Entre O Amor, A Razão E O Coração escrita por Vanessa Fontoura


Capítulo 1
Capítulo 1. Inevitável


Notas iniciais do capítulo

"Vendo a fachada do prédio, lembrei da minha infância. Não fora muitas vezes que eu visitei a minha mãe, na maioria das vezes ela é que ia nos visitar (...)"



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Olhei para o lado, as casas passavam como borrão nos meus olhos, realmente meu pai corria na estrada. Tudo certo, ele pode desgastar os pneus o quanto quiser, tem dinheiro para comprar outros, mas eu só tenho uma vida e ele também, não precisa ser imprudente. Cat pulava frenético no meu colo, estava torto de medo, o pobrezinho.

Que cansaço.

Passei os últimos dias enfurnada no meu quarto empacotando tudo, e além do mais, sozinha. Fora muito a que guardar. Não sei se caberá tudo no apartamento da minha mãe, aliás, eu tenho certeza de que não caberá.

Dei uma olhada para trás, o caminhão frete que meu pai alugou estava a uns 50 metros e se escondia nas curvas atenuadas. Quanto será que meu pai havia dado para o motorista pra ele dirigir durante todos esses dias atravessando o país da Califórnia a Virginia? Muito dinheiro, provavelmente.

Senti os olhos curiosos do meu pai pousarem em mim.

– está preparada? – ele perguntou. Sua voz firme e forte como sempre, sem nenhuma expressão. Não sei como ele consegue, eu praticamente falo tudo o que eu estou sentindo apenas com timbre da minha voz.

O olhei meio cautelosa, o que ele não expressa ele observa sendo expresso nos outros.

– estou. – falei.

Mas na verdade eu não estava nada preparada para uma nova vida. Viver com a minha mãe? Sempre fora tão difícil meu relacionamento com ela.

Virei minha cabeça para janela outra vez, tentando esconder o medo no meu rosto, o medo a frustração e o ódio por ter que mudar de vida. Meu pai afagou a mão que estava em meu colo, me virei de súbito para ele.

– não tem problema pai, eu estou preparada.

Ele pôs a mão do volante outra vez e estava sorrindo, na realidade, ele riu.

– você sempre mentiu muito mal, sabe disso.

Suspirei. – odeio mentiras.

Houve uma breve pausa até que ele resolvesse falar outra vez. Antes disso observei a estrada. A plaquinha dizia Bem-vindo a Fim do Mundo. Bom, talvez Fim do Mundo não fosse o nome da cidade, mas pra mim aquilo era o fim. Do meu mundo.

Dei outro longo suspiro o que foi a deixa para ele começar o discurso.

– veja bem minha filha, é difícil pra mim ter de deixar você nessa cidadezinha com habitantes suficientes para encher o nosso prédio em Los Angeles, porém é necessário. Você viveu 13 anos comigo, está na hora da sua mãe participar da criação. – ele disse inexpressivo.

– você fala como se eu fosse um objeto. – pelo amor de Deus! Alguém perguntou se eu queria me mudar? Eu gritei comigo internamente sentido a raiva brotar. – Aliás, você fala como se eu não tivesse importância, como se eu sempre tivesse sido um infortúnio e agora você está passando o estorvo para minha mãe.

– não, não! É claro que não, sentirei saudade.

– sentir saudade não quer dizer que se importa. – rebati. Se você se importasse não teria concordado com ela na mudança. Pensei outra vez, mas eu estava com raiva de mais para discutir.

– papai, as coisas seriam muito mais fáceis se você acreditasse nas minhas mentiras. – continuei.

– seriam mais fáceis, – ele se interrompeu. – se você acreditasse nas suas próprias mentiras.

Peguei meu celular, fingindo que estava vendo algo na internet. Pelo menos assim ele veria que eu não estava mesmo a fim de discutir. Fechei os olhos com muita força, e lá vieram elas, as lágrimas de raiva. Odeio quando isso acontece, antes que meu pai percebesse as sequei.

O resto da viagem fora rápida e silenciosa. Eu comecei a ficar estranhamente conformada com o fato de ter de viver com minha mãe, só não sabia como seria a experiência. Minha convivência com ela sempre foi difícil, falando em outras palavras... Nunca foi fácil. Não me acostumo com o estilo de vida dela. Já com meu pai é mais acostumável. Se é que essa palavra existe.

