Opposite escrita por Giovana Marques


Capítulo 18
Parentesco


Notas iniciais do capítulo

Finalmente o capítulo está aí, cheio de revelações... Espero mesmo que goste! E reviews me fazem feliz, você sabe disso.:3
Beijos e boa leitura!



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O líquido prateado e espesso, de que o Oráculo é composto, se move formando uma espécie de onda. Parece um computador processando seus dados ao ser ligado, ou talvez eu tenha ido longe demais com essa comparação.

Fecho uma das minhas mãos em punho, já que a outra está em Luke. Estou tão nervosa que posso jurar que meu coração dá cambalhotas. Encaro os movimentos do Oráculo com tanta expectativa, que ignoro o que quer que Luke esteja dizendo.

Mas então acordo dos meus pensamentos quando percebo que não está funcionando. O Oráculo não está funcionando! Seus movimentos param de uma hora para outra, como se eu nunca tivesse perguntado pelo meu nome. E o meu desespero é tão grande que faço de tudo para me conter.

– Emy, você está me escutando? – Luke chega mais perto de mim, parecendo um pouco mais preocupado que o normal. – Tem alguma coisa errada...

Algo parecido com uma mistura de ódio e decepção preenchem minha mente. Estou tão desacreditada que poderia chorar. Mas o que diabos está acontecendo? O que eu fiz de errado para não estar funcionando?

Depois de tanta euforia para saber sobre o meu passado, tenho a leve impressão de que não vai acontecer. Isso pelo simples fato do Oráculo ter surtado completamente do nada e não estar funcionando como deveria!

Viro-me para encarar Luke e devo estar tão desapontada, que sua expressão muda completamente. Vai da preocupação para a pena. Já mencionei o fato de odiar que as pessoas sintam pena de mim? Bom, eu odeio.

Sua mão solta-se da minha e segura meu ombro direito com firmeza, como se precisasse da minha calma, afinal, desespero nessas horas nunca é a melhor solução. Francamente, como se eu fosse muito desesperada...

Jeremy e Nina já estão bem próximos de nós, encarando cada detalhe do Oráculo e tentando descobrir o motivo de não estar funcionando. Não que tenha um. Essas coisas geralmente não têm um motivo. Não é como algo lógico, do mundo humano, e sim uma coisa muito mais complexa. Demorei um pouco para captar desde que cheguei em Opposite, mas finalmente entendi que a lógica não funciona muito bem por aqui.

Minhas esperanças já foram todas por água à baixo, de novo, e por um momento, um devaneio de fraqueza percorre minha cabeça. Chego à conclusão de que eu não preciso saber quem são meus pais, apesar de queirer muito. Se for para viver, posso viver sem isso... Diante disso, poderiamos simplesmente sair daqui, voltar para Kingswood e fugir para o mundo humano. Eu, Luke, Jeremy, Nina e suas famílias poderiamos viver juntos e esperar até que o feiticeiro branco psicótico dominasse a Terra e então, encontriamos um refúgio. Talvez conseguiriamos, mas tenho absoluta certeza que Luke não concordaria em deixar o resto da sua espécie para trás. Da nossa espécie. Se o conheço bem, ele pode até morrer tentando encontrar a garota perdida, mas não vai desistir.

Não faz muito tempo que aprendi que feiticeiros são assim: treinados desde pequenos a darem tudo de si próprios para salvar seu povo, sua raça. E por um momento me sinto estúpida e egoísta por não me identificar com isso. Talvez eu seja só uma covarde. Uma feiticeira covarde criada por humanos.

– É claro que alguma coisa tinha que dar errado, quer dizer, era bom de mais pra ser verdade... – Digo, engolindo em seco.

Luke respira fundo e sinto seus dedos apertarem ainda mais meu ombro. Também está preocupado e confuso, provavelmente não sabe o que fazer. Assim como eu.

– Não pode ser... – Ele resgmunga, baixando seus olhos. – Fizemos tudo o que foi preciso!

– Eu sei. – Digo e minha voz sai um pouco mais esganiçada do que eu espero, mas eu não me importo. Estou tão desapontada, que de repente não ligo para mais nada. – A gente atravessou uma droga de um oceano infestado de criaturas marinhas perigosas, destruímos um barco, quase perdemos um de nós. Quero dizer, dois de nós, pois eu poderia ter morrido com a mordida do poisonie. Sem falar que tivemos de lutar contra demônios, um dragão e lobisomens. E para que tudo isso? Para nada! Para não conseguir salvar Opposite, para nunca ficar sabendo de onde eu vim, para nunca saber quem são meus pais. Nem mesmo meu verdadeiro nome...

