“E eu só tenho a dizer, a vista parece boa daqui. Tudo parece legal nesta época do ano e mesmo que o futuro seja obscuro, eu poderia simplesmente ficar por um tempo.” The View, Christa Black.

Eu observava a cada detalhe das ruas e das pessoas que passavam ali. O céu nublado, as calçadas cobertas de folhas alaranjadas e marrons, as casas que seguiam um padrão. Kathy sorria abertamente. Ela é linda. Possui cabelos castanho-claros que batiam em seus ombros e são extremamente lisos, a pele tão branca quanto a minha e olhos azuis como os de minha mãe. Eu não a via desde os meus sete anos quando ela nos visitou no Brasil. Eu me sentia feliz por estar na Inglaterra, tinha certeza de que tudo daria certo, de que eu teria as melhores férias na casa da tia Kathy e depois teria o melhor ano escolar em Londres, mas apesar de estar com minha tia, eu mal a conhecia. Sabia coisas básicas como ela ser divorciada, ter crescido em Holmes Chapel, tinha uma filha adorável de sete anos. Eu estava ansiosa e descontava o nervosismo nas minhas cutículas.

– Você esta animada para estudar em Londres?

– Estou com medo, você sabe, de não entender o que o professor de historia falar. – ela deu um risinho.

– Você vai se sair bem, seu inglês é ótimo.

– Obrigada.

– Então me conte. – ela olhava fixamente para a estrada – É tipo um internato? Aqui na Inglaterra têm muito desse tipo, alguns até só para meninas.

– Não sei bem se é um internato porque você não fica preso na escola vinte e quatro horas por dia. São vários prédios aonde os alunos podem fazer de moradia e fica próximo ao prédio principal do colégio. Nem tudo mundo mora lá porque não é obrigado, sabe? Geralmente fica quem mora longe ou alguns intercambistas. Foi isso que me informaram pelo telefone.

– Sei. Você vai fazer compras quando chegar lá? Você podia pedir ajuda a Gemma, ela iria adorar ir com você a Londres e te ajudar a comprar coisas para decoração.

– Quem é Gemma?

– Ah. Ela é nossa vizinha. Não tem a mesma idade que você, é um pouco mais velha, mas é um amor. Ela esta super animada para te conhecer. – ok, ninguém no mundo fica animado de me conhecer, Gemma vai ficar animada até me conhecer e até descobrir que sou uma anti-social sedentária.

– Legal. – sorri.

– Chegamos. – ela deu um pulinho no banco.

Holmes Chapel era calma. Poucas pessoas andavam pelas ruas. O céu estava em tons de cinza e branco devido às nuvens e o asfalto pouco molhado denunciava que havia acabado de garoar. Havia árvores bem aparadas, jardins floridos, calçadas limpas e casas de tijolos que pareciam ter acabado de sair de um livro de contos. E era exatamente assim a casa de Katherine. As paredes eram de tijolos, um jardim com arbustos floridos, portão da garagem em uma cor verde escura, grandes janelas de vidro e uma porta branca. Era aconchegante, me dava vontade de entrar ali e tomar leite quente e eu nem ao menos sabia o porquê. Ela estacionou o carro do lado de fora da garagem e saiu saltitando. Ela era tão baixa quanto eu, parecia uma fada ou algo do tipo, não aparentava ter seus trinta e seis anos. Pisei fora do carro e congelei instantaneamente. Meu sangue aglutinava dentro de minhas veias, meu corpo havia sofrido um choque térmico. Minhas pernas começaram a tremer e meus dedos pareciam ter congelados impossibilitando movimento. Kathy já havia chegado à porta e procurava a chave correta para abri-la. “Vamos, Lucy. Nem esta tão frio assim”, pensava. Meus pés simplesmente não obedeciam às coordenadas de meu cérebro. Um passo de cada vez. De vagar entrei na casa logo atrás de minha tia.

– Você pegou um dia frio em Holmes Chapel.

– Mal posso esperar a neve. – disse sorrindo ao máximo. Seria minha primeira vez em uma nevasca e esperava que isso acontecesse logo – O mais frio que peguei no rio foram dezesseis graus.

– Nós temos dias quentes aqui também. A sorveteria e o parque ficam cheios. – ela tirou seu casaco do corpo e pendurou em um dos ganchos atrás da porta – Gemma? Bettie? – gritou.

Enfiei minhas mãos no bolso traseiro da minha calça jeans a fim de esquentá-las. Logo ouvi passos correndo sobre minha cabeça e risadas vieram em seguida. Bettie apareceu sorridente. Ela tinha cabelos avermelhados longos com ondas nas pontas, sua pele era ainda mais branca que a minha, seus olhos eram grandes e azuis e a boca rosada devido ao frio. Ela correu até Kathy, que a pegou no colo.

– Bettie, essa é a Lucy, sua prima.

– Oi, Lucy. – ela acenou e desceu dos braços de sua mãe.

– Oi. Como você esta? – me abaixei ficando na sua altura.

– Estou bem. Gemma pintou minhas unhas. – ela esticou suas mãos em minha direção me mostrando as pequenas unhas pintadas de rosa cintilante.

– Que cor bonita. – ela sorriu e colocou seu cabelo atrás da orelha – Eu trouxe um presente para você do Brasil, mas não sei se vai gostar. Posso te dar depois do jantar? – ela assentiu e eu me levantei novamente.

– Então você é a famosa Lucy? – disse à menina que acabava de descer as escadas, ela tinha cabelos negros que batiam pouco abaixo dos ombros, pele clara típica, olhos redondos e grandes, sobrancelhas bem marcadas e seus lábios formavam um sorriso deixando sua bochecha marcada por uma covinha de dar inveja. Simplesmente linda. – Sou Gemma. – ela me puxou para um abraço.

– É um prazer, Gemma. – tentei dar meu sorriso mais simpático.

– Quando Kathy me contou que sua sobrinha iria passar um tempo em Holmes Chapel eu fiquei bastante animada. Mais uma menina para o grupo. Você vai amar Cheshire.

– Tenho certeza que sim.