Opposite escrita por Giovana Marques


Capítulo 12
Afeto


Notas iniciais do capítulo

Como prometido, aqui está o capítulo! Tentarei escrever o próximo até Quarta, ok? Se der, eu posto antes.
Espero que gostem desse!
Bom, é isso aí! Beijos e boa leitura :3



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– Ele parecia ser poderoso. – Digo, ainda me referindo ao cara do sonho. – E perigoso. Ele mencionou dominar Opposite!

Já é de manhãzinha. Luke e Jer preparam a canoa enquanto eu e Nina desmontamos as barracas e terminamos de arrumar as malas. Estamos bem próximos e todos conseguem me ouvir.

– Pais perigosos podem ser um problema. – Comenta Jeremy, zombando. – Ainda piores do que os super protetores. – Ele refere-se a Sra. Gray.

Resmungo algo que nem eu mesma consigo entender e continuo a trabalhar em silêncio. A verdade é que estou um tanto irritada pelo fato de meus amigos não levarem tão a sério minhas teorias sobre meu pai invadir minha mente durante o sono. Eles acreditam que tudo não passou de um sonho.

– Emy, eu sei que é difícil por você nunca ter conhecido seus pais, mas é impossível alguém invadir seus sonhos. Impossível. – Nina explica, percebendo o quão magoada estou.

– Mas é aí que está: Eu achava que ser uma feiticeira também era impossível! – Respondo, tentando convencê-los.

Jeremy dá uma risadinha e depois disso permanecemos em constante silêncio.

Acontece que eu não quero e nem consigo acreditar que aquele sonho foi apenas um sonho qualquer, sem nenhum outro significado. E não é só porque estou louca para conhecer meus pais, mas porque foi real. Real até demais. Tanto, que eu até pensei estar morta.

E por um momento, uma dúvida dolorosa percorre minha mente: O que Peter diria sobre meu sonho, se estivesse aqui? Será que acreditaria que aquele cara envolto com o manto branco era realmente meu pai? Aposto que sim, Peter costumava ser tão sonhador quanto eu.

Lembrar dele me faz sentir uma pontada dolorida no coração e o estômago embrulhar. Decido tentar pensar em outra coisa para me distrair, mas infelizmente Logan me vem a cabeça, junto com a enorme saudade que sinto dele. Balanço a cabeça, já com a garganta ardendo e acabo escolhendo não pensar em absolutamente nada.

Termino de carregar a última mala até o barco com um suspiro e noto que Luke já está parado bem atrás de mim, provavelmente querendo me dizer alguma coisa. Eu me viro em sua direção e ele chega um pouco mais perto

– Emily, é o seguinte, eu sei que você quer praticar o uso dos seus poderes o quanto antes, mas acho melhor seguirmos a diante com a viagem. Aqui não é muito seguro, entende? Quando finalmente chegarmos até Arcanum Island, nos revezamos para te ajudar a controlar sua força. Tudo bem?

– Tudo bem. – Concordo, um tanto quanto tensa.

Se tem uma coisa de que estou decidida é de que não usarei mais meus poderes enquanto não praticar. Eu não suportarei ser a causa da morte de mais um de meus amigos. Não mesmo. É claro que não digo isso em voz alta...

Entramos no barco com rapidez e navegamos para fora da gruta, remando com umas espécies de remos improvisados por Nina.

Logo que saímos da gruta, a pouca claridade já machuca meus olhos. Levanto minha cabeça e encaro ao céu, admirando sua cor: uma mescla de azul, alaranjado e alguns tons de dourado. As nuvens também coloridas adornam cada pedacinho de onde eu consigo enxergar. E então avisto o sol surgir, além do horizonte.

A beleza celeste do nascer-do-sol, refletida nas águas escuras me deixa boquiaberta e totalmente sem palavras. Nunca imaginei que fosse um dia parar em um lugar como este. Não prestei muita atenção no começo da viagem, porque estava embaixo d’água, mas agora consigo ver o quão maravilhoso é o Shadow Ocean, apesar das indesejáveis criaturas marinhas.

