Café, Solidão E Plástico Bolha escrita por K Blodeuwedd


Capítulo 4
Parte IV: Efeito Bella


Notas iniciais do capítulo

Demorei, mas foi mais devido a falta de reviews do que de vontade...
Peço que todos comentem, pois esse é a parte final. Ela está diferente de tudo que eu já escrevi, e bem sem mais delongas...



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– Você deveria reconsiderar sua escolha de se matar, por que a vida é doce... - murmurou um Edward meigo a centímetros dos lábios avermelhados dela, sentindo a respiração acelerada em seu rosto, o hálito fresco em sua própria boca e por fim os olhos levemente aterrorizados nos dele. - e por que existem pessoas mais persistentes que Jacob.- concluiu, colocando toda a frustração que sentia no nome, como se tudo fosse culpa dele.

Bella permaneceu imóvel, uma marionete sem vida que ao sentir o toque delicado e acalentador de lábios nos seus se transforma em emoção para depois se sentir consternada e se petrificar de assombro. Não podia estar ali, desejando intensamente que mais uma vez os lábios se tocassem, que ele disse algo carinhoso e que acima de tudo, a fizesse querer ficar. Fizessem-na desejar algo que sua mente lhe lembrava ser um erro. Um grande e irrefutável erro.

Edward percebendo a mudança no olhar dela, permitiu-se enfim soltar seus braços e se afastou, crendo que dar a ela um pouco de espaço fosse necessário. Obrigatório, talvez. “ Afaste-se, Edward. Evite sofrer.” Ordenou a si mesmo, em vão. Era inconcebível, ele iria ficar.

Se em um país de 308.745.538 habitantes, eles se encontraram em meio a uma linda tarde de sábado, contrariando todas as possibilidades, logo era o dever de Edward salva-la, mesmo quando o perigo em questão era ela própria. A situação era incontestável, assim como o fato da certeza de que ela era sua alma-gêmea. E isso só poderia ter um nome: destino.

– Você tem que abastecer o carro. –lembrou Bella com a voz rouca e a face corada, retirando Edward dos pensamentos atordoados no qual ele se afogava cada vez mais.

Ele acenou em concordância e abriu a porta, lembrando do gosto dos lábios de Bella nos seus e tentando focar-se no que realmente importava. Lento, ele fez tudo mecanicamente, entre suspiros, sorrisos e algumas caretas. Enquanto isso, Bella mantinha-se quieta no interior do volvo, passando os dedos ao redor dos seus lábios e sonhando com um futuro que antes de tudo pensava em se privar. Na superfície, tudo estava calmo, mas tudo não passava de uma ilusão que seria levada facilmente pelo vento.

– Vamos.- disse Edward, entrando no volvo, sem que Bella o notasse.

Tudo que se seguiu foi muito rápido, borrões passaram pela janela e ambos permaneceram calados.

Intrigante como mesmo quando queremos desesperadamente falar não temos a coragem necessária, não lutamos com afinco suficiente pelo direito que temos de expressar o que sentimos por medo de magoar quem nos cerca. E agora, anos mais tarde, tudo o que Edward desejava era ter voltado, dito que ela não poderia acabar com a própria vida por que ele necessitava dos seus lábios, dos dedos macios acariciando a sua face e dos pensamentos mais íntimos que ela havia tido até aquele exato momento. Isso não seria possível, entretanto. O problema com o tempo é exatamente esse: ele não te obedece e nunca está disposto a ceder aos nossos caprichos.

– Onde estamos?- perguntou Bella após longos minutos, encarando a paisagem a sua frente consternada. Estavam no Fort Foster.

Edward virou-se e a encarou, com as sobrancelhas arqueadas e um sorriso cético nos lábios. Ambos sabiam que era impossível não reconhecer a praia, o píer e a vista do farol Whaleback*** , mas ignoraram o fato. Era como se vissem tudo pela primeira vez.

– Fort Foster. - ele respondeu. – Venha.

