A Vida Sexual De Odano Odajima escrita por Scarlat7


Capítulo 3
Observando o patinho feio.


Notas iniciais do capítulo

Alô, alô. Apenas leia, vai.



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                Depois de ter comido, na verdade, devorado como um animal que encontrava-se sem comer por dias, meu onigiri, me deitei no chão levemente empoeirado do terraço e fiquei encarando as nuvens. Algumas delas tinham formatos bem interessantes. Vi uma parecida com um gato, outra com sanduíche, um dragão, um óculos, um raio e um pênis. O que me fez lembrar de ter ouvido, em algum programa de variedades que passava de tarde para apenas os sem-ocupação verem, que os desenhos que vemos nas nuvens são um sinal do nosso subconsciente sobre alguma carência, desejo reprimido ou traço de nossa personalidade.

                O que minha vista estava me falando era que: eu gosto de gatos, correto; estou com fome, corretíssimo; gosto de histórias fantásticas, fantasticamente certo; sou nerd, bem, sim; gosto de Harry Potter, correto novamente; estou precisando de um macho, correto, certo, afirmativo, verdade, exato, verídico, real, autêntico, e todas as outras palavras afirmativas que existem dentro de um et cetera.

                Acho que apenas não vi a imagem da face de Kouyou nas nuvens pois esta representação rudimentar feita de água condensada difamaria toda a beleza e harmonia existentes entre os traços daquela face tão cuidadosamente feita. Eu tenho essa pequena impressão que eu exagero só um pouquinho quando eu penso no Kouyou. Só um pouco.

                As outras aulas se estenderam até o horário do almoço, tão tediosas quando poderiam ser. E tão chatas também, mas essa característica específica se aplicou com mais enfática na aula do Minamoto. Aquele cara é incrível, ele simplesmente não fala qualquer coisa que não esteja relacionada com a matéria, e, quando fala, é para reclamar sobre a estupidez gigantesca de uma pergunta que foi feita em relação à matéria. Basicamente, ele nos acha burros por perguntar. E pior ainda, por perguntar algo que ele acabou de falar. Até que somos, mas, pô, não precisa falar com todos as letras na frente da turma inteira né.

                O almoço foi legal, claro, tinha comida e meus amigos. Só faltava o vídeo game. Porém, como sempre, fiquei observando Kouyou de longe. Ele estava sentado em uma mesa bem afastada da nossa, com seus amigos e aquele moreninho que nunca saía do seu lado. Acho que ele era da turma 3-C, então, nem da minha e muito menos da do Ruki. Eu já tentei, mas com minha rede de informação escassa não consegui descobrir seu nome, nem o tipo de relação que tem com o meu Loiro Maravilha.

                Até onde eu sabia, a possibilidade de Uruha ser homossexual era bem remota, logo, a possibilidade de aquele garoto ser seu namorado também. Mas, ele era mais próximo de Kouyou do que eu jamais irei ser, então eu sentia inveja e ciúmes, e consequentemente uma vontade louca de trucidá-lo e jogá-lo no mar para ele nunca mais encostar um dedo sequer no Uruha.

                Acho que exagerei um pouco.

                Mas, poxa, o garoto era tão fofo. Tão mais do que eu. E com esses pensamentos ainda rondando por minha mente voltei à sala de aula para os períodos da tarde.

                Após os períodos de aula que tínhamos durante a tarde, era a hora das atividades extracurriculares. Coisas como participação em clubes ou aulas de reforço.  Eu, como bom representante da classe dos feios e excluídos dos grupos normais, participo do clube de desenho. Tudo bem, não é tão mau assim. Claro, tirando o fato de que a maioria das pessoas ali é quase, veja bem, quase, tão feia quanto eu. Mentira. Eles até que são bonitos, apenas não se ajudam. Quer dizer, pô, tudo bem eles serem nerds, mas precisavam usar aquelas roupas com duas vezes seus tamanhos? Não que eu possa falar muita coisa sobre roupas. As minhas são bonitas. Quando eram usadas pelo meu irmão mais velho elas eram, pelo menos.

                Ruki fazia parte desse clube também, mas ele gostava mais era de desenhar roupas. Que ficavam lindas, claro, meu amigo talentoso. Ele até fazia as suas próprias algumas vezes. E essa pequena vontade do baixinho em ser estilista era eternamente zoada por mim e seu namorado, já que na indústria da moda todos eram extremamente bem providos verticalmente, diferentemente de Takanori. O pintor de rodapé estava fadado em ajustar as roupas apenas da cintura para baixo, já que acima da cintura não alcançaria direito. Não que eu queira brincar com ele, mas se normalmente ele já bate no ombro das pessoas, com elas em cima de um banquinho a coisa iria ficar feia.

                Reita, juntamente com Uruha, faziam parte do time de basquete da escola, que normalmente, se não chovesse, treinavam nas quadras ao ar livre. Que, por uma ótima coincidência do destino, eram visíveis da sala do nosso clube. Sim, era assim que eu desenhava as várias faces e poses de Kouyou que tomam conta da parede nada gay do meu quarto.

                Como sempre, Ruki encontrava-se desenhando suas roupas, os outros membros se dividiam em desenhar, pousar para desenhos e ler alguma revista em quadrinho (ou, como preferimos chamar, pesquisar referências). E eu observava o time de basquete da escola fazer alongamentos acompanhado de minha prancheta, folha, lápis e borracha. Fazia alguns rabiscos que nem sequer podiam ser considerados rascunhos, não estava no ânimo para desenhar. Observava atentamente Uruha alongar seu corpo, atentando a cada detalhe que pudesse ter passado despercebido por meus olhos, mas eu sabia que não havia passado, já observara ele muitas vezes para decorar todos mínimos aspectos daquele corpo.

                Senti-me observado, porém os orbes de Uruha não estavam voltados a mim, quem dera. Então, quem? Dei uma rápida olhada pelo outros componentes do time, deparando-me com Reita, que olhou para mim. Então era ele.

                Mas era estranho, Reita acabara de me olhar, por não mais de um segundo, e aquela sensação já se prolongara por mais que isso. Acho que é minha mania de perseguição dando as caras. Sentindo-me mal por isto, voltei-me para o interior da sala, recebendo um olhar de interrogação de Ruki. Apenas balancei a cabeça em sinal de negação, num silencioso “não foi nada”.

                Mas quem disse que o baixinho se contentava com essa explicação pífia?

                — Tá, conta aí, o que foi Odano?

                — Sei lá, Taka. Parece que eu estava sendo observado. Até pensei que era o Reita, mas ele não estava olhando para cá. Só... É estranho.

                — Também né, você parece um stalker do Kouyou, já estava na hora de sentir um pouco do próprio veneno.

                — Ai, que maldade Taka.

                — Maldade? Pobrezinho do Odano... O Taka tá sendo mau. — falou, fazendo uma voz infantil, como a que usamos para falar com bebês, e apertando minhas bochechas. —Tá dodói o nenê?

                — Cala a boca, pigmeu! E larga minhas bochechas!

                Voltei para a minha janela, é melhor se sentir observado do que ter suas bochechas estupradas por um anão de jardim mutante. A sensação demorou alguns minutos para voltar, mas voltou. Eu devia mesmo estar ficando paranoico.

                Depois de um tempo, e um desenho não muito bom, Ruki se juntou a mim na janela. Mas, diferentemente de mim, ele era espalhafatoso por natureza e gritava a cada tentativa de cesta que seu namorado fazia. Também xingava a cada vez que roubavam-lhe a bola. Ô boquinha suja, pai do céu. Depois de um tempo, se cansou disso e ficou quieto observando, tão quieto que até estranhei. Mas quem sou eu para reclamar?

                — Ei! Odano! — ouvi a voz de Ruki de repente, o que me fez ir para trás de susto. Apenas não soltei um gritinho estridente e gay porque ele não havia falado alto o bastante. — Aff, cara, como você é bicha. Eu só te chamei, não vou te esfaquear não. Mas, de qualquer jeito, eu também estou sentido. Quer dizer, essa sensação se estar sendo observado.

                — Hum.

                — Olha aquele garoto ali, o que está no ataque. Do time do Reita. Acho que é ele. Mas ele não parece estar nem um pouco incomodado de estar sendo encarado.

                — Qual, Ruki? — perguntei, vasculhando o local em busca do dito cujo. Achei alguém que parecia estar olhando para cá, porém, assim que bati os olhos nele, ele desviou o rosto para o jogo, saindo de sua posição anterior. — Aquele de cabelo castanho?

                — É, mas ele parou de olhar assim que você pousou os olhos nele. Conhece? Acho que ele é da 3-C.

                — Provavelmente, da minha turma não é. Se não é da sua... Mas por que ele estava olhando para nós?

                — Vá saber. — respondeu Ruki, voltando para dentro da sala, provavelmente perdeu o interesse no jogo. Claro, com o namorado ao seu dispor, para que ficar olhando de longe?

                Continuei ali pela uma hora e meia restante, observando Uruha, porém, dessa vez, sem ser observado pelo garoto misterioso. Será que ele estava achando que eu era perigoso ou algo do tipo? Não que eu passe a ideia de ser perigoso. Quer dizer, para os outros não, mas acho que sou bastante perigoso para mim mesmo. Ninguém me machuca como eu mesmo o faço.

                *~-~-~-*

                Saímos do colégio e esperamos por um tempo Reita ali na frente. Ele sempre demorava mais, porque tinha que tomar banho antes de sair. Fomos para casa, eu ainda pensando sobre o garoto do time de basquete e consequentemente não prestando atenção à conversa que se desenrolava entre meus dois melhores amigos.

                — Né Odano? — o baixinho me perguntou, me tirando dos meus devaneios.

                — Quê?

                — Tinha um garoto do time de basquete nos encarando hoje.

                — Sim, sim. — concordei — Ele tinha cabelo castanho.

                — E não era muito alto. Não sei o que estava fazendo o time de basquete. — o baixinho complementou.

                — Bom, claro, ainda era maior que o Ruki. — alfinetei o baixinho ao meu lado, recebendo um tapa na cabeça em resposta.

                — E mais bonito que você Odano.

                Ai. Essa doeu Ruki. Não era necessário. Não mesmo. Eu sei que sou feio, agora não precisa ficar tocando na minha cara.

                — Tá, tá, crianças, que tal pararem com isso? — Reita falou. Como se ele fosse mais velho. Nem em sonhos. Nasci antes queridinho. Pirralho. Respeite os mais velhos. — Agora, eu acho que sei de quem vocês estão falando. O nome dele é Ginta. Uzuke Ginta. Ele tá meio distraído durante os treinos faz um tempinho mesmo. Além disso, ele encaixa na descrição pouco apurada de vocês dois.

                — E como ele é Reita? Chato, legal, rabugento, inteligente, pobre, rico...?

                — Ele é... normal. Quer dizer, sei lá. Não converso muito com ele, nada além de cumprimentos. Mas ele parece ser legal e ouvi dizer por aí que ele é rato de biblioteca. Se bem que, não entro naquela biblioteca há séculos, não tenho como confirmar.

                — Hum... Odano, temos uma missão. Vamos stalkear nosso stalker! — o baixinho exclamou, como se tivesse falado a frase mais genial do universo, e em seguida passou um braço por cima de meus ombros, se esticando todo no processo.

                — Ele deve ser um estranho, isso sim.

                — Mas por que você acha isso?

                — Ele estava me observando, para ficar me olhando por tanto tempo ele tem que ter problemas. Ou, não sei, uma retina muito potente para não sofrer danos com a visão da minha cara.

                *~-~-~-*

                Cheguei em casa e logo subi para o meu quarto, deixando a minha mochila tocada em qualquer lugar. Troquei de roupa, colocando um camisetão e uma calça larga. Era infinitamente mais confortável do que aqueles jeans do inferno. Liguei meu computador, maldizendo-o inúmeras vezes pela demora para ligar. Assim que ele ligou, vários pop-ups apareceram na tela. Eu tenho que fazer uma limpa nesse pc. Como sempre, fechei um por um, até ser possível ver meu wallpaper, um desenho de Uruha que tinha feito, mostrando-o arremessando a bola em direção da cesta.

                Depois de fazer coisas totalmente aleatórias no computador, apenas para perceber, uma hora depois, que aquilo tinha tomado tempo demais. Relógio que atrasa não adianta, Odano. Estava disposto a levantar a bunda da cadeira e ir socializar com minha família, quando um barulho irritante me impediu. O Ruki sabe escolher a pior hora para chamar alguém. Sei lá. Ele deve ter alguma bola de cristal ou um detector de momentos inconvenientes. E tenho certeza que ele sente um prazer insano em atrapalhar a vida dos outros, aquele anão sádico.