O oceano parece calmo, mas mesmo assim Luke pede para não falarmos muito, pois agora somos visíveis e audíveis pelas criaturas marinhas e tudo o que não queremos é outro polvo gigante para nos incomodar. Remamos em silêncio por um bom tempo e tudo continua tão tranquilo que acabo relaxando em relação às criaturas marinhas abaixo de nós.

Como teremos de passar longas horas dentro do barco, Jeremy logo sugere que nos dividimos: enquanto dois descansam, os outros dois remam. Todos concordam e acabamos decidindo que eu e Luke começaremos descansando.

Cravo meus olhos na paisagem e não demoro muito até apagar. Acordo depois de horas e o sol já brilha forte no céu. Sou obrigada a ignorar seus raios fortes que já atingem minha pele. Esfrego minhas mãos em meus braços, levemente avermelhados. Droga, isso vai doer bastante mais tarde.

Já estou pensando em me lamentar sobre não ter trazido o filtro solar quando Nina joga para mim um frasco minúsculo com um rótulo que diz “Poção bloqueadora de raios solares”. Estou prestes a despejar a substância em minha pele quando Nina me impede rindo, dizendo que devo bebê-la. Sorrio, impressionando-me novamente com a eficiência da magia e bebo o conteúdo do frasco em um segundo.

Eu e Luke tomamos posse dos remos e deixamos Nina e Jer descansarem. Nina deita em um canto do barco e Jer no outro, deixando eu e Luke no meio.

Alguns minutos se passam e o calor torna-se cada vez maior. Uma gosta de suor escorrega pela minha testa e atinge a madeira do barco. O sol está tão quente que já não sei dizer que horas são? Três da tarde? Talvez.

Meu olhar se perde na imensidão azul e estou fico tão absorta no balanço da água, que de repente sinto minhas pálpebras pesarem e minha consciência falhar gradativamente.

– Emily? – Luke chama pelo meu nome, trazendo-me de volta a realidade.

Levanto minha cabeça, que já está de lado, com rapidez e aperto o remo com força em minhas mãos. Meu susto faz Luke rir.

– Desculpe. – Digo envergonhada e volto a remar. – Eu cochilei.

Ele me encara parecendo cansado como sempre, apesar do ar de divertimento em seus olhos devido ao meu rápido cochilo.

– Eu percebi. Se está cansada, é só me falar. Posso pedir a Jeremy para trocar de lugar com você.

– Não! – Descarto a ideia na mesma hora. – Seria crueldade. Ele está dormindo feito um bebê. Nina também. E outra, já foi meu horário de descanso.

– Tem certeza? – Pergunta, preocupado.

– Absoluta. – Digo, tentando convencê-lo de que estou bem.

– Tenho que admitir... Também estou ficando com sono. Remar é tão monótono!

– Converse comigo. – Dou uma ideia. – Talvez o sono passe. Ou não, já que sou a pessoa mais entediante do mundo. Ah, deixe para lá! Esqueci completamente que os demônios marinhos podem nos escutar.

Rio de leve e Luke também, apesar de parecer levemente confuso com o que eu acabo de dizer.

– Podemos falar, se for assim. – Ele passa a sussurrar. – Por que você seria a pessoa mais entediante do mundo?

Dou de ombros e continuo remando. Suas irís azui-esverdeadas já estão cravadas nos meus olhos, como se tentasse me decodificar. Passo a encarar ao oceano, meio sem graça com seu olhar em mim.

– Sei lá, geralmente o Logan é o cara legal. Eu sou só a irmã mais nova chata, que trocaria uma festa por um livro. – Sussurro em resposta.

– Eu também trocaria... Mas depende do livro. E da festa. – Diz, tentando ser legal, e é claro que eu não deixo de sorrir. – Você não estava gostando, né? Da festa em que nos conhecemos.

