Diary Of A Journalist escrita por Shorty Kate


Capítulo 8
Capítulo 8


Notas iniciais do capítulo

Aproveito para deixar os parabéns ao pequeno grande baterista, Ringo Starr, que completou 72 anos no sábado. Quero chegar ao 70 e ter ainda toda aquela energia, mas acho que primeiramente quero chegar aos 70 anos!



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(…) Bem, está na hora de voltarmos. E, sabes que o Paul não comeu… Devias ir ajudá-lo a assaltar a cozinha do hotel e passar um tempinho com ele.- Eu revirei os olhos. O que seria que eles falavam de mim nas minhas costas?

Chegados ao hotel, uma série de olhares foram trocados entre Ringo, John e George. Oh, eles não estavam a fazer o que eu pensava que eles estavam a fazer!

-Hei, Paul, - Ringo falou. – a gente vai subindo.

-Deves estar com fome, por isso aproveita que ninguém está a ver e vai à cozinha. – Depois continuou George, dando um sorrisinho matreiro.

-É, e – O John pôs-me a mão no ombro e empurrou-me para o Paul. – leva a Kate contigo. Ela já provou saber fazer matreirices! – Depois caminhou para o elevador com os olhos. – Bem, tchau, boa-noite pombinhos. Divirtam-se!

Eu olhei o Paul pelo canto do olho e ele gesticulava com a boca aquele tipo de coisas que se diz a um amigo que nos acaba de envergonhar em público: “vou-te matar!”. Ele depois reparou que eu olhava para ele e sorriu. – Então… - Ele coçou a parte de trás do pescoço. – sempre me ajudas com o assalto à cozinha?

-Eu não tenho fome, por isso vou subir e- - Não consegui acabar a frase e este foi daqueles momentos que todos temos quando nos odiamos um bocadinho. O meu estômago descaradamente roncou.

-Com que então não tens fome? – Ele riu e caminhou para a cozinha.

-Ok, - Eu sussurrei, seguindo-o. – talvez tenha um bocadinho de fome. - Ele acendeu a luz e toda a cozinha se iluminou.

-O que faço agora?

-Ai perguntas-me a mim? Eu só sou cúmplice nisto!

-Ah, então – Enquanto falava, Paul abria os armários e tirava aquilo de que gostava deixando tudo pousado na bancada. – eu sou o cérebro maquiavélico e tenho que saber o que fazer?

-Basicamente. – Eu disse numa gargalhada.

-Pois, mas é que eu não sou bom cozinheiro. – Ele virou-se com pão na mão. – Eu não sou cozinheiro de forma alguma.

-Por favor! – Tirei-lhe o pão da mão e caminhei para a sanduícheira que tinha visto. – Não sabes sequer desenrascares-te e fazer uma tosta mista?

-Eu ponho as coisas noutros termos, - Ele trouxe para a minha beira o queijo e o fiambre. – eu e qualquer utensílio de cozinha não nos damos!

-Ok, - Eu sentei-me sobre a bancada enquanto a tosta aquecia. Ele seguiu o meu movimento e sentou-se à minha beira. Eu vi uma faca e mostrei-lha. – só te digo: se algum dia alguém te gesticular com isto na cara, afasta-te!

Ele ria às gargalhadas e disse. – Experiência de jornalista?

Eu fiquei muito séria, tentando não me rir. – Nunca, mas nunca, entrevistes um talhante de faca na mão.

Ele continuava a rir-se e eu estava a adorar aquilo. Ele ria-se de forma tão genuína que dava gosto ouvir. E ainda por cima ele tem o risinho mais engraçado e adorável que eu já ouvi. E, assim do nada o Paul deixou-se de rir e empinou o nariz no ar. – Não te cheira a queimado?

-Oh, porra! – Quando me virei e tirei as tostas mistas da sanduícheira elas já estavam um pouquinho queimadas.

-Afinal não sou o único que não sabe cozinhar! – Ele ergueu o pão e enrolava a língua à volta do queijo derretido que caía.

-A culpa foi tua! Tu é que me distraíste! – E ao dizer-lhe isto, dei-lhe um empurrão na brincadeira no ombro.

-Ha, culpa minha isso querias tu! Culpar-me de seres má até a fazer uma tosta!

-Ah, grande lata! - Eu rosnei, abafando uma risada. – Tu nem sabes fazer uma! – E novamente dei-lhe um empurrão.

-Sei pois! – Ele agarrou-me a mão e eu congelei. Desliguei do momento em que estava e ele continuou a falar, mas eu não sei o que ele disse. Só voltei aos meus sentidos quando ele me chocalhou, chamando. – Kate! Kate! Hei, Kate, está tudo bem?

-Sim, está. – E quando tentei puxar a mão para a esconder dentro do bolso, ele não a largou. E tentar puxá-la à mesma só lhe causou desconfiança. Eu tentei cerrar o punho, mas ele não deixou e olhou para a palma da minha mão. – Tens aqui um grande corte.

