Memórias escrita por Não sou eu


Capítulo 7
Luce




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 Depois de acordar e voltar para seu quarto, Luce decidira que iria a biblioteca, queria saber o motivo das sombras sobrevoarem aqueles livros. O primeiro que escolheu foi Anjos, por que caíram? Apesar de não estar nem um pouco a fim de lê-lo, pegou-o e levou para seu quarto. Depois de algum tempo folheando-o não achou nada que despertasse seu interesse, então o colocou de lado e saiu do quarto. Era domingo e como ninguém podia sair do colégio, todos estavam nos jardins e nos salões de jogos, então Luce achou que seria o melhor lugar para encontrar algum de seus amigos ou Daniel.

Quando entrou na sala de jogos, logo avistou Arya, sentada em um canto com algumas garotas. Ela não parecia ter notado Luce até o momento que ela chamou seu nome. Ela tinha uma expressão séria, o que fez Luce se sentir pior ainda.

— Posso conversar com você? — Quando percebeu que todos estavam interessados no assunto, acrescentou: — Em particular?

Arya levantou e seguiu para o corredor que levava aos jardins, com Luce logo atrás. Ela parou perto de uma grande arvore, sua expressão continuava séria e entediada.  

— Não estou entendendo o porquê de você estar brava comigo. É por causa do Marcus? — Luce sabia a resposta, agora ela entendia que Arya estava gostando dele, e não falara nada.

— Não é por causa dele, é por sua causa, pensei que fossemos amigas.

—E somos.

— Eu te perguntei se tinha acontecido algo entre vocês, mas você disse que não, mentiu para mim olhando nos meus olhos. — Sua voz se alterara, e Luce se mantinha controlada, ela não iria brigar.

— Eu não menti, aquele dia no meu quarto foi muito inesperado para mim, eu juro.

Arya encarou Luce por um minuto, parecia tentar decidir se ela estava falando a verdade. Parecia convencida, abraçando-a ela começou a rir.

— Eu sou uma tonta por brigar com você por isso. É talvez você tenha razão, eu fiquei com um pouco de ciúmes de vocês, mas juro que nunca mais vou fazer isso com você.

Luce agora se sentia melhor em relação a isso, por mais que tudo estivesse muito estranho na sua vida, era bom ter alguém normal e que faz coisas normais. Ela queria dizer a Arya tudo o que estava acontecendo, mas não podia. Não queria que ela se ferisse de alguma forma, por pior que fosse ela teria que fazer tudo sozinha.

Depois de algumas horas junto com Arya, Luce queria ficar um pouco sozinha e mesmo que tivesse ido até aquela cachoeira uma única vez, arriscou em ir até lá. Alguns minutos depois, achou que estava totalmente perdida, até encontrar uma arvore conhecida, o que a levou até a cachoeira. Quando chegou lá notou que Daniel estava lá. Estava sentado com os braços em volta das pernas, perdido em pensamentos. Sua expressão era triste, o que partiu o coração de Luce. Ela se aproximou e ele virou para encará-la, seus olhos brilhavam de certa forma que jamais havia visto.

— Pensei que não tinha ninguém aqui, desculpe. — Ela se virou para ir embora, esperando que ele pedisse para ela não ir, mas isso não aconteceu.

De repente Luce sentiu uma mão tampando sua boca, levou um susto e reprimiu um grito.

— Não grite, sou eu.

Daniel tirou a mão da sua boca e abaixou até a sua cintura. Luce estava assustada demais para ficar vermelha pelo toque dele.

— O que você pensa que está fazendo?

— Venha, vou tirar você daqui. — Aquilo não era um convite. Ele a pegara pelo braço e Luce quase tinha que correr para poder acompanhar seus passos. Quando já estavam nos terrenos da escola, ela se soltou e sentiu a raiva se apoderando dela.

— Você vai me explicar o que significou isso? Ou vai ser como sempre, vou ficar no escuro esperando que as respostas caíam do céu?

— Luce, você não entende... — Sua voz se perdeu, e ele olhou para o chão.

— Como vou entender alguma coisa, se tudo que você fala é como se fosse um enigma?

