha casa, eu me lembro de ver a empregada da casa me espiar através das cortinas, momentos depois eu senti uma presença próxima a mim e então, tudo ficou escuro.

“Quando eu acordei, eu estava em um lugar escuro e sujo, uma cabana. Eu olhei ao redor e ele estava lá. Eu não me assustei pelo seu tamanho, pelos seus músculos ou pelos dentes afiados que estavam expostos graças a seu sorriso perverso, não. O que realmente me assustou foram os olhos extremamente vermelhos que ele possuía.”

Eu ouvi Edward respirar profundamente, mas não me virei para olhá-lo.

“Eu não me lembro muito bem dos primeiros anos, mas eu sei que naquela época ele não era tão terrível. Eu poderia dizer que ele era bom, mas mesmo sem me maltratar, ele me assustava! Na época eu não sabia se era pelos olhos aterrorizantemente vermelhos ou se era pelos afiados dentes que ficavam expostos através do sorriso malicioso que ele sempre exibia. Quando fiz treze anos as coisas ficaram... estranhas.”

Eu fechei meus olhos com força. Eu não tinha nenhuma idéia de como contaria isso a ele, eu não sabia se eu conseguiria.

- Eu só tenho que te alertar, isso não é um conto de fadas. – soltei uma risada nervosa.

Senti a mão de Edward pegando a minha e a apertando com força. E de alguma forma, eu senti como se ele soubesse que o que eu iria contar a ele era a pior coisa que poderia acontecer com um ser humano.

- Confie em mim. – Edward sussurrou em meu ouvido e foi o que bastou para um turbilhão de pensamentos me atingirem.

Eu cofiava nele, totalmente, mas meu medo era tão grande que eu mal podia pensar sobre a hipótese de Edward me deixar. Talvez eu não devesse pensar nisso. Talvez eu devesse simplesmente me concentrar no agora e contar a verdade de uma vez. Se ele me deixasse provaria que ele nunca me amou realmente. E eu não quero passar a eternidade com alguém que não me ama, certo?

Um dor se alastrou em meu peito, eu sentia que ela não pararia antes que os pensamentos de Edward me deixando fossem embora. Eu mal conseguia respirar ao pensar na hipótese de ser abandonada. E então eu percebi o que o amor faz com a gente. Eu conseguiria sobreviver com o fato de Edward não me amar. Doeria, mas eu sobreviveria desde que eu estivesse com ele.

Balancei a cabeça tentando afastar esses pensamentos e me concentrei em minha historia novamente. Respirei fundo e voltei a falar.

“Quando eu fiz treze anos ele ficou mais duro, rude. O sorriso no rosto dele pareceu mais perverso do que nunca. E a cada dia ele ficou pior. Um dia eu acordei e ele estava parado perto da minha cama, me olhando fixamente. Eu me assustei com o que eu vi no olhar dele, e eu nem mesmo pude identificar o que era. Então ele saiu, disse que iria caçar. Ele disse que precisava de muito sangue para manter o controle para o que iria acontecer naquela noite. Eu pensei em perguntar o que iria acontecer, mas achei melhor ficar quieta, ele não gostava que eu fizesse muitas perguntas. Eu passei o resto do dia encolhida no chão com a sensação de que algo terrível aconteceria naquela noite, e eu estava certa.

Quando anoiteceu, eu ouvi um ruído bem alto de passos do lado de fora da cabana. Eu me encolhi ainda mais e tentei não fazer barulho, mas parecia quase impossível. Meu coração batia tão rápido em meu peito que eu sabia que ele podia ouvir de onde ele estava. O barulho que seus pés faziam quando batiam no chão de madeira combinavam perfeitamente com o ritmo de meu coração acelerado. Eu sabia que ele só estava tentando me assustar, ele era um vampiro afinal, e poderia se mover a qualquer velocidade sem fazer qualquer ruído. E então, ele quebrou a porta da frente e a lançou contra a parede. Ele entrou em seguida e me procurou com os olhos.

Ele sorriu quando me viu encolhida no canto do quarto. Eu tive uma imensa vontade de correr, mas eu sabia que ele me alcançaria de qualquer forma, então continuei parada. Ele caminhou lentamente, até demais, até mim e se sentou no chão, bem a minha frente para que seus olhos ficassem na altura dos meus. Ele perguntou se eu estava com medo dele. Eu não respondi. Ele tomou meu silencio como um sim, pois soltou uma gargalhada estrondosa. Eu usei todas as minhas forças para não demonstrar como eu estava com medo, mas ele sabia, é claro.

Ele disse que eu não tinha motivos para ficar com medo, mas eu não acreditei nele. Depois de alguns minutos, ele colocou uma mecha de meu cabelo atrás da minha orelha e eu fiquei com tanto nojo do toque dele e nem sabia o porquê.”

