Rock Of Ages escrita por AniinhaBorges


Capítulo 2
Capítulo 1




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Como de costume, o clube já estava lotado quando cheguei. Era verão e toda a exclusiva parcela de sócios estava se banhando na deliciosa piscina e aproveitando os campos de minigolfe do local. Antes mesmo de eu nascer, minha família frequentava aquele ambiente, então todos já sabiam quem eu era, mas mesmo assim, eu não tinha nenhuma amizade especial naquele lugar. Conhecia algumas meninas da minha idade, algumas inclusive do internato, mas não tínhamos aquela relação de fazer festa do pijama uma na mansão da outra ou de ligar chorando quando estivéssemos precisando ouvir um conselho sobre meninos. Eu as conhecia pelo simples fato de que nossas mães estavam sempre tomando chá ou Dry Martini na beira da piscina ou no salão do clube.

Entrei pela familiar porta da frente e passei pelo hall de entrada. Havia alguns homens conversando sobre as ações da bolsa enquanto tomavam uísques e fumavam charutos e algumas mulheres conversando sobre bronzeamento e sobre os divórcios alheios, geralmente minha mãe e meu pai eram assuntos constantes das madames do clube. Passei por elas e continuei meu caminho em direção à área exterior, onde se localizava a piscina e mais a frente o restaurante. Ao chegar ao restaurante, o simpático maître me cumprimentou e me levou até a mesa que meus pais sempre reservavam. Era uma afastada de quase tudo, na varanda do restaurante, de frente para uma das mais maravilhosas vistas de toda Malibu. Sentei-me à mesa e em segundos um garçom se aproximou, me entregando um cardápio e me avisando sobre o especial do dia. Disse a ele que no momento só gostaria de uma água com gás e que em breve o chamaria para anotar meu pedido. Ele se afastou e eu me ajeitei na cadeira, colocando minha bolsa na cadeira ao lado e guardando a carta do colégio. Provavelmente não precisaria mais dela. A essa altura meu pai já deveria saber das minhas artimanhas e, para minha infelicidade, já teria também avisado mamãe sobre o ocorrido.

O garçom voltou em segundos e me serviu. Enquanto ele se afastava, me distraí com a paisagem que estava a minha frente. Desde criança eu era apaixonada por aquela vista. Ver o mar quase por inteiro me tirava o fôlego e desde sempre imaginei como seria poder ser livre para poder navegar por aquelas águas, ou até mesmo, como seria poder entrar em contato com aquelas águas, sentir suas ondas batendo na minha pele e o sol iluminando e queimando tudo lá do alto. Crescer numa família da alta sociedade nunca foi muito bom para mim. Quero dizer, nunca reclamei do fato de crescer cercada por todo o conforto e luxo que meu pai me proporcionou, mas tudo isso vinha com um preço. Apesar de ser muito próxima a ele, não cresci com meu pai por perto. Ele estava sempre viajando a trabalho e quase nunca tinha tempo para me ver. Minha mãe esteve sempre comigo. Ironicamente, não consigo suportá-la. Ela sempre me disse o que fazer, quando fazer e como fazer. Seu sonho sempre foi que eu me tornasse uma segunda versão de Katherine Griffin, mais sofisticada, mais dedicada à família e mais esnobe. Como se isso fosse, de alguma maneira, possível.