Luce estava gritando, mas ele não dizia nada, continuava com os olhos para o chão, parecia tentar achar as palavras certas. Ele cerrou os punhos, e antes que Luce previsse, ele segurava seu rosto fazendo com que ela olhasse bem nos seus olhos.

—Eu não vou te dizer nada e fique longe de mim. — Seus olhos brilhavam, e por mais que Luce quisesse que ele estivesse mentindo, sua voz parecia sincera demais. Ela queria protestar e falar que não queria isso, mas não havia nada que pudesse fazer, se ele não lhe dissesse o que estava acontecendo, iria descobrir sozinha, e pedindo que se afastasse, só servia para que lhe deixasse com um pressentimento ruim.

— Como quiser Daniel. — Suas mãos afrouxaram de seu rosto e ela seguiu o caminho para a escola. Não sabia exatamente o que estava sentindo, mas seu coração estava acelerado e doía. Ela tinha medo disso, nunca havia sentido nada assim e agora entendia o que queria dizer a expressão coração partido. Ele fora tão frio com ela, que a machucara, mas não podia perder tempo com isso, tinha que descobrir o que estava acontecendo.

Alguém chamou seu nome, se virou e viu que era Matt. Ele estava vindo na sua direção e Luce achou que seria a oportunidade para descobrir alguma coisa.

— Ei Luce, a bibliotecária disse que você está com um livro, e eu queria saber se você já terminou de ler ele, preciso fazer um trabalho de história.  — Luce se lembrou do livro do qual estava falando, e não achou nada anormal.

— Tudo bem, eu não terminei, mas posso te emprestar. Vou até me quarto buscar.

— Vou com você.

Quando chegaram lá, Luce procurou o livro e o entregou a Matt. Ele o pegou e o observou um minutos antes de guardá-lo na bolsa.

— Sabe, não estou nem um pouco a fim de ficar naquela biblioteca chata fazendo esse trabalho, que tal você me fazer companhia? — Era o convite que Luce estava esperando, assim podia conversar com ele sobre Jenna e o que significa aquele assunto.

—Eu topo.

Ele sorriu e foram para a biblioteca. Depois de se sentarem em um canto bem sossegado, Matt falou:

— Começou a ler esse livro? — Luce negou com a cabeça, ele continuou: — É uma história incrível, sabe, anjos. Alguns livros são um monte de mentiras, mas esse aqui é o meu favorito, ele quase consegue mostrar como aconteceu.

— E como você sabe como realmente aconteceu?

— Eu não sei, mas alguns livros têm tantas mentiras que você consegue identificar facilmente. Esse aqui não, já o li tantas vezes que perdi a conta e nunca me canso. Qualquer dia desses, você devia lê-lo, não vai se arrepender. — Ele voltou sua atenção para o livro, deixando Luce curiosa.

— Ei Matt, posso te fazer uma pergunta?

— Fala ai.

— Na outra noite, você separou a briga e depois eu segui vocês, mesmo que tenha sido errado, não consegui evitar. — Seus olhos estavam fixos nela, mas não demonstravam nenhum sinal de preocupação. — Ela é ex-namorada do Daniel, não é?

— Essa não é a pergunta que eu estava esperando, mas a resposta é mais ou menos. Eles tiveram um caso, que não significa mais nada para ele. Está com ciúmes Luce? — Ele gargalhou e Luce corou, desejando que não tivesse que chegar a esse ponto. Estava com medo de Matt dizer a Daniel que ela estivera fazendo perguntas a seu respeito, ele poderia pensar que ela estava perseguindo ele, mas isso não importava agora, nem tudo tinha a ver com ele.

— Não, não é por isso. É que estou tentando entender o motivo dela me odiar tanto. — Na verdade, estava com ciúmes sim, mas não iria admitir.

— Ela é assim mesmo, não ligue para isso. — Ele ficou distraído por alguns minutos, antes de falar. — Ela não consegue entender, porque ele não a quis.

— E você sabe qual o motivo?

— Sei sim, mas não é um que ele queira que eu compartilhe com qualquer um. — Entendeu que queria dizer, ele não iria compartilhar com ela.

— O que ela quis dizer com “espero que quando ela morrer, não volte nunca mais.”? Era sobre mim não era?

