Kuroi Torikago escrita por MayonakaTV


Capítulo 1
I- Seed


Notas iniciais do capítulo

Título do capítulo: Seed, Janne da Arc. Não que haja alguma relação com a letra da música.



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Mesmo que seu equilíbrio sobre o par de plataformas fosse perfeito, a corrida não lhe valera de nada. Apoiou-se no batente da porta, encarando frustrado a janela descuidadamente esquecida aberta. Havia chegado tarde demais.


Os pássaros ao seu redor agitavam-se dentro das gaiolas, bicando as grades e, no furioso bater de suas asas, levavam penas, sementes e água ao chão. Caída de qualquer jeito junto à porta, próxima a algumas penas de um belíssimo azul oceano, estava a enorme gaiola negra que o homem mantinha há anos como sua maior preciosidade. A portinhola aberta ainda balançava, seu rangido antigo misturava-se aos grasnados de protesto das aves encarceradas. Mana abaixou-se com certo pesar, recolhendo a gaiola e devolvendo-a ao balcão de onde caíra. Aproximou o rosto da portinhola, verificando suas dobradiças e recolocando em seu lugar o fecho improvisado. Cerrou-a e observou o fecho se abrindo sozinho, a ave devia tê-lo bicado até que se quebrasse. “Maldição”, pensou. Era o sexto pássaro raro que perdia no curto período de um mês e meio, pelo mesmo motivo.


Suspirou pesadamente. Aquela gaiola era uma verdadeira antiguidade, de um modelo único e não mais fabricado. Mana a havia conseguido em uma de suas raríssimas viagens ao exterior. Passava perante um antiquário quando a viu sendo jogada fora e, como se fosse um sinal divino, algo em seu coração lhe disse que aquela gaiola deveria ser sua. O dono do lugar lhe disse que era inútil, uma vez que era de um modelo possível de ser trancado, mas nem mesmo ele conseguira encontrar a chave pertencente àquela gaiola. De qualquer maneira, Mana precisava daquilo e tanto insistiu que o velho, contente por livrar-se da peça que não lhe traria lucro algum, deu-a de bom grado a Mana. Por anos de sua vida, o excêntrico amante de pássaros se dedicou a encontrar a chave que trancasse a preciosa gaiola negra, mas nem mesmo sua considerável fortuna o ajudara em sua missão.


O olhar percorreu a sala ampla, passeando pelas inúmeras gaiolas menores ali guardadas antes de novamente pousar-se na gaiola mestra sobre o balcão. Não havia jeito. Se dependesse dela, continuaria perdendo espécimes que demorava semanas para capturar. Tirando um lenço do bolso traseiro, pôs-se a limpar a peça com esmero e, tendo terminado, carregou-a para fora dali sob os trinados incessantes de seus amigos alados.


– Calados – Ordenou ele aos pássaros, que o ignoraram totalmente.


Optou por guardar a gaiola em uma sala que utilizava apenas para aquele fim. Vendê-la estava fora de cogitação, seria como vender sua alma. Não sabia qual o encanto que aquela pequena prisão exercia sobre ele, porém, não tinha a menor vontade de resistir. Acontecesse o que acontecesse, ele jamais se desfaria de sua jóia.


A campainha tocou. Mana consultou o relógio no pulso direito, não esperava visitas. Há tempos não chamava ninguém à sua casa e não via motivos para que alguém o procurasse.


– Quem será a esta hora da manhã?


Irritado, levando nos braços a velha gaiola, atravessou o hall e abriu a porta. Um rapaz alto de cabelos à altura dos ombros o aguardava, trajando o uniforme da polícia local.


– Pois não, Sakurai? – Disse ele ao reconhecer a figura perante si.


– Perdão por incomodá-lo, Mana-san – Desculpou-se o policial, apresentando o distintivo. – Mas venho lhe trazer uma notícia desagradável.


Mana assentiu.


– Seja breve.


– Seu irmão Asagi está morto.


Morto? – Repetiu Mana com certa descrença, arqueando a sobrancelha direita.


– Passeava com o filho quando foi atropelado por um motorista alcoolizado que dirigia em alta velocidade. A criança sofreu apenas alguns arranhões, mas já foi atendida pelos paramédicos e passa bem.


“A criança passa bem”... A expressão do estudioso se contorceu em desagrado. Sua relação com o irmão caçula nunca fora das melhores e, depois do nascimento do sobrinho, tudo pareceu desandar. Sua antipatia pelo pequeno era quase tão grande quanto a que costumava sentir pelo agora falecido Asagi.


– Agradeço pelo aviso, Sakurai – Agradeceu em uma reverência curta, dificultada pela gaiola junto ao peito. – Irei me aprontar para providenciar os papéis do funeral.


– Não há de quê, Mana.


Após o policial despedir-se com um aceno breve, Mana fechou a porta atrás de si e retomou o caminho para o andar superior. A gaiola parecia no mínimo duas vezes mais pesada, como se todas as mágoas se abatessem sobre ela. Sabia que poucos dias após o enterro haveria a leitura do testamento. Não que estivesse interessado na pequena fortuna que o irmão possuía... O que o tirava do sério era uma segunda condição com a qual jamais concordara e agora, com a morte de Asagi, ele seria forçado a cumprir.


– Parece até que já sabia que ia morrer – Resmungou, meneando a cabeça em negação. – Plantou a semente da discórdia quando resolveu mudar aquela droga de testamento!


Adentrou a chamada sala de tesouros após destrancá-la com a chave que não guardava em outro lugar que não fosse o bolso interno do casaco. Depositou-a em um espaço vazio que parecia ter sido deixado ali especialmente para recebê-la e, após dar uma última olhada em sua posição entre tantas outras antiguidades de extremo valor sentimental, preparou-se para sair. Consultou novamente o relógio, devia se arrumar logo. Como o irmão mais velho e controlador dos gastos da família, teria muito a fazer ultimando os detalhes do enterro de Asagi.


Como havia dito antes, o irmão havia plantado a semente da discórdia, e ela havia escolhido um péssimo momento para germinar.


– Irresponsável... – Chutou a porta. – Maldito irresponsável!


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Notas finais do capítulo

Digno de algum review, nem que seja pra criticar? :/