Flashbacks daquela noite confusa, que eu havia jurado à mim mesma no dia seguinte que esqueceria, aparecem claramente em minha cabeça. A boate, eu sendo enganada por Logan, Stacey e lobisomens surgindo completamente do nada.

– Nem um pouco. Principalmente por que Logan havia me enganado para que eu saísse com você, e como eu não o conhecia, estava bem nervosa.

Percebo que disse algo idiota quando Luke sorri com o que eu digo. Seus olhos parecem ainda mais cheios de curiosidade quando ele comenta:

– Estava nervosa porque ia sair comigo? Quer dizer, você nem me conhecia.

Já mencionei o fato de minhas bochechas ruborizarem justo nos piores momentos? Esse é, definitivamente, um desses momentos. Suspiro disfarçadamente e tento o fugir do seu olhar o máximo que posso.

– Não sou boa em fazer amigos. – É a única coisa que consigo pensar. “Nunca havia saído com ninguém antes.” decididamente não é a melhor coisa a dizer, afinal.

Luke sorri e balança a cabeça, como se dissesse “Entendo”. Talvez até entenda em relação a fazer amigos, já que ele é tão bipolar quanto eu. Na verdade, muito mais bipolar do que eu. Porém, é só colocar os olhos em Luke para saber que ele deve ter bastante experiência no quesito mulheres. Ele é bonito demais para ser deixado de lado por elas, como é o meu caso em relação aos homens... Não tenho dúvidas de que já esteve envolvido em algum relacionamento antes, ou melhor, alguns.

– Lembro de quando te reconheci. – Ele diz, acordando de mais um dos meus devaneios. – Você estava discutindo com aquela garota...

– Stacey. – Digo como se tivesse acabado de dizer um palavrão. Bufo com a lembrança do ser acéfalo com quem eu tinha de conviver todos os anos letivos.– Fico feliz em saber que nunca mais vou vê-la.

Isso me lembra que nunca agradeci a Luke por ter me ajudado a calar a boca de Stacey Richards naquela noite. Ele nem me conhecia, tinha coisas mais importantes a resolver e eu ainda o tratei com rispidez. Lembrar disso me faz sentir tão infantil, que se pudesse, voltaria no tempo só para não ter sido tão estúpida e injusta.

E o pior é que quero agradecê-lo por sua atitude, mas não vejo como. Será absolutamente estranho se disser isso agora. Mas então, Luke muda de assunto:

– Uau. Tem tanta certeza assim de que não sairemos vivos da missão?

– Não é isso... É que se sairmos vivos e eu finalmente encontrar meus pais, não tenho nenhuma pretensão de voltar ao mundo humano. Talvez para visitar algumas pessoas, mas não para viver lá. – Suspiro, voltando a encarar a imensidão azul do oceano. – Não sei explicar, mas é como se eu não me encaixasse entre os humanos.

– Imagino como deve ser estranho para um feiticeiro ser criado no mundo humano. – Seu rosto de contorce em uma careta. – Mas você tinha uma amiga ao menos, não é? Acho que chegou a mencioná-la, quando estavamos indo para Londres.

Logo adivinho a quem se refere.

– Rachel? Era minha melhor e única amiga. Eu me sentia tão sozinha e ela... – Faço uma pausa, pensando no que vou falar. Será mesmo que ele se importa em saber sobre mim? Ou ainda está fazendo isso por causa do sono?

É estranho estar desabafando com alguém que não seja Rachel, ou pior, com um cara mais velho que tem muito mais outras preocupações do que as minhas antigas frustrações. Não digo mais nada e Luke provavelmente deve estar me achando louca por isso.

– Ela...?

– Esqueça. – Viro-me para ele, séria. – Você não quer saber sobre isso. É besteira... Nada comparado aos seus problemas.

Ele parece incrédulo com o que eu digo, como se tivesse dito algo absurdo.

