Acesso Restrito escrita por Charlotte Fuller


Capítulo 5
Capítulo 5




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Cinco

Você tem ideia de quantos casos de suspeitos presos, sem realmente ter culpa pelo que são acusados existem? Eu tenho, e se você quer saber, eles passam boa parte da vida na cadeia até que prove sua inocência. Por fim não havia dedurado Megan como tinha prometido, porque ao contrário do que imaginava eu não era do tipo que jogava a culpa nos outros. Você pode dizer que sou covarde, por fugir do que parece ser uma tremenda bobagem. Mas vou te perguntar: como eu provaria não ter extraído informações ultra-secretas? Eu não tinha. E sim eu via televisão para saber que hacker de celebridades, desses que roubam as fotos e espalham pela rede, ficavam um bom tempo na prisão. E o que eu esperaria do FBI? Eu não pretendia descobrir.

       Corri, corri com toda a força que consegui retirar dos meus músculos inferiores e dos pulmões. As casas — como na minha rua — possuíam uma simetria similar, embora suas cores fossem as mais distintas possíveis, talvez para manterem sua autenticidade. Mas o problema foi parar na ponta da rua, ao lado da esquina, e sentir que como se os órgãos estivessem em falência. Respirar foi árduo, que pude apostar mais cinco minutos daquele jeito e estaria dura no chão. Eu sabia que lugar era aquele, sabia, também, a quem pertencia à casa azul celeste escandalosa a todo resto. Então eu caminhei meio mancado, meio correndo, no fim uma coisa estranha. Mas não parei em frente à porta como uma pessoa normal. Eu contornei pela direita o imóvel, ficando de frente a uma sacada, onde o quarto estava com a luz acessa. É claro que Megan estaria acordada, estava na hora daqueles reality shows estranhos sobre vestidos de noivas e de pessoas acima do peso. Ela dizia que engordaria só para participar, só para mostrar sua dedicação e influenciar as outras pessoas.

       Felizmente aquele tipo de atitude era muito mais comum do que você imagina. Digo, se esgueirar pelas janelas como gatunos ou amantes apaixonados. O que não vinha a ser nenhum dos dois. Todos sabiam o que fazíamos, não era nenhum segredo para o universo. Embora, hoje, seu motivo relacionasse a descrição.

     Eu estava certa sobre seu entretenimento. Megan assistia, coberta por uma camada de farelo e papeis, a mulher experimentar seu quinto vestido (dizia o locutor) e reclamar sobre a postura da sua prima em relação as escolhas. Como ela pode gostar disso? É um tremendo barato, ela argumentaria ao seu favor.

     — ...Joyce e Carmen parecem não concordar nas escolhas.  — escutei o locutor, quando me aproximei da porta da varanda. — ...”ela está fazendo minhas escolhas, como se fossem para seu próprio casamento.”

     Empurrei a porta de correr, entrando no seu quarto. Megan desviou sua atenção do bate-boca familiar para olhar na minha direção.

     — Você precisa ver isso. Carmem é uma vaca. Total!

     Eu disse que essas visitas já eram costumeiras. Mas Megan precisou voltar seus olhos na minha direção e dizer:

     — Meu Deus! Onde você estava? Concorrendo a uma maratona?

     Ah é! Agora percebi, minha respiração saia num jorro barulhento e bufante.

     — Eles estão aqui, na minha casa, interrogando minha mãe. Não estão de brincadeira, Megan, eu vi. Tinham carros na rua esperando. — atropelei as palavras, aninhando na sua cama.

     — Uhum, entendo. — ela murmurava vendo, agora, o noivo entrar na confusão. — Conversa com eles, uma boa conversa resolve tudo.

   O quê?

   — Conversar? Você ouviu o que eu disse? Ele entrou na minha casa, ficou mostrando sua autoridade e começou a falar sobre tudo. Tudo! Eu corri, mas vi quando entraram no meu quarto feito um bando de rinocerontes. — Megan não descolava os olhos da televisão no seu clímax. — O FBI, o FBI ta na minha casa.

   Ela piscou algumas vezes.

   — Ainda com isso? Eles não vão para sua casa, nós saímos de lá mais rápido que o tempo de um raio atingir o solo. — disse ela.

