O Mistério de ísis escrita por Arthemisys


Capítulo 2
Ato II




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O Mistério de Ísis

 

Por Arthemisys

 

 

 

Ato II

 

 

“Ela entende o que eu nunca falei,

Ela sabe o que existe em mim,

E ela vem de um lugar,

Que nunca conheci,

Mas juro que já estive lá.”

 

(Trecho da letra “Ela e o Castelo”, da banda Catedral)

 

 

Mais uma vez ele se encontrava naquele lugar. Tão grande e tão vazio, aquele salão parecia lhe tirar bruscamente da dimensão real, o levando para um outro mundo, um mundo imaginável, de sensações e odores. Tal lugar era de um colorido forte e suas paredes eram adornadas pelos mais variados tipos de desenhos – que sempre que ele se encontrava ali, pareciam ganhar vida, mas que mesmo assim, não era possível assimilar que tipos de imagens seriam aquelas. Pesadas cortinas escarlates desciam majestosas do alto, no lugar onde havia uma imensa porta feita de uma madeira pura e enegrecida. Não havia móveis, mas isso não era um fato estranho.  Tudo ali era grande demais e vazio demais, como em um sonho. Seu sonho.

 

Conseguia ouvir a sua respiração e sentia a brisa – é estranho, mas ele conseguia sentir o toque do vento em seu sonho – tocar levemente em seu rosto. Olhou para o local onde as cortinas desciam, mas não teve a ação de caminhar até a porta, pois no momento em que sua mente cogitou essa ação, a porta se escancarou, dando passagem para mais alguém. Nesse momento, sentiu sua respiração parar e sua boca secar. Novamente, aquele lugar seria o palco de mais um pesadelo.

 

Os passos do estranho pareciam ser os de um felino. Os músculos das coxas semi-cobertas por uma espécie de saiote se contraiam e relaxavam a cada passo que era dado. Seus olhos cor-de-mel pareciam estar dilatados e um meio-sorriso completava a fisionomia daquele ser que tinha em uma de suas mãos, uma fina adaga que brilhava fria e sedenta.

 

Ao ver que a distância que os separavam não era superior a cinco metros, o estranho empunhou a adaga e o outro correu em sua direção, pronto a evitar algum golpe e imediatamente, contra-atacar. Porém, como sempre, ele não obtivera sucesso. No exato momento em que conseguiu se desviar de um golpe da arma e de quase atingir o seu oponente com um potente chute, ele sentiu sua visão turvar, como se tivesse bebido naquele exato momento, dezenas de garrafas de uísque. Suas pernas fraquejaram e sentiu que involuntariamente, era posto de joelhos no chão. Ouviu uma gargalhada insana vinda de seu inimigo ilusório. Também escutou palavras, mas eram algo tão desconexo que o máximo que conseguiu imaginar foi a de que seriam provenientes de algum idioma muito antigo. Mesmo entorpecido, usou as poucas forças que restavam e levantou a cabeça a fim de encarar aquele homem mais uma vez. E assim o fez. Quando seus olhos se encontraram com os olhos do estranho homem, sentiu um frio descomunal percorrer todo o trajeto de sua espinha dorsal, como se a presença da morte se fizesse a cada segundo mais presente.

 

‘- Você é meu.’ – o estranho falou com uma calma e frieza incalculáveis, seguidos por um sorriso cínico, que demonstrava a sua real natureza: a de desprezar a qualquer inimigo que se opusesse a ele.

 

E com um movimento rápido, ele enterrou a mão esquerda nos cabelos do outro que estava de joelhos no chão, puxando brutamente a cabeça dele para trás. E com um simples gesto, fez com que a adaga em sua mão passeasse sem dificuldade pelo pescoço do outro, o fazendo sentir junto com o amargo saber de sangue, uma dor tão lancinante, que seu grito transpassou todas as dimensões possíveis que ligavam àquele pesadelo, ao mundo real.

 

‘- NÃOOO!!! Arf... Arf... Arf...’

 

Sentou-se na cama imediatamente. Seu corpo estava completamente ensopado pelo suor e a dor continuava forte em sua garganta, como se a adaga ainda estivesse a cortá-la. Elevou uma das mãos até o tórax, a fim de massagear a região onde o coração pulava descompassadamente. E assim ficou durante algum tempo. Quando sentiu que poderia ficar de pé, se levantou, caminhando ainda tropegamente até a varanda do apartamento recém adquirido. Ao abrir a porta de vidro, sentiu a brisa noturna de Tóquio percorrer por todo o seu corpo, como se pudesse assim, obter o controle sobre seu corpo novamente. Deu mais alguns passos, enquanto retirava a camisa completamente encharcada de suor e a jogou sobre uma cadeira. Seus passos pararam em frente ao parapeito da varanda e segurando com ambas as mãos o frio metal que fazia a segurança daquele compartimento, inspirou profundamente, mesmo sentindo que o ar que invadia seu pulmão, fazia também com que a dor aumentasse mais um pouco. Ao expirar, deixou sua cabeça pender em direção ao peito. A sensação incômoda já estava quase que eliminada, porém, as imagens daquele pesadelo pareciam continuar ainda mais reais.