E eles saíram do carro, em sincronismo. Desistindo momentaneamente de fugir dele, Bella se encaminhou calmamente para o banco de madeira que ficava em frente a praia, assentou-se e focou sua mente apenas no farol Whaleback. Quando criança, costumava se imaginar no alto do farol, saltando deste e voando na direção do mar. Mesmo criança ela já se sentia um pássaro privado da tão ansiada liberdade e talvez com a morte ela a conseguisse.

– Por que estamos aqui?- perguntou Bella.

Edward suspirou e jogou fortemente a pedrinha que repousavam em sua mão nas ondas do mar.

– Para que você entendesse o por que de viver.

Bella desviou o olhar do farol, de suas lembranças e sonhos, e o encarou. Um Edward com os cabelos desgrenhados ao vento, emoldurado pelo céu nublado e visivelmente desesperado observava o mar. Estava intrigado como ela parecia tentada a dificultar tudo para ele, tentava livrar-se dos braços dele para seguir para os braços da morte e não parecia interessada em reconsiderar. Jogou mais uma pedrinha e escutou o som suave do baque, que rapidamente foi substituído pelo sonoro uivar das ondas quebrando na areia.

Seguindo o exemplo dele, Bella se levantou, procurou por mais pedras e se juntou a ele. Não pensaram em nada, mas foram envolvidos por uma sinfonia sincronizada das pedras sobre a água. Duas pedras dele, um suspiro, duas dela, um curto tempo de espera e tudo recomeçava. Um ciclo, afinal toda a vida se resumia a isso, certo?

– Eu sempre amei água, principalmente a salgada.- sussurrou ele, parando subitamente com a sinfonia. – Quer nadar comigo?

Bella lembrou-se dos diversos afogamentos que sofreu e respondeu com veemência:

– Não.

Edward riu, pegou as pedras que estavam na mão dela e as jogou na água, ignorando os débeis protestos que saiam dos lábios avermelhados.

– Você quer se jogar no rio Piscataqua, mas não quer nadar comigo? Interessante. Mais interessante do que posso dizer.- sua voz estava ferida e as orbes verdes brilhavam em lágrimas, que ele resistia bravamente em derramar.- Venha, por favor.

A voz, o brilho, a forma como o vento levava os cabelos e o beijo roubado, levaram-na a aceitar a proposta. Abriram os lábios dela e forçaram o “sim” para o ar frio da noite. Andaram lado a lado, com as mãos fortemente atadas, aos suspiros.

– A vida é doce e também pode ser salgada. - disse Edward assim que chegaram a beira d’água, onde as ondas lambiam os sapatos dele e os pés dela.- Você deveria viver por isso.

– Prefiro doce.- retrucou Bella, evitando olha-lo.

– Mas sem o salgado, talvez o doce não fosse tão doce ou não se chamasse doce.- ele riu de sua lógica pouco compreensível e foi acompanhado por Bella.

Dando o melhor de si, ele se abaixou com a mão dela grudada na sua, o que obrigou Bella a abaixar-se também, e retirou seus sapatos. Levantaram-se e ele simplesmente jogou o mais longe possível o par de tênis nike que havia ganhado de presente da irmã. Teria se jogado também caso soubesse que isso faria sua amada permanecer viva.

Após o ato, Bella o olhou entre boquiaberta e admirada. Tinha que admitir que apesar de louco, Edward era um ótimo lançador.

– Não gostava dos sapatos?

Edward riu novamente e retirou seus documentos do bolso, juntamente com a carteira e o casaco de couro, afinal mesmo as sua irresponsabilidade tinha limites.

– Espere aqui.- pediu ele e se dirigiu para o carro.

Bella evitou olhar, no entanto era impossivelmente impossível. Seguiu todos os movimentos dele, viu quando o cenho dele se franziu e até mesmo quando os dedos longos da mão abriram e fecharam nervosamente.

– Agora, oficialmente: vamos?- pediu, chegando perto dela e estendendo novamente a mão.

Ela aceitou e juntos deram o ultimo passo para mais uma certeza: a vida era doce e salgada.