                Depois de encher meu saco sobre estar com medo de o garoto jogador de basquete ser um maníaco e sobre eu aumentar minha autoestima e atacar o Uruha, ele decidiu que era hora de parar de falar comigo. Sem dar tchau. Nem beijinho. Totalmente insensível. Depois de ter me impedido de passar meia hora envolto em amor familiar e compreensão. Sim, sei. Amor e compreensão. Tá, talvez um pouco. Minha família é legal, no final das contas.

                Desci as escadas, já ouvindo o barulho proveniente da minha família do topo destas. Eu tinha sérias suspeitas que nosso DNA de japoneses fora corrompido por algum aminoácido italiano ou algo do tipo. Em vez de falar baixo e ser reservada, minha família era um furacão. Gritava para quem quisesse, ou não, ouvir todos os fatos de nossa vida, incluindo momentos íntimos e a vida sexual dos dois jovens da família, ou melhor, falavam das namoradas e namorados do meu irmão e da minha reclusão social passada na frente do computador, lendo livros ou desenhando. 

                — Ei, Odano! Nem vi você chegar em casa, garoto. — meu padrasto, que eu chamava de pai já que nunca tive o meu genitor biológico presente, exclamou, sempre com um sorriso no rosto.

                — Ah, é que eu fui direto para o quarto.

                — Cresça e apareça, mano! — retorquiu meu irmão mais velho, que se encontrava estirado no sofá vendo um filme. — Se continuar se escondendo só vai diminuir sua imagem.

                — Você fala isso porque é gigante, né Mevs. — provoquei, na verdade, não era exatamente uma provocação, mas meu irmão tinha uma mania estranha de se ofender quando mencionavam sua alta estura.

                — Nada a ver. E você é lindo, só que fica se escondendo atrás desse cabelo e dessas roupas gigantescas. —Miyavi falou, emburrado.

                Ishihara Takamasa é meu irmão mais velho, mas todos chamam ele de Miyavi e derivados. E quando falo todos, eu realmente quero dizer todos, nem nossos pais o chamam pelo nome. Ele é a pessoa que mais defende a tese de que eu sou bonito, porém ainda tenho de ser lapidado. Ou melhor, ele é muito simpático e nada sincero comigo. Não temos nenhum vínculo de sangue, mas isso não o faz menos meu irmão. Seu pai, Ishihara Sugiya, é meu padrasto desde que eu tinha 8 anos, assim, faz nove anos que Miyavi é meu irmão. Sugiya é um exemplo de homem, em todos os sentidos, alto, inteligente, bonito e acima de tudo, muito legal. Totalmente o contrário do meu pai biológico. Odano Shiga era um caminhoneiro, que largava minha mãe por dias sozinha enquanto namoravam, até que soube da gravidez desta, e então rumou para a estrada para nunca mais voltar. Era melhor assim.

                — Ô cambada, o jantar tá pronto! — minha mãe, Shiroyama Koharu, gritou da cozinha. Bem, gritar talvez seja um termo um pouco ameno, ela berrou com um tom de voz tão alto que acho que ultrapassou em muito os decibéis saudáveis para os pobres tímpanos humanos.

                E assim começou um típico jantar da família Shiroyama/Ishihara/Odano. Cada um aqui com um sobrenome, tudo culpa do facilitamento do divórcio nos tempos modernos. E alguns acidentes de percurso.

                Do tipo, eu.


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Notas finais do capítulo

Então, isso aí das nuvens no início do capítulo eu não tenho certeza se tá certo. Mas, como as manchas de tinta de Rorschach revelam aspectos psicológicos por serem ambíguas, as nuvens podem fazer o mesmo, certo? Não. Ou sim. Mas eu vou fingir que sim então está tudo ótimo.
Bem, desculpe a demora, se alguém ainda lê isso aqui. Quando eu sento no computador para escrever simplesmente não sai, e quando eu consigo escrever é quando eu não posso, porque estou na rua e afins.
Passei as férias inteiras estudando para o meu curso e tentando aprender a mexer em coisas como HTML e CSS, e esses códigos simplesmente não entram na minha cabeça. :
Bem, beijos e boa sorte para vocês. Eu sei que é meio cara de pau, mas... Não me abandonem!