In Love With Her escrita por naty


Capítulo 41
A história vindo à tona




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EDUARDA

Tio Jorge me olhou por alguns segundos, como se me avaliasse, então soltou um longo suspiro e disse, mais para si mesmo que para mim:

–- Bem, eu avisei a eles que não conseguiriam manter segredo para sempre – e depois mais alto, de forma que eu pudesse ouvir com clareza – Então você descobriu. Eu sabia que mais cedo ou mais tarde isso aconteceria, e sei também que você e seus irmãos têm o direito de saber a verdade. Mas antes que a gente entre nesse assunto, eu queria que você compreendesse que existem fatos dos quais eu não tenho ciência e tampouco propriedade para falar.

–- Tudo bem tio, eu não quero saber nada demais, apenas quero entender o que realmente aconteceu, pelo que entendi, o Eduardo e minha mãe foram casados, não é? E ele e meu pai eram melhores amigos, mas imagino que meu pai não se casaria com a minha mãe apenas por pena, então…

–- Vamos fazer assim, eu vou contar o que eu sei e você tira as suas próprias conclusões, okay? – confirmei e ele logo começou seu relato:

–- Nós todos nos conhecemos no Ensino Médio e éramos inseparáveis, assim como você, a Ana e os meninos. O Toni e o Edu já eram amigos por serem vizinhos, assim como eu e a Paty. Nos tornamos um quarteto no nosso primeiro ano do Ensino Médio e sempre saíamos juntos. Naquela época eu já era apaixonado pela Patrícia, arrastava um bonde por aquela garota – tio Jorge parou, parecendo lembrar-se dos velhos tempos e sorriu saudoso, como se quisesse voltar àquele tempo – Só conhecemos sua mãe um ano depois, quando ela veio de São Paulo.

Essa parte da história eu conhecia: Mamãe nasceu aqui em BH, mas mudou-se com o meu avô e meu tio Bernardo para o interior de São Paulo quando minha avó faleceu. Minha mãe não passou muito tempo em São Paulo, meu avô veio a óbito menos de um ano depois da minha avó e então ela voltou para BH aos dezesseis anos, para morar com uma tia. Tio Bê ainda era muito pequeno e ficou morando em São Paulo com outros parentes do meu avô.

–- Eduardo e Toni apaixonaram-se por ela quase que imediatamente, mas não admitiam isso um para o outro nem por decreto, mesmo sendo melhores amigos – tio Jorge continuou – Adriana, porém, estava muito focada nos estudos, não tinha cabeça para mais nada, sonhava alto, nunca me esqueço dela dizendo “quero ser doutora, Jorge, eu vou orgulhar meus pais, eles vão ter orgulho de mim quando me olharem lá de cima”.

Acho que era daí que saía o sonho da minha mãe que eu me formasse em Medicina. Ela não chegou a se formar, engravidou do Diogo logo no início da faculdade e desistiu dos estudos para cuidar da família que estava surgindo naquele momento.

–- No meio do nosso segundo ano, Paty e eu começamos a namorar e o Edu e o Toni continuavam tentando conquistar sua mãe, cada um à sua maneira. Edu era o palhaço galanteador da turma, sempre dando um jeito de jogar uma cantada ou outra direcionada a Drica. Mas ela era mais apegada ao Antônio, ele fazia mais a linha “melhor amigo de todas as horas”, estava sempre ao lado da sua mãe para o que ela precisasse. Drica e Patrícia eram muito amigas também, e pelo que a Paty me contava, mesmo não querendo se envolver com ninguém, e ainda sofrendo pela perda prematura dos pais, Adriana não pôde evitar se apaixonar por um dos dois. Seu pai era muito tímido e introspectivo na época, e não deixava seus sentimentos por sua mãe transparecerem, enquanto Eduardo fazia de tudo para demonstrar os dele. Acho que foi isso que acabou fazendo com que sua mãe se apaixonasse pelo Edu e visse o Toni como apenas um amigo de quem ela gostava imensamente.

–- Sempre pensei que meus pais tivessem sido o primeiro amor da vida um do outro, como eles nos fizeram acreditar – declarei, incrédula

–- Pense por esse lado, Duda: talvez eles fossem. Talvez, se seu pai tivesse mostrado antes os verdadeiros sentimentos dele, a história teria sido diferente – tio Jorge interveio

–- É, talvez… Mas continua tio, eu quero entender essa história direito – ele me sorriu e concordou

–- Tudo bem, mas antes, acho melhor colocarmos essa dorminhoca na cama, ou ela acordará toda torta – ele falou e só então me lembrei que a Ana ainda dormia no meu colo

Na TV, os créditos do filme subiam na tela, balancei o braço de Ana levemente, fazendo-a abrir os olhos ainda sonolenta e se sentar no sofá, espreguiçando-se.