O primeiro contato com a água os fez estremecer. Sentiam frio até mesmo em suas almas. Definitivamente aquela havia sido uma ideia absurda.

– Vou morrer de frio.- reclamou Bella, tremendo e rindo simultaneamente.

Apesar do frio, ela se sentia bem, perto da felicidade. E se sentiu ainda melhor quando braços quentes e confortáveis a envolveram, levando-a para fora da água.

– Vamos ao píer?- perguntou Edward tentando controlar-se e não denunciar como estava afetado pela proximidade entre eles.

Impossibilitada de negar algo a ele, por razões que nem mesmo Bella tinha conhecimento, ela deixou que mais um sim escapasse dos seus lábios. Trôpegos eles seguiram para o píer, subiram as escadas, ouviram o estalar da madeira e se assentaram. Deitaram-se e se aconchegaram. Namorados alguém os denominaria, se os vissem adormecendo no píer em pleno sábado ao anoitecer. Um hora, foi o tempo que permaneceram assim.

Bella foi a primeira a acordar ao sentir um vento mais forte em seu corpo um pouco molhado. Assustada, ela se remexeu inquieta nos braços de ferro que a envolviam, acordando consequentemente Edward que sonhava com os lábios dela nos seus.

– Quantas horas?- perguntou rouca devido ao sono.

Edward sacudiu levemente a cabeça, tentando afastar a tentadora ideia de beija-la, e soltando-a a contragosto respondeu:

– Não sei, mas devem ser 08 horas.

Bella pestanejou mentalmente por haver se rendido aos encantos do desconhecido e se levantou cambaleante. Apoiou em um dos corrimãos de madeira e coçou os olhos, sonolenta.

– Temos que ir.

Edward acenou em concordância, sem confiar em sua voz para dirigir-se a ela, e levantou-se, sentindo o corpo dolorido. Não deveriam ter dormido em um píer, provavelmente foi algo errado de se fazer para alguém que ele acabara de conhecer, entretanto ele podia jurar que aquilo fora o correto. Terrivelmente correto.

– Você tem que viver, por que a vida é doce, salgada e pode ser tranquila como adormecer em um abraço.- disse Edward, olhando somente para os lábios a sua frente, hipnotizado.

Bella olhou tristemente para a figura a sua frente, sem notar o modo como seus lábios eram analisados, e sussurrando exprimiu a verdade incontestável sobre a vida e seus problemas desconhecidos:

– O problema é que os sonhos não se realizam.

– Me fale um deles, que eu o realizarei.- prometeu ele deixando seus anseios de lado e voltando ao desespero habitual de mantê-la viva.

Bella pensou e lembrou-se do farol, na Bella criança e no pássaro que existia em seu interior. Antes de poder se conter, por estar contando um segredo tão intimo e secreto como aquele, ela falou:

– Eu quero voar.

Edward analisou a expressão a sua frente e julgou que ela nunca havia dito aquilo a ninguém. Por isso as próximas palavras mudaram tudo.

– Esse era meu segredo.

Sorrindo ele encontrou um modo de fazê-la permanecer com ele. Talvez sua avô estivesse certa, havia sim uma luz no fim do túnel.


˜˜˜˜˜˜˜˜˜˜˜ * ˜˜˜˜˜˜˜˜˜˜˜

– Está segura?- ele perguntou, sem conter a expressão preocupada que surgia no seu rosto.

Bella segurava-se fortemente no apoio para bicicletas que ele mantinha no carro, sorrindo. Ela estava estonteante.

– Vamos logo. - repreendeu-o, ansiosa para sentir o vento nos cabelos e nos braços como se estivesse verdadeiramente voando. Seria parcialmente livre, enfim.

– Claro. - resmungou Edward em resposta, aterrorizado com a possibilidade de ser o causador da morte que ele tentava evitar com aquele ato.

Contrariado seguiu para o volvo e entrou, implorando mentalmente para que tudo desse certo. Tinha que dar certo.