E então minhas últimas palavras soam como um soco no meu estômago, já que desvendo o mistério do Oráculo. O mistério sobre não funcionar.

Luke também percebe e seus olhos se arregalam assim como os meus. Ele solta meus ombos e deixa seus braços caírem.

Meu verdadeiro nome. – Repito, prestando atenção em cada palavra. – Por isso não funcionou.

Nina já está próxima de nós e parece entender o que estamos dizendo.

– Parker não é seu verdadeiro sobrenome. – Ela conclui, preocupada e satisfeita ao mesmo tempo. – Achei que talvez funcionasse, já que você foi adotada. Mas aparentemente, não.

Minha cabeça gira em vários pensamentos e eu não faço ideia do que teremos de fazer a partir de agora. Nossa salvação era o Oráculo e infelizmente ele não consegue me identificar.

– Pessoal! – Jeremy grita, fazendo-nos pular. Então nos viramos para encará-lo, esperando que não seja outra daquelas piadas estúpidas que ele faz nos momentos mais críticos. – Venham aqui.

Jer está a alguns metros para a direita, onde a parte espelhada do Oráculo termina. Ele passa a mão sobre a parede de rochas e então consigo ver algo entalhado em dourado por ali.

Andamos até nosso amigo, que tem seus olhos arregalados sobre a escrita em runas na parede de rochas, que acaba de descobrir. Não sei porque, mas de repente meu coração se enche de esperança novamente.

Jeremy parece um pouco mais animado que estava há alguns segundos atrás quando nos informa:

– Vocês esqueceram de ler isso. Parece ser algum tipo de instruções para utilizar o Oráculo. Está dizendo que se quisermos saber sobre o passado de alguém, devemos fornecer o nome completo da pessoa. – Ele diz o que já sabiamos e faz uma pausa. Então, quando volta a falar, meu coração quase para. – Ou, um pouco do seu sangue.

Com isso entendo que terei de fazer uma segunda doação sanguínea no dia.

Olho de Nina a Luke e suas expressões são como uma mistura de alívio e felicidade. Algo como um entusiasmo perdido renova minha esperança e curiosidade de saber quem são meus pais.

Não espero nem mais um segundo e retiro o pedaço de pano em minha mão que havia amarrado firmemente para estancar o sangue do pequeno corte que abri há algumas horas.

Olho para minha mão, entregando o pedaço de pano ensanguentado para Luke.

– Agora é com você, Emily. – Ele me incentiva com um olhar encorajador.

Sorrio com a ansiedade e corro para mais perto do Oráculo, sendo seguida pelos meus amigos.

Fico de frente para a coisa prateada novamente e finalmente pressiono minha mão machucada naquilo. Sinto receio em tocá-lo, então o faço em um só impulso, sem pensar muito.

Tateio-o e sinto o quão gelado é. Sua consistência é algo estranho, indefinível. Nem líquido, nem sólido.

Estremeço ao perceber que a palma da minha mão começa a formigar, mas não a puxo de volta e fico na mesma posição até o Oráculo voltar a funcionar.

O líquido prateado se movimenta, formando novamente as pequenas ondas e dessa vez eu as sinto. Vão ficando cada vez mais fortes, de forma que tenho de fazer uma força extra para conseguir permanecer em pé.

O chão estremece, me assustando, e o barulho das rochas sendo movidas é quase ensurdecedor. Tenho um tanto de pavor de que tudo desabe e sejamos esmagados pelas pedras, mas não deixo me abalar totalmente por isso.

Consigo, atráves do meu toque, sentir algo retornando à vida, uma espécie de energia se renovando. É o Oráculo voltando a ser utilizado depois de tantos anos.

Uma névoa espessa e branca surge completamente do nada. Isso acaba me afetando de certo modo, já que quando olho para trás não consigo enxergar nenhum dos meus três amigos.

A palma de minha mão para de doer e eu finalmente crio coragem para retirá-la do líquido prateado. Encaro-a e percebo que o corte desapareceu, assim como a dor. Foi curada pelo Oráculo.