– Nenhum problema é pequeno ou grande demais. Todos são ruins. E é claro que eu estou interessado no que você tem para dizer. – Fala com sabedoria, mas eu continuo em silêncio até que ele passa a resmungar. – Qual é Emily? Somos amigos, não somos?

Ele olha nos meus olhos de novo, como se esperasse uma resposta positiva e isso me deixa mais nervosa que o normal. Fujo do seu olhar, para variar, olhando para o remo em minhas mãos.

– Há alguns dias atrás eu diria que não, mas sim somos amigos. – Coloco para fora, totalmente sincera.

Por incrível que pareça, sua expressão não muda.

– Por que há alguns dias atrás você diria que não?

– Sei lá, você estava sempre tão distante e mal humorado. Cheguei a pensar que não gostava de mim, algumas vezes. – Digo nada mais que a verdade, olhando para ele desta vez.

Ele suspira e encara ao oceano em silêncio por alguns segundos. Meu coração dá cambalhotas dentro do meu peito e eu arrependo por ter sido tão sincera. Acho que Luke acaba de se chatear com o que eu disse e agora esse clima esquisito vai ficar nos perseguindo para sempre!

– Desculpe. – Ele diz, surpreendendo-me.

– Não precisa se desculpar, quero dizer, fico feliz em finalmente poder ser sincera com você, Luke. Eu sei pelo que está passando e não parece ser nada fácil. – Digo, tentando escolher as melhores palavras possíveis.

– E realmente não é.

Um silêncio chato preenche o momento de novo e ficamos naquele clima pesado por uns minutos.

De repente um barulho surge completamente do nada, como se fosse um tipo de ruído produzido por algum animal ou algo assim. Eu e Luke nos assustamos e nos encaramos preocupados, mas no fim das contas percebemos que é Jeremy roncando feito um porco.

É claro que começamos a rir na mesma hora. Tanto, que meus olhos chegam a lacrimejar. Tenho de me levantar para virar Jer com o toda a delicadeza do mundo até que pare de roncar e não chame a atenção de criaturas marinhas.

Volto a sentar ao lado de Luke e ainda estamos rindo. Ou melhor, gargalhando. Mas eu paro assim que começo a ficar sem ar. Percebo que é a primeira vez que rio de verdade, durante dias. Os últimos deles foram bem exaustivos e preocupantes, em decorrência da missão.

– Certo. – Ele diz, logo que termina de rir. – Fazia algum tempo que eu não ria assim.

– Era exatamente nisso que estava pensando. – Sorrio de leve, olhando para ele.

Luke estuda minha expressão, como se fosse um livro que não conseguisse entender. Como se fosse uma pessoa muito diferente do que as outras que conhece, o que não deixa de ser mentira, já que fui criada no mundo humano.

– Você vai continuar calada ou vai começar a me contar sobre a sua vida? – Ele pergunta, com um sorrisinho no canto de seus lábios. – Eu realmente estou interessado nos seus problemas.

– Tudo bem. – Concordo. – Mas depois vai ter que me falar sobre os seus.

– Fechado.

Fico feliz por poder confiar em Luke e por estarmos nos dando tão bem. Também fico contente em vê-lo nesse bom humor repentino e ainda mais em saber que eu sou responsável por parte dele.

– Do que estavamos falando mesmo? Ah sim, Rachel. – Começo a falar e Luke parece realmente interessado. – Eu conheço Rachel desde os sete anos de idade, antes disso não tive nenhum outro amigo sequer. Sempre arrumava briga, na escola, e acabava ficando no “cantinho do castigo”.

– Brigas? – Ele pergunta, com um sorriso esboçado em seus lábios. – Não parece tão entediante quanto disse que é.

Não posso deixar de rir com seu comentário a meu respeito.