O carro começou a se movimentar, devagar, cautelosamente. Bella soltou a mão dos apoios e abriu os braços. Indescritível. Sentia um frio percorrer seu corpo e o vento em seu rosto. Estava voando, mesmo sem asas. Estava livre, mesmo estando presa. Sentia-se bem e finalmente realizada, como talvez nunca tivesse se sentido.

– A vida é liberdade, quando se deseja.- completou ela aos sussurros, para si mesma. Queria viver sempre assim, se sentindo livre e amada, mesmo que somente pelo vento que beijava sua face. Sentia todas as emoções do dia se esvaindo, deixando somente Bella Swan, a garota que mesmo sem saber havia tomado sua decisão.

Esqueceu-se de Renée, Charlie, Jacob, Rosalie e até mesmo Edward. Lembrou-se apenas de si e sem nem mesmo perceber começou a entoar Hey Jude.

Após demorados minutos, eles enfim chegaram ao inicio. Edward estacionou o volvo e ela parou na beirada do carro, colocando uma mascara de indecisão em seu rosto. Não sabia qual era a sua decisão final, mas não queria dividi-la. Não ainda.

– Não me deixe.- pediu Edward, enquanto a pegava nos braços e a abraçava.

Ela tinha que viver. Era um fato.

– Me deixe só, está bem?- pediu Bella, se sentindo intimidada pela força dos sentimentos que ele exteriorizava.

Ele era tão intenso. E em contrapartida ela era tão...desprovida de segurança e certeza. Se ao menos pudesse roubar parte do que ele possuía, talvez fosse mais fácil permanecer ao lado dele. Poderia ser simples como respirar. Suspirou, pois na verdade era mais complicado do que viver, afinal permanecer do lado dele implicaria a invasão do seu espaço, os olhares analisadores e os lábios doces. Não conseguiria, não quando...

E o pensamento se foi, como se nunca houvesse existido.

Bella da despedida guardou somente o gosto do beijo, a satisfação e a irritação que a tomavam por tê-lo perto, e o indubitável fato de que precisava se ver livre da sensação que ele lhe causava. Hoje fazem exatos 4 anos desde este dia. Após o momento deles, Bella assentou-se na ponte, relembrando-o. Surpresa constatou que não desejava mais morrer. Tinha alguns sonhos, um hamster e tanto tempo! Isso lhe bastava, ao menos por enquanto.

Edward procurou-a no dia seguinte, e no próximo, e no próximo. No decorrer de uma semana, leu todas as noticias, esperando pela morte da amada. Nada.

Tudo voltou normalmente a normalidade, a essa ilusão pueril. O efeito Bella teve seu desfecho, ela o encantou, criou esperanças imaginarias e sumiu, deixando-o a deriva. Cansado, deprimido e apaixonado por uma adorável desconhecida que um dia foi salva pelo príncipe do volvo prata, ele segui a vida. Essa é a estória de um rapaz que conheceu uma garota. Eu deveria ter te avisado que esta não era uma estória de amor e sim uma estória em homenagem a vida, mas não queria desanima-lo afinal...

– O que você está lendo?- perguntou uma voz de sotaque inglês.

Bella levantou seu olhar e deparou-se com olhos extremamente azuis fixos nos seus. Sentiu-se corar e perguntou-se mais uma vez onde estaria caso não houvesse sido salva de si mesma.

– Jane Eyre. - respondeu com um sorriso, repreendendo-se mentalmente por haver se esquecido que tudo poderia acontecer, mesmo em uma pequenina cafeteria no subúrbio de Londres.



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Notas finais do capítulo

***farol Whaleback: do inglês " Whaleback lighthouse".
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* Uma última nota de sua narradora*
- Comentem;
- Sim, eu sou pior que Fitzgerald no quesito geografia, por isso me perdoem os possíveis erros cometidos quanto a localização dos espaços citados;
- Espero que tenham gostado da fic, tanto quanto eu;
- Kay: o que houve comigo?
Psicoticamente, Blodeuwedd.



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