A minha mão tremeu e eu olhei o corte. – Acho que devo ser verdadeira contigo, Paul. – Tirei o casaco e só lhe mostrei o braço esquerdo, desnudado de roupa. Tinha posto um vestido de propósito para o concerto deles. Um vestido simples, pelo joelho, de manga curta e usei uns sapatos de tacão bem baixos.

Ele engoliu em seco, e sem nunca largar a minha mão, tocou-me no antebraço. – O que é que te aconteceu?

-Lembras-te quando me perguntaste porque tinha regressado? Bem, isto foi a razão. – E então passei a contar-lhe o episódio que deu origem a estas duas cicatrizes.

Era uma tarde de Verão. Estava um calor abrasador e eu fui brincar com os meus amigos do bairro. Erámos todos da mesma idade, todos andávamos na mesma escola e todos na sexta série. O meu pai ia sair para trabalhar e estava sóbrio, por isso ainda podia dizer que ele era o meu pai. A bebida tornava-o numa pessoa irreconhecível. Ele disse que eu podia ir, mas que tinha que estar em casa antes da hora do jantar. Prometi obedecer, mas a verdade é que me distraí.

Quando ia a caminhar para casa, já depois de ter ouvido o sino da vila badalar as sete da tarde, eu só pedia que ele ainda não estivesse em casa. Mas ele já tinha chegado. Conseguia vê-lo em frente da televisão e a mão dele pendurada no sofá, agarrando um copo. Fechei a porta e entrei, pé ante pé mas ele deu pela minha entrada.

-Onde estiveste? – Ele falou de manso sem se levantar nem me olhar.

-Estive com os meus amigos, como me deixaste ir.

-E o que é que eu te disse?

-Para voltar antes do jantar…

Ele descruzou a perna e bateu forte com o pé no chão. Lembro-me de me baixar e o copo partiu-se na parede atrás de mim. – Eu venho cansado do trabalho e espero ter o jantar sobre a mesa, mas não! Não tenho nada! - Ele agarrou-me pelos ombros, abandando-me com robustez. Depois atirou-me contra a mesa e eu bati nas cadeiras com força.

Ele olhou-me, enquanto eu me tentava levantar do chão. – E estás toda encharcada porquê?

-Estava calor e nos fomos brincar para a margem do rio e acabamos por nos molhar todos. - Mas o problema dele não era eu estar molhada.

Eu não falei mais, vendo-o a caminhar para mim. Ele bofeteou-me com força e eu segurei as lágrimas, ficando com o rosto vermelho. – A tua mãe…ela mo…ela morreu ali para te salvar e tu ainda vais para lá? Não sentes a falta dela, não? – Desta vez ele pontapeou-me na barriga.

-Todos os dias. – E comecei a chorar.

-Oh, não me venhas com choradeiras que eu nem te aleijei! E não vale a pena chorares lágrimas de crocodilo pela tua mãe! Agora levanta-te e vai-me buscar mais uísque.

Ele voltou a sentar-se no sofá como se nada tivesse acontecido e eu fui buscar um copo e a garrafa. Mas, a garrafeira era alta e eu estava toda molhada. Quando peguei na garrafa, ela escorregou-me das mãos e caiu, partindo-se. Os passos rápidos e pesados dele aproximavam-se e eu baixei-me, apanhando os cacos.

-Levanta-te! – Ele rosnou secamente. Eu olhei-o e ele levantou o dedo, apontando o caminho para o meu quarto. – Vai buscar a guitarra. – Eu cumpri a ordem e voltei com a minha guitarra acústica, a guitarra que o meu avô me deu quando eu voltei a Portugal. Ele disse que ainda era pequena para aprender, mas quando chegasse aos meus doze anos (idade que tinha) já devia aprender mais a sério.

-Pai, não. – Eu chorei, sabendo o que ele ia fazer. Ele ia destruir aquilo que era tão precioso para mim como a bebida agora era para ele.

-Dá cá isso! – Olhei a guitarra pela última vez e depois vi-a partida no chão. – Não serve para nada! O meu pai foi um louco por te ensinar estas coisas sobre música. Só te pôs minhocas na cabeça. Para quê que isso te servirá na vida, uh?

Senti-me ofendida, e senti que ele ultrajou o meu avô também. Ele foi quem me ensinou tudo o que eu sabia. Tudo. Ele dizia que eu tinha um dom especial, e eu adorava aprender. Ainda não tinha esquecido nada do que tinha aprendido nos meus tenros anos enquanto vivia com ele. Então eu baixei-me e apanhei um dos cacos, fungando as lágrimas.

Olhei o meu pai com rancor e corri para ele, empunhando o vidro. Mas eu era inútil à beira dele; eu não conseguia abater o porte de quase dois metros e ele apanhou-me pelo pulso e esbarrou-me contra a parede.

-O que é que ias fazer? – O bafo dele tresandava a álcool e eu tentava sair da dominância dele, mas sem sucesso. Ele levantou o bocado de vidro e disse. – Ias bater no teu próprio pai?

Ele não estava magoado ao dizer aquilo. Ele disse-o quase sarcasticamente porque eu não podia bater no meu pai, mas ele podia como fizera, espetar aquele vidro na palma da minha mão. E quando ia berrar, ele tapou-me a boca, as lágrimas escorriam pela minha cara e o sangue pela minha mão. Mas ele não estava satisfeito. Agarrou-me o braço e cravou lá o vidro, arrastando-o até ao meu pulso. Fiquei com um lanho no antebraço, a sangrar imensamente.

Ele largou-me e eu escorreguei parede abaixo, a chorar e a soluçar. – É bom que aprendas que não se levanta a mão contra quem te criou. – A porta da entrada bateu com força e eu sabia que ele tinha saído. Mais umas bebidas e ele acabaria por chegar a casa completamente embriagado pela manhã…se não acabasse por dormir na soleira da porta.

Levantei e fui buscar a caixa de costura. Eu tremia por todos os lados e tentava limpar o sangue que escorria pelo meu braço e pela minha mão. Consegui meter a linha na agulha e respirei fundo. Antes disso olhei a garrafeira e peguei na água ardente que lá estava. Bebia uns goles e comecei a cozer-me a mim própria. Fiquei depois disso um tempão em transe, não sabia se estava bêbada ou em choque pela dor que tinha sido cozer-me a mim própria. Levantei-me e liguei ao meu avô. Ele meteu-me a mim e ao meu pai no avião. Levou-me para Liverpool, para viver com ele, e ao meu pai mandou-o para Londres, para uma clínica de desintoxicação.  

-E foi assim que consegui estas duas cicatrizes. – Eu terminei, falando aberta e alegremente. Já nada disto me afetava mais.

-Kate…Desculpa, eu não queria-

-Shh. – Eu levei o meu dedo aos lábios dele, silenciando-o. – Não há problema. Eu quis contar-te isto. – Coloquei a minha mão na bochecha dele e acaricie-a com o polegar. – Está tudo bem, Paul.

Os lábios dele colaram-se nos meus e eu desliguei. Se quiserem que eu descreva como foi o beijo, não sei! Aconteceu, eu senti-o na hora, e só eu sei o que senti. Claro que ele era o Paul McCartney e um montão de raparigas morreria para ser eu naquele momento, mas eu não consegui sentir muito. O beijo foi bom, sem dúvida, avassalador! Mas foi como beijar um irmão. E ele também sentiu como se tivesse beijado a irmã.

Nada ficou esquisito ou embaraçoso até porque nos olhamos, sorrimos e continuamos a beijar-nos. Mas, simplesmente não havia aquela faísca. Aquela química. Eramos amigos, muito bons amigos. Somente nenhum de nós faria sexo sem significado e então parámos ali, conformados com a situação. Ele agarrou-me pela cintura e colocou-me no chão.

-Acho que os rapazes se enganaram desta vez.

-Normalmente os amigos são assim. – Eu expliquei enquanto caminhávamos para os quartos. – Quando vêm dois amigos juntos, querem logo juntá-los!

-Oh não! – Ele disse ao ver a porta do quarto. – Esqueci-me de lhes pedir que me dessem a chave e agora não vou estar a acordá-los.

-Podes ficar na minha cama, - Eu falei a abrir a porta do meu quarto. – eu não vou dormir de qualquer maneira.

-Como assim não vais dormir? – Achei engraçado que ele de certa forma estava a reclamar comigo por eu não ir dormir e lhe estar a oferecer a cama, mas entrou no quarto comigo.

-Bem, depois de me despedir de trabalhar para o Brian, foi intercetada por um jornalista de Londres do lado de fora do camarim. Ele diz que compra o meu artigo se ele for bom. – Ele sentou-se na beira da cama. – Tenho que acabá-lo até ao final da semana. Por isso, a cama é tua. Eu não vou pregar olho a noite toda!

-Então, tens até ao final da semana. Ainda tens tempo!

-Esqueceste que o final da semana é amanhã!

Ele levantou-se e segurou-me as duas mãos, fazendo-me caminhar em direção à cama. – Amanhã, eu e os rapazes prometemos deixar-te escrever o artigo na viagem. Agora precisas de dormir, assim como eu.

Suspirei fundo. Aqueles olhinhos de cachorrinho dele não davam margem de manobra. – Não cabemos os dois na cama.

-Cabemos pois. – Ele deitou-se e esticou o braço esquerdo. – Se nos juntarmos bem, cabemos.

Fiz do braço dele a minha almofada e envolvi a cintura dele com o meu braço. Ele beijou-me na testa antes de me abraçar contra o corpo dele e ambos adormecermos. 


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Notas finais do capítulo

Uhm, e esta? O que será que acontecerá a seguir?
Não se esqueça de comentar *.* KKKKKKKKKK



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