Winter In London escrita por Luh Moon


Capítulo 15
Capítulo 15 – Sim! Eu me importo!


Notas iniciais do capítulo

Ah! Eu sempre penso muito antes de escrever para não "humanizar" demais o Sherlock! Por que ele é humano sim, mas daquele jeitão dele.
Nesse capítulo temos uma típica carta de amor de Sherlock... Ou o mais próximo disso que ele consegue chegar!
Os mais emotivos devem pegar os lenços...
Boa leitura!



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Quando John voltou a Baker Street o acumulo de informações ainda causava uma certa tontura. Não sabia o que era mais inquietante: encarar o fato de que seu melhor amigo tinha uma relação intima e secreta com uma mulher ou que essa mulher tinha sido criada como sua irmã. As duas coisas era igualmente fantásticas! Soavam sensacionalistas, como uma notícia de um folhetim barato. Sabia que não podia discutir o assunto abertamente com Sherlock, como fizera com Mildred. Ele não era um livro aberto cheio de respostas como sua não-irmã. John ficou confuso por um momento imaginando qual seria o título mais apropriado para se referir a ela. Amante? Amiga? Não-irmã ainda parecia o mais aceitável de seu ponto de vista.

Subiu as escadas devagar, sabia o que ia encontrar. Provavelmente o amigo ainda estaria metido no quarto, fazendo-se sabe Deus o que ele fazia trancado lá durante horas. Pelo menos daria a ele algum tempo para pensar e absorver todas as informações que havia recebido. Ainda parecia que acabara de sair de um universo alternativo de muito mau gosto. Quando abriu a porta porém, viu suas expectativas frustradas: Sherlock estava sentado na cadeira de costume, mergulhado em um silêncio profundo, enquanto fitava o fundo de uma xícara de chá.

Mal John deu dois passos dentro do apartamento, Sherlock ergueu os olhos e observou. Alguma coisa na atitude do médico chamara sua atenção. E aquele cheiro... Ele conhecia aquele perfume. Franziu levemente a testa quando constatou, ao olhar para os sapatos do outro, que sabia exatamente onde ele estivera. Por quê? Por que teria ido vê-la tão cedo pela manhã? E, mais importante, o que tinham para conversar? A julgar pelo horário que John costumava acordar e pelo tempo que se levava normalmente até o apartamento dela, tinha conversado bem mais de duas horas, eram quase onze horas agora...

– Onde esteve? - perguntou de chofre.

John hesitou por um instante. Era uma pergunta casual e afinal o outro estava falando... Porém quando olhou para o detetive percebeu que havia algo de raivoso em seus olhos e uma incrível tensão nos músculos de seu rosto. Certo! Sabia que ele era capaz de deduzir onde ele estivera, então por que estava perguntando? Sherlock juntou as mãos diante do rosto e bateu os dedos uns nos outros, estava claramente ansioso pela resposta.

– Saí... - agora John estava curioso com aquela situação.

– Sim? Isso é bastante óbvio para mim! - suspirando. - Ainda assim gostaria de saber onde e com quem esteve por mais de duas horas? É tempo suficiente para muita coisa... - estreitando os olhos.

– Fui ver Mild, se é que isso realmente importa... - caminhando até a cozinha.

– Oh! É mesmo? Mild? - o tom de voz era mais áspero do que John jamais ouvira vindo de Sherlock. - Quando foi que ficaram tão intimos ao ponto de você ir visitá-la logo cedo da manhã e chamá-la por apelidos? - ficando em pé.

– Ora! Sherlock! Sua irmã...

– Ela não é minha irmã! - e agora parecia realmente irritado.

– Que seja! - lembrou-se imediatamente do conteúdo da conversa com Mildred e concordou com ela sobre os motivos pelos quais Sherlock enfatizava tanto o fato de não serem irmãos. - O caso é que ela é uma criatura adorável...

– Oh! Ela é? - erguendo uma sobrancelha e detendo-se a porta da cozinha, apertando ainda mais os olhos.