– Quando tinha seis anos, dei um soco na cara de uma garota que implicava comigo, na escola. Ela acabou quebrando um dos dentes da frente e a diretora quis conversar com Carl. Achei que ele fosse me dar o pior castigo de todos, mas ignorou completamente o acontecido. Acho que ele tinha medo de eu dar um soco na cara dele também.

Nós rimos exageradamente com a menção do meu ex-pai adotivo panaca.

– Mas eu era a esquisita da escola, ninguém ficava perto de mim. Até que Rachel entrou na minha turma e aquela loirinha atarracada era tão encrenqueira quanto eu. No começo, nos odiávamos e o resto das crianças nos cercavam só para ver a gente brigando. Mas fomos crescendo e como éramos as duas excluídas, resolvemos nos unir. – Sorrio com a lembrança. – Mais tarde, resolvemos mudar de escola. Mas essa coisa de não se encaixar continuava sendo um problema. Quer dizer, com Rachel até que não. Ela fez novas amigas e tudo o mais, mas eu não. As meninas sempre falando sobre coisas que nunca me interessavam, como moda, dinheiro, meninos, quando o que eu mais queria era me formar para poder ter meu próprio dinheiro e sair da casa do meu pai. No começo eu achava que não, mas Rachel gostava de mim o suficiente para preferir ser excluída comigo do que me deixar sozinha. É claro que eu nunca gostei muito dessa história, já que quem estava perdendo era ela.

– Não acho que estava perdendo. – Ele me interrompe por um momento. – Digo, ser sua amiga deveria ser muito melhor do que ser amiga dessas meninas fúteis.

Suspiro, um tanto chateada com aquilo.

– Mas eu sou uma feiticeira e ela não. Rachel também se interessa por essas coisas fúteis e muitas vezes eu fazia um esforço tremendo para tentar conversar com ela sobre roupas de marca e tudo o mais, mas é claro que não entendia a maioria das coisas que ela dizia. E agora, eu simplesmente a abandonei.

Ficamos em silêncio por um momento e eu volto a falar:

– Tenho tentado não pensar nisso, mas Rachel está sozinha agora. Eu sou o motivo por ela não ter amigos e desapareci completamente do nada. Ela deve estar sofrendo e eu me sinto culpada por isso.

Luke olha para mim com algo diferente em seus olhos, como se nunca tivesse me olhado daquele jeito antes. Com alguma coisa muito parecida com afeto... Como se fossemos realmente amigos. E somos, eu acho. Não estaria conversando com ele sobre isso se não fosse meu amigo.

– Não sinta-se culpada, Emy. Tenho certeza que Rachel é uma boa pessoa, como você diz, e que ela vai conseguir fazer outros amigos. – Ele sorri de leve, olhando para mim e eu não deixo de fazer o mesmo. – E outra coisa, se sairmos vivos dessa missão, eu prometo que vou com você visitá-la.

Suas palavras me deixam feliz, reconfortada e me fazem sorrir.

– Obrigada, Luke.

Paramos de remar por um instante e decidimos comer alguns sanduíches, que felizmente, Nina conseguiu salvar de dentro do submarino destruído.

O barco se move com as ondas, mas sem sair muito de onde estamos. Segundo os cálculos de Luke, chegaremos em Arcanum Island só amanhã de manhã e confesso que isso me desanima um pouco.

– Presumo que seja minha vez de “desabafar”. – Luke diz, mordendo um pedaço do sanduíche.

– Pode começar. – Digo, dando uma piscadela.

– Você sabe quase tudo sobre mim, sobre a a missão, sobre o quanto me sinto pressionado. Na verdade, quase todo mundo sabe sobre isso. – Ele diz encarando ao horizonte, bem atrás de mim.

– É. – Concordo.

