Highway To Glory - Season 2 escrita por ThequeenL


Capítulo 9
Nove - Clove


Notas iniciais do capítulo

Uai gente, cadê os leitores da fic? O último cap. passou quase despercebido por vocês! Mesmo sendo meio morninho pensei que alguém iria se manifestar ao menos para reclamar dele. De todo jeito, aqui está o capítulo novo (que espero ser mais legal que o antigo). Tomara que nesse o feedback seja maior.
bjs e boa leitura.



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O dia já começa com dificuldade. Logo cedo a sirene de alerta toca e somos todos obrigados a nos reunir na sala central para receber a nova informação, que não era tão boa. Assim que o aposento ficou cheio, Coin se pronunciou:

“A praça virou terra de ninguém. Milhares de rebeldes se posicionam de um lado, enquanto pacificadores são obrigados a recuar do outro. Alguns dos revoltosos estão armados, mas a maioria atira pedras ou outras coisas encontradas nas ruas. Teremos de agir pela tarde, quando a confusão diminuir. Dois aerodeslizadores do D.13 já estão sendo preparados e munidos para vir ao D.2 participar da ação, e devem chegar por volta das 16h. Às 13h a sede de comando será transferida para o Edifício da Justiça, e os esquadrões restantes se dividirão entre as demais sacadas dos prédios em torno da praça, assim teremos possibilidade de acatar por cima, caso seja necessário. Até lá, vocês ficarão aguardando novas orientações. “

Ninguém parecia muito contente com as atualizações de Coin, que partiu de volta para o 13 logo em seguida. Katniss conversava com Haymitch muito preocupada, provavelmente esperando notícias de Peeta. Ontem após a reunião escutei um dos soldados comentar com Lyara que ele havia sido telessequestrado, e que provavelmente o estavam torturando diariamente na Capital. Lyara ordenou que, logo após a operação de hoje, fosse montada a equipe para o resgate de Peeta. Penso em ir até Everdeen contar sobre o que sei, mas o próprio Haymitch já deve a estar informando disso. 

No tapete central, o gato faz cócegas na barriga de Phia, deitada no chão. Muitos soldados ficaram curiosos com eles, nunca tinham visto uma criança da Capital. Não que eu pense que todas sejam iguais a ela, de cabelos brancos com pontas lilás e olhos e unhas roxas, mas imagino que sim, sejam sempre tão excêntricas quanto os pais. Loivissa, felizmente, não aparece no meu campo de visão desde que chegamos ao 2, ao contrário de Cato, que fica me olhando do outro lado da sala. Decido ir falar com Thorment, já que é o único com quem tenho um pouco de intimidade para conversar e não parece ocupado, apenas observando sua comandante falando com Gale.

“Acabamos conhecendo a Lyara, ein?” Tento puxar assunto e ser educada, embora minha voz seja claramente fria. Ele continua olhando-a por uns segundos, até reparar na minha presença.

“Não é mesmo?” Ele responde, sem jeito. Hm.

“Você parece interessado.” Falo direta. Ele olha para mim preocupado, e sou obrigada a sorrir, porque a cara que ele faz é realmente engraçada. Me lembrou a expressão da menina que matei na fogueira, no início dos Jogos.

“Não tem por que rir, Ruthless. Só estou surpreso, porque a imaginava muito mais velha e mais...”

“Feia?” Pergunto para provocar. Ele revira os olhos e me puxa pelo ombro em direção a outra parte da sala.

“Vamos parar de conversar inutilidades e apresentar você formalmente aos outros vencedores, já que estaremos todos no mesmo esquadrão daqui pra frente, que tal?”

Sem escolha, sigo Thorm até onde Johanna e Finnick estão conversando animadamente. Eles interrompem o assunto assim que nos aproximamos. Thorment me apresenta antes que eu possa fazê-lo por mim mesma, o que me irrita um pouco, já que tenho voz própria.

“A atiradora de facas” Exclama Johanna.