– Sim... - John encheu uma chaleira. - E, veja, ela é gentil e... - só então percebeu o olhar assassino com o qual o outro o fitava. - O que há?

– Ainda não consigo entender o que é que tinham de tão importante para conversar que não pudesse ser dito pelo telefone, por exemplo.

– Telefone? - soltou uma risada. - Não, era coisa para ser conversada pessoalmente e... - e foi de repente que John entendeu perfeitamente o que estava acontecendo. - Oh! Bom Deus! Como não percebi isso antes?

– Está fugindo do assunto, John! - protestou Sherlock.

– Não, não estou! - sorrindo. - Você está com ciúmes!

– Eu? Eu estou … o quê? - dando as costas para John. - Ora! Não seja ridículo!

– Está morrendo de ciúmes por eu ter ido vê-la! Deus! - ainda sem conseguir conter o riso. - É claro como água!

– Está sendo ridículo e pretensioso, John Watson! - tentando retomar o controle e indo sentar-se em sua poltrona.

– Mas é claro! - continuo John seguindo-o. - Você não come, dorme demais, fuma demais... Como foi que não percebi antes? Todos os sinais estão aí! - apontando para ele.

– Sinais? Quais sinais? - com uma estranha expressão de curiosidade nos olhos.

– Está apaixonado!

Por uma fração de segundo, impossível de ser percebido por alguém destreinado com John Watson, o coração do detetive consultor disparou, sua pulsação acelerou, a respiração falhou e suas pupilas dilataram significativamente. Seria a perfeita confirmação de que o que o médico dissera era a mais pura verdade! A patética verdade de uma vida inteira! É claro que tinha consciência disso! Tinha consciência disso desde que ela tinha cinco e ele doze anos... Ele sempre fora apaixonado por ela de tantas formas e em tantos sentidos que uma pessoa comum dificilmente entenderia. Agradeceu mentalmente pela capacidade limitada que John tinha de fazer observações.

– E está morrendo de ciúmes por que não sabe o que eu fiz no tempo em que estive sozinho com ela! - John frisou aquela palavra propositalmente.

– Está alucinando, John... - mas a frase saiu sem muita convicção. O fato de ter a confirmação de que o médico estivera sozinho com ela não o deixava mais confortável.

– Não seria mais fácil que desse o braço a torcer? - sentando-se em frente ao moreno.

– Não sei do que está falando... - voltando a se concentrar na xícara.

– Sherlock! Admita! - insistiu o médico. - Qual é o grande mal em admitir que tem sentimentos?

– Está dizendo além que colocar a vida de outra pessoa em risco por ter um laço afetivo comigo? Assim como já aconteceu com você? Ou além de sempre haver a possibilidade que eu tenha que, digamos... - fez uma expressão trágica. - … fingir minha própria morte e abandonar alguém que realmente se importa comigo? Ou talvez, e apenas talvez, você não esteja levando em consideração o quando nossa vida é errática e sem nenhuma segurança... - ia continuar, mas percebeu que o sorriso de John tinha desaparecido.

– Você já pensou em tudo não foi? Um dia você realmente considerou a possibilidade de...

– Não sei do que você está falando... - agitando a mão e levantando-se apressado.

Considerar a possibilidade? Ignorar seus instintos, seu gosto pelo perigo e pelos crimes e viver uma vida monótona ao lado de uma mulher? Se tinha considerado? Dúzias de vezes... Uma sem conta de noites em claro que nada tinham a ver com casos a serem resolvido e que tinham tudo a ver com a distância que se impusera entre ele e aquilo que ele mais desejava... Aquilo que ele tinha como propriedade sua antes de Mycroft lhe provar que estava errado. Mas não tinha como explicar isso a John, tinha?

Não era um caso de paixão, era mais que química básica! Era mais que aquela atração explosiva que empurrava um para os braços do outro sempre que estavam juntos. Era mais do que palavras seriam capazes de dizer. Era um vicio, uma dependência, uma doença, um veneno que corria em suas veias e que não tinha antídoto ou cura! Ela significa algo para ele, era simplesmente o combustível sem o qual sua existência perdia completamente o significado. John entenderia algo assim?