O chão para de tremer e a neblina continua cada vez densa ao meu redor. Já não sei mais o que devo fazer quando uma figura envolta em um negro manto de seda surge dentro do Oráculo, a uma distância bem próxima de mim. Não consigo ver seu rosto, nem nada por baixo do tecido, então fico extremamente desconfiada quando ergue uma de suas mãos e faz um movimento para que eu a siga para o interior da coisa prateada. Pela silhueta estreita e um tanto delicada, acredito que seja uma mulher, apesar de não fazer ideia alguma de quem é que possa ser.

Olho para trás procurando pelos meus amigos, porém como não consigo enxergá-los decido fazer o que a misteriosa mulher sugere, afinal, não vejo a hora de acabar logo com isso.

Fecho meus olhos, andando lenta e gradativamente na direção do Oráculo. Entretanto, quando estou prestes a sentí-lo, gelado e indefinível, é como se não estivesse mais em minha frente. Não o Oráculo, e sim a barreira prateada. Quando menos espero, já estou em seu interior e eu mal percebi como.

Dou exatamente três passos para frente, voltando a abrir meus olhos. Encontro-me em um lugar completamente incomum. De forma precisa, tudo ao meu redor é branco como se estivesse dentro de uma sala infinita ou algo do tipo. As únicas coisas que se destacam nesse plano são: eu, a entidade oculta e a passagem prateada para sair do Oráculo.

A ausência de som surge e, de repente, fico na dúvida se devo perguntar alguma coisa à mulher ainda coberta e flutuando no ar, bem em minha frente. A verdade é que eu estou um pouco hesitante, então permaneço calada.

– Olá, jovem feiticeira... – Uma voz feminina ecoa por todo o lugar, como se viesse do nada. Posso descrevê-la como sendo levemente grave e sensual, mas que me deixa ainda mais inquieta, para ser sincera. – Meu nome é Calista.

Antes que eu me apresente, Calista deixa que seu véu escorregue pelo seu corpo, atingindo o chão. Quando coloco meus olhos nela, meu coração simplesmente para e tenho vontade de gritar.

Apesar do formato humanóide, Calista é um pouco maior do aparentava ser debaixo do manto, além de possuir seis braços. Sua pele é tão pálida quanto a atmosfera clara e sem limites onde nos encontramos e eu chego a questionar até se está morta. Ela veste algo parecido com uma longa túnica de seda negra, que chega a cobrir seus pés por completo. No entanto, o que mais me assusta é sua cabeça. Além de não ter nenhuma evidência de pelos (me refiro a cabelos e sobrancelhas), seus olhos esverdeados cobrem a maior parte de seu rosto, que por incrível que pareça, é desprovido de boca e nariz. No lugar das orelhas, Calista possui suas fendas que devem lhe proporcionar o sentido da audição.

Confesso ter de fazer um esforço extra para parecer não estar tão assombrada assim diante de sua disforme aparência. Eu estava esperando uma mulher e não essa criatura sombria e ameaçadora.

Ela fita fixamente meus olhos e eu perco o ar, esquecendo-me do que devo dizer ou fazer.

– Não fique assustada. – Calista diz, percebendo o meu terror em relação à sua fisionomia. Noto que sua voz vem do ambiente, devido a ausência de boca. – Acredite ou não, eu já fui uma bela feiticeira, exatamente como você.

O fato dessa criatura já ter sido uma feiticeira me deixa curiosa, mas decido não dar muita atenção a essas informações, principalmente pelo fato de estar aqui com um propósito: descobrir sobre o meu passado.

– Não estou assustada. – Minto, tentando parecer o mais sincera possível. – Na verdade, é um prazer conhecê-la, Calista. Sou Emily.

Calista flutua para mais perto de mim, como se estudasse cara detalhe do meu ser. Isso me deixa mais insegura e sem graça, mas não fujo dos seus grandes olhos verdes e sustento meu encarar de volta com coragem.

– Sem querer subestimá-la, mas devo dizer que estou curiosa quanto ao fato de você, uma feiticeira aparentemente tão jovem e tão inexperiente, ter conseguido chegar até mim. – Ela continua a se aproximar até que então, levanta um dos seus seis braços e toca a ponta do meu queixo, fazendo-me estremecer. – Não é uma tarefa simples, eu sei disso.

– Não, não é. – Digo, com firmeza.

– Então você deve ter algo bastante importante para me perguntar.

Os cantos de seus olhos se enrugam e eu suponho que se Calista tivesse uma boca, ela estaria sorrindo com malícia. Felizmente, se afasta, fazendo com que eu sinta-me menos pressionada.