–- Hora de ir para a cama, princesinha – tio Jorge falou, eu achava muito bonitinho o carinho e o cuidado com que ele tratava a única filha

–- Já amanheceu? – perguntou confusa

–- Não, só você que dormiu demais mesmo – falei rindo

–- Duda, eu vou colocar sua amiga na cama e já desço para continuarmos nossa conversa – falou ajudando Ana a levantar-se e encaminhar-se para o quarto, mesmo sob protestos de que não precisava de ajuda.

Também me levantei do sofá, peguei o controle, desliguei a televisão e o aparelho de DVD, peguei a caixa vazia da pizza, a garrafa de refrigerante que ainda estava pela metade e os pratos que usamos para comer e fui para a cozinha.

Tinha esfriado bastante com o passar das horas e decidi fazer mais um pouco de chá para aquecer. Coloquei a água na chaleira e separei duas xícaras. Lavei as louças sujas enquanto esperava a água ferver. Tio Jorge apareceu na porta da cozinha bem quando eu estava passando seu café preto sem açúcar, depois de preparar o meu chá.

–- A Paty alienou mesmo vocês duas com essa mania que ela tinha de tomar chá, não é? – ele falou, sorrindo e acomodando-se em um banco em frente ao balcão da cozinha.

–- Ela simplesmente sabia o que é bom – falei sentando-me de frente para ele e entregando o seu café – Do jeito que o senhor gosta, forte e amargo até mandar parar!

Rimos e emendamos alguns assuntos aleatórios até de fato voltarmos ao assunto principal.

–- Então o Eduardo pediu a mamãe em namoro no final do segundo ano de vocês e eles se casaram logo após a formatura. E o meu pai? Como ele ficou com tudo isso?

Era ali que a história começava a tomar um caminho até então desconhecido por mim. Até onde eu sabia, meus pais se casaram quando se formaram no Ensino Médio, papai começou a trabalhar com meu avô e tios e mamãe entrou para a faculdade. Mas o verdadeiro casamento foi entre a minha mãe e o Eduardo.

–- Sabe Duda, eu não sei como o Toni conseguia ser frio a esse ponto, mas ele não demonstrou reação alguma ao ver a garota que ele gostava namorando o seu melhor amigo. O Edu nunca soube que o Antônio gostava da Drica, ele sempre escondeu isso muito bem, mas eu, por ser muito observador, já tinha percebido o amor platônico que ele nutria por ela. Quando Eduardo e Adriana anunciaram que iriam se casar, o Antônio se afastou um pouco de todos nós, mas na época ninguém sabia o motivo. Assim que a gente se formou, houve o casamento e como o Toni, na época tinha ido passar um tempo fora de Belo Horizonte, a Paty e eu fomos os padrinhos. Diogo nasceu dois anos depois e sua mãe largou a faculdade de Medicina para cuidar do filho e o Eduardo, que nem chegou a entrar para a faculdade, passou a trabalhar ainda mais para arcar com as despesas. Era pesado para eles, ainda eram muito jovens, mas tinham o total apoio dos pais do Edu e, Duda, eu sei porque passava muito tempo com eles e aqueles dois eram muito felizes antes da tragédia que aconteceu.

–- Não entendo porque eles mentiram esse tempo todo, sempre acreditei que mamãe tivesse se casado com meu pai assim que os dois saíram da escola – a cada frase que saía da boca de tio Jorge, eu ficava mais perplexa

–- Eu também não sei o motivo da mentira, só sei que a iniciativa de esconder de vocês que o Diogo é fruto do primeiro casamento da sua mãe, foi do Toni. Isso gerou muita discussão entre os dois porque a Drica não queria esconder nada, mas acabou cedendo quando o Toni concordou em deixar que ela contasse a verdade somente para o Diogo, que na época, apesar de pequeno já entendia uma coisa ou outra, e era muito apegado ao pai quando ele morreu.

–- Tio, eu sei que o Eduardo morreu com um tiro ao tentar salvar minha mãe de um assaltante não foi isso? – perguntei e recebi a confirmação em um gesto dele – Mas e meu pai? Onde ele entra nessa história se não estava morando na cidade?