“Até que é bem bonitinha” Finnick comenta. Torço o nariz, e eles dão uma risada. “Acompanhamos você nos jogos pela TV. Era a aposta de Johanna”

“Depois da Katniss, claro. Mas só porque aquele 11 que ela ganhou nas avaliações individuais me deixou curiosa.” Johanna completou. Conversei com eles durante um tempo, até perceber que Cato se aproximava, então fui procurar Enobária. Não estava com paciência para lidar com ele hoje.

Conversei com minha antiga orientadora até o horário do almoço, que passou voando. Antes mesmo de recolherem os pratos já estavam todos arrumando suas coisas para a mudança da sede. Fomos transferidos em carros blindados (disponibilizados pelo 13), e pude ver a confusão que se dava na rua. De fato, os pacificadores estavam em desvantagem, mas não saberia dizer até quando ficariam sem pedir reforços. Os rebeldes já tinham sido avisados da presença do comando no Edifício da Justiça, no entanto, ninguém além de nós sabia sobre o plano de ataque à Noz, para evitar que a informação vazasse e chegasse até os ouvidos de Snow. Essa medida me preocupou bastante.

Embora tenha apoiado a idéia de Gale, e das coisas de disse a Cato, tenho que admitir que não ficaria inerte à situação. Desde que cheguei, só no que consigo pensar é em meu irmão, indo para a escola como se nada tivesse acontecendo no centro na cidade. Assim como ele, a maioria do distrito fechava os olhos a tudo que não fosse televisionado. Agradeci ao universo por manter essa confusão toda longe dele. Talvez meu pai fosse trabalhar hoje, no centro da Noz, mas minha maior preocupação era em como eu iria explicar ao Nial que ele não iria mais voltar, depois de hoje. Minha mãe deve estar muito ocupada, recebendo as encomendas da Capital, para se dar ao trabalho de falar com ele, a empregada quem cuida e o busca na escola. Quem sabe quando tudo tiver terminado eu não possa dar uma passada para vê-lo antes de ir para a próxima missão...

15h. Gale está explicando, pela vigésima vez, a logística do plano, como se ninguém a tivesse decorado. Vou até a distrito 12 depois que ele encerra as orientações. Ela está roendo as unhas perto da janela.

“Preocupada?” Pergunto.

“Você não? Estamos a poucas horas de explodir a central do seu distrito.”

“Todos que me importam estão do lado de fora da Noz” Respondo. Katniss mantém o olhar firme na grande montanha.

“Eu não seria capaz de entrar lá nem por um momento.”  Ela fala. Posso compreender, já que seu pai morreu dentro de uma mina.

“Quando isso aqui acabar, vamos para o D.13 e você vai se sentir melhor.”

Katniss fez uma careta, como se tivesse engolido algo amargo.

“Você não pode nem imaginar como é o D.13. Às vezes penso que sou ainda mais presa quando estou lá dentro. Nem o Peeta gostou muito do lugar, antes de ser levado...”

“Katniss, sobre o Peeta...” Tento informá-la, meio receosa de sua reação. Ela se vira para me olhar com atenção

“Ele foi telessequestrado, já me informaram disso. É um dos motivos que fazem ser quase impossível ficar aqui nesse lugar. Eu deveria estar numa equipe de salvamento dele agora.”

Fico em silêncio, apenas por não ter uma boa resposta. Katniss e eu nunca fomos amigas, mas o que passamos na arena nos fez próximas o suficiente para nos importarmos – mesmo que pouco – uma com a outra. Sem querer, acabamos ficando um pouco parecidas, meio secas, com ar de viúvas. A diferença era que Peeta tinha se distanciado devido a um infortúnio, e Cato, por vontade própria. Era como se todos na sala pudessem perceber algo de errado, e estivessem nos dando os pêsames. É irônico como nós somos o símbolo da força, da resistência. No fim do dia, o Tordo é quem mais merece ser salvo.

Everdeen aperta de leve meu braço, em sinal de agradecimento, e se desloca para o outro lado da sala, carregando uma nuvem negra em volta de si. Gale tenta abraçá-la, mas parece que nem ele pode suprir a falta de Peeta. Decido ficar um tempo na janela, pensando em nada, vendo as fogueiras na praça e as pessoas, algumas correndo, algumas no chão.