– Apenas admita que se importa... - murmurou John quase se dando por vencido.

– E isso faria alguma diferença? - a voz dele saiu trêmula e o médico teve que se levantar e confirmar o que sabia por intuição. Quando deu a volta encontrou um Sherlock com os olhos avermelhados.

– Isso é... - John afastou-se.

– É mais do que você pode lidar, John! - suspirando. - Apenas me diga o que de tão importante tinham para falar um com o outro...

– Eu estava preocupado com você... - disse o médico cedendo finalmente. - Ela concordou em explicar alguns pontos que você fez questão de manter obscuros...

– Mesmo? - engolindo em seco e alcançado a carta que descansava no bolso do seu roupão.

– Ela contou o que aconteceu no aniversário de quinze anos... - disse sem muita coragem.

– Como eu já disse, não é algo de que eu me orgulhe... - caminhando devagar e voltando a sentar-se na poltrona.

– Ela disse que não tem nada com sentimentos e que... - Sherlock ergueu imediatamente o olhar e John achou que estava falando demais. - Que era uma espécie de vicio, de estimulante... - fechou os olhos, arrependido de ter mencionado aquela parte.

– Ela sabe... - sorrindo sem entusiasmo. - Ela sempre soube. É inteligente... - enfiou a mão no bolso e tirou o papel dobrado. - Já que você conhece a história, pode ler isso... - estendendo o papel a John que hesitou um momento antes de apanhá-lo.

– E isso é?

– Uma carta. Escrevi na noite do aniversário, a que você citou... Depois de cometer, o que eu acredito ter sido, um dos piores erros da minha vida... - levantando-se. - Divirta-se com a leitura! - saindo e trancando-se em seu quarto.

John suspirou e apertou a carta entre as mãos. Não sabia o que aquele gesto significava, mas sabia que não era bom... Coçou a cabeça confuso. Desde que Mildred surgira não reconhecia mais seu amigo. Achou que aquele pedaço de papel, escrito a quase quinze anos poderia lançar alguma luz sobre o assunto. Abriu-o com cuidado e iniciou a leitura:

“È definitivamente uma coisa estranha de ser feita, mas sei que em algum momento vou precisar dizer a você e tenho certeza que isso vai se tornar impossível. Mais que precisar, sei que vou desejar dizer isso. É bom que eu escreva enquanto ainda sinto isso desse jeito, um pouco descontrolado.

Na verdade sinto um enorme desconforto agora. Como se fosse ter um infarto nos próximos minutos. Essa dor no peito, perto da entrada do estômago me incomoda já faz algum tempo, mas eu realmente só a encarei hoje, quando você cruzou a porta da bancada e surgiu feito uma aparição no meio da minha sala. Foi quando senti a sensação esquisita de ter engolido alguma coisa leve demais para ser digerida. Você sabe não é? A sensação das borboletas. E também sabe o que significa.

Tem sido um dos meus mais empenhados esforços apagar a sua impressão da minha vida. Especialmente por perceber que sempre me coloca nessa posição desagradável de vulnerabilidade. E teria sido muito bem-sucedido se você realmente tivesse desaparecido. Mas você insistiu em voltar e tornar tudo mais complicado. Não podia continuar sendo só uma lembrança? Tinha mesmo que vir e tornar tudo irremediavelmente concreto?

Minha mente tem esse mau hábito de estar sempre alguns passos a frente. Nenhum dos meus outros sentidos consegue alcançar. Minhas emoções se tornam terrivelmente aborrecidas diante da magnífica dinâmica dos pensamentos, especialmente quando a algo a ser resolvido, encontrado, analisado. Mas você sabe bem disso! Perdeu algumas noites de sono apenas para me ouvir falar sem parar. O problema, a questão aqui é que nada disso funciona direito quando você está por perto.

Não há nada de errado com minha mente ou meu raciocínio. Ao contrário, sua presença acelera ainda mais minha capacidade de raciocinar de uma forma que nem eu mesmo consigo entender ou controlar. Quando está por perto, funciona como combustível posto ao fogo. Mas potencializa as minhas emoções mais profundas.