– Como você pode perceber, sou uma espécie de mediadora entre o que o Oráculo vê e os feiticeiros em geral. – Explica, sem piscar quase que nenhuma vez. – Além disso, eu costumo trabalhar com trocas de favores.

– Como assim? – Pergunto, já imaginando o que é que Calista pode querer de quatro jovens feiticeiros.

– Eu lhe dou a informação que quiser, seja ela pertencente ao passado, presente ou futuro. Entretanto, você deve me dar algo que eu quero em troca. – Calista murmura com ansiedade. – Devo dizer, como você já me acordou de um longo e tedioso sono existente por anos, sou obrigada a responder pelo menos duas de suas perguntas.

– Certo.

A informação deixa-me aliviada e contente. Duas perguntas são o suficiente para que descubra o que realmente preciso descobrir sobre meu passado.

– Então, acredito que queira saber sobre o dono do sangue depositado no Oráculo. – Calista diz, referindo-se a mim mesma. – Sobre o que quer saber primeiro?

Quero questionar, logo de cara, quem são meus pais. Porém como o melhor sempre é revelado no final, resolvo deixá-la como segunda e última pergunta.

– Sobre as informações gerais do meu nascimento. – Respondo, com clareza. – Horário, local e data.

Calista balança a cabeça positivamente e então fecha seus olhos. Noto que parece bastante concentrada, como se conversasse com alguém em silêncio. Para a minha surpresa, ergue suas seis mãos para cima e elas passam a emanar uma espécie de luz dourada.

A luz destaca-se de Calista e se mistura ao ar, bem diante dos meus olhos, formando pequenas runas. As runas dançam por um momento e se dividem formando algumas frases. Fixo meu olhar nos símbolos tão estranhos e desconhecidos por mim, quando de repente, os reconheço e números aparecem em minha mente.

Concentro-me ao máximo passo a entender o que dizem. Vinte oito de Outubro do ano de mil novecentos e noventa e seis. Vinte e uma horas, quarenta cinco minutos e dezesseis segundos. Raven Place.

Tenho de dizer, saber sobre minha verdadeira data de nascimento deixa-me realmente desapontada. Imagine só, você passa sua vida inteira achando que nasceu em Agosto, mas na verdade nasceu em Outubro.

É meio triste quando você descobre algo sobre si que não sabia, ou ainda pior, pensava saber. Parece que desconheço bem mais da metade das informações que existem sobre a minha pessoa.

Paro para refletir e levo um susto ainda maior quando me toco que, segundo o Oráculo, nasci em Raven Place. Quer dizer, como eu, uma feiticeira branca, teria nascido no vilarejo dos feiticeiros negros? Isso é, sem sombra de dúvida, extremamente curioso.

– Sua segunda pergunta, por favor. – Calista suga-me dos meus pensamentos e eu percebo que finalmente chegou o momento pelo que tanto esperei.

– Gostaria de saber sobre minhas relações de paternidade e maternidade. – Respondo, ignorando minhas mãos completamente trêmulas e meu estômago completamente revirado.

Novamente, tenho aquela impressão de que Calista sorriria com malícia, se fosse provida de lábios. Porém, não dou muito importância ao fato, já que o que realmente me preocupa é a resposta que terei em poucos segundos.

Calista retorna ao processo de comunicação com o Oráculo, me deixando na expectativa. E quando ela volta a me encarar, é que acontece.

Dois rostos finalmente surgem, como hologramas, em meio ao nada. Parecem fotos, ou talvez algo bem mais complexo que isso. Até o meu último fio de cabelo é arrepiado quando me vejo diante das imagens de meus pais.

Dirijo meu olhar ao homem alto e forte, da direita. Seus cabelos são de um loiro tão claro, que chegam a ser quase brancos. Seus traços são marcantes e alguns parecidos com os meus. Aparenta ter pouco mais de trinta anos, apesar de saber que tem mais. Usa uma espécie de túnica branca com alguns detalhes em prata. É bonito, muito bonito para falar a verdade. E seria ainda mais se sua expressão, na imagem do Oráculo, não fosse tão fria e cruel.

Reconheço os olhos azuis, meio acinzentados e cheios de maldade, sem muita surpresa. Os olhos azuis dos meus sonhos. Ou seria melhor dizer, pesadelos? Pertencem ao mesmo homem que me atormenta enquanto durmo e que também planeja dominar Opposite. É a primeira vez que eu o vejo sem o manto branco em que sempre está envolto. Então é realmente meu pai.