— Eu não me lembro dela ter dito isso, mas se disse não deve ser nada demais, quando ela está brava diz coisas sem sentido. — Sua atenção estava voltada para o livro, o que dava a impressão a Luce que ele poderia estar dizendo a verdade, sua calma era confortante e ela podia começar a pensar que poderia ter sido sua imaginação. Sim, estava certa agora, tinha imaginado isso.

— É, pode ser que eu tenha imaginado isso na hora da raiva, desculpe.

— Não tem problema Luce, eu te entendo. Ei fico feliz por ter vindo me acompanhar, você é bem legal.

Eles ficaram mais algum tempo na biblioteca até Matt dizer que iria para o refeitório. Luce não quis o acompanhar então ficou mais algum tempo perdida em pensamentos. O livro havia ficado com ela, pois ficou com uma pequena curiosidade sobre ele. Depois de ler as primeiras paginas, resolveu que continuaria de ler em seu quarto antes de dormir. No caminho para seu quarto, resolveu que iria visitar Jorge antes.

No momento em que foi bater na porta, ouviu um barulho dentro da pequena casa e resolveu esperar. Algumas vozes diferentes chegaram ao seu ouvido, e achou melhor dar uma olhada pela janela, para ter certeza que não teria problema em bater, para que não se metesse em nenhuma encrenca.

Apoiou-se na janela, que parecia ficar tão acima que Luce se esforçou para conseguir ter uma visão boa, assim se equilibrando ao máximo para que não caísse. A janela dava visão para a sala, onde duas pessoas estavam sentadas, ela reconheceu Jorge sentado de costas para ela, e o outro era o diretor da escola. Algo na conversa deles chamou sua atenção.

— Não acho que seria uma boa idéia ela ficar aqui por muito tempo, e também ter tanto contato com você. — O diretor estava diferente daquele que sempre estava bravo e passando sermões, ele estava calmo e tinha uma aparência bem mais velha, o que Luce nunca havia percebido.

— Ela não é uma má pessoa, e também não sabe de nada. Talvez pudesse ser melhor se ela soubesse a verdade. Sou só um homem velho, que não tinha nada, e essa menina trouxe algo para mim, ela me lembra muito minha falecida esposa. — A voz de Jorge era quase inaudível, parecia fraco demais para falar algo, havia sentimento em tudo o que falava.

— Sei que para o senhor, tudo isso parece uma grande besteira, e pode ser que nem ao menos acreditou em mim uma única palavra, mas escute, ela não é quem pensa que é. Ela não irá trazer nada de bom, eu sei. Já a conheci há muito tempo para saber disso.

— Aprecio muito que o senhor está tentando me dizer, mas nada muda o que acho dela. Desde o dia que a conheci no hospital, senti algo nela, contei coisas a ela que não tinha contado a ninguém, e ela me ouviu, não parecia com esses adolescentes que não ligam para nada, ela é diferente.

O diretor se levantou e foi até a porta, Jorge o seguiu abrindo a porta para ele.

— Espero que não se arrependa Jorge.

O diretor sorriu e saiu pelo caminho de volta á escola. Jorge ficou olhando para o jardim por um tempo, até que se virou e fechou a porta. Lá dentro Luce ouviu um resmungo e logo depois as luzes foram apagadas.

Só então percebeu que não estava respirando normalmente. Soltou o ar com alivio, mas com o coração aos pulos. Algo dizia que aquela conversa havia sido sobre ela, mas nada parecia se encaixar. Sua vida parecia ter mudado de um dia para o outro, tudo estava fora do normal. Não podia perguntar ao Jorge do que se tratava aquilo, ele não iria ser totalmente sincero, então agora havia mais coisas da qual ela tinha que descobrir.

No caminho para seu quarto, pensou em muitas coisas da quais não faziam sentido, e depois quando se sentia exausta, pensou em Daniel. Ele havia dito coisas que a machucara e isso era o que a deixava mais nervosa com tudo. Sentia-se tão vulnerável a ele, e isso teria que mudar, de agora em diante ela ergueria barreiras em volta de seu coração, quando o visse. Já em seu quarto, tomou um banho e deitou-se na cama. Pegou o livro que Matt recomendara e começou a ler, depois de algumas páginas decidiu que ele tinha razão, era um livro extremamente bom.