Fiquei distraída por um tempo até que percebi alguém se aproximando de mim. “Pai! Que bom vê-lo!”- eu disse, levantando para abraçá-lo. Eu conhecia meu pai, sabia que ele iria aparecer, ainda mais depois da ligação de minha diretora. “Eve! Que saudades suas!”- ele disse, sendo sincero em cada sílaba. Não nos víamos desde Abril, no aniversário do vovô e já estávamos em meados de Julho. “Então, encontraram bebida no seu quarto. De novo.” – ele disse se sentando. Eu não era nenhuma gênia do crime nem nada e a única péssima ideia que eu bolei para ser expulsa foi plantar algumas garrafas de vodka no meu quarto. Eu não respondi nada, só sorri inocentemente. “Desculpa.”- eu disse por fim. Ele respirou profundamente e me olhou, com um olhar de desaprovação. Por mais que eu odiasse ser encarada dessa forma por ele, eu sabia que iria valer a pena. “Bem, o que faremos com você?”- ele disse chamando um garçom e pedindo-lhe uma dose de uísque puro e nossa refeição. “Não sei. Mas obviamente continuar no internato está fora de cogitação. Você me conhece, antes de ser aluna do Cornelius, eu nunca tive problemas com bebida.” – eu disse, bebendo minha água. “Acho que poderíamos aproveitar essa situação para eu poder passar um tempo com o senhor. Que tal? Eu poderia morar com você por alguns meses, quem sabe isso não me faria bem?” – eu disse bebendo mais água e virando minha cara para ele não me encarar. “Querida, eu adoraria, mas você sabe que eu sou um homem ocupado.” – ele disse pegando minha mão e me fazendo tentar entender como se eu tivesse três anos. “Eu sei, mas podíamos bolar algo; eu estudaria o dia todo e você trabalharia. Assim, teríamos a noite pra nós.” – eu sugeri animada. “Morar com seu pai?! Evelyn, por favor.”- ela disse, interrompendo nossa negociação e se sentando à mesa conosco. “Katherine.”- meu pai disse, secando a garganta. “Arthur.” – minha mãe retrucou em seguida. Desde o dia que assinaram os papéis do divórcio, era assim que eles se cumprimentavam. “Mãe, o que você faz aqui?” – perguntei com desgosto. Esse era para ser um almoço pai e filha. Sem mãe por perto. “Ora, pelo que estou vendo isso é uma reunião de família e eu sou parte dessa família, certo?”- ela respondeu enquanto um garçom servia-lhe um Dry Martini. Todos os garçom e funcionários do clube sabiam que quando Katherine Griffin chegasse, era bom que sua bebida já estivesse a aguardando, pronta. Eu ignorei seu comentário e me voltei para meu pai. “De qualquer forma, o que me diz pai? Você aceita tentar?” – eu perguntei quase implorando. “Querida, eu queria muito que pudéssemos passar mais tempo juntos, mas eu sou muito ocupado, quase não fico em casa. Melhor deixar as coisas como estão; você morando com sua mãe e estudando na Cornelius, onde é o seu lugar.” – ele disse. “Mas eu não quero morar com ela! Eu quero morar com você. E além do mais, eu fui expulsa do colégio. Não te informaram isso?” – eu gritei. Minha mãe tentou me controlar, mas eu não dei a mínima para ela. “Sim, informaram. Mas eu conversei com sua diretora e eles decidiram te dar mais uma chance. Você tem um currículo exemplar, é uma excelente aluna.” – minha mãe agora estava sorrindo sarcasticamente. Ela sabia que esse “decidiram te dar mais uma chance” era uma desculpa. A Cornelius era severa demais e quando uma aluna era expulsa, não havia volta. “Ok, Arthur. Agora me conte: quanto custou essa chance?” – ela perguntou soltando gargalhadas. “Katherine, por favor. O que importa aqui é que Evelyn continuará morando com você e assim que o verão terminar ela voltará para o colégio, como se nada tivesse acontecido. Agora, se me derem licença, tenho que ir. Meu voo para o Canadá parte em algumas horas e eu ainda não terminei de ver alguns detalhes.” – ele se levantou e terminou sua dose de uísque, sem ao menos olhar para mim. Eu não acreditava no que estava acontecendo; tá certo, eu não fiz nenhum esforço monstruoso para ser expulsa, mas eu fui. Todos sabiam. Eu iria voltar ao colégio, marcada com todos me olhando e falando de mim. E para piorar tudo teria de voltar para minha vida, para a casa da minha mãe, com a minha mãe. “Ligo para você quando voltar, ok?” – ele se virou para mim e me beijou na testa. “Ah, e Katherine, coloque o almoço na minha conta sim?” – ele avisou e saiu andando.

Eu e minha mãe almoçamos em silêncio. Já estávamos acostumadas a não trocar palavras nem olhares durante nossas refeições. As únicas vezes que nossas vozes eram ouvidas era quando uma chamava o garçom para pedir mais um drink ou mais uma água. Eu estava me odiando naquele momento, estava odiando tudo. Minha mãe, aquele lugar, minha vida e meu pai. Mais uma vez ele tinha me trocado pelo trabalho e me largado com aquela mulher, presa naquela casa e naquela escola. Eu estava cansada de tudo aquilo, não aguentava mais aquela atmosfera que estava vivendo. Não só a casa e o colégio estavam me sufocando, mas tudo ao meu redor. O hábito de vir ao clube e passar horas conversando sobre bolsas e sapatos com meninas que eu nem ao menos sabia o nome, ficar presa em casa podendo sair somente para o clube ou acompanhada de seguranças. “Sabe, quando eu tinha sua idade, também tive minha fase rebelde.”- minha mãe estava, estranhamente, tentando quebrar o silêncio entre nós. Eu a olhei com olhos em chamas, sem entender o que ela pretendia com aquilo. “Eu queimei todas as minhas roupas e me recusei a vir na festa de Natal do clube. Sua avó ficou furiosa.” – ela continuou, risadas vinham ao seu rosto conforme ela lembrava e contava suas aventuras. “Isso não é uma fase.” – eu sussurrei, porém ela ouviu. “Claro que é. Logo logo você irá parar de agir feito uma adolescente mimada.” – ela disse bebendo mais um pouco daquele que era seu terceiro drink. “Talvez eu só esteja agindo assim porque a única coisa que eu sou é uma adolescente mimada, a princesinha de vocês.” – eu disse aumentando meu tom de voz. “Evelyn, por favor, aqui não é lugar para isso. Tem pessoas olhando.” – ela segurou meu braço forte e me encarou. Soltei meu braço e a encarei também, decidida a ganhar essa batalha. “É isso que eu sou né, uma marionete. Eu tenho que ser a filha perfeita, tenho que dar certo. Porque vocês eraram uma vez, não podem errar duas vezes.” – eu a desafiei. “Não bote sua irmã no meio. É uma questão completamente diferente. Agora, cale-se e termine sua sobremesa.” – ela segurou novamente meu braço, dessa vez mais forte e ficou me encarando até soltá-lo. Eu respirei fundo e voltei a comer, em silêncio.

Após o almoço, voltamos para o estacionamento. Minha mãe entregou as chaves ao manobrista e o observou enquanto ele corria para pegar seu carro. “Então, como você veio para cá?” – ela perguntou colocando seus óculos escuros. Ela fazia isso quando não queria me olhar nos olhos, ou simplesmente me olhar. “De carro.”- eu respondi. “Bem, sendo assim, eu avisarei a diretoria que seu carro está aqui e mais tarde William virá aqui buscá-lo.” – ela disse. Para ser sincera, não estava prestando atenção no que ela dizia, estava mais uma vez presa aos meus pensamentos. Todo o almoço passou pela minha cabeça, me embrulhando o estômago. Tudo que eu queria era que esse dia terminasse comigo no carro do papai, indo para a casa dele, com ele, rindo e conversando sobre como nossa vida seria. Doce ilusão a minha. De repente, me peguei pensando em outra pessoa, alguém que eu não havia pensado ainda, a única pessoa de quem eu não estava com raiva. “Evelyn! Você está me ouvindo?” – a voz dela me fez acordar. Virei-me para ela, que já estava em seu carro, se preparando para dar a partida. “O que foi?”- eu disse. “Entre no carro, William pegará seu carro mais tarde.” – ela disse, me apressando. “Não, não precisa. Eu vou no meu carro.”- eu respondi. Ela abaixou seus óculos e me olhou com um olhar desconfiado. “O que você está armando, garota?” – ela me perguntou. Eu sorri inocentemente e dei minhas chaves ao manobrista. “Nada, mãe. Eu só quero ir no meu carro.” – eu disse. Ela colocou seus óculos de volta e deu a partida. “Tudo bem então. Nos vemos em casa.” – ela disse fingindo um sorriso. Eu sorri de volta pra ela e acenei antes dela dar a partida. “Sim, nos vemos em casa, mamãe.”



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