15:20. Estou prestes a me mover para longe da janela, quando escuto o sibilar ofídio de uma voz próxima do meu ouvido

“Admirando a vista, Clovezinha?” Loivissa questiona, para o meu desprazer. Continuei estática como se não tivesse escutado nada além de um leve zumbido, mas ela não se deu por vencida.

“Engraçado o que a gente acaba ficando sabendo aqui na base, não é? Eu estava bem fazendo um lanchinho pro Cato na cozinha quando escutei a Coin falando sobre o dia de hoje, logo antes de ir embora. Você sabe que dia é? Dia de levar os filhos ao trabalho na Noz!”

Meu olho arregalou instantaneamente. Ela só está querendo me provocar. Ela só está querendo me provocar. Ela só está querendo me provocar. Bem, ela conseguiu me provocar.

“É mentira” Respondi de volta. E realmente, era só o que podia ser.

“Será que é mesmo? Talvez eu esteja mentindo sim, há essa possibilidade. Mas, se for verdade, você acha que vale a pena arriscar não me escutar?”

“Lyara jamais permitiria que explodíssemos a Noz se tivesse uma criança por cada adulto lá dentro.”

“Pode ser que ela nem saiba, queridinha. Tenho certeza que a Coin jamais contaria a ela. E Gale, por exemplo, se soubesse, também ficaria de bico calado. Eles topariam qualquer coisa para explodir aquele monte de pedra logo.”

Depois disso não tive tempo para raciocinar. Agora pensando vejo que tinha muitas coisas que eu poderia ter feito. Eu poderia ter ido falar com Lyara, ela averiguaria a informação e suspenderia o ato, se necessário. Eu poderia ter ido falar com Katniss para confirmar com Gale, e ela mesma daria um jeito de impedir qualquer loucura. Eu poderia simplesmente ter esganado Loivissa e fingido que nada tinha acontecido. Mas não, eu abandonei todo tipo de pensamento racional, porquê não conseguia tirar Nial da cabeça. Ele adorava o trabalho do pai, e sempre pedia para ir com ele, para ficar na sala só observando. Comecei a imaginar ele lá dentro, correndo enquanto a avalanche acontecia, e tive certeza que não, não valia a pena arriscar.

Só tive tempo de apanhar uma mochila qualquer e ir correndo até o elevador. Não falei com ninguém, e fui silenciosa para não ser percebida. Caso dessem por falta de mim dariam um jeito de me impedir, eu bem sei. O elevador foi rápido, mas assim que pisei no térreo escutei alguém descendo as escadas, e suspeitei que podia ter sido vista. Fui ainda mais depressa para a rua, onde era quase impossível escutar uma coisa só, e enrolei um lenço no rosto para não ser reconhecida. Eu tinha menos de meia hora para achar meu irmão na Noz e tirá-lo de lá.

15:45. Consigo pegar um trem na estação da praça, e olho desesperadamente para o relógio no pulso. A mochila que trouxe contém duas máscaras de oxigênio, algumas armas e materiais de primeiros socorros, além de um celular e uma corda. O trem chega dentro da Noz, que está abarrotada de pessoas entretidas em seus afazeres, sem sequer imaginar o que está para acontecer.

A sala do meu pai fica bem ao fundo, no subterrâneo da montanha, e é, portanto, o local a ser mais danificado quando esta for atingida. Os elevadores estão lotados então uso as escadas, que parecem não ter fim.

O relógio central bate às 16h, e meu coração gela. Começo a descer as escadas quase voando, sem sequer me importar em atropelar ou não quem estiver na minha frente. O bombardeio começou pontualmente, mas ninguém mudou seus afazeres. Ataques à Noz eram comuns, e sempre improdutivos. Só eu sabia a proporção do acontecimento.

Finalmente consigo chegar ao andar do escritório, e o corredor parece simplesmente infinito. A sala é uma das últimas e quando chego lá a porta está... Trancada.

