Já chorei mais nesses cinco dias do que nos últimos cinco anos. Com os altos e baixos que constam no histórico, vejo que acumulei uma pilha de lições e um vazio imenso que não sei como será preenchido. E conheço boa parte desse vácuo, o mesmo que eu sentia antes de ser envolvida pelos braços e lábios de Ângelo. Antes dele, meu coração era como um cais de porto permanentemente aberto à visitações, esperando alguém lhe servir de navio, fazendo as manobras corretas para atracar, lançar âncoras ao mar e amarras bem firmes, ocupando de vez a vaga.

Bobo que é, o tal do coração sempre se esquece de que a maré sobe e os portos podem ser varridos por furacões. Alguns nem vemos se aproximar, mas outros são facilmente perceptíveis pelas nuvens carregadas, que decidimos acreditar que algum vento vá levá-las para longe.

Comodidade tem um preço alto.

E agora o vazio é ainda maior, pois por muito tempo Ângelo é que tornou meu cais completo e belo. Agora, restou a devastação.

Dizem que isso vai passar, mas ainda olho em torno e só vejo nuvens negras. O vento está diminuindo, mas nenhum sol à vista.

E só Deus sabe que eu posso conseguir o que eu tanto quero — ainda que eu não saiba dizer exatamente o que é. Mas é hora de varrer o cais, ir ao farol e trocar a lâmpada, jogar alguma luz no horizonte.

Sempre pode haver algum navio perdido perto da costa. Mesmo que eu nunca tenha certeza se será finalmente a embarcação correta, não quero limo em meu cais.