Sonhei que estava na clareira, o antigo lugar onde costumava encontrar Pedro, ou Pã.

Mas tudo estava diferente, haviam muitas poucas árvores ao redor, a grama não era mais verde, era cor de palha e estava seca, a pequena nascente que saia de uma pilha de rochas havia secado. E o céu, antes de um incrível azul agora estava cinza, triste.

Eu me vi, não ainda criança, como eu costumava me ver nas outras visões, eu me vi atualmente. Então eu percebi. Eu não estava tendo uma visão do passado, aquilo era como a clareira estava no presente. Ela mudou muito desde os últimos anos.

Aquela visão me entristeceu de verdade. Foi como se a minha infância estivesse acabado ali, eu queria chorar e sair correndo. Não me sentia mais confiante. Nesse momento tudo o que eu passei nos últimos dias estava se passando sob os meus olhos como se tivesse uma tela de televisão na minha frente.

Nesse momento caiu a ficha. De tudo o que aconteceu nos últimos dias. Eu ainda não tinha processado tudo, mais agora...

Uma sombra veio da clareira. Parecia mais chocado do que eu pelo estado do lugar. Os cabelos cacheados e olhos profundos me encararam. Era Pã, só que disfarçado, como eu costumava vê-lo, menos os chifres, ele não deveria ter mais magia para esconde-los. Aliás não parecia ter magia para nada.

Era estranho, ele estava ali mais não estava. Ele se reproduzia como um holograma e ficava tremeluzindo. Era o máximo que ele conseguia, não tinha mais forças para se materializar.

– Sam – Ele sorriu – Você cresceu tanto.

Num movimento desesperado tentei abraçá-lo, um abraço de Pedro era tudo o que eu mais queria. Uma dúzias de vezes, eu ficava agarrando seus braços de névoa, mais não sentia nada. Até que ele começou a tremeluzir mais, então resolvi parar

– Por que... – Consegui dizer, através de um suspiro entrecortado. As palavras tropeçando entre soluços, eu estava em prantos – Eu preciso te sentir... Por favor.

Agora Pedro estava se segurando para não chorar. Ele notou o meu estado, parecia pior do que ele.

– Eu morri não lembra ? – Disse, tentando sorrir – Eu não estou aqui

– Como pode não estar aqui ? Estou te vendo

– Mas não está me sentindo. E em breve não poderá me ver também, meu tempo está se esgotando.

– Pedro...

Ele fechou os olhos, e fez um gesto para que eu fizesse silêncio.

–Sol, Céus e Ladrões irão se juntar

Irão recuperar o fluído da vida, de quem não pode carregar

Irão ímpar, voltarão par.

Surpresas, ao seu caminho terão.

Se fizerem certo, todos voltarão

Mais cuidado, tenha sanidade

Tudo se perde com facilidade.

Então Pã sorriu tristemente para mim.

– Você não deveria ser preparada para passar isso, deveria acontecer naturalmente. Se falhar será tudo culpa minha, eu sou um desastre que aconteceu na sua vida.

– Não...

– Me perdoe, criança – Agora lágrimas gordas rolavam pelas suas bochechas. – Eu era paranóico com os humanos, mais alguns me fizeram aprender que eu estava errado. Siga seu coração e encontrará o fluído da vida

– Você disse um fluído da vida? Quer dizer...

– Qualquer um que viver poderá retornar a vida, por isso é tão cobiçado.

Idéias se formavam na minha cabeça, qualquer um poderá retornar a vida. Qualquer um.

– Não! – Ele interrompeu meus pensamentos – Não tente me salvar criança, é um aviso, eu só fui prejudicial em sua jornada

– Você foi a melhor coisa que me aconteceu – Agora era eu que estava sumindo – Só tenho a te agradecer por tudo

– Eu te tornei fria.

– Não completamente. Sou uma filha de Apolo, então sou quente por dentro. Esse choque térmico que ás vezes pode assustar as pessoas

– Você tem que buscar ser uma pessoa normal Sam. Confiar mais nas pessoas.

– Não sou anormal, sou especial. Quem me dizia isso era você, a pessoa em quem eu mais confio, lembra?

Ele sorriu.

– Eu também confio em você, Sam. Faça a coisa certa.

– Vou fazer. E me espere. Nós vamos nos ver muito nos próximos dias – Eu estava tentando parecer confiante o bastante. Para disfarçar o medo

– Sam... Você é tão teimosa. Como o seu pai...

– E esperançosa como você. Você não vai se livrar de mim tão fácil.

Pã Estava começando a sumir.

– Sam... – Havia tempo para uma última palavra – Obrigada.

Então ele sumiu completamente. O sorriso foi o último a desaparecer

“Como o gato em Alice no país das maravilhas” Pensei. Notando que estava sumindo também

“Todos a julgam estranha, louca” continuei em pensamento. “Assim como eu”

“Nós somos especiais, Sam” – Imaginei Alice respondendo. “Vamos encontrar o final feliz”

E depois caiu a ficha, eu estava conversando mentalmente com um personagem de contos infantis

– É, mais vamos combinar que eu sou mais louca que você. – Disse para a Alice imaginária

Então eu acordei suando frio.