Trancada? Meu pai sequer veio trabalhar hoje. Pensando bem, ele provavelmente foi avisado, justamente por ser meu pai. Como eu pude ser tão burra a ponto de acreditar no que aquela cobra loira estava tentando me vender? É tão óbvio agora que a Lyara tivesse dado um jeito para que a minha família e a de Cato estivessem a salvo na hora do ataque, que nem consigo dimensionar a raiva que sinto pela minha própria estupidez.

A terra começa a tremer, e sei que as avalanches já começaram. O pessoal começa a correr preocupado, a sirene de emergência é acionada e uma voz nos alto falantes pede para que todos mantenham a calma. Eu sento no chão e começo a ter um ataque de riso, porque sei que vou morrer aqui dentro. E é tão engraçado, que eu não consigo parar. Eu vim exclusivamente para morrer aqui dentro.

É quando alguém me puxa pelo braço. Penso que é só um dos trabalhadores daqui e tento ignorar, mas a pessoa me chama pelo nome e me põe nas costas sem nenhuma licença, e percebo que aquele toque, aquela voz, me são familiares.

“Cato?” Pergunto incrédula. Quase não consigo escutar a minha própria voz, devido aos gritos gerais. Ele provavelmente não me escuta, mas posso reconhecê-lo, ainda que no meio da poeira toda que sobe cada vez mais. As luzes começam a falhar até se apagarem por completo, e o ar fica cada vez mais pesado.  Somos guiados por um sinalizador que Cato trouxe em uma das mãos, e as poucas cenas que ele ilumina a nossa volta me deixam sem palavras: pessoas gritando em pânico, pisotendo umas as outras enquanto batem – inutilmente- contra as saídas de ventilação e tentam impedir que o interior da Noz seja engolido por suas próprias pedras. Alguns tiros podem ser ouvidos, e centenas de pessoas caem incontáveis metros no vão das escadas, ao tentarem se salvar. O estrondo de vários corpos consecutivos caindo dos andares me dá agonia, e peço a Cato para parar de andar, só por um minuto.

Ele me ignora, tossindo muito por causa da terra suspensa no ar. Abro a mochila, coloco uma das máscaras e estendo a outra para ele, que pausa a corrida por um instante para colocá-la.

“O que você está fazendo aqui?”Grito o mais próximo possível de seu ouvido, para aumentar as chances de ser escutada, mas antes que ele pudesse responder uma multidão desesperada nos empurra para frente. Cato me põe no colo rapidamente, e consigo ver do que todos estão fugindo: um pequeno reservatório de gás explodiu, e as chamas avançam tão depressa, que pude sentir o calor vindo em nossa direção. Os elevadores sobem e descem o mais rápido que podem, e os mais desesperados acabam caindo no vão na tentativa de subir pelos cabos. O único jeito de tentar sair é por onde entramos, já que a voz no auto falante informa que as saídas foram obstruídas.

Faltam apenas dois andares até a saída de trem ligada à praça, mas o caminho parece estar mais distante a cada passo. Me seguro firme para não cair, porque sei que se me perder de Cato agora serei facilmente pisoteada. A fumaça oriunda da explosão já asfixia alguns a nossa volta, e Cato é obrigado a passar por cima de alguns corpos para chegar até o nosso destino. Nossa caminhada parece durar mais de uma hora, quando finalmente chegamos à estação interna, iluminada pela locomotiva que já está sendo carregada com a lotação máxima possível.

Logo na entrada principal, um líder da segurança da Noz orienta todos os que chegam, embora muitos apenas ignorem o que ele diz através do megafone. Cato tenta me empurrar para dentro do vagão, mas o homem o impede de fazê-lo

“Apenas os mais urgentes” O homem informa. Cato parece prestes a protestar, ou a arrancar a cabeça dele, mas eu tiro a máscara de ar e pergunto ao segurança “Onde podemos ficar enquanto o trem não sai?” O homem aponta na direção da sala de segurança, enquanto Cato me olha, perplexo. “Vamos esperar o trem sair e ir a pé pelo túnel logo depois” Digo em tom de ordem ao mesmo tempo em que desço do colo de Cato e corro para a sala, tentando desviar do mar de pessoas. Entro no cubículo e fecho a porta, e Cato entra logo depois. O local possui isolamento acústico, então conseguimos nos escutar melhor. Da janela o lado de fora parece um filme de terror mudo, por isso desço um pouco as cortinas.