Ele se chama Klaus, é do tipo que gosta de viver só, mas passou 17 anos de sua vida acompanhado. Durante quatro anos, por mim e por minha mãe, durante 13 apenas por mim. Nunca o vi sair com mulher alguma depois de se separar, talvez por não encontrar alguém a sua altura, talvez por mim, mas na realidade ele realmente prefere viver só. Minha mãe se chama Emily, é artista, gosto disso. Puxei o seu gene para a arte. O que eu não gosto mesmo, é dos muitos namorados que ela carrega embaixo do braço. E quando digo muitos, eu não estou mentindo.

Me pego pensando, como será comigo lá, será o que número avantajado de homens diminuirá? Provavelmente não. Se na minha infância ela não se importava, agora, também não se importará.

– você se lembra onde fica o apartamento? – perguntou meu pai.

– ali. – apontei para a esquina a frente.

Ele dobrou a esquina que apontei. Lá estava o prédio. A tintura branca estava desbotada com a ação do tempo, as janelas de vidro grosso, que sempre deram um charme a mais no lugar, continuavam intactas. A julgar pelo bairro, aquele apartamento hoje estaria valendo uma fortuna, cada vez mais casas ricas eram construídas e mais prédios erguidos.

– o lugar mudou muito. – comentou.

– tem razão. Olhe essas casas! – meu espanto era aparente.

– estou sentindo uma mudança na sua voz... – começou.

– não tente papai, não vai funcionar, eu ainda preferia as ruas ensolaradas da Califórnia.

Ele riu.

– não ria! Não acho nada engraçado.

– você está mentindo outra vez. – ele disse dando risadas. O olhei incrédula. – você não percebe, mas seu timbre de voz sobre três oitavas e seu olho direito treme quando mente. Não sou tão observador quanto pensa, mas te conheço melhor que você mesma.

Fiz um som de desdém.

– ok Katherina, eu não quero ser rude com você, viver essa temporada com sua mãe te fará um bem enorme. – meu pai falou, já sendo rude, eu soube que ele falava sério por que me chamou com o nome de batismo Katherina, e não de Kath que é como ele me chama sempre. Sempre mesmo.

– pai, eu não estou reclamando. – tentei ser o mais convencível, mas não funcionou, nunca funciona com ele.

– vou acreditar. – disse ele por fim.

Desci do carro em frente ao prédio de minha mãe, a entrada havia mudado um pouco, estava mais moderna do que da ultima vez que eu tinha visto. Havia um toldo de plástico duro e transparente, dois grandes vasos de flores dos lados da porta e um tapete gigante no chão escrito “edifício residencial Notredame”. Peguei Cat no colo, seu pelo azulado estava todo ouriçado de medo.

– xiu, calma Cat, já chegamos. – tranquilizei.

Todo mundo me condenou no dia em que eu chamei meu gato, de Cat, mas achei que combinaria comigo, digo com meu nome. Todos me chamam de Kath, ou eu mesma induzo todos a me chamarem de Kath, acho Katherina tão longo e cansativo.

Nasci em uma pequena cidade na Polônia. Meu pai é de lá e queria que eu também fosse, recebi o nome da bisavó da avó do meu pai, que fora princesa. Tenho nome e sobrenome de nobres, Petrova. Já pela parte de minha mãe, sou mais humilde, ela é filha de americanos naturais do Arizona. Posso dizer que gosto mais das coisas simples daqui, principalmente da minha avó americana, Elizabeth. Principalmente por que é ela quem coloca as coisas na vida da minha mãe nos seus devidos lugares.

Vendo a fachada do prédio, lembrei da minha infância. Não fora muitas vezes que eu visitei a minha mãe, na maioria das vezes ela é que ia nos visitar, mas tive alguns flashes de memória, não posso dizer que não a amo, Emily sempre fora um pouco cabeça-oca e precipitada, mas de alguma forma esteve presente. E merece um credito por isso.

Meu pai tocou meu ombro. – vou mesmo sentir sua falta.

Abaixei o olhar. – eu sei, também vou, pai.

Ele me abraçou por um momento, meio hesitante. – vamos entrar.

Soube naquele momento que indiferente de qualquer coisa, uma hora meu pai ia querer viver sozinho, era algo completamente inevitável.



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