Encaro seu nome já escrito pelas runas reluzentes, bem ao lado da imagem. Agramon.

Para ser sincera, sinto-me desapontada já que meu pai é aparentemente uma pessoa terrível. Apesar de ter pensado na hipótese do cara dos meus pesadelos ser de fato meu pai, eu tinha uma leve esperança que não. Uma falsa esperança, no fim das contas.

Meu olhos passam para a figura ao lado: Uma mulher com a pele tão clara quanto a minha, contrastando com seus lábios excessivamente avermelhados. Seus longos cabelos são negros, bem mais escuros que os meus. É muito bonita, principalmente pelos seus traços delicados do rosto. De repente noto que temos o mesmo queixo e as maçãs do rosto praticamente na mesma altura. Seus olhos são de um azul vivo e vibrante, diferente dos olhos do homem à esquerda. Na verdade, são exatamente como os meus.

Um som aterrorizante que reconheço por ser um riso frio e sádico pertencente a Calista me faz saltar de repente. Encaro-a com um quê de interrogação, afinal, realmente não vejo nenhum motivo para risadas.

– Não está surpresa? – Ela pergunta, parecendo admirada pelo fato de eu não estar em choque em saber quem são meus progenitores.

– E por que eu estaria? – Respondo com outra pergunta, voltando a contemplar as duas ilustrações dos meus pais.

Mas antes que Calista possa dizer qualquer outra coisa, meus olhos pousam em algo que me deixa completamente paralizada. Penso que estou prestes a ter uma parada cardíaca ou algo bem parecido, quando coloco meus olhos no nome dela. No nome de minha mãe.

E sem saber como reagir ou até mesmo no que pensar, balbucio, completamente transtornada:

Blake Darkbloom.

***

Posso estar imóvel, mas minha cabeça se resume a uma enxurrada de pensamentos e teorias, umas mais absurdas do que as outras. Nada mais parece fazer sentido diante da fatídica descoberta que acabo de fazer. Então Blake Darkbloom é mesmo minha mãe.

E eu ainda ousei me sentir chateada pelo fato da minha data de nascimento não ser a que eu sempre pensei que fosse. Quem me dera fosse apenas isso...

Acontece que eu sou filha de Blake Darkbloom, a feiticeira negra que desapareceu com a “garota perdida” há dezesseis anos. E se sou filha de Blake, logo há a grande chance de eu ser a própria “garota perdida”. Existe a possibilidade de eu ser quem estávamos procurando há tanto tempo.

Eu realmente achei que depois de descobrir sobre meus pais sentiria-me completa, entendendo meu passado, encaixando todas as peças desse quebra-cabeça sinistro que é a minha vida. No entanto, agora vejo o quão eu estava enganada. A verdade é que estou tão desorientada quando estava antes de desvendar tais informações.

E é aí que ela está! A falta de lógica, novamente: se sou uma feiticeira branca como é que minha mãe pode ser uma feiticeira negra? Além disso, não sou filha de Therion, e sim de um certo feiticeiro branco maligno chamado Agramon Illuminati, que aparentemente, pretende me usar para dominar Opposite. Puxa vida, que família exemplar essa a minha.

Estou no mesmo estado quando Calista coloca-se bem ao meu lado. Ela ainda parece estar se divertindo com a minha evidente desgraça. Começo a me questionar se já não sabia sobre mim e meus pais, antes mesmo de eu ter perguntado.

Agora está surpresa? – Sua voz vinda do além tira-me do estado de transe.

– Você sabia, não é? – Pergunto, sem me preocupar em ser indelicada. Estou tão desacreditada que não tenho mais tanto medo assim de Calista e sua aparência bizarra. – Você sabia quem eu era e até o que vim fazer aqui. Você sempre soube.

– Eu sei de tudo, Emily. – Ela se aproxima ainda mais, com um ar de misteriosidade que não me agrada. – Sobre o seu passado, presente e futuro. Acho que já mencionei isso...

Um interesse sobre o que Calista diz surge subitamente dentro de mim. Se ela pode ver o futuro, logo deve saber o que devemos fazer para unirmos feiticeiros negros e brancos e derrotarmos o exército demoníaco de Agramon.

– Sobre as informações do futuro... – Começo a questionar, mas ela me interrompe.

