Estávamos a caminho da escola, Thiago colado ao seu celular como sempre e eu... Não estava fazendo nada. Já estava mais que acostumada a ser deixada no vácuo, enquanto era substituída por algum aparelhinho eletrônico.

— Soube o que a Marcela fez com a Tati? — murmurou Thiago, sem tirar os olhos da telinha e digitar frenéticamente um mensagem para alguém.

Ah, Marcela... O demônio aloirado do Colégio T.J., mal amada, peituda, estranha e chicleteira. Tudo de ruim, claro. Adorava aprontar alguma com quem se metesse no caminho dela, em especial com Tati. Digamos que ela... Pegou emprestado o coração do namorado de Marcela. Mais que merecido.
O demônio loiro já recebeu mais de uma visita "amigável" da HG, mas nem assim teve o bom senso de pôr as barbas de molho.

— Não importa. —cantarolei, já estava cheia de dar uma de babá do mal para cima de Marcela.

— A Tati é sua melhor amiga, Emily. Como você pode não fazer nada? A coisa maquiada humilhou sua amiga na festa do Devon, encheu o cabelo dela com aquele chiclete gosmento que ela vive mastigando e você não vai fazer nada?

Respirei fundo e não respondi.

— Pensei que fosse a justiceira.

— Não, Thiago, eu quero parar com isso. Um dia alguém vai se machucar de verdade. — retruquei. Odiava aquele papo de Hell Girl, porque sabia que o assunto poderia cair nos ouvidos de alguma secretária barriguda e, logo, logo, eu seria descoberta, ameaçada e expulsa.

— Você não mata. Não tem como dar errado.

— Cedo ou tarde vão saber quem é a Hell Girl, Thiago! Todas as máscaras caem alguma hora.

— E enquanto isso, você faz o que tem de fazer. Ser a defensora dos nerds! —exclamou Thi animado, segurando o meu braço.

— Ou não fazer nada e ser uma menina normal. E então, Hell Girl nunca será descoberta! —dei um tapa na mão dele e me afastei. Não havia sentido em discutir aquilo. Assim como qualquer bom super herói, um dia eu teria que me retirar. E, pior, rumores da pior e da melhor espécie já se espalhavam por toda escola. As pessoas já imaginavam quem poderia ser a tão famosa Hell Girl. Principalmente o demônio loiro, que me queria a milhões de quilômetros do seu caminho. —Acha mesmo que eu vou deixar que aquela... Coisa de blush, saia por aí espalhando terror?

Thiago revirou os olhos e nós adentramos a escola. O movimento estava meio conturbado, estavam todos correndo para a mesma direção - o armário de Marcela - , só o que ouvi foram gritos e um choro fino e cínico.

Sorri.

— Emily... —sussurrou Thiago, virando seus olhos para mim.

Puxei-o pela mão e passei pela multidão aglomerada, todos observavam atentamente a garota de olhos arregalados, quilos de maquiagem no chão, pó para todo canto, batons destampados e... Um sapo na mão do diretor-assistente. Ou melhor, Mary Jane.

— Bom trabalho, Mary. —balbuciei.

— Quem é Mary, Emy? —perguntou-me Thiago, sem tirar os olhos da rã gorducha que se sacudia nas mãos do D.A, ou melhor, meu Tio James.

— O sapo na mão do Tio James. Minha prima achou no quintal da minha casa outro dia. Eu ia vendê-la, mas... Tive uma ideia melhor que isso.

— Achei que não fosse fazer nada para defender a Tati.

— É... Eu vou mesmo pensar em parar. Mas nada me impede de me divertir de vez em quando. — dei de ombros, enquanto abria espaço na multidão para observar mais de perto os cabelos aloirados bagunçados e as grotescas veias que pareciam saltar da testa empapada de corretivo. Marcela estava com os olhos vermelhos e batia o pé freneticamente, andando de um lado para o outro enquanto apurava os estragos feitos em seu armário.

— Cara, aquilo é a maquiagem e o material da garota. —interveio Thi, prendendo o riso.

— Não, lá só tinha umas maquiagens da MAC mesmo. —ri. —Não sou tããão má assim.

— Ah. Claro, Hell Girl.

O armário foi fechado por uma das copeiras. Por cima do metal cinza gasto e descascado do armário, estava escrito em cor prata brilhante: " HG esteve aqui. XoXo"