De todos os vícios que tenho esse é de longe o mais perigoso. É perigoso perder o controle sobre si mesmo. Mas há qualquer coisa em você que levanta uma barreira diante da frieza da minha razão e tudo o que resta são destroços.

Estou sendo demasiado prolixo, sei disso. Seria muito mais produtivo escrever as benditas três palavras que ficam fazendo eco no meu pensamento enquanto eu tento racionalizar toda essa loucura. Mas no momento em que você adormeceu tudo em que eu consegui pensar foram as palavras da sua última carta, que encontrou o destino de todas as outras e foi incinerada pela fúria reparadora do seu amado irmão e protetor. Infelizmente para nós dois sou perfeitamente capaz de me lembrar de cada palavra que li, mesmo tendo feito isso apenas uma vez.

Sempre achei que para sempre era uma força de expressão sem efeito prático ou real. O que me coloca em um dilema. Não confio em nada que não possa ser racionalmente explicado e, no entanto estou debruçado há algumas horas nesta escrivaninha procurando qualquer coisa de racional que possa acender uma luz no meio da confusão em que me encontro e não encontro nada exceto mais confusão.

Às vezes tenho a mais absoluta certeza que você saiu das profundezas do inferno apenas para me atormentar. Mas seria preciso que o inferno existisse e que eu de fato acreditasse nele! Às vezes só tenho certeza de que você chegou cedo demais... Se eu tivesse conhecido você ontem, acredito que não exerceria nenhum efeito sobre a minha consciência.

Certa vez, como você deve se lembrar, eu experimentei um chá de uma planta vinda dos trópicos. Lembra-se disso? E posso descrever perfeitamente o modo como me senti. Foi estranho, maravilhoso e assustador. No princípio, era apenas a sensação de formigamento, como se o corpo inteiro estivesse relaxando. A visão foi a primeira a se perturbar, turva, confusa. A sudorese foi o sintoma seguinte, palma das mãos especialmente. Em seguida as palpitações, a respiração difícil e a sensação de que a qualquer momento encontraria a morte certa! E depois, outra vez, aquela estranha sensação de relaxamento.

Quanto tempo eu estive fora do ar? Uma noite inteira talvez? Você deve se lembrar disso com mais nitidez do que eu sou capaz. Por que depois disso a febre e os delírios é tudo o que me lembro. Uma planta curiosa que tinha a propriedade única de amplificar os sentidos e as emoções a níveis assustadores. Não é divertido brincar com sassafrás desse jeito.

Mas eu não descrevi isso para alertá-la dos riscos da metilenodioximetanfetamina. O caso é que não experimento nada parecido com isso há anos e, no entanto, neste momento, sinto todos os sintomas descritos acima. Essa é você agindo no meu organismo. E esse é o poder que você exerce sobre mim.

SH”

Quando terminou a leitura não sabia se devia rir ou chorar. Estava errado! Seu amigo não estava apaixonado! Aquilo era mais que uma paixão! Aquilo era um sentimento profundo ao qual não se atrevia a dar um nome! Era isso o que Sherlock temia! Mildred desequilibrava seu sistema de controle perfeito! Ela era o impensado, o imponderável, o inesperado... O elemento que o detetive não podia prever ou controlar! Ela desestabilizava sua confiança e embotava seus sentidos. John voltou a dobrar a carta e caminhou devagar até a porta do quarto do outro. Surpreendeu-se quando a encontrou aberta.

Entrou e percebeu o amigo encolhido em sua cama, ainda vestindo o roupão. Largou a carta sobre o criado-mudo e ia sair sem dizer palavra, mas parou por um segundo...

– Devia dizer a ela que se importa... - murmurou. - As pessoas costumam pensar que você não tem sentimentos... - saindo e fechando a porta atrás de si.

– Sim! Eu me importo! - sussurrou Sherlock para o travesseiro.


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Notas finais do capítulo

E agora, o que vai ser? Adianto que muitas emoções inesperadas ainda esperam por nosso detetive!



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