A Tempestade escrita por French Lily


Capítulo 4
quatro: covarde


Notas iniciais do capítulo

Rod e Gilbert de volta. Tentei melhorar a caracterização, e infelizmente acho que a fic vai se estender mais que o previsto - eu não gosto de longfics, admito XD Bem, estou à espera de opiniões. Espero que gostem~



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A condição de neutralidade de Vash Zwingli constituía mais um ameaça que uma vantagem. Não era porque o suíço não cedera à sua proposta de aliança que não estava propenso a aceitar nenhuma outra.

Com estes pensamentos em mente, Ludwig arquitetava em silêncio seus próximos movimentos. Aquilo era um jogo, uma partida de xadrez, e lhe faltavam peças valiosas. O poderio bélico do suíço, ainda que velado e guardado em verdadeiras fortalezas, poderia tornar-se, em mãos alemãs, uma valiosa carta na manga. A força de Vash decididamente convenceria Gilbert a reassumir seu lado no front – e, quando o dia chegasse, seria a garantia do sucesso de sua investida-relâmpago.

Por hora, porém, teria de se contentar com a força bruta do irmão – atrás do qual, pensou, com desânimo, ainda teria que correr atrás.

O caminho até o casarão de Roderich Edelstein lhe parecia um misto de nostalgia, saudade e melancolia. Voltar ali, depois de tanto tempo, era um encontro com memórias que há muito ele aceitara deixar para trás.

Mas aquilo não devia demorar. Ludwig mantinha a vaga esperança de que o austríaco compreenderia suas intenções, e cooperaria sem reagir. Quem sabe, até, ele não podia sair dali com Gilbert em uma das mãos e Roderich em outra? Sim, o surto de rebeldia do irmão já devia ter passado àquela altura, e o moreno devia estar fraco demais para resistir... Mais calmo, agora, Ludwig limpou as botas no tapete à porta, e deu um suspiro rígido. Deu três batidas longas no portal envelhecido, e aguardou.

Roderich não parecia ter implantado nenhuma melhora na segurança. Apesar do clima de conflito, não se viam vigias ou soldados, cercas eletrizadas ou qualquer tipo de proteção. Seria ele tolo o bastante para pensar que suas próprias mãos, sozinhas, seriam capazes de defendê-lo? Ludwig deu um sorriso de pena e pigarreou antes que o atendessem.

— Por alguma razão, isso não me surpreende — afirmou, sério, antes que seu interlocutor dissesse qualquer coisa.

— Que saudade, irmãozinho — ria-se Gilbert, apoiado ao batente. Sua expressão era de vitória e um orgulho quase infantil. — Você fez a barba? Fica melhor assim.

— Vim conversar com o dono desta casa, e desconfio que não seja você. Onde está o Edelstein?

— Infelizmente acho que desta vez você errou, maninho — o albino bagunçava os cabelos com um ar de desapontamento. — A casa é minha, sim. Você não ficou sabendo? Nós nos casamos ontem.

— M-mas o quê... Que tolice é esta? — antes que Gilbert pudesse ir mais longe com suas provocações ao irmão, Roderich apareceu ao seu lado. Ludwig, que se assustara com a brincadeira do outro, recompunha-se após vislumbrar o moreno com o irmão, e cumprimentou-o com polidez e firmeza.

— Calado, Gil — disse o austríaco, indicando que entrasse, ao que Gilbert, rindo deliciosamente, obedeceu. — Creio que seu irmão tenha assuntos de severa importância a tratar comigo.

— Muitas boas tardes, meu caro Roderich — disse Ludwig, que mantinha uma postura impassível.

— Muitas boas tardes, Ludwig — repetiu o outro. — Quais as boas novas?

Sem dar tempo para que o silêncio se instalasse, o loiro adiantou-se a falar.

— Quais as chances de o senhor estar ciente de minhas intenções para consigo? — com um pedantismo forçado, Ludwig tentava fazer graça da finesse de seu interlocutor.

— Todas as chances — respondeu Roderich com calma. — Assim como vossa senhoria decerto sabe que infelizmente não possuo intenção de entregar-me. Se sua visita tratava-se somente disso, muito boa tarde. — o moreno fez menção de fechar a porta, mas o visitante simplesmente suspirou com impaciência e o impediu.

— Suponho que esteja tendo problemas com um visitante indesejado.

— Ah, não, de maneira alguma — a expressão de Roderich era de surpresa. — Estou perfeitamente bem, muito agradecido.

— O que acha que ele pode proporcioná-lo? Proteção? — Ludwig deu um riso de escárnio. — Sabe que meu caro irmão não está em condições de opor-se a mim, exatamente como o senhor. Logo...

— Acho que não entendeu direito, meu caro Ludwig — de alguma forma, Roderich mantinha-se em completa tranquilidade, como se já esperasse pela visita. — Sou eu quem o está protegendo. Gilbert Beilschmidt desgarrou-se de seu comando, veio até mim noite passada, pediu-me asilo e... Bem, como o senhor próprio pode ver, eu concedi.

— Concedeu refúgio a ele? — perguntou o loiro, atordoado. — Infelizmente, ele não é válido. Gilbert deverá voltar comigo, e agora.

— Você não pode requisitar o retorno de um refugiado, Ludwig. Sabe bem como estas coisas funcionam. Ele está em minha casa, sob minha proteção, e, a partir do momento em que ele me pediu refúgio, você perdeu o poder sobre ele. Eu sinto muito, mas, sem minha permissão, não vai tirá-lo daqui.

— Isto não está certo. Isto não pode... Depois de tud... — a expressão do alemão ganhava ares de pavor. A força do irmão era necessária para fortalecer suas bases. Como prosseguir na guerra sem ele? Com a resistência austríaca, Ludwig poderia lidar. Mas, com Gilbert em sua casa... — Depois de tudo o que ele te fez, ainda vai abrigá-lo?

— Não compreendo sua objeção. Minha derrota é tão vital assim para seu exército, meu amigo?

— Não era este o objetivo de nossa conversa.

— Ludwig, perdoe-me. Teremos que parar por aqui.

— Pense no que está fazendo, Edelstein. Pense... No risco que corre, vivendo sob o mesmo teto que ele! Não se engane, Roderich...

— Estamos em guerra, Ludwig, meu caro – explicou o moreno. — É uma questão de diplomacia. E sobre isso... — ele lançou um rápido olhar para o lado de dentro, de onde Gilbert, curioso, tentava entreouvir a discussão. — Penso que o senhor saiba muito mais do que eu.

— Sabe que ele não está tentando te salvar, não sabe? — O alemão tentava parecer sinceramente preocupado, e essa sua afirmação pareceu, por um instante, fazer hesitar o outro. Constatando isso, animou-se a prosseguir. — Ele quer ficar com a consciência limpa. Meu irmão sabe a quem deve sua lealdade...

Roderich pareceu não respirar por um instante.

— E realmente não creio que ele vá manter-se contra mim.

— Eu também não — apressou-se o austríaco, parecendo, pela primeira vez, ligeiramente abalado. — Mas talvez seja a hora de este homem cansado começar a correr alguns riscos.

Como se fosse incapaz de compreender a decisão do anfitrião, Ludwig deixou-se vencer. Ele ainda não estava em desvantagens, ao menos não muito, e ele podia esperar. Um pouco. Seria incômodo, sim, mas não havia razão para permanecer discutindo com Roderich Edelstein.

Muito pelo contrário – Ludwig deixaria que as coisas se ajeitassem sozinhas.

O olhar do austríaco, que ainda ostentava uma sombra tristonha, ergueu-se, e os olhos violetas faiscavam por detrás dos óculos antigos.

— Entenda isso, Ludwig... Enquanto estiver aqui, você não tocará em um fio de cabelo do Gilbert Beilschmidt.

O louro não respondeu. Com uma continência, retirou-se sem nada dizer, cedo demais para que pudesse ver o irmão retornar ao batente do luxuoso portal.

— Mandou bem, aristocrata. Quase pensei que você fosse durão.

Gilbert sorria, mas algo em seu olhar denunciava o desconforto por ser a causa da discussão entre o irmão caçula e o austríaco. Fez menção de provocar o moreno, jogando sobre seus ombros um de seus braços, mas desistiu. A tensão que se formava entre os dois era apenas um prenúncio do que estava por vir.

— Chega a ser vergonhoso admitir que fiz isso por sua causa — resmungou Roderich. — Mas acho que as coisas estão acontecendo como deveriam. No fundo, acho que...

— Não queria realmente se entregar, não é?

A expressão do albino encheu-se de uma seriedade tão rara que Roderich lançou-lhe um olhar de surpresa, sem saber o que responder. Era verdade.

— Eu entendo — continuou Gilbert. — Você pode ser um aristocrata exibido e fresco, mas não é um covarde.

— Muito obrigado.

— Não acho que haja espaço para dois de nós, e de covarde já basta eu, não é? Afinal, é isso o que todo mundo parece pensar de mim agora. — o rosto do prussiano dividia-se entre o sério e o humor, e Roderich perdeu as palavras por um instante.

— Se... Se essa sua covardia — começou, um tanto relutante. — Me salvar a vida, eu só poderei ser grato.

Kesesese — rindo deliciosamente, Gilbert bagunçou os cabelos do moreno, o que só fazia irritá-lo.

— Por Deus — reclamou Roderich, enquanto ajeitava os próprios cabelos e os óculos. Gilbert já se afastara, e subia a escadaria. — Por que eu não deixei que Ludwig levasse você?

O albino parou e virou-se para responder, com um sorriso infantil de satisfação e, por alguma razão, agradecimento.

— Admita, você ia totalmente sentir a minha falta.

Roderich não respondeu, bufou, e brincou de ignorá-lo.

Gilbert, que já se voltara à escada, não pôde vê-lo sorrir.


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Notas finais do capítulo

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