Acordou com um barulho, e percebeu que seu celular estava tocando. Meio sonolenta atendeu e ouviu uma voz familiar

— Filha, como você está? Estou morrendo de saudades.

— Mãe, oi, estou bem. O que aconteceu?

— Tenho uma ótima noticia, o diretor ligou para todos os responsáveis e disse que poderemos ir visitar vocês no próximo feriado. Não é ótimo? Um piquenique em família?

Luce soltou um pequeno gemido de decepção. Ela amava sua família, mas não conseguia pensar em um piquenique em família, não agora.

— Claro mãe, seria ótimo. Depois eu ligo para combinarmos.

Antes que ouvisse os protestos de sua mãe, ela desligou o celular e o jogou longe. Luce tentou voltar a dormi, mas não conseguiu. Depois de ter se arrumado desceu para o café da manhã, onde havia um murmúrio, que Luce deduziu que se tratava das boas novas. Arya e Marcus chegaram logo em seguida sentando-se na mesa de Luce, o que a deixou feliz, por pelo menos isso estar normal.

Enquanto ouvia as conversas Luce se distraiu ao ver que Daniel entrava no refeitório, e seu coração saltou ao ver que ele estava de mãos dadas uma menina que não conhecia. Já havia a visto algumas vezes, mas não sabia que eles tinham nada um com o outro. Ela engoliu em seco, sentido toda raiva tomar conta de seu corpo. Ela era linda, de cabelos pretos e um corpo todo bonito. Eles passaram pela mesa em que Luce estava sentada, e Daniel a olhou rapidamente, mas Luce virou a cabeça para outro lugar, para que não precisasse o encarar diretamente.

— O que foi Luce? — Arya estava a olhando seriamente, o que deixou envergonhada pela sua reação. Isso era muito bom para Luce, assim poderia ficar livre desse sentimento que nutria por Daniel.

— Não foi nada.  — Um sorriso se formou em seus lábios, o sorriso mais difícil que dera em muitos anos.

— Tudo bem, então. Olha quero te contar uma novidade. Vou começar a trabalhar na secretaria da escola.

— Como você conseguiu isso?

— Ah, o professor de sociologia pediu um trabalho do qual não lembro o nome, ele sugeriu que fizesse um pequeno estagio e fizesse um trabalho sobre isso. Só sei que no final eu consegui trabalhar na secretaria da escola, por duas semanas.

— Que surpresa você tão animada por trabalhar, é só isso mesmo?

— Mais ou menos, olha eu sei que deve ser proibido ver a ficha dos alunos, mas eu dei uma pequena na ficha do Daniel. Não me olhe com essa cara, eu percebi que você está afim dele, e só quis me certificar de que ele não era nenhum serial killer.

Luce se sentiu envergonhada por estar tão na cara que sentia algo por Daniel, mas sua curiosidade estava ativa, ela queria saber o que tinha lá.

— E então, o que você achou Arya?

— Nada, é só uma folha em branco. Não tem registro, nem documentos. Está completamente vazia.

Como assim vazia? , Luce pensou. Não tinha como isso ser possível. Arya parecia tão surpresa quando Luce. Do outro lado do refeitório, a acompanhante de Daniel encarava Luce, sem ao menos ser dar ao trabalho de ser discreta, e quando percebeu que estava sendo encarada também, ela sorriu. Não era um sorriso irônico, mais parecia com um sorriso amigável, o que fez com que a raiva tomasse conta de Luce.

Ela se levantou sem dizer nada a ninguém, e foi para seu quarto. Lá deitou-se e chorou baixinho como se fosse uma coisa horrível, nunca havia passado por isso antes, e agora o que estava sentindo era péssimo. Pegou o livro e começou a ler, para tentar se distrair. Anjos eram tão magníficos e perversos ao mesmo tempo, que Luce sentiu seu coração bater mais rápido, ela gostava disso.

Ouviu alguém bater na porta e foi atender. Levou um susto ao ver quem era, não esperava que ele viesse lhe visitar. 


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