O que você estava pensando?” Foi a primeira coisa que Cato me disse, e o tom que ele usou não era de agradar.

“O que você estava pensando? Eu não pedi pra você vir atrás de mim” Retruquei

“Você achou mesmo que eu iria deixar você tentar suicídio sem fazer nada?” Ele gritou. Minha cabeça girava. Eu só queria sair dali.

“Se te deixa mais tranqüilo, eu não estava tentando me matar. A sua namoradinha disse que meu irmão estava aqui dentro.” Gritei de volta, irada. Então ele não sabia que Loivissa tinha me enviado pra cá? Belo casal eles são.

Cato me fitou, sem ação. Tento imaginar como ele está me vendo agora, totalmente descabelada, descontrolada, roxa de tanto chorar, tremendo loucamente e com os olhos tão arregalados que podem a qualquer momento sair de órbita. Ele deve estar com medo. Pior, ele deve estar com pena. Ele se move na minha direção e eu saio do caminho, imaginando que ele deve estar tentando sair pela porta atrás de mim. Mas ele vira e se aproxima mais de mim, e me abraça. Assim, sem dizer nada. Apenas me abraça. E então eu desmorono, e me dou ao luxo de chorar ainda mais. A gente vai morrer, e a culpa vai ser minha, penso. É um abraço de despedida, ele irá embora e me deixará para trás. Eu preciso que ele vá embora, agora, pra que tenha uma chance ao menos de sobreviver. Mas ele não me solta, ele não se afasta. O que Cato faz é me puxar para ainda mais perto, afagar meu cabelo e sussurrar no meu ouvido “Eu vou tirar você daqui.”

E é quando eu quero chorar ainda mais, mas, de repente, as lágrimas somem e eu consigo olhar nos olhos dele. Tento normalizar minha respiração para começar a protestar. Tento dizer a ele que é ridículo pensar só em mim numa hora dessas, e que ele tem que dar um jeito de sair depressa, mas Cato me silencia com um beijo. E é como se a gente nunca tivesse se separado, é como se o mundo não tivesse explodindo lá fora. E em vez de corresponder, de ao menos responder, eu só... Apago.

                                                                     .            .               .

Fiquei desmaiada por tanto tempo, que quando acordei já estava novamente nos braços de Cato, que caminhava pelos trilhos vazios. Sua testa sangrava e haviam cortes por todo o braço.

“O que aconteceu?” Perguntei meio grogue. Ele sorriu rapidamente e me colocou no chão com calma.

“Pouco depois de você desmaiar, um grupo desesperado invadiu a sala, parece que alguém espalhou que ainda tinha ar respirável lá dentro. Tive que lutar para que pudéssemos sair.”

“Que horas são?”

“Já é bem de noite, tenho certeza. O trem saiu não faz muito tempo, houve problemas incontáveis até a partida. A equipe tordo deve estar estranhando muito a demora.”

“Você avisou alguém que viria?” Indaguei. Lyara iria nos matar, se chegássemos vivos até a base.

“Não. Só corri atrás de você. Percebi que alguma coisa estava errada quando entrou no elevador, mas como mais ninguém tinha notado, não tive tempo de mobilizar o resto do pessoal. Eles devem estar preocupados.”

“Eles devem estar loucos lá fora. Se conseguirmos sair tenho certeza que Coin vai pedir nossa cabeça!”

“Ela provavelmente gostaria de ser informada que fomos soterrados aqui. Sua alegria só seria maior se alguém dissesse que Katniss estava aqui conosco. Tem algo naquela mulher que não me agrada... Ela não parece estar do nosso lado.”

Caminhamos calados durante um tempo, que juro ter sido próximo a uma eternidade. Queria perguntar a ele sobre nós, mas tive receio de que ele dissesse algo só pra me agradar, tendo em vista que estamos consideravelmente próximos da morte. Levamos mais de duas horas caminhando até que conseguimos escutar o barulho que vem de lá de fora. A voz de Katniss ecoa por toda parte, devem estar tentando fazê-la discursar a fim de convencer o povo a ir para o nosso lado. Balanço a cabeça, porque sei que é inútil. Ninguém que estivesse na Noz toparia juntar forças com aqueles que os sepultaram lá dentro. E então tudo fica momentaneamente silencioso, e escutamos um único tiro antes de voltar o pandemônio.

“Será que foi algum dos nossos?” Cato perguntou. Apertamos mais o passo, e depois de 500 metros de corrida chegamos até o fim do túnel, e me choco ainda mais com a paisagem do lado de fora.

Não há nada. Tudo é fumaça, e gente ferida, e armas apontadas. Mas ainda assim, não há nada. Os holofotes da praça iluminam aquilo que parece um massacre quaternário multiplicado por dez. Há pedaços de gente na rua, há mulheres gritando e o som de tiros sem parar. Olho para os telões e vejo Katniss baleada no chão, e percebo que a guerra é dura para todos os lados.

“Precisamos pegar a Everdeen e entrar no Edifício da Justiça, agora” Orientei Cato. Ele acenou com a cabeça em sinal de concórdia e juntos corremos até onde Katniss estava no chão, desacordada. Consegui ver Lyara dando ordens a alguns soldados na porta do Edifício, ela nos reconheceu e mandou que nos escoltassem para dentro. Cato levou Katniss nas costas até o elevador, onde havia uma maca esperando por ela. Lyara ordenou que subíssemos pelas escadas, e pelo tom dela pude ver que estávamos encrencados.

Quando chegamos no salão principal, Katniss já estava sendo atendida pela equipe de paramédicos, enquanto Gale a observava, preocupado. Haymitch, Enobária, Johanna e Finnick apareceram vindos da varanda, todos com armas em punho e em alerta. Lyara entrou correndo e, depois de conferir o estado da Everdeen foi logo gritando comigo.

“Você está tentando nos matar, Ruthless? Espero que tenha uma explicação muito boa para dar, porque a culpa de tudo ter dado errado é inteiramente sua.”

 Cato pensou em reagir, mas Thorment apontou a arma na sua direção e disse “É melhor ficar quietinho, Encantado, ela não está de bom humor.” Lyara respirou fundo e espiou pela sacada. A praça agora estava quase silenciosa.

“Tomamos o distrito.” Disse Gale, de longe. Lyara torceu o nariz.

“Exatamente. Tomamos o distrito. Deveríamos ter convencido o distrito. Mas nada deu certo.”

“O objetivo não era esse?” Cato perguntou, irritadíssimo. Eu só estava cansada, quase cega com a diferença de claridade, então não me acanhei e fui sentar no sofá. Deviam ter umas trinta pessoas na sala agora. Haymitch tentou esclarecer a situação para os que tinham acabado de chegar.

“O plano era fazer com que vocês, do próprio distrito, fizessem o discurso. Acredito que, se tivesse sido desse jeito as chances de algum de nós sair baleado seria consideravelmente menor, e teríamos que usar muito menos força contra a sua gente.”

“E tudo teria funcionado se a Clove não resolvesse dar uma de suicida e ir dar uma voltinha no olho do furacão. Me diz garota, o que você estava pensando?” Finnick provocou, do outro lado da sala.

Não me dignei a responder de imediato, e por um tempo, nada foi dito na sala. Lá fora o céu clareava indicando que esse dia horrendo estava prestes a terminar. Katniss ainda não havia recobrado a consciência, embora o tiro tenha atingido apenas o colete a prova de balas que ela usava. Lyara já voltara a ser serena e discutia baixo com outros agentes. Quando tudo pareceu equilibrado, ela voltou a me indagar sobre os motivos da minha, hm, mudança nos planos.

“A Loivissa me disse que meu irmão estava dentro da Noz.” Foi só o que eