Samantha está sentada no canto de seu quarto. As paredes beges manchadas de sujeira . Seu rosto manchado de vermelho e lágrimas quentes descendo de seus olhos de oceano. Lamentava. Mas só em sua mente. Não abriria a boca. De jeito algum. As veias de seu pescoço pulsavam, e Sam sentia suas lágrimas descerem das bochechas até o queixo, até o pescoço e depois secarem lá mesmo. Lembranças más afagaram sua mente, banhando-a de escuridão passada. Passada não. Muito recente. Mas Samantha trabalhava em enterrá-las bem no fundo de sua memória. Apertava os olhos com muita força, até ver bolinhas laranjas afetando sua visão. E infelizmente, mais memórias forçavam as pálpebras de Sam. Dessa vez foi diferente. Não foi apenas o fundo do frasco das memórias repugnantes que guardara dessa tarde. Não foram apenas as notas de fundo do perfume amargo que perseguia Samantha durante o dia acinzentado. Foi um jorro de lembranças malditas que dilaceravam seu coração . Agora foi bem claro, nítido e colorido. Aliás, a única coisa colorida daquele dia. Ela caminhava de mãos dadas com o jovem de cabelos pretos e olhos incrivelmente verdes. Andava graciosamente pela grama vestindo um vestido de renda branca e sapatilhas rosas. Ela não estava confortavel vestindo aquilo. Não pelo que se lembrava. Mas nada importava pra ela naquele momento. Ela só via o rapaz de pele amarelada sorrindo pra ela, vestindo uma blusa vermelha e calças pretas. Ele beijou sua bochecha com seus lábios gelados e aparentemente doces para a pele sensível de Samantha. Ela decidiu parar por aí. Abriu os olhos e não viu nuance alguma. Só um manto cinza cobrindo sua mente dolorida. Sua cabeça também estava dolorida. Ela se manteve forte. Sabia que aquilo era necessário. Samantha não era de fazer drama, e nem muito menos gostava de ser tratada como a menininha sensível que precisa da ajuda de alguém. Depois de tanto sofrer com um pai desaparecido e uma mãe embreagada 95% do dia, Samantha aprendeu que o mesmo mundo que finge que te ajuda, no momento seguinte te vira as costas. Ela teria de enfrentar tudo sozinha. Coisa que não era muita novidade para ela. Olhou para o chão coberto de poeira sem nada ver. Era normal o torpor. No momento seguinte de um momento de mínima paz, Samantha se viu na chuva. Imaginou ser apenas sua ilusão da nuvem cinza e roxa que cobria seus olhos desabando acima da própria cabeça. Pareceu ser no meio do caminho da verdade e da nuvem que a leva para o sonho de de vez em quando. Rolou no chão e viu o piso de madeira. Reconheceu-se a seguinte cena: Samantha jogada no chão coberta de sangue, que irrompeu de suas veias por obra de Mason. Não acreditava. Não podia ser. Suas palavras amargas foram forçadas pra baixo da garganta de Puckett. Lançadas como flecha, acertando em cheio o alvo que era o coração de Samantha. Pra ele, apenas algo tenro que destruia de garotas que caracterizava comum. Saía-se de dentro algo que ela chamava de amor, e ele de ilusão. Todas as vezes. Com a força que Sam ainda tinha, ela sentou-se no chão. Olhou pra ele com os olhos mergulhados no pavor, e na paixão. Ridículo sentimento. Palavras ditas pelo idiota. Ele largou o pedaço de madeira que estava manchado de sangue no chão, saindo com os olhos frios. Lábios que um dia jurou ser seu sonho de amor, se tornaram um pesadelo constante, que voltaria a atormentar o cérebro de Sam cada noite mal dormida. Ela sentiu frio. Dos dois lados de sua realidade. Acordou, de forma bruta no chão de seu quarto. Pareceu ser menos pior. Um minuto depois, lágrimas espirravam das bochechas da loira, que não se continha. Nenhuma mão amiga seria capaz de apaziguar a guerra de ódio e dor que fora formada dentro dela. Não sabia o que fazia da vida. Com um replexo preciso e involuntário, ela se ergueu do chão manchado de vermelho intenso, e caminhou em passos lerdos até o banheiro. Tirou a roupa, e vestiu um conjunto que havia separado naquela manhã para o banho que aconteceria mais tarde, junto com a promessa que seria feita mais tarde, se o seria o sangue não fosse derramado em suas peças de roupa escolhidas meticulosamente para encontrar a pessoa que Samantha julgava a mais importante de sua vida. Vestiu sem olhar o que estava usando. E deixou no chão as roupas sujas de sangue seco. Saiu pela porta sem mesmo puxar os cachos loiros pra fora da camiseta. Quando foi virar o corredor, sua mente carregada de vazio lhe alertou algo. Puckett podia estar passando pelo pior momento de sua vida, mas seus instintos criminosos ainda pulsavam em seu interior. Lembrou-se de fechar a porta do banheiro que continha a prova de um acontecimento recente que não queria nem que uma bactéria ficasse sabendo. Trancou o cômodo e enfiou a chave no bolso de trás. Caminhou até a porta do apartamento grotesco em que sua mãe vivia e rastejou até um lugar que sua mente caracterizava de paz. Após descer as escadas, pegou a rua que a levaria ao Bushwell Plaza.