– Elas são bem definidas, mas dependendo, podem tornar-se sujeitas a alterações. Principalmente se você souber sobre o seu futuro e evitar que coisas ruins aconteçam, como por exemplo, sua própria morte.

De repente sinto minha garganta arder perante ao que Calista acaba de falar.

– Então, você sabe quando eu vou morrer?

– Não só quando, também como, onde e porque. – Responde, aproveitando-se do entusiasmo que deixo escapar com minhas perguntas. – E você pode ter essas informações e muitas outras. Mas como já disse, anteriormente, eu trabalho com um sistema de trocas de favores.

Mordo meu lábio inferior com insatisfação e confesso estar muito tentada a saber sobre o meu futuro. Não apenas sobre o meu futuro, mas também o de toda a minha espécie. Essas informações podem vir realmente a calhar se os feiticeiros correm tanto perigo assim.

– O que você quer? – Pergunto, disposta a pensar nos desejos de Calista.

Minha pergunta a deixa contente, o que é visível, já que ela já está a rir daquele jeito assustador novamente.

– O que quero? Não é bastante óbvio? Quero somente a liberdade.

– Como? – Questiono, não entendendo como é que eu posso lhe proporcionar algum tipo de liberdade.

– Quero voltar a ser uma feiticeira, assim como era antes de estar presa ao Oráculo. Mas para isso, preciso de uma voluntária para permanecer no meu lugar.

Meus olhos se arregalam e eu me afasto instintivamente. Se Calista está mesmo pensando que eu aceitarei servir ao Oráculo em seu lugar, ela está muito enganada. As previsões até podem ser bem importantes, mas a minha liberdade é algo indiscutível.

A mediadora logo percebe o meu susto em relação às suas palavras, parecendo levemente preocupada com o meu modo de agir.

– Não estou falando de você, Emily. É óbvio que você não aceitaria ficar em meu lugar, ainda mais com tanto para resolver. – A expressão utilizada no fim da frase me causa um certo calafrio, já que Calista sabe exatamente o que é que vou ter que resolver.

– A quem se refere, então? – Murmuro, voltando a sentir-me nauseada. Não estou gostando nada do rumo que nossa conversa toma.

Calista flutua de um lado para o outro, como se pensasse na estratégia perfeita para me manipular. Ela sabe perfeitamente como eu preciso dessas previsões do meu futuro, do mesmo jeito que sabe qual será minha reação diante de sua proposta.

– Todos os feiticeiros conhecem a antiga lenda do Oráculo Mágico, mas sei que por ter crescido no mundo humano, você não. Acontece que para servir como mediadora entre o Oráculo e os feiticeiros em geral, você precisa ser uma feiticeira, isso é, do sexo feminino. – Calista faz uma longa pausa, aproximando-se da camada prateada por onde entrei e fazendo com que meus olhos sejam pousados nesta. Logo, a substância em prata passa a se mover e, então, avisto em meio dela, os meus três amigos que ficaram na caverna à minha espera.

Estreito meus olhos, um tanto quanto desconfiada, quando percebo que apesar de poder ver meus amigos, eles não podem fazer o mesmo em relação a mim.

A criatura de seis braços se coloca entre eu e a passagem não mais prateada, apontando para Nina. Com um certo desespero, entendo, finalmente, suas intenções.

– Traga-a para mim, Emily, – Calista ordena, olhando fixamente em meus olhos. – e terá todas as informações que precisa.

– Nem pensar! Eu definitivamente não posso fazer isso! – Balanço minha cabeça em negação, com horror. – Nina é minha amiga, eu não posso prendê-la aqui.

As seis mãos de Calista passam a tremer e uma ruga de reprovação surge entre seus olhos. E para completar a minha aflição, passa a flutuar até mim.

– Não seja tola, Emily. – Sua voz passa gradativamente da calma para o ódio. Quando eu menos espero, ela já está berrando. – Você tem outros amigos, não precisa necessariamente dela. Traga para mim e terá as soluções para tudo o que mais teme!

– Eu não vou fazer isso! – Berro no mesmo tom e, de repente, me arrependo de ter feito isso.

– Ah, mas você vai!

Calista está totalmente tomada pela raiva e voa em minha direção como quem está prestes a atacar alguém. À medida que ela me alcança, eu me afasto. Sem mais saber o que fazer, desembainho minha adaga de prata.