–- Não sei se por sorte ou obra do destino, quando o Edu faleceu, fazia menos de um mês que o Toni tinha retornado a BH. Ele estava radiante com o retorno do amigo, e confesso que eu também senti muita falta do Antônio nesses anos que ele andou sumido. Toni foi o último a ver o Eduardo com vida, ele faleceu durante a visita do seu pai a ele no hospital. Essa época das nossas vidas foi muito dolorosa, todos nós sofremos muito, principalmente a sua mãe e o seu pai. Lembro perfeitamente do Toni saindo chorando daquela UTI e dizendo que o Edu o havia feito prometer cuidar da Drica e do Diogo, era tudo que ele conseguia falar, parecia em choque.

Tio Jorge parou de falar por alguns instantes, olhava para a própria xícara que agora já estava vazia. Permaneci em silêncio enquanto esperava ele se recuperar, eu sabia o quanto deveria ser doloroso para falar naquele assunto, afinal, Eduardo também era seu amigo. Depois de alguns minutos de reflexão, ouvi um grande suspiro e tio Jorge voltou a falar.

– Bem, depois disso, tudo aconteceu muito rapidamente. Antes que pudéssemos piscar, Toni e Adriana já estavam casados e você veio pouquíssimo tempo depois, tempo recorde, pode-se dizer. Não me orgulho disso, mas por algum tempo, cheguei a ter raiva dos seus pais por isso, como eles podiam passar por cima da morte do Edu dessa forma? Era quase como se não tivessem ficado tristes com o que houve. Mas aí veio você, todos nós nos apaixonamos por aquele bebê lindo que vinha para tirar um pouco da nossa tristeza. Você foi a nossa luz, Duda. Depois que você nasceu, foi como se a felicidade pudesse retornar às nossas vidas, todas as mágoas foram esquecidas e voltamos a ser a grande família que começou a ser formada ainda na escola… Quando tudo voltou ao normal – dentro do possível – e eu voltei a ver seus pais como os amigos que eles sempre foram, pude conversar com Toni e percebi que a pressa dos dois em ficarem juntos, era apenas o que eles julgavam ser o melhor para o Diogo, eles não queriam que ele sofresse a morte do pai.

Mais uma vez, eu não sabia o que falar. Nunca poderia imaginar que a história fosse tão complexa e delicada assim. Meus pensamentos estavam todos bagunçados com a quantidade de informações novas que estava recebendo. Precisei de um tempo até organizar as coisas dentro da cabeça e finalmente colocar as prioridades em ordem:

– Tio, eu sei que pode parecer besteira, mas eu não consigo entender como a mamãe conseguiu se casar com o meu pai tão pouco tempo depois da morte do primeiro marido dela.

– Não é besteira Duda, eu também fiquei muito confuso na época. Somente depois é que fui compreender o que houve. Esse casamento foi um ato de amor da sua mãe, não pelo Antônio, pois ela só tinha olhos para o Eduardo, mas ela amou e ama tanto o Diogo, que abdicou do seu momento de luto para dar a ele a chance de não sofrer como todos nós estávamos sofrendo. A Drica sempre se culpou pela morte do Edu, uma vez que ele morreu por defendê-la.

– Mas ela não teve culpa, ninguém teve! – protestei

– Eu sei disso, todo mundo sabe, mas sua mãe não pensa do mesmo modo. Para ela, casar com o Toni era o mínimo que poderia fazer para que o filho não crescesse sem o pai. Mesmo não amando seu pai, não pensou duas vezes antes de aceitar o pedido dele, que sempre foi louco por ela.

– Que loucura! Sempre acreditei piamente que meus pais sempre foram apaixonados, que se amavam acima de tudo, cresci acreditando nisso.

– De certa forma, isso era sim verdade por parte de seu pai, mas a sua mãe ainda demorou um pouco até conseguir amar o homem com quem se casou. Como você sabe, ela e a Paty eram inseparáveis, e não foram poucas as vezes que sua mãe veio até nós buscando colo, solução para seus problemas. E entre estes problemas, estava o amor que ainda sentia pelo falecido Eduardo, amor esse que não conseguia de forma alguma redirecionar para Antônio. Porém, mais uma vez, você foi peça fundamental nessa história toda: o amor e a devoção que o Toni sempre dedicou a você e ao seu irmão, foi o que despertou na Drica, além do carinho de amiga, um sentimento novo que foi se fortificando com o passar do tempo – ele parou, me olhou com uma expressão de bondade no rosto, como se soubesse o que se passava em minha cabeça e quisesse me tranquilizar, continuou – Não tente entender – pediu – O amor também pode ser aprendido com o tempo.