 

‘- Nii-san...?’

 

Ele se virou imediatamente, e viu que desta vez, seu pesadelo despertara mais alguém. Seu irmão mais novo o encarava com um ar de seriedade e preocupação enquanto trazia um copo com água gelada. Ele não deixou de dar um meio-sorriso ao ver seu parente com aquele tipo de zelo por ele.

 

‘- Não foi nada Shun. Volte a dormir.’

 

‘- Antes de ontem você disse a mesma coisa e ontem também.’ – Shun retrucou prontamente. – ‘Ikki, seus pesadelos estão se tornando cada vez mais freqüentes e pelo visto, mais assustadores.’ – e estendendo o copo com água na direção dele, completou. – ‘Beba isto.’

 

Ikki não teve como negar e pegando o copo da mão de seu irmão, ingeriu o líquido gelado em grandes goles. Enquanto isso, Shun se apoiou no parapeito, com o olhar vago para a vista noturna. Nesse momento, uma estrela cadente cruzou os céus de oeste a leste, em uma linha azulada. Ao virar os verdes olhos em direção ao irmão, o viu olhar o mesmo céu, como se seus pensamentos estivesse a anos-luz dali.

 

‘- Ikki. Ainda não consigo acreditar que aceitou o convite da Saori.’

 

‘- E por que não?’ – o rapaz respondeu. – ‘França parece ser um ótimo país de se conhecer.’

 

‘- Eu sei.’ – Shun retrucou com um sorriso iluminado. – ‘Mas bem... Trata-se de uma visita da Saori a uma amiga dela... E bem... Isso não faz muito o seu tipo.’

 

‘- Coloque duas coisas em sua cabeça de uma vez por todas, Shun: Primeiro. Eu não preciso ficar grudado na Kido o tempo todo e segundo: é para isso que o Seiya existe, entendeu?’

 

Shun não conseguiu conter uma gargalhada pela “comparação” feita pelo irmão mais velho. Tal gargalhada foi tão contagiante, que até mesmo Fênix não conseguiu manter o ar sério por mais tempo e ambos ficaram rindo da ilusória e cômica situação por algum tempo, onde logo depôs, Ikki conclui:

 

‘- Vamos dormir. Amanhã será um longo dia.’

 

‘- Sim. A viagem vai ser longa mesmo.’ – o rapaz retrucou com um breve sorriso. – ‘E se precisar de mim, é só me chamar, certo?’ – assim, o jovem cavaleiro sai rumo ao seu quarto.

 

‘- Não se preocupe. Eu gritarei por você.’ – Ikki respondeu com o seu habitual sarcasmo, pronto a ouvir a resposta do irmão.

 

‘- Isso não tem graça!’ – Shun resmungou com um ar de despeito enquanto desaparecia por entre os cômodos do apartamento.

 

Após um meio-sorriso, Ikki ainda ficou na varanda por uns quinze minutos, mas suas pálpebras começaram a ficar pesadas novamente. Deu assim, uma última olhada para o céu que apesar das fortes luzes metropolitanas, estava naquela noite, particularmente bela de se observar. Fênix preferiu guardar em sua memória aquela magnífica visão das estrelas celestiais, a fim de ser reproduzida durante o seu sono, em um suave sonho.

 

...x...x...x...

 

Na manhã seguinte, o aeroporto de Tóquio estava como sempre, apinhado de gente. Homens e mulheres andavam apressadamente, temerosos em perder os seus respectivos vôos e no meio dessa pequena multidão caótica, um grupo se distinguia dos demais.

 

‘- Férias!’ – um rapaz fala com um entusiasmo fora do normal, porque não, infantil.

 

‘- Você já disse isso pela vigésima vez desde que chegou aqui.’ – outro rapaz retruca com um ar de quem já estava perdendo completamente a paciência.

 

‘- Férias, férias e férias! Eu adoro essa palavra! Parece até mesmo uma suave música para os meus ouvidos!’

 

‘- Você também já disse isso hoje.’ – outro rapaz, também retrucou com um sorriso um tanto sem graça.

 

‘- Bah! Qual é a de vocês, heim?!’ – o mesmo jovem que falava animadamente, se vira em direção aos outros dois que apenas o observavam. – ‘Hyoga e Shun: Pela primeira vez em nossas vidas, iremos para um lugar desconhecido, cheio de pessoas desconhecidas para fazer algo inédito em nossas vidas! Se liguem!’

 

Hyoga e Shun se entreolharam, suspirando ao mesmo tempo. Ambos tiveram a nítida certeza de que aquelas férias com o Seiya por perto, seriam sem dúvida, “inesquecíveis”.

 

‘- Demorei muito, rapazes?’ – uma voz feminina pergunta com delicadeza, fazendo com que os jovens cavaleiros se virassem para a sua dona.

 

‘- Saori! Graças a Deus!’ – Hyoga disse com um sorriso aberto. – ‘Pensei que você não chegaria mais!’

 

‘- O que? E por que não chegaria?’ – a jovem deusa sorriu descontraidamente e Seiya que estava um pouco longe dos três, não deixou de reparar que a cada sorriso que dava, Saori parecia ainda mais com uma bela visão a ser contemplada. Pégaso sentiu que uma leve pontada doeu em seu coração e instintivamente, elevou sua mão direita até o local daquela sensação. Mas mesmo assim, não deixou de sorrir também ao notar que ela o olhava ainda com o mesmo sorriso em seus lábios rosados e úmidos pela ação da suave maquiagem que usava. – ‘Seiya! Vem aqui!’

 

‘- Pronto, já estou aqui, querida chefinha!’ – Seiya falou ao se aproximar do grupo novamente e sem antes, bater continência à deusa que balançou a cabeça negativamente, talvez pensando que Seiya talvez nunca crescesse idéia essa que a deusa da sabedoria sempre amou.

 

‘- Sem gracinhas.’ – ela falou, tentando não sorrir mais do que já estava. – Bem, eu demorei porque estava terminando de aprontar o passaporte de todos vocês. – assim, ela entrega para cada um, o documento. – ‘Os vistos de vocês já estão “ok” e agora, é esperar o nosso vôo!’

 

‘- Saori... Você não está esquecendo de alguém?’ – Shun perguntou ressabiado.

 

‘- Claro que não, Shun. Aliás, esse “alguém” já tinha cuidado do visto no passaporte dele bem antes de mim.’

 

‘- O que?! O Ikki mais interessado nessa viagem do que a gente?! Isso só pode ser um sonho!’ – Hyoga respondeu altamente admirado.

 

‘- Os sonhos se tornam realidade ou nunca ouviu falar desse ditado?’ – uma voz interrompe a conversa e todos olham para a direção da voz.

 

‘- Ikki! Há quanto tempo!’ – Hyoga dispara, indo até o cavaleiro e cumprimentando com um forte aperto de mão. – ‘E que bagagem extra é essa?’

 

‘- Sem brincadeiras rapaz!’ – Tatsume que estava do lado de Fênix, arregala os minúsculos olhos em direção ao russo que apenas sorri divertido. – ‘Eu vim deixar a senhorita Kido no Aeroporto e nada mais!’

 

‘- O tempo passa, o tempo voa, mas o Tatsume continua a mesma mala sem alça...’ – Seiya arremata com um suspiro, o que deixou o mordomo mais enraivecido.

 

‘- Ora seu...’

 

‘- Chega!’ – Saori interferiu. – ‘Pare Tatsume e você Seiya, dá para ser comportado somente uma vez?’

 

‘- Por que você briga tanto comigo heim?!’

 

‘- Por quê? Porque você merece!’ – Saori retrucou.

 

Enquanto outro bate-boca começava a se armar, Ikki olhou o relógio e começou a caminhar rumo ao hangar de embarque, dizendo. – ‘Hei vocês. O vôo sai daqui a três minutos.’

 

‘- O QUE?!’ – todos exclamaram e prontamente, começaram a andar apressadamente para o que seria a primeira viagem de férias de suas vidas.

 

Durante o extenso vôo que se seguiriam com algumas pequenas escalas rumo à Paris, todos os rapazes brincavam entre si, como se ali fosse uma turma de colegiais rumo a uma divertida excursão. Saori que fez questão que todos fossem àquela viagem, sentia naquele momento de felicidade tão visível, a alegria por ver seus únicos e verdadeiros amigos desfrutarem aquilo que seu íntimo imortal sempre desejou: a pura e simples vida comum, com as suas alegrias, frustrações e descobertas diárias. Para a deusa, ver Seiya sendo o eterno menino levado, Shun mostrando o seu mais belo sorriso, Hyoga com as suas afirmações extremadas e Ikki que por tantas vezes sozinho, estava ali, conversando despreocupadamente, era sem dúvida, a maior benção que os céus poderiam lhe oferecer. E essa graça a alcançou de certa forma. Ela, que há alguns anos atrás vivia em meio a guerras e tragédias iminentes, naquele momento era apenas a deusa regente de um Santuário que hoje, está inundado pela paz e Saori Kido, a herdeira da poderosa Fundação Graad e que tinha como preocupação apenas, dar bom seguimento aos negócios deixados pelo seu saudoso avô, Mitsumassa Kido. Ao se lembrar do ente querido, a jovem não deixou de fechar os olhos e sorrir, sentindo uma leve pontada de dor feita pela saudade e tambéo deixou de fechar os olhos e sorrir, sentindo uma leve pontada de dor feita pela saudade e tamb curiom, a ansiedade ao pensar que logo, veria seus amigos de tão longa data. Sentia-se como uma garota insegura com o futuro e estava feliz por isso.

 

E assim...

 

‘- Vive la France!’  – gritou um animado Seiya, logo na plataforma de desembarque. O falso sotaque francês foi alvo mais uma vez de uma estrondosa gargalhada dos amigos.

 

‘- Hei, não grite tão alto! Vai espantar as mulheres!’ – Hyoga tenta diminuir o entusiasmo do colega.

 

‘- Ai, ai...’ – Seiya suspirou feito uma criança. – ‘As mulheres francesas são as mulheres mais belas do mundo!’

 

‘- Você errou! As mais belas são as brasileiras!’ – retrucou Shun. – ‘Aliás, vamos marcar de viajar para o Brasil na próxima?!’

 

‘- Para o Brasil?’ – Hyoga indagou e depois, fechou os olhos em um ar completamente malicioso. – ‘Mas temos que marcar de ir ao Brasil na época em que rola por lá as festas de carnaval. Tem gata brotando até do chão!’

 

‘- Festa? Mulher?! To dentro!!...’ – Seiya se exclamou completamente animado, mas sua animação se esvai quando sente sobre si um olhar completamente ameaçador... E ciumento.

 

‘- Hum, hum!’ – Saori temperou a garganta para que os rapazes se tocassem. – ‘Eu escolhi a França, porque uma grande amiga minha de infância me convidou para passar alguns dias aqui...’ – e olhando de canto de olho para um Seiya completamente acanhado, arremata. – ‘Mas se alguém não está gostando, o incomodado que se retire!’

 

Os três jovens engolem em seco, mas ao mesmo tempo, Shun e Hyoga tentam a todo custo segurarem uma tremenda gargalhada com a cara que Seiya faz para Saori.

 

Enquanto a conversa seguia de certa forma “animada”, Ikki estava completamente absorto em pensamentos longínquos. O pesadelo. A dor. A estranha sensação que sentia há vários dias. Virou-se e viu Seiya tentando dar explicações à jovem de rosto belo e emburrado e o sorriso de seu irmão e de seu outro amigo. Dizer a eles o que estava sentindo era completamente inconcebível, pois apenas Fênix conhecia o caminho certo naquele labirinto de sensações que sua mente estava desbravando naqueles últimos tempos. Claro que havia se aproximado mais deles, mas não o suficiente para que eles, até mesmo Athena, tocasse o seu espírito em chamas.

 

Assim, preferiu então, ver alguns panfletos que expostos no balcão de visto, tinham os mapas dos pontos turísticos da bela e contemporânea Paris. Após verificar alguns deles sem nenhum entusiasmo aparente, seus olhos ficaram fixos em um panfleto que tinha uma imagem bem ampliada da grande estrutura metálica, símbolo da capital francesa. Após seus olhos passearem mais um pouco naquele mapa, descobriu então que o primeiro lugar que iria conhecer, não ficava mais do que quinze minutos de táxi do Aeroporto.

 

‘- Hei! Aonde você vai?’ – Hyoga perguntou, vendo o cavaleiro de Fênix se afastar mais ainda.

 

‘- Dar uma volta.’ – ele respondeu sem olhar para trás.

 

‘- Dar uma volta? Mas você nem sabe falar francês!’ – Seiya retrucou, todo debochado.

 

‘- E você sabe?’ – Ikki devolveu imediatamente, sendo fuzilado pelo olhar por Seiya.

 

Shun deu uma pequena corrida até o irmão mais velho que já alcançava a imensa saída externa do Aeroporto Internacional.

 

‘– Nii-san, você vai ficar aonde? Em um hotel, na casa da amiga da Saori ou...’

 

‘- Não se preocupe comigo. Eu irei aparecer alguma hora dessas. Até.’

 

‘- Está certo.’ – Shun respondeu com um suspiro. – ‘Se cuida então.’

 

Andrômeda perde o irmão de vista, quando sua fisionomia finalmente havia se misturado com a grande massa de pessoas que começavam a tomar as vastas ruas e avenidas da cidade.

 

‘- Bem...’ – Saori se aproximou de Shun. – ‘Vamos?’

 

‘- Sim.’ – o rapaz respondeu com um breve sorriso, que tentava esconder a sombra da preocupação de seu rosto. – ‘Vamos.’

 

...x...x...x...

 

Nem tão grande como muitos diziam, nem tão pequena quando vista de muito próximo. Essa foi a primeira impressão que Ikki teve ao avistar ainda dentro do táxi, o pico da Torre Einfell, que se insinuava por detrás das frondosas árvores da Avenida Campos Elíseos. Ele ainda não tinha uma idéia exata de onde se hospedar e também concordava mentalmente com o que Seiya havia dito: ele não sabia falar nem um “a” em francês. Mesmo assim, sabia que poderia “sobreviver” em meio aquela selva metropolitana. Logo que saltou do táxi que estacionou na praça central de Paris, o cavaleiro que tinha como bagagem apenas uma mochila de tiracolo, olhou ao redor, percebendo a babilônia de raças e credos que a França era na realidade. Repentinamente, enquanto ainda contemplava o transitar de pessoas que ora andavam apressadas, ora caminhavam tranqüilamente, sentiu-se esbarrado. Ao se virar, ele viu com certa surpresa um rosto completamente pintado de branco, onde uma grande lágrima era bem contornada com lápis preto. Notou também que a pessoa estava completamente vestida de preto e que o olhava com acurada atenção. Fênix ainda pensou em pedir desculpas, mas o estranho fez uma severa expressão de desagrado e com as mãos, fez um gesto de como estivesse passando a marcha de um veículo, começando a “dirigir” um veículo imaginável que fazia serpenteios em meio às pessoas.

 

‘- Atropelado por um palhaço em seu carro imaginário. Que ótimo começo de viagem.’ – Ikki resmungou para si mesmo, mas mesmo assim, não deixou de dar um leve sorriso, com todo aquele ar novo que experimentava. E despreocupadamente, saiu a vagar até um dado momento em que avistou em uma das inúmeras esquinas que circundavam a praça, um belo Café de arquitetura à moda da cidade, com várias mesas espalhadas pela calçada cimentada.

 

Um fumegante capuccino e um exemplar do dia do jornal “Le Monde” foram deixados na mesa do japonês que maquinalmente, tomou o impresso a fim de pelo menos, registrar na mente as imagens fotografadas das notícias daquele dia que parecia ser um dia como outro qualquer. Porém, antes que seus olhos visassem às imagens impressas na primeira página, Ikki acabou por vislumbrar uma outra imagem.

 

Não estava mais do que cinco metros de distância de sua mesa. Sentada quase que formalmente, a jovem parecia bastante concentrada em um pesado livro que folheava vagarosamente. Os longos e lisos cabelos negros caiam sob a forma de uma brilhante cascata pelo seu pescoço e braços. Seu corpo era esbelto, mas, possuidor de redondas formas tipicamente femininas, onde a pele morena e levemente bronzeada fazia um belo contraste com a blusa de seda branca que discreta e sensualmente, tinha uma de suas alças decaídas, insinuando assim, o busto que arfava tranquilamente, embalando como se fosse um barco à deriva, um pingente dourado possuidor de um formato que o cavaleiro não soube identificar. Ela também usava uma calça jeans e sandálias de médio salto, comprovando assim, seu gosto ponderado para roupas.

 

E durante o breve momento no qual Ikki a olhava, a moça de repente levantou o rosto, encarando os olhos azuis que a estudavam. Finalmente, o cavaleiro conseguira vislumbrar o rosto de formas delicadas e possuidor de olhos castanhos amendoados e expressivos que em momento algum se desviavam dos olhos dele. E era essa forte expressão que o olhar daquela desconhecida possuía que estava fazendo com que o cavaleiro tivesse a incomoda sensação de que todo o seu espírito estava sendo implacavelmente desbravado, e que todos os seus segredos mais íntimos estavam sendo totalmente revelados a ela. Era como se ele já tivesse sido alvo daquele mesmo olhar, daquela mesma mulher. Mesmo assim, ele não queria retirar seus olhos dos dela. Queria ficar daquele jeito. Sempre.

 

Entretanto, dois personagens se fizeram presentes, quebrando o frágil elo que já parecia os unir. Dois rapazes se sentaram à mesa em que ela estava. Eles riam bastante. Ela parecia que não os conhecia, pois continuava séria. Um deles fechou o livro dela bruscamente, enquanto outro acariciava o braço dela que imediatamente, afastou de sua carícia, imediatamente se levantando. Eles também se levantaram e agora alterados, falavam mais alto, fazendo com que o rosto da jovem perdesse levemente a cor rosada. Rapidamente, o homem de aparência mais robusta a segura por trás, enquanto o outro tentava aproximar seus lábios dos dela. Antes que conseguisse seu intento, ele recebeu um inesperado chute entre as pernas dado por ela.

 

‘- Vach!’ (Vaca!) – o que havia recebido o golpe gritava contrariado. – ‘Il me paiera!’ (Vai me pagar!)

 

O outro homem segura a jovem com mais força e se viram, rumo a saída da cafeteria. Mas antes de darem um segundo passo...

 

‘- A soltem agora.’

 

Os três se viram e a moça dá um sorriso, mesmo com o medo que sentia naquele momento. Os homens o encaram e o mais magro se aproxima de Ikki que o encarava de uma forma completamente desprovida de emoção.

 

‘- Je ne comprends pas sa langue Japonaise, mais s'il ne veut pas blesser, donnez l'hors d'ici maintenant.’ (Não entendo a sua língua japonês, mas se não quiser se ferir, dê o fora daqui agora mesmo.) – ele ameaçava enquanto retirava da jaqueta uma pequena navalha.

 

Ikki não entendeu o que o outro falava, mas isso não era o mais importante. Ele sentiu que ela precisava de ajuda e sem dúvida, ela teria o socorro dele. Por isso, ele caminhou ao encontro do francês que sem titubear, se lançou contra ele. Com um rápido movimento, Fênix se desvia de um certeiro golpe da pequena arma e ainda mais veloz, ele segura a mão do homem e com força, faz com que a lâmina da navalha se feche na mão do homem, provocando um ferimento profundo. A pressão é tão forte que a lâmina acaba se desprendendo e arranha a mão do cavaleiro também.

 

Ao ver o companheiro gritando de dor e espanto, o maior solta a morena com brusquidão e parte para cima de Ikki com uma outra navalha, aproveitando a distração do cavaleiro. Mesmo assim, o nipônico é mais veloz e o acerta com um soco na altura do estômago. Vendo o amigo caído ao chão e a aproximação da polícia de rua, o homem ferido pela navalha saiu correndo, sendo então perseguido por dois guardas enquanto um terceiro algemava o homem mais forte, ainda gemendo ao chão. Ikki apenas observava a ação dos policiais, quando sentiu um toque delicado em seu braço.

 

‘- Arigatou.’ – a moça agradeceu.

 

‘- Não precisa agradecer.’ – Ikki respondeu imediatamente. – ‘Você fala japonês?’

 

‘- Sim. Aprendi com uma amiga há alguns anos atrás. Err... Você é bem rápido, não?’ – ela aquiesceu enquanto fazia um gesto de golpe com o braço.

 

‘- Foi apenas reflexo. Eles eram seus amigos?’

 

‘- Amigos?! Não! Nem os conheço!’ – a morena respondeu velozmente. – ‘Eram apenas uns desocupados. Paris está repleta deles.’

 

“E vazia de mulheres lindas como você.” – Ikki pensou, vindo logo em seguida a se censurar pelo pensamento.

 

‘- O que aconteceu, monsieur?’

 

‘- Err... Nada.’ – Ikki respondeu, imaginando que aquela estranha conseguira mesmo ler a sua mente.

 

‘- Como nada? Sua mão está sangrando!’ – ela interrompeu preocupada, enquanto procurava examinar a mão ensangüentada de Ikki. – ‘Vamos. Eu vou levá-lo para um hospital e...’

 

‘- Isso não é nada, não se preocupe.’ – disse o cavaleiro enquanto puxava o braço das mãos dela gentilmente. Estava sentindo que aquele simples toque o havia deixado com mais calor que o normal.

 

‘- Hum... Já sei! Tem medo de agulhas, não é?’

 

‘- Eu? Medo de agulhas? Não me faça rir!’

 

‘- E você não me faça ficar mais preocupada com esse ferimento! Vamos nem que seja para uma farmácia! Eu prometo que serei uma enfermeira boazinha e não farei você sentir nem uma dorzinha sequer!’ – ela voltou a tocar o braço dele e Ikki sentiu novamente o calor provocado pelo toque lhe subir pelos nervos rumo a todos os extremos do corpo.

 

“Quem é você?” – Ikki se indagou, desejando muito saber um pouco mais sobre aquela bela estranha que o cativou. Mas para o desagrado de Fênix, seus lábios proferiram outras palavras. – ‘Está bem, você ganhou.’

 

‘- Ótimo!’ – a jovem falou com um largo sorriso.

 

Alguns minutos depois...

 

‘- Pronto! Agora é só você trocar as bandagens regularmente e logo sua mão vai está como nova!’

 

‘- Não precisava se preocupar... Foi só um arranhão.’

 

‘- Eu sei, mas fiquei preocupada com tanto sangue na sua mão!’

 

‘- Era mais o sangue dos caras que te perseguiam do que o meu. Eu não sou de sangrar muito.’ – o japonês respondeu enquanto examinava o curativo que ela havia feito nele. – ‘Mas confesso que você é caprichosa. Por acaso é enfermeira mesmo?’

 

Ela ergueu um pouco a cabeça, enquanto ria com a pergunta feita por ele. Porém, o som de seu sorriso foi abafado pelo farfalhar das águas de uma fonte, onde eles estavam sentados na borda. Nesse momento, Ikki percebeu que o pingente que ela usava se assemelhava a uma cruz cristã, mas que se fosse vista bem de perto, daria para perceber alguns escritos talhados na peça.

 

‘- Eu não sou enfermeira, nem médica. Sou arqueóloga e tentando obter a especialização em Egiptologia!’

 

‘- Arqueóloga?’ – Ikki indagou enquanto franzia o cenho. – ‘Tipo Lara Croft ou Indiana Jones?’

 

‘- Não, monsieur. Tipo Ísis Alquiè.’ – ela meneou a cabeça para o lado, enquanto o fitava com certo ar de doçura. – ‘Esse é o meu nome.’

 

‘- Ísis.’ – Ikki repetiu com uma incomum atenção. – ‘Esse nome não é estranho para mim...’

 

‘- E não é mesmo. É o nome da deusa egípcia da magia.’ – ela respondeu imediatamente. – ‘E você? Como é o nome do meu herói?’

 

Ele sorriu levemente ao ouvir a palavra “herói”. – ‘Meu nome é Ikki. Ikki Amamiya.’

 

‘- Ikki?!’ – Ísis falou surpresa. – ‘É um nome lindo! É uma remitência ao herói grego Ícaro que morreu ao...’

 

‘- Voar além do permitido por seu pai.’ – o cavaleiro falou, calando a jovem que ficou um tanto frustrada por não poder expor mais dos seus conhecimentos. – ‘Acredite. De mitologia grega eu sei até demais.’

 

‘- Então isso é ótimo! Sabia que está muito difícil de encontrar um homem erudito por aí?’

 

‘- É?’ – ele perguntou de uma forma debochada. – ‘Então quer dizer que eu sou uma espécie em extinção?’

 

‘- Se você gosta de se referir a si mesmo como um bichinho de estimação, oui, você é uma espécime muito rara!’

 

‘- Prefiro referir-me como uma ave.’ – ele observou misteriosamente.

 

‘- Uma ave? Tudo bem, que assim seja. Está hospedado aonde?’

 

‘- Eu não sei.’

 

‘- Como assim não sabe?’

 

‘- Eu ainda não encontrei um hotel.’

 

‘- Entendo...’ – e depois de alguns segundos calada, disparou. – ‘Mas como é alta estação, ficará difícil de você encontrar uma vaga nos hotéis daqui... Que tal você ficar hospedado em minha casa?’

 

‘- Na sua casa?’ – Ikki fez uma expressão de descrença. – ‘Não acha perigoso convidar um estranho para se hospedar na sua casa assim... logo de cara?’

 

‘- Não acho perigoso.’ – ela respondeu imediatamente. – ‘Você não é estranho a mim.’ – a morena se calou logo em seguida, esperando a resposta dele.

 

‘- E se eu disser um “não”?’

 

‘- Então você perderá a chance de ouro de ter uma guia turística que fala fluentemente a língua nipônica e que não cobrará um centavo sequer pelos seus serviços!’

 

“Fica impossível dizer um ‘não’ com esse sorriso.” – o rapaz pensou, mesmo mantendo um ar sério. Ele era assim. Os eventos por quais passou durante toda a sua vida o fizeram manter sempre um ar sério e quando sorria, tinha sempre um ar de sarcasmo. As tragédias pelas quais passou, criaram nele uma espécie de cortina por sobre os seus sentimentos. Mas ao contrário do que muitos poderiam imaginar, Fênix tinha mais sentimentos do que muitos que se diziam sensíveis.

 

‘- Ísis, veja. Eu não quero ser um incômodo a você e...’

 

‘- É só isso? Então está tudo “ok”! Vamos agora mesmo!’ – e sem deixar Ikki com meios de se sair daquela situação, ela o puxa pela mão, indo até um táxi.

 

‘- Você é sempre assim?’ – ele perguntou perplexo enquanto era “arrastado” pela francesa.

 

‘- Apenas com o que eu desejo muito.’ – ela devolveu, com um sorriso maroto.

 

‘- Por Deus...’ – ele suspirou.

 

‘- Mon Dieu!’ (Meu Deus!) – Ísis exclamou, parando abruptamente.

 

‘- O que foi?’

 

‘- Que dia é hoje, Ikki?’

 

‘- Doze de março.’ – ele respondeu, pensando logo em seguida. - “O que deu nela agora?”

 

‘- Ai não!’ – ela colocou uma das mãos na testa. – ‘Ela chega hoje e nem me toquei disso!’

 

‘- Ela?’ – Ikki estava cada vez mais confuso.

 

‘- Oui! A minha amiga! Ela veio passar uns dias na minha casa e me esqueci que ela viria hoje! Ela vai me matar!’

 

E imediatamente, a jovem dá meia volta, mas dessa vez Ikki a pega pelo braço. – ‘Hei, aonde você vai?’

 

‘- Para o Aeroporto. Acho que ela ainda deve estar por lá.’

 

‘- Não seria melhor você ligar primeiro para saber se ela já foi para a sua casa?’

 

‘- Boa idéia, monsieur.’

 

E assim, ela ligou e recebeu a notícia de que sua convidada já havia chegado a sua residência. E sem tempo a perder, o casal pegou o táxi, rumo a um bairro um pouco mais afastado do centro de Paris.

 

Continuará.

 

Revisão: Juliane Sandoval.

 

 

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Ficha do personagem original:

 

Ísis Alquiè

 

Idade: 21 anos.

Altura: 1,69 metros.

Peso: 50 quilos.

Pele: morena-clara.

Cabelos: castanho-escuros.

Olhos: castanho-escuros.

Local de nascimento: Egito.

Onde vive: Paris, França.

 

Breve perfil.

 

Ela sabe que seus verdadeiros pais eram egípcios e dada a circunstância de como foi encontrada, talvez eles fossem nômades também. Mas quis o destino que sua vida não fosse fadada aos sacrifícios e isso realmente aconteceu quando um arqueólogo francês chamado Jeromè Alquiè a encontrou durante uma escavação em um famoso templo da deusa egípcia Ísis em Behbeit el-Hagar, por isso, deu-lhe esse nome, em homenagem à deusa.

 

Ao contrário do real significado de seu nome que em grego quer dizer “Aquela que chora”, Ísis é muito alto astral e jura não se lembrar qual foi a última vez que chorou de tristeza. Mas é bom alertar que como toda mulher, não é muito recomendável chegar perto dela nos períodos de TPM (XD!). Ela adora exercer a profissão de arqueóloga e no momento, ela está preparando uma tese de especialização onde afirma que os seus personagens mitológicos prediletos (Ísis e Osíris) realmente existiram e que foram os primeiros reis do Egito.

 

Católica, Ísis tem como santa protetora, a francesa Joana D’arc e ao invés de sonhar com o príncipe encantado, ela prefere dizer que espera com paciência pelo seu “Osíris”, fazendo alusão ao mito mais famoso do Egito. Mas dizem as más línguas que a moça já está perdendo a paciência pela demora dele!

 

Atualmente, Ísis convive entre as aulas de arqueologia da Universidade de Paris e as viagens ao Egito, entre estudos e relatórios infindáveis. Mesmo assim, ela sempre arruma um tempinho em sua agenda apertada para estar na companhia dos seus melhores amigos, os estudantes de arqueologia Roxane Whinttfield e William W. Thompson e para se dedicar a sua grande paixão, as aulas de esgrima com o professor Albert Theodore.

 

Mas de todos os amigos, Ísis sempre teve como melhor amiga e confidente, a rica Saori Kido, que a conheceu quando esta veio estudar na França, ainda menina. Agora, depois de mais de doze anos longe uma da outra, Saori finalmente viajou até a França, a fim de rever a amiga e colocar as confidências de longa data em dia.

 

Mas parece que o destino novamente quer brincar com a sorte de Ísis, a começar pelos seus sonhos e visões incompreensíveis e pelo seu encontro tempestivo com certo japonês...

 

Continua...

 

 


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