– Porém, existe algo sobre mim que ninguém sabe. Algo que eu sinto. – Ele suspira, entre as palavras e eu de repente me sinto importante por ser a primeira pessoa a ouvir o que está prestes a dizer. – Você não faz ideia de como eu odeio quando as pessoas me tratam como o “coitado que tem a missão de nos salvar”. Quer dizer, quando agem como se eu não soubesse o que eu estou fazendo e como se não colocassem nem um pingo de fé em mim. Tem gente que me olha de longe com cara de pena, e tudo o que eu quero, de verdade, é que ser olhado com orgulho. Orgulho de ter essa missão tão importante em minhas mãos! Você consegue me entender? Eu só não aguento mais todas essas pessoas pensando em mim como um erro.

Me sinto mal por Luke e não consigo me imaginar em seu lugar por um só momento. Ele volta a falar:

– Às vezes, até mesmo meus melhores amigos acabam me tratando assim, agindo como se tivessem pena de mim. Sei que não é culpa deles, já que todos agem desse mesmo jeito em relação à minha pessoa. Mas só quero rir um pouco de vez em quando, sabe? Esquecer por um momento que Opposite está em minhas mãos. – Ele olha para os lados, para certificar se Jer e Nina ainda estão dormindo e continua a falar. – Às vezes, me sinto mal por Nina e Jeremy. Tantas vezes que já perdi a cabeça com eles! E o pior é que eles não retrucam, só aceitam, sem dizer nada. Quando a raiva passa e eu paro para pensar, fico me sentindo uma péssima pessoa.

– Luke. – Interrompo-o. – Seus amigos entendem quando está nervoso, eu tenho certeza. Nina parece te amar como um irmão mais velho e Jeremy também, sem falar que ele é seu primo. Quanto a eles, você pode ficar tranquilo. E quanto aos outros, simplesmente esqueça-os! Tem muita gente que fala sem saber de nada e eu sei que não só você, mas nós, vamos supreender a todos. Nós vamos encontrar “a garota perdida” e assim que ela se casar, você será livre para sempre. Livre para viver a vida com que sempre sonhou. E eu vou conseguir reacender a Fogueira da Fortuna, porque também vamos encontrar Blake Darkbloom!

Me surpreendo com meu otimismo repentino e acho que Luke também, já que parece bem mais contente agora. Não sei como e porque, mas me sinto três vezes mais motivada para dar continuidade à missão quanto antes.

– Entende? É disso que eu preciso: Alguém otimista. – Luke diz, cravando seus olhos nos meus. – Emily, tenho que confessar que você é a primeira pessoa com quem consegui ter uma conversa sincera como não tinha há muito tempo. E além disso, fazia mesmo um bom tempo que não ria daquele jeito que rimos. Eu só quero dizer “obrigado”. Obrigado, de verdade! E me desculpe pelas vezes que fui grosso com você, que não foram poucas.

Fico impressionada diante de tudo o que ele acaba de dizer, sério. Sinto os cantos da minha boca se alargarem em um sorriso. Porém, há algo dentro de mim ainda precisa ser esclarecido. Já que é a hora dos agradecimentos e desculpas, significa que também é hora de lembrar de um certo favor que ele havia me prestado.

– Eu é quem tenho que me desculpar. Como eu mesma disse uns dias antes, sou explosiva e não meço as palavras antes de dizê-las. Tem vezes que elas simplesmente saem pela minha boca, como naquela vez em que você me ajudou com Stacey, na noite em que nos conhecemos. Eu não agradeci a você e comecei a dizer umas coisas estúpidas que não deveria ter dito. Bom, muito obrigada!

Ele sorri e então ficamos nos encarando em completo silêncio. Ele olhando fundo em meus olhos, enquanto eu olho nos dele. Luke é tão bonito, e tão perfeito. Parece tirado de um daqueles seriados de televisão, mas não como o mocinho certinho, e sim como o anti-herói, confuso em suas ações, mas completamente charmoso e bonitão.

– Tem mais uma coisa que eu quero dizer... Emy, eu sinto muito mesmo pelo Peter. Não falei da boca para fora, ontem à noite. – Ele diz, parecendo meio chateado e um tanto envergonhado. – Queria ter te dado um abraço, mas não sabia se era a melhor coisa a fazer, nem como fazer.

Lembrar de Peter dói tanto que tenho de engolir em seco antes de responder.

Confesso que agora sim tenho uma outra visão de Luke. Um Luke amigo, gentil e até mais charmoso que o normal. Não sei o que dizer, então eu simplesmente digo:

– Pode me abraçar agora, se quiser.

Ele sorri de leve e me envolve com seus braços, quentes e confortáveis. Sou tão pequena perto dele que acaba sendo até um pouco engraçado. Devo admitir que seu perfume amadeirado mexe um pouco com meus pensamentos e que me sinto mais segura que o normal em seus braços.

Mas em poucos segundos, algo acontece.

– Emily e Luke. – Ouço a voz de Nina, pelas costas de Luke. – O que quer que estejam fazendo, não se mexam.

Abro os olhos e vejo a pequena feiticeira de cabelos ruivos tão assustada como nunca.

Continuo abraçada a Luke e tenho a impressão de que ele já percebeu tudo o que está acontecendo. Estou imóvel, seguindo a advertência de Nina e sinto-me um pouco constrangida, já que Jer também está acordado e nos vendo abraçados.

Sinto os braços de Luke se soltarem e se moverem para baixo, como se procurasse por alguma coisa no barco... Armas? Talvez.

– O que está acontecendo? – Sussurro, preocupada.

– Serpentes leão. Muitas delas! Estão em volta do barco. – Nina responde, tão imóvel quanto eu.

E de repente, algo pesado e molhado voa por cima de nossas cabeças de um lado do barco e vai parar do outro. Na mesma hora, Luke me aperta com os braços e nos abaixamos. Nina e Jeremy nos imitam, já que as centenas de Serpentes leão começam saltar por cima da nossa pequena canoa.

– E agora? – Pergunto, assustada.

– Seria inútil lutar. – Nina observa.

Luke e eu estamos deitados na canoa, um do lado do outro e de repente percebo que ele me observa um tanto pensativo.

– O que foi?

– Emily, acho que vai ter que nos salvar de novo... – Ele diz, um tanto receoso, já que matei um de nós naquele redemoinho gigante que criei.

Balanço a cabeça, em negação. Não mesmo! Não pretendoo machucar mais ninguém. Eu jurei para mim mesma que não usaria meus poderes sem ter praticado o suficiente para controlá-los.

– Não, Luke. Não pratiquei e prometi a mim mesma que não tentaria de novo sem antes praticar.

Luke respira fundo, nervoso e sem saber o que fazer. Olha para mim e com toda a compreensão do mundo, diz:

– Não precisamos de um redemoinho, só nos tire daqui. Por favor!

Sinto várias pontadas doloridas em meu estômago, já evidenciando o nervoso, e minhas mãos tremerem. Mordo meu lábio inferior, insegura.

– Luke... – Choramingo, rezando para que ele não insista nem mais um pouco.

– Vai dar tudo certo! – Suas mãos de repente tocam as minhas.

Respiro fundo, conto até três e mordo o lábio inferior sem saber exatamente o que fazer. As mãos de Luke ainda seguram as minhas com firmeza, me transmitindo algum tipo de paz. E não é a primeira vez que isso acontece.

Fico tentada a nos tirar dali usando meus poderes, mas penso nos riscos novamente. Olho para o céu, totalmente dividida até que as serpentes leão voltam a saltar sobre o barco. Muitas delas. Muitas mesmo!

– Emily! Pelo amor de Deus! – Jeremy suplica, aos berros.

Motivada pelo desespero, eu resolvo tentar. Ignoro minha consciência que grita para que eu não faça o que estou prestes a fazer e livro minhas mãos das de Luke, virando minhas palmas para cima.

– Segurem-se! – Advirto, fechando os olhos e me preparando para nos tirar daqui.


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