Apertei meus olhos fechados com força. A mão de Edward estava imóvel segurando a minha. Pode parecer impossível, mas eu juro que a mão dele ficou mais gelada depois que eu falei a ultima parte.

“Eu queria gritar para que ele não me tocasse, mas eu não conseguia pronunciar qualquer palavra. Depois de alguns segundos eu consegui sussurrar que eu estava com medo. Eu não queria ter dito aquilo, simplesmente saiu. Eu não queria parecer tão fraca, mas é claro que ele já sabia que eu estava com medo. Ele tentou me tranquilizar, ele disse que ia ficar tudo bem. Mas a cada segundo meu medo só aumentava.

Ele passou a mão no meu cabelo de novo... Eu queria gritar com ele e mandá-lo parar, mas eu não tinha coragem. Ele me perguntou se já tinha me feito mal. Isso me fez pensar um pouco, ele não tinha. Ele me dava tudo o que eu precisava, e apesar de me manter aprisionada naquela cabana e de me assustar mesmo que inconscientemente, ele me tratava bem. 

Ele disse que tinha um presente para mim, e tirou uma caixinha de veludo do bolso. Lá dentro tinha um colar. Eu disse a ele que não queria e ele me perguntou o porquê, inventei uma desculpa qualquer na hora, mas a verdade é que eu não queria nada dele. Ele não aceitou minha recusa, então pegou o colar e o colocou no meu pescoço.”

Meus olhos se encheram de lágrimas instantaneamente. A pior parte estava chegando e foi pior do que eu temia. O medo de Edward me deixar foi substituído pelo medo de reviver a cena mais perturbadora e aterrorizante da minha vida. Minha respiração estava acelerada, mas me forcei a continuar, eu não poderia parar agora.

“A mão dele ficou passeando pelo meu braço e isso me causou um arrepio de desgosto, mas ele não parou. Ele colocou a outra mão no meu pescoço e aproximou o rosto ainda mais do meu.”

Ouvi Edward respirar fundo e apertar minha mão com uma força excessiva, mas eu não me importei. Ele estava aqui e isso me confortava.

“Ele disse que eu não precisava ter medo, mas medo era o único sentimento que eu estava sentindo no momento. Depois ele disse que... me amava.”

As lagrimas caiam de meus olhos agora, eu queria desesperadamente parar de falar sobre aquilo, mas as lembranças giravam em minha mente como se as cenas estivessem passando na minha frente.

“Eu sabia o que aconteceria naquele momento. Na verdade, acho que eu sempre soube que aquilo aconteceria, eu só... Ele puxou meu rosto e me beijou.”

A mão de Edward deixou a minha em um segundo e senti ele se levantar do sofá. Apertei meus olhos ainda mais, tentando ignorar a dor em meu coração. Eu sabia que isso aconteceria, mas mesmo assim continuei a falar.

“Eu tentei me soltar, fiquei me debatendo, mas ele não me soltava! Depois de alguns segundos ele se afastou e disse que se eu lutasse seria pior... Então, eu desisti. Eu esperava que ele parasse de me tocar em algum momento, mas ele não parou!”

Minhas últimas palavras saíram cortadas pela crise de soluços e lagrimas que eu não conseguia conter nem que eu quisesse. Por um momento eu pensei que Edward tivesse ido embora, pois eu não ouvia nenhum som além o do meu choro.

De repente um estrondo soou atrás de mim, me virei já me colocando em posição de ataque. A cena a minha frente era atordoante e perturbadora. A estante de CDs foi lançada inteira do outro lado da sala, no lugar dela estava um Edward completamente transtornado.

A face perfeita dele estava contorcida em uma careta de dor, as mãos fechadas em punho tão apertadas que se ele fosse humano com certeza se machucaria, seus olhos estavam fechados e ele levou uma das mãos para apertar a ponta de seu nariz, um habito que ele tinha quando ficava nervoso. Eu o olhei cautelosa, eu não tinha idéia do que ele estava pensando e tinha medo de descobrir.

Um soluço que eu estava tentando reprimir escapou de minha garganta. Nesse momento Edward abriu os olhos e olhou diretamente para mim. Seus olhos tinham um brilho diferente, estavam tristes e eu tinha certeza de que se ele pudesse chorar, estaria em prantos.

Ele caminhou lentamente em minha direção. A cada passo que ele dava era uma lágrima de veneno que escorria pelo meu rosto. Ele parou tão próximo a mim que eu nossos corpos estavam quase se tocando. Eu sabia que ele me olhava, mas não tive coragem de olhar em seus olhos dourados. Eu tinha medo de ver o nojo que ele sentia por mim expostos nos olhos dele. Fechei os olhos tentando conter as novas lágrimas de caírem, mas parecia impossível.