Consegui soltar um pequeno sorriso e balancei a cabeça, aliás, era o que eu mais fazia naquela conversa, depois de suspirar, é claro.

Levantei-me, peguei as duas xícaras e lavei, voltando em seguida para o lugar onde tio Jorge ainda estava sentado, me observando em silêncio.

– Fala!

– O que? – me surpreendi com o seu tom quase de ordem

– Eu sei que você não está satisfeita e que ainda tem muitas perguntas

– Sabe? – tentei me esquivar

– Nós podemos ficar a madrugada inteira aqui, ou você pode começar a fazer as perguntas que realmente importam. Eu sei que, apesar de curiosa sobre como tudo aconteceu, o foco nessa conversa é outro. Vamos lá Dudinha, eu já disse que responderia às suas perguntas. O que você quer saber sobre o seu irmão?

– Ele foi mesmo expulso de casa pelo papai, não foi?

– Sim, ele foi. Um dos piores defeitos do seu pai, Duda, é a intolerância, e ele mostrou isso ao colocar o Diogo na rua quando ele contou sobre a sua orientação sexual

– Foi o que eu imaginei – sussurrei e depois falei mais alto – E a minha mãe?

– Ela fez o que estava ao alcance dela, não pôde impedir a expulsão do filho, mas me pediu que providenciasse tudo que ele precisava para se manter em São Paulo.

– Certo, dessa parte eu não sabia

– Ninguém sabe, seu pai não pode sonhar com isso, tenho medo da reação dele… Cerca de um ano depois da sua partida, perdi o contato com Diogo, mas sua mãe não, eles sempre se comunicaram por telefone, claro que sem o conhecimento do seu pai.

– Tudo bem, se depender de mim, ele nunca saberá de nada. Tio… tem mais uma coisa… - hesitei e ele fez sinal para que continuasse – O senhor acha que o papai seria capaz de algo… O senhor acha que ele poderia fazer algum mal para a gente?

– O Antônio que eu conheço e que era meu melhor amigo, não, de forma alguma. Mas não sei se ainda conheço esse homem que ele se tornou de uns tempos para cá.

– Foi por isso que o senhor se afastou lá de casa depois que o Diogo foi embora, não foi?

– Não vou mentir Duda, foi sim. Amo e sempre amei você e seus irmãos como se fossem meus próprios filhos e o que o Toni fez com o Diogo… - ele não chegou a completar a frase, não precisava

Ficamos mais um tempo conversando, os assuntos variavam, e eu gostei disso, pude tirar um pouco o assunto que me incomodava da cabeça.

Me diverti bastante com as perguntas de tio Jorge a respeito do “namoro vai-volta” da filha com o Gustavo. O ciúme tomava conta dele quando falava de Ana e chegou a me fazer prometer que contaria a ele caso Guto machucasse sua princesinha.

Quando nos demos conta, já passava de 2h da madrugada, decidimos que já era hora de ir dormir. Ajudei tio Jorge a terminar de fechar a casa e subimos juntos para o segundo andar. Nos despedimos na porta do quarto de Ana, ele me deu um beijo na testa, desejou boa noite e encaminhou-se para o final do corredor onde ficava seu quarto. Porém, antes que eu entrasse, ele me chamou novamente:

– Duda?

– Oi tio

– Tome cuidado com o seu pai, ele pode não te apoiar nas suas decisões... Mas saiba que você e seus irmãos sempre terão um pai torto que os apoiará em tudo, tudo mesmo. Você sabe que podem sempre contar comigo, não sabe?

– Sei sim tio, obrigada!

– Boa noite! – desejou novamente e entrou no quarto

Fiquei parada no corredor por mais um tempo, refletindo sobre suas palavras. Ele sabia. Não adiantava tentar esconder, assim como a minha mãe, ele já sabia de Manuela, mesmo que eu não tivesse contado nada a eles. Mamãe até tentou disfarçar, mas eu percebia os seus olhares e, principalmente, seus silêncios. O modo como ela aceitara que eu viajasse com Manu, era quase como um acordo silencioso entre nós. Talvez, somente talvez, D. Drica pudesse me entender.

Sacudi a cabeça e entrei no quarto de Ana, tentando não fazer muito barulho. Fui até seu guarda-roupa, peguei um camisão de algodão e uma calcinha que estavam em minha gaveta – sim, eu tinha uma gaveta com roupas minhas no quarto de Ana, assim como ela tinha uma no meu quarto – e fui em direção ao banheiro, sabia que encontraria uma toalha limpa por lá.

Tomei um banho e me deitei ao lado de Ana na cama, sempre foi um hábito dormirmos juntas e isso não mudara com o passar do tempo. Manuela tinha um certo ciúme disso, sorri ao me lembrar e logo caí em um sono um pouco agitado devido a tudo que estava acontecendo e também às informações novas que adquirira.

MANUELA

– Liga para ela, Manu! – já tinha passado mais de uma semana, mas Julia continuava insistindo no assunto, senti muitas saudades da minha amiga, mas confesso que essa teimosia dela não me fazia falta alguma.

– Ai, que coisa! Sai do meu pé, já disse que não vou ligar! – respondi irritada

– E porque não, posso saber? – perguntou antes de tomar mais um pouco da sua água de coco, ainda era bem cedo e a praia estava quase vazia

– De novo essa conversa, Julia? Eu já não falei mil vezes que a Duda desistiu de mim?

– Quem disse?

– Eu tô dizendo! E chega desse papo, vou pra água, você vem? – falei, me levantando da toalha onde estava sentada embaixo do guarda-sol e ajeitando o biquíni no corpo.

– Daqui a pouco eu vou – Julia nem mesmo olhava na minha direção, já tinha encontrado um alvo: uma mulata com cabelos cacheados e um micro biquíni branco que acentuava perfeitamente suas belas curvas e que vinha caminhando em nossa direção

– Não vou ficar aqui pra isso, fui – mandei um beijinho no ar e desci em direção àquela imensidão de água que eu senti tanta falta

O mar estava calmo, então andei até que a água estivesse na altura de meus ombros e mergulhei um pouco mais para o fundo, como gostava de fazer.

Fiquei um pouco ali, pensando em Eduarda, era impossível não fazê-lo sabendo que era para ela estar ali comigo. Mas não foi assim que ela quis, então eu respeitaria a sua vontade, não ligaria, como a Julia insistia tanto para que eu fizesse.

Não demorei muito dentro do mar e retornei para a areia, a ideia era só dar um mergulho e ir para a casa de Júlia, onde nos reuniríamos para um “almoço em família”, e por família entendia-se: nós duas e o restante da nossa turma de amigos.

– Vamos Ju? O pessoal já deve estar quase chegando – chamei Julia e ela concordou

Na semana que passou desde que mamãe e eu retornamos ao Rio, não aconteceu muita coisa, eu não estava mais tão animada quanto antes. Me forçava a sair com a Júlia e meus outros amigos para matar um pouco da saudade, mas meu desânimo era visível:

– Manu, que cara é essa, gata? Pensei que ficaria feliz em saber que eu estou disponível para dar uns beijos, uns amassos, o que você quiser

Estávamos reunidos para beber e jogar conversa fora, como era o ritual, sempre que nos encontrávamos. Eu era a única menor de idade ali, então, bebida não era problema.

– Nos seus sonhos, seu safado – respondi meu amigo com um sorriso

– Pô Manu, vai me deixar na mão?

– Literalmente, Juninho. Pode esquecer, a Manu veio para me pegar – não consegui conter a gargalhada diante da afirmação de Caio

– Querem parar vocês dois? Da fruta que vocês gostam, a Manuzinha aqui chupa até o caroço – completou Bia, me abraçando de lado – Não é lindinha? – perguntou e eu balancei a cabeça em concordância, rindo da cara de desânimo dos meninos

– Pô, eu pensei que ela tinha mudado de ideia, não custava tentar, né não, mano? – Juninho justificou e teve total concordância do outro

– Claro!

– Bobões! – retruquei

Meus amigos sabiam o motivo da minha tristeza tão aparente e faziam de tudo para me animar. Eu sempre podia contar com as palhaçadas dos irmãos Caio e Juninho, que tinham, respectivamente, 19 e 21 anos. E como não amar a fofura em forma de gente que era Beatriz?

Caio, o mais novo, era um amor na pele de um cafajeste. Moreno queimado de sol, cabelos pretos e encaracolados, olhos na mesma cor, alto e com um corpo moldado na academia, era o tipo de garoto que deixava as meninas héteros loucas com seu jeitão de pegador, mas, no fundo, todo mundo sabia que tinha um coração enorme.

Ju ninho era o oposto do irmão, quase tão baixinho quanto eu, corpo magro, com olhos cor de mel por trás de grandes óculos de grau, fazia mais o tipo nerd, mas nem por isso perdia para o irmão no quesito “pegação”. As únicas coisas que os dois tinham em comum no físico eram os cabelos e a pele morena.

Bia, tinha 20 anos, uma altura mediana, corpo lindo, sem uma gordurinha sequer, cabelos castanho-claros e lisos, na altura dos ombros e olhos também castanhos, porém, escuros. A melhor coisa na Bia era o seu jeitinho meigo de fazer todo mundo se sentir bem.

Os meninos foram jogar pebolim na varanda e nós continuamos no interior da casa, colocando o papo em dia enquanto Júlia, Alice e Jaqueline estavam na cozinha, preparando algo para comermos. Porque todas as três precisavam ir, eu não fazia ideia.

Alice era a mais velha da nossa turma, tinha 23 anos, já era formada em Pedagogia e dava aulas em uma escolinha infantil. Ela e a Júlia mantinham uma amizade-colorida e sem compromissos desde antes de eu conhecê-las. O lema delas era que sempre que estivessem solteiras, não queria dizer que precisavam ficar sozinhas, e isso já durava mais de três anos. O que eu achava legal nessa relação delas, é que eram, acima de tudo, grandes amigas. Alice era quase tão alta quanto Eduarda, tinha incríveis cabelos ruivos naturais e cacheados que chegavam à cintura quando usados lisos, olhos extremamente verdes e pele pálida e cheia de sardas.

Por último, mas não menos importante, estava Jaqueline, ou Jack, como preferia ser chamada. Tinha 18 anos, baixinha, mas não tanto quanto eu, tinha cabelos crespos que ela usava em um estilo afro, pele negra e olhos castanhos. Jack arrastava olhares por onde passava pelo seu corpo “tipicamente brasileiro”.

“Uma tremenda gostosa, com todo o respeito!” - era o que sempre dizia Julia

– Manu – Bia me tirou de meus devaneios – Você sabe que a Julia vai insistir nisso até você ligar para a sua namorada, não sabe?

– Mas a Julia não é minha mãe e a Eduarda não é mais minha namorada – protestei

– É isso que você quer? Que ela seja apenas sua ex? - perguntou carinhosamente

– Não – respondi baixinho

– Liga para ela, baixinha, vocês precisam conversar

– Não sei… - falei, pensando na possibilidade

– O que você não sabe, Manu? - Beatriz era tão carinhosa e atenciosa, que não tinha como ficar chateada, brava ou irritada com ela por insistir no assunto.

– Não sei se ela ainda quer algo comigo – a insegurança falava tão alto que era impossível não dar ouvidos

– Mas se você não sabe, a melhor solução não seria ligar para ela? - questionou-me e completou, antes que eu pudesse dizer qualquer coisa – Não precisa responder, só pensa nisso, tá bom?

Eu assenti e ela me deu um beijo no rosto antes de ir até a cozinha ver o porque da demora das meninas.

Fiquei mais um tempo ali, até que o Juninho me chamou:

– Ei Manu! Vem aqui ajudar esse mané do meu irmão que tá perdendo de lavada?

Sacudi a cabeça em negativa com um sorriso e fui até a varanda, jogando ao lado de Caio. Não ficamos nem 10 minutos jogando e as meninas nos chamaram para o almoço.

Ainda estávamos sentados à mesa, comendo a torta de limão que Alice trouxera e conversando sobre tudo e nada ao mesmo tempo.

– E o viado do Dani, como sempre, não veio, né? - reclamei

– Parece que ele tinha um compromisso com a família do namorado e não pôde vir – explicou Julia

– Ih, se ferrou! - Juninho cutucou Jack, que estava ao seu lado e ela concordou, rindo com ele

– Espero que ele não falte amanhã, eu vou ficar muito puta da vida, se o Dani não aparecer! - o mais engraçado era o tom doce que Bia usava mesmo quando estava contrariada ou falando palavrões.

– Você?

– Puta da vida?

– Com alguém?

Perguntou Caio, Julia continuou e Jack completou logo em seguida, implicando com Bia.

– Impossível! - Alice, Juninho e eu resolvemos entrar na brincadeira e falamos todos juntos, como se fosse ensaiado.

– Argh, como vocês são chatos! - censurou, ainda no mesmo tom de voz, o que nos fez rir – Eu tô falando sério, é meu aniversário, ninguém está autorizado a faltar, nem você, Manu, já que está aqui no Rio. Amanhã quero todo mundo no meu churrasco à beira da piscina.

Festa, na casa da Bia. Com certeza aquilo estaria lotado, Bia tinha essa aura contagiante que fazia com que fosse adorada por todos. O problema era que, entre esses “todos” estava a pessoa que eu menos queria ver no mundo, - depois da Márcia que eu não queria ver nem pintada de ouro e cravejada de diamantes, é claro, mas essa já estava bem longe – é claro que a cobra da Natalia estaria lá, pois, infelizmente, Samanta, sua prima, era amicíssima de Beatriz. Tenho certeza que a minha ida ao Rio já tinha chegado aos seus ouvidos e ela não perderia a chance de me infernizar.

– Err… Bia… Eu não sei se seria… Uma boa ideia com– não pude completar a frase, fui cortada por ela

– Nem termine de falar, você vai Manu! Não vai ser a primeira nem a última vez que vocês vão se encontrar.

– Ela tá certa, Manu, você não pode se privar dos seus amigos por causa daquela lá – Jack apoiou – E, além do mais, não estará sozinha, estaremos todos do seu lado

– Se você quiser, posso falar que estamos namorando

– Obrigada, mas não precisa Juninho – ri do meu amigo, que não perdia uma oportunidade

– Manu, me empresta seu celular? - Julia interrompeu a conversa, trocando de assunto

– Para quê? - perguntei desconfiada

– Lembra da menina da praia? - balancei a cabeça – Fiquei de ligar para ela para combinar algo e quero chamá-la para a festa da Bia já que essa aí – apontou para Alice – Vai com o peguete dela

– E onde é que meu celular entra nessa história?

– Entra na parte que eu não tenho créditos – falou com a cara mais lavada do mundo e eu entreguei o celular, censurando-a com o olhar.

Ela o pegou e saiu de perto, indo para o quarto enquanto o restante do pessoal conseguiu me convencer a ir à festa de Bia e ignorar a presença de Natalia.

Alguns minutos depois, uma Julia com um sorriso de orelha a orelha entra na sala de jantar com uma cara de quem estava aprontando e não era pouco.

– Porque essa cara de boba alegre? Conseguiu convencer a mina? - Caio questionou

– Não, ela tem compromisso amanhã – respondeu e me entregou o celular

– E porque o sorriso? - foi a minha vez de perguntar

– Ih, não é nada, larguem do meu pé! - Julia não ia falar, mas todos nós sabíamos que aí vinha coisa. Julia não dava ponto sem nó.

EDUARDA

Assim que acordamos, Ana foi comigo em casa para deixar as “compras” que eu tinha feito no dia anterior e arrumar uma mochila com algumas coisas para passar o restante do tempo que meus pais ficariam fora em sua casa, como nos instruiu Tio Jorge.

Depois disso, insistiu para que fôssemos para a casa do Rafa, curtir a piscina com os meninos. Depois de me encher a cabeça de tanto falar, acabei concordando e o Math veio nos buscar na casa dela.

Tínhamos acabado de almoçar e estávamos na sala, jogando videogame – futebol para ser mais exata – quando o meu celular tocou.

Ele estava na mesinha de centro, e Lucas, que estava mais próximo, pegou e me entregou.

Meu coração foi à boca quando vi que o prefixo era do Rio de Janeiro, mas logo tirei as caraminholas da cabeça: se a Manu ligasse, seria do seu próprio número e o número na tela, apesar de ser do Rio, era desconhecido.

Provavelmente deve ser engano – dei de ombros antes de atender:

Alô?

Alô, Eduarda? - estranhei quando a voz feminina do outro lado da linha sabia meu nome, mas não era a Manu

Sim, sou eu. Quem fala?

Não sei se você já ouviu falar de mim, meu nome é Julia, sou uma amiga da Manuela


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Notas finais do capítulo

Galerinha que gostou da pequena aparição da Júlia no primeiro capítulo... ela mandou avisar que tá de volta! kkkk

gostaram do capítulo? oq acharam?