– Fique para trás. – Ameaço-a empunhando minha única arma, de forma falha. Como se uma simples adaga fosse mesmo o suficiente para derrubar a grande e aparentemente forte criatura que se aproxima cada vez mais.

Outra risada de deboche vindo de todos os lugares ecoa pela minha mente fazendo meu estômago queimar. Calista, com toda sua habilidade, passa a voar ao meu redor, prendendo-me em um círculo.

Angústiada, penso em tentar usar meus poderes para atacá-la. Porém, é com uma frustração que logo lembro-me de que deve Calista deve ser imortal, afinal, serve ao Oráculo Mágico. Meus pensamentos desesperados se misturam e me vejo sem ter o que fazer.

Calista passa a fechar cada vez mais o círculo em que flutua ao meu redor e então, eu finalmente, desisto. Cerro meus olhos com força e espero até o meu previsível sofrimento.

***

Uma espécie de estalo seguido por um silêncio repentino me fazem abrir os olhos novamente. Com um suspiro de alívio, noto que estou de volta à caverna subterrânea, de frente para o Oráculo Mágico. Fico curiosa, querendo saber como é que eu sai da sala infinita, mas o que realmente importa é que estou bem.

Minha respiração é irregular e eu estou tremendo da cabeça aos pés. Não notei o quão assustada estava diante de Calista. A substância prateada em minha frente faz com que eu sinta-me ameaçada e então, afasto-me instintivamente.

Topo com algo às minhas costas, fazendo com que minha respiração falhe por um momento. Mãos quentes envolvem meus pulsos, sustentando-me e é com alívio que percebo ser ninguém menos que Luke. Viro-me, apreciando suas íris que costumam me acalmar e desabo em seus braços.

Nina e Jeremy já estão dispostos bem ao nosso lado, ambos curiosos e inquietos.

– Emy! – Ele exclama com preocupação. – O que aconteceu?

dentro existe uma criatura horrível. – Digo apontando para a substância prateada do Oráculo. As palavras escorrem para fora de minha boca com rapidez. – Uma espécie de intermediária entre os feiticeiros e o Oráculo... Enfim, nos desentendemos e ela estava prestes a me atacar quando, graças a Deus, tudo desapareceu.

– Essa intermediária – Luke parece saber do que estou falando. – não pode tocar você. A não ser que você permita. Por isso tudo desapareceu.

– Sabia da existência dela? – Pergunto, confusa.

– Não com certeza. Havia lido alguns relatos de feiticeiros que conseguiram chegar até o Oráculo, mas como nada é muito confiável não levei a sério. – Então ele muda de assunto. – Conseguiu descobrir alguma coisa?

Sua pergunta me atinge de forma brusca e eu fico inerte por poucos segundos, ainda apoiada em Luke, respirando fundo. Para ser sincera, ainda não sei como é que vou informá-los de que sou filha de Blake Darkbloom. Tenho até medo de como é que irão reagir ao fato.

Suspiro e me afasto dos três. Luke parece relutante em me deixar ficar de pé sem a sua ajuda, mas eu balanço minha cabeça, indicando que já estou bem o suficiente para fazer isso.

Permaneço calada, tentando formular uma frase perfeita para desvendar a verdade sobre mim. Nina, Jeremy e Luke parecem tão agoniados quanto eu, porém, estão na expectativa para saber o que descobri.

– O que aconteceu, Emy? – Nina não consegue se conter. – Não conseguiu descobrir quem são seus pais?!

– Eu até consegui, Nina, mas é que... – Começo a falar, porém não consigo terminar. Minha garganta arde impossibilitando-me dizer o que preciso dizer em voz alta. As palavras simplesmente não saem e, quando eu menos percebo, as lágrimas já escorrem pelo meu rosto.

Meus amigos parecem ainda mais assombrados, fazendo com que eu sinta-me levemente culpada por estar enrolando tanto.

Luke faz a menção de me tocar, mas eu me afasto. Não é nada pessoal, mas eu preciso me recompor e encarar tudo isso sozinha. Eu preciso ser forte.

Enxugo minhas lágrimas com as mãos e sem mais delongas eu finalmente comunico:

Sou filha de Blake Darkbloom.


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Notas finais do capítulo

Algumas coisas que não foram totalmente explicadas nesse capítulo, serão mais detalhadas nos próximos. Não esqueça que Reviews me fazem feliz......... Hahaha.
Beijos!