Então, eu senti um toque tão delicado como plumas em meu rosto, limpando minhas lágrimas. Abri meus olhos e levantei meu olhar para encontrar os de Edward. Eu não encontrei ali nada do que eu esperava. Não havia nojo, não havia ódio e nem nada do que eu esperei. Havia milhares de sentimentos girando pelos olhos de Edward, mas o único que eu consegui decifrar foi o amor.

Passei meus braços ao redor de Edward e chorei. Chorei por tudo o que passei nas mãos de James, chorei por não ter mais idéia do que fazer para esquecer, chorei por que passei minha vida inteira perdida, e agora, nos braços do homem que eu amo, eu finalmente descobri onde eu pertencia. Para mim os braços de Edward era o lugar mais seguro do mundo. Sorri em meio às lágrimas, por que eu sabia que era verdade.

- Bella, ele...? – Edward não terminou a sentença, mas eu sabia o que ele queria perguntar.

- Sim, ele... me estuprou. – eu engasguei com a palavra e percebi que nunca a tinha dito em voz alta. Foi muito mais fácil colocá-la para fora do imaginei. Era como se tivessem tirado um peso imenso de meus ombros.

Edward soltou um som estrangulado, a expressão de dor ainda mais evidente em seu rosto perfeito. E foi só olhá-lo para notar que o peso que saiu de mim parecia ter ido direto para ele. O abracei ainda mais forte tentando passar todo conforto que ele estava me dando.

- Vai ficar tudo bem, Edward! – sussurrei encostando minha cabeça em seu peito. Ele apertou seus braços mais forte em torno de mim.

- Não era eu que devia dizer isso? – eu pensei que ele estava tentando ser humorado, mas não havia nem um pouco de humor em sua voz ou em sua postura.

Ergui minha cabeça para poder olhá-lo e beijei seus lábios, ele estava tenso no começo, mas logo retribuiu. Eu sabia que ele estava mal com o que eu acabara de contar, mas eu não sabia exatamente o que ele precisava que eu dissesse.

- No que está pensando? – eu sorri quando terminei de falar, eu soei exatamente como ele. Edward abriu um fraco sorriso.

- Em você, em nós... nele. – ele engoliu em seco. – Eu vou matá-lo... da forma mais dolorosa que eu encontrar, eu te prometo isso, Bella.

Edward POV

Desesperado, confuso, perdido, atordoado e mais um milhão de sentimentos me tomaram quando Bella terminou com sua história. Como a vida poderia ser tão injusta? Como alguém poderia ser tão cruel a ponto de fazer uma atrocidade dessas com alguém tão pura como Bella?

Eu me sentia acabado, mas acima de tudo, perdido. Eu queria poder pegá-la e levá-la para longe. Eu queria levá-la a um lugar bem longe de todos, um lugar onde eu pudesse curar o coração dela sem ninguém por perto para atrapalhar. Eu queria poder tirar toda essa tristeza do olhar dela. Era o que eu mais queria!

- Você não pode matá-lo, eu nem sei se ele ainda está vivo. – ela respondeu em um fio de voz. A dor que ela sentia parecia sair de cada poro do corpo dela. Eu queria desesperadamente tirar isso dela, mas eu sabia que era impossível.

- Eu tenho a eternidade para descobrir isso.

- Não! – ela respondeu rapidamente. – Você tem um compromisso comigo, durante todos os dias da sua eternidade.

Não pude conter uma risada de escapar pelos meus lábios. Mas ela durou pouco, eu não conseguia rir nesse momento. Não com as imagens do que James pode ter feito ela sofrer.

- Bella? – ela me olhou, o fraco sorriso descansando em seus lábios distraia-me das lágrimas que ainda escorriam pelo seu rosto. Eu beijei as lágrimas para limpá-las e sussurrei. – Foi a única vez?

Eu precisava saber, mesmo que a verdade só me atormentasse, eu precisava saber.

- Não. – ela sussurrou tão baixo quanto eu – Aconteceu quando eu tinha 13 e continuou até os 17.

Eu tinha me esquecido como respirar. Uma dor alucinante surgiu em meu peito. Eu tinha vontade de correr, de gritar, de quebrar meu quarto inteiro. Ou talvez a casa inteira, e sabia que mesmo se fizesse tudo isso, essa dor, essa angustia não iria passar. Eu sabia que Bella precisava de mim nesse momento, então eu fiquei. Eu a abracei e disse que ficaria tudo bem. Na verdade, eu estava tentando convencer a mim mesmo disso.