   — Eles não vão. Já estão! To tão ferrada, mas tão... — comecei a ziguezaguear pelo seu quarto. — O que eu faço? O que eu faço?

   Megan pulou com a agilidade de um gato, esparramando toda aquela sujeira pelo seu carpete. Ela caminhou o pouco espaço que nos separava numa passada. Aquilo foi assustador, acredite, ela era ainda menor do que eu.

   — O que disse? Como assim? Me explica isso daí, acho que ouvi mal. Eles estão na sua casa?

   Concordei frenética.

   — E sabem que foi você que invadiu? Digo, nós. — ela consertou quando viu minha careta.

   — Não sei. Eu atendi a porta e tudo aconteceu rápido demais. Escuta, entrei em pânico. Minha mãe ficava falando sobre contas, prazos e Matt sobre ordem judicial, CSI. Ai subi, porque todo o bolinho primavera borbulhou no meu estômago e foi ai que eu vi, os carros.

   — Que carros? Vans pretas? — ela se apressou a acrescentar.

   — Não, comuns com o vidro escuro. Mas eu sei que não fazem parte da vizinhança. Eram eles!

   — Você acha que eles irão te prender? Digo, nós? Ai, puta que pariu, eles te seguiram até aqui? Minha mãe vai pirar.

   — Eles não me seguiram! Não sou tão burra. Eles nem sabem sobre você, mas eu não sei o que estão fazendo com minha mãe.

  Poxa! Fique claro aqui, Megan nunca retribuiu o que fiz por ela. Não que eu esperasse uma recompensa, mas veja livrei sua bunda de uma bela enrascada.

   — Eu não acreditei, eu não, eu não... Pensei que seria dessa forma. Eles não tem caras perigosos para prender? Não é como se guardassem o segredo do mundo, ou que o presidente mata cachorrinhos indefesos como hobby no site.

   Me olhou aflita e disse: — Eles não têm, né?

   — Ah não sei! Você quer entrar mais uma vez para ter certeza? Por que ai, quem sabe, podemos ser presas por ter feito uma coisa que realmente fizemos?

   — Vão nos prender? — ela gritou. — Porra! Vou aparecer nos jovens fora da lei? Assim não vou para nenhuma faculdade.

   — Megan, espera ai, eles nem sabe sobre você, eu não disse nada.

   Ela se encolheu. — Mas obviamente eu tenho culpa. Uma grande culpa no cartório. Preciso fazer alguma coisa, vou até lá e digo que sou culpada.

   — Certo, então somos duas culpadas. Duas para ser julgada, duas para se ferrar. Não acho muito esperto.

   — E você achou esperto fugir?

   Tremenda sacanagem. Eu havia fugido para avisá-la e agora me chama, na cara de pau, de idiota? Nada legal. Ofendi-me, não vou negar, estava sendo a amiga do ano. Valia receber um elogio.

   Ela interpretou meu descontentamento. — Me desculpa. Mas fugi não mostra resultado. O primeiro lugar que eles vão procurar vai ser minha casa. Talvez, quem sabe, eles só queiram conversar?

   — E pra quê os carros? Para uma comemoração após minha confissão? Para se juntarem num bar depois e dizer coisas do tipo: “Cara, você viu ? A pirralha se borrou de medo.” “Nós a demos um tremendo susto, nunca mais vai se meter com a gente.” Acho que não.

  — Então negue, diga que nunca mexeu com algum programa hacker e quem nem sabe a diferença de um megabyte para o gigabyte.

  — Megan, eles chegaram até minha casa, como e com quê eu vou desmentir isso?   

  Ela ficou em silêncio e eu aproveitei para emendar a minha ideia. — Vou fugir!

  — Você já fugiu. — ela respondeu em tom óbvio.

  — Para outra cidade. Ai eu ganho tempo para uma desculpa, ou seja lá o que conseguir.

  Megan me balançou pelos ombros.

  — Se você fugir, vai dar a razão. Ninguém foge sem ter culpa no cartório. E pra onde vai? Você não conhece ninguém.

  — Não sei. Não sei de nada, Megan. Ainda tenho dúvidas de que curso vou fazer na faculdade. O que você esperava? Onde, na minha remota consciência, eu iria esperar que um dia, não mais que de repente, teria que escolher entre ficar e dizer tudo pro FBI ou simplesmente fugir?

  Ela não falou nada. Mas não porque viu que meu ponto de vista estava certo. Oh não!  Já era de se imaginar o estado de loucura que minha amiga alcançaria, depois de descobrir que todas as minhas suspeitas comprovaram serem bem fundadas. Megan nunca foi o exemplo de bom comportamento em relação a situações criticas. Geralmente, ela jogava quase tudo sobre mim, mesmo que inconsciente, escapando pela tangente com promessas de fazer mais na próxima vez. Só que tudo se comprovava vazio, porque se ela caia na mesma cilada, onde precisava de decisões rápidas, travava como um jegue — ou seja lá o animal que estaca contra as ordens do dono. Eu voltei a falar, quando suas fungadas ficaram altas demais. Naquele especifico momento não foi diferente.

  — Acho que minha pressão está baixa. — ela esbaforiu sentando no sofá e enfiando a cabeça entre as pernas. — Vou vomitar.

  — Não vai não. Olha aqui Megan. Pra mim! — ela agora fazia um tipo de exercício de respiração para grávidas. — Pelo amor de Deus chega desse estilo cachorrinho! Olha aqui, preciso que você fique calma. Se não como vamos pensar numa saída? Duas cabeças, duas cabeças pensa melhor do que uma.

  — Sim elas pensam. — olhou na minha direção voltando a respirar normalmente. Embora, no fundo, eu soubesse que ela gritava.

  — Isso, muito melhor. Agora entenda, para eles Megan não existe, no pior dos casos você é só a amiga da meliante que não sabe nada sobre o ocorrido. Está me entendo?

  Megan balançou a cabeça como aqueles cachorros de carro: — É eu não sei.

  — Então, quando eles vierem fazer qualquer tipo de pergunta tenha uma reação de surpresa e diga que nem imaginava. Melhor! Diga que não tem conversado muito comigo, porque brigamos.

  — Brigamos? — perguntou confusa.

  — Ah sim uma briga feia! Sobre, sobre...algum trabalho do colégio em dupla.

  — Mas nós nunca discordamos. Somos a dupla perfeita, porque não disputamos, apenas juntamos as ideias.

  — É eu sei caramba, mas eles não. Eles não nos conhecem.

  Convencer Megan foi muito mais difícil do que imaginei. Grande parte pelo fato de sua má postura em questões complicadas e rápidas. Mas no final ela acabou cedendo. Tudo bem, eu tinha conseguido ajeitar uma parte daquela confusão, exceto pela parte que ao arrumá-la me colocava numa situação feia. Não descreva minhas decisões como a forte queda pelo heroísmo, comuns em grande parte das ficções, porque no fundo eu queria me esconder debaixo da cama. De preferência com um cobertor quente ao qual resignaria um nome fofo e infantil. Era tudo que eu pedia. Entretanto, a melhor hipótese foi deixar sua casa numa jornada sem rumo. Eu andei grande parte das ruas domiciliares para me aproximar das avenidas abarrotadas de lojas comerciais, além de ser o ponto de partida para fora de Niceville.

     A minha esquerda havia um daqueles largos becos, que cortam uma parte do quarteirão levando-nos até a movimentada avenida. Passei pelo corta caminho, contemplando uma via de trafego rápido. Se você tem interesse, andei o mais rápido que conseguia para a cabine telefônica. Isso ai, eu estava em fuga há alguns minutos, quem sabe hora, e já estava ligando para casa. Julgue se quiser, não ligo.

      Meu ideial ter uma suposta resposta do destino. Você sabe, se eu estava agindo por puro instinto e voltar para casa fosse a melhor solução. Não demorou dois toques, minha mãe atendeu no seu tom ensandecido. O mesmo que ela fazia quando nossos parentes vinham nos visitar e tinha que fazer sua própria comida.

              — Sophie é você? — ela arquejou. — Onde você está?

              Então eu fiz a coisa mais idiota para se dizer a uma mãe desesperada.

              — Hm... E ai mãe? Não se preocupe só estou dando uma volta. Você entende, respirando.

              — Dando uma volta? Que tipo de definição sua cabeça desmiolada tem sobre os acontecimentos? Tem um monte de homens do FBI me acusando sobre invasão e roubo ilegal de informações de acesso restrito do governo. E de repente, eles invadem minha casa, sem nenhum pedido educado, entram nos nossos quartos e começam a gritar dizendo que tem uma fugitiva. Sabe o quase infarto que eu tive quando descobri que eles falavam sobre você? Eles quebraram minha coleção de pequenas causas.

              Mamãe choramingou e eu decidi não me sentir ofendida por citar suas bugigangas com tanto amor.

               — Ah isso. Olha, isso é complicado.

               — Complicado? — mamãe rebateu. — Detenção é complicado Sophie. O que você fez, se você fez mesmo, é crime. Me diga está tentando me culpar por alguma coisa?

               — Não... O quê? Culpar? Qual é mãe, sabe tudo não precisa ser definido com uma única explicação. Quer saber, eu te ligo mais tarde, essa linha ta grampeada.

               — Grampeada? Oh Meu Deus! —ela arfou. — Veja, já está falando como uma criminosa. O que você fez? Nós podemos conversar com eles e chegar num acordo.

                Acordo? Mamãe não via filmes de ação. Não! Ela era defensora da abolição de filmes violentos. Agora já sabe o motivo por tanto escândalo quando sou mandada para detenção. Eles não negociam, questionar talvez. Mas não deixariam uma adolescente, que por sinal pode estar mentindo pela sua natureza, com informações existenciais. No mínimo fariam uma lavagem cerebral.

                — Sophie Francinara, Agente David Collins. — a voz estrondosa substitui a esganiçada da minha mãe. — Por favor, volte para sua casa. Vamos conversar, não há nada para temer. Só precisamos de respostas.

                É claro que eu fiz uma careta a uma mentira tão descarada.

                — Pra vocês decidirem essas respostas como insuficientes? Acho que não.

                — Eu não sei o que te preocupa, mas isso é só uma medida. Não haverá julgamentos, apenas perguntas. — Liam-Neeson-da-vida-real falou de forma lenta.

                — Hey, cara — comecei, podendo ouvir a voz histérica da minha mãe de fundo. — Você está me rastreando. E eu não gosto de dissimulados.

                Não sei de onde tirei tanta coragem, mas ela saiu. Simples assim. Eu acabava de chamar um agente do governo de mentiroso na maior cara dura. Certo Sophie como você é inteligente, vai lá, joga bosta no ventilador. Quem liga? Obviamente eu mesma que passaria de hacker idiota para uma criminosa fugitiva.  Desliguei o telefone olhando perdida para a avenida. Eu sabia que tinha três motivos para não acreditar no FBI:


3º) Eles nunca agem como prometem. Quer dizer, na primeira oportunidade me algemariam e prenderiam numa sala de interrogatório.

2º) Prioridades. Bem, eles têm muitas e eu seria a última.

              E o principal motivo para não acreditar nos caras do FBI, mesmo que eles me pedissem na sua voz mais agradável e afirmassem que nada iria acontecer...


1º) Inexoravelmente, irrevogavelmente, idiotamente eu havia invadido seu sistema e para isso não havia desculpas.

     Se eu, em algum momento, esperava uma resposta do destino... Imagine, acabava de recebê-la. Embrulhada para viagem, nesse caso.





  Deixa eu te contar uma coisa sobre cidades pequenas, caso você more em metrópoles e não faça ideia de como funciona essas áreas: as pessoas são prestativas. Isso mesmo. Se de alguma forma elas podem te ajudar, bem, elas fazem. Fácil assim. Então pense na imagem: garota pequena, sozinha, com uma mochila e um casaco três vezes acima do seu número. Pedir carona foi, como diz minha mãe, mamão com açúcar.

          A van igual às usadas para excursões parou no acostamento e logo o vidro do motorista foi abaixando mostrando a imagem de um senhor sorridente.

          — Hey, querida. — a mulher, dez anos mais nova que o motorista, debruçou sobre o homem de forma que pudesse me ver. — Está precisando de uma carona?

          — Hm... Isso ai.

          Ela sorriu e olhou para os fundos do automóvel.

          — Pablo largue seu irmão e abra essa porta. — a morena gritou.

          Escutei alguns muxoxos e o clique da trava. A porta correu para a direita e eu quase morri de susto. Acomodados nos bancos estava uma grande quantidade de adolescentes, muitos para serem filhos dos mesmos pais se me permite uma observação.  A mulher percebeu minha hesitação, afirmando espontaneamente.

          — Entre querida. — então olhou para a pequena população e soltou. — Sentem como gente e dêem espaço para a menina. Pablo nem pense nisso ou não respondo pelos meus atos!

         Pablo parecia ser o moreno, aparentando ter 15 anos, que estava pronto para estapear o menor sentado na sua frente. Ele olhou para mulher como se tivesse medo, guardando suas mãos no colo junto à brincadeira que pretendia realizar. Os menores na fila da frente começaram a pular os assentos até que o primeiro depois da porta se viu livre. Eu entrei ainda assustada, quer dizer, se apenas Matthew era capaz de tirar minha pouca privacidade imagine se todos ali fossem realmente irmãos. Um pesadelo, eu acharia. Pablo empurrou a porta, fechando e fazendo-se ouvir o clique da trava. A mulher olhou na minha direção, seus dentes estupidamente brancos a mostra e disse com empolgação.

          — Rosário De La Cruz — passou sua mão por cima do estofado na minha direção.

           Eu a peguei ainda abobada e apertei.

           — Sophie. — ela me olhou com as escuras íris. — Só Sophie.

           — Certo Sophie só Sophie. Está tudo bem? Tem algum lugar especifico para ir?

           A menina de cabelos pretos e marias-chiquinhas me encarou. Sorri, mas ela não parecia o tipo de criança gentil com estranhos. Eu era uma criança gentil com estranhos. Aquilo foi esquisito.

           — Nada especifico. — juro que rezei para não acharem à afirmação suspeita. — Vocês são de Niceville?

           Quer uma dica? Mude de assunto, sempre mude. As pessoas tem tendência a gostar de falar sobre si mesmas. Eu sei egocentrismo, mas olha são humanos. Rosário, como não podia ser diferente, nem ao menos percebeu meu contorno de fuga.

            — Não mesmo! Somos de Chihuahua, México. — ela divagou sobre as características da sua origem.  — ... Então resolvemos conhecer todos os pontos turísticos dos Estados Unidos.

             Eu quis perguntar o que ela fazia em Niceville sendo que poderia ir para Disney. Com aquele tanto de crianças seria a minha primeira opção de parada, mas isso seria grosseiro demais.

           — Agora estamos indo para a Geórgia. — Rosário completou.

           — Vamos ver, tipo, a sede da coca-cola. — a jovem com seus 13 anos, disse logo atrás de mim. — Você sabe se eles distribuem algum tipo de brinde?

           Virei meu rosto na sua direção. Ela tinha olhos claros e cabelos quase loiros, distinta da maioria ali. Pensei que com todas as atrações mais interessantes como o maior aquário do mundo ou até o memorial de Martin Luther King, a sede da Coca-cola era uma das ultimas visitas que faria. Porém, eu nunca havia deixado Niceville de maneira que não tinha muito que falar. Nada além do meu gosto por história. Como disse, podem julgar a vontade. Foi impossível responder; primeiro eu preferia pepsi, segundo não sabia nada mesmo. A loira que descobri chamar Helena não ficou muito feliz.

            — Podemos deixá-la próximo ao seu destino. É só falar. — Rosário estava debruçada.

            — Geórgia está ótimo pra mim. — eu disse.

            — Você é um tipo de andarilha ou algo assim? — Pablo se esticou dos fundos para perguntar.

            — Pablo! — Rosário chamou sua atenção mais uma vez. De um jeito Pablo era parecido comigo. Quer dizer, seu nome era proferido mais do que as filiais do McDonald’s na estrada.

            — Algo assim. — respondi.

            — Mas onde estão seus pais? Eles não acham ruim? — A maria-chiquinha se pronunciou.

            Esperei Rosário chamar a atenção da maria-chiquinha, mas infelizmente ela também ficou interessada na resposta.  Oh eu estava ferrada! Turistas de forma alguma querem se envolver com o FBI. E saber que minha mãe estava desesperada em casa a minha espera, Rosário é mãe ela não irá gostar nadinha disso.

            — Estou procurando meu pai. — respondi com uma meia verdade.

            Todos ficaram piscando suas longas pestanas na minha direção, características da família ao que parecia. Maria-chiquinha parecia satisfeita, ficando quieta do meu lado, Pablo não mexia mais com seu irmão mais novo e Rosário estava com os olhos marejados. O que eu não gostei nem um pouco.

            — Você sabe onde ele está Sophie? — Não vou negar que quase engasguei com minha saliva, quando o senhor De La Cruz (ou que imaginei ser o homem da família) se pronunciou pela primeira vez. Sua voz carregada com o sotaque latino.

            — Não senhor.

            — Então como pretende achá-lo? Tem alguma evidência de que ele está agora no estado da Geórgia ou é apenas um chute?


           Bem se um mais um são dois, meu pai tinha que está em algum lugar do país. Certo? Você não joga batalha naval eliminando as áreas onde os navios possam estar? Eu poderia fazer o mesmo com os estados. Tudo bem que o jogo era nada perto do gigante território americano, mas nem era isso que eu pensava em fazer. Não até aquele momento. Porque pensar no meu pai acendeu a ideia de que ele poderia me ajudar. Como? Não fazia a menor ideia, mas ele e eu sempre tivemos essa ligação diferente. Foi por isso que mamãe preferia, de certo modo, Matthew. Os dois haviam implantado sentimentos obscuros em relação ao meu pai e de como ele era um canalha por nos abandonar sem muitas explicações. Eu, ao contrário, apenas acreditava que devia ter um mistério envolvendo seu sumiço. O meu pai, o homem que conheci até meus oito anos, nunca foi o exemplo de um covarde. Não a pessoa covarde e mesquinha que eu estava sendo fugindo dos meus problemas. Ele sempre foi melhor.


          — Eu segui algumas pistas. — menti. — Elas me levam para uma cidade no leste da Geórgia.

          O homem olhou pelo retrovisor.

          — E acha que essa seria uma boa ideia? — perguntou.

          Minha boca abriu algumas vezes sem emitir som nenhum.

          — O importante não é isso.  O principal é sua mãe está de acordo? — Rosário tinha recuperado sua fala.

          Que tipo de mãe concorda que a filha vá ver o pai que a abandonou? Minha mãe, pelo menos, nunca seria uma dessa. Mas partindo do principio que somos desconhecidos mais mentiras não causariam nenhum dano.

           — Não é como se achasse a melhor ideia do mundo, mas ela não pode fazer nada. Ele é meu pai, eu tenho direito e tudo ficaria nesse impasse se ela não fosse sensata. — argumentei.

           A mulher me olhou por alguns segundos.

           — Bem, ela certamente aceitou por você. — concluiu.

           — O importante é que tenho seu consentimento. — esclareci, mais uma vez, tentando parecer politicamente correta as suas vista.

           Mas minha lógica foi para o ralo, quando o homem da família veio com seu pensamento mais do que correto.

           — E por que estaria na estrada pedindo carona? Seria mais sensato pegar um ônibus. Não somos de qualquer forma, mas andar em carro de estranhos me parece muito arriscado. Sua mãe não pensou nisso?

           — Claro que pensou. — soltei uma das minhas risadas anasaladas, daquelas que você faz quando está mentindo descaradamente.

           — E mesmo assim ela deixou?

           Ah qual é cara! Eu não podia pegar uma daquelas caronas em que ninguém questiona nada? Olhei para o retrovisor, quase contorcendo o rosto em desgosto, mas me segurei para responder a primeira coisa que veio em mente.

           — Ela é uma hippie. Não pensa como a maioria, você entende, pra ela, entrar em carros de completos estranhos é como uma jornada para a descoberta da essência dos humanos. Comunicação, compartilhamento, tudo parte do pacote humanidade.

           O casal se entreolhou, rindo depois de segundos. Eu não fazia ideia de como era a vida no México, mas, aparentemente, hippies pareciam ser algo incomum. Porque, levando em conta a maior bobagem que soltei, acredite possuo um armário abarrotado delas, não consideraram a hipótese de me tirar do carro. O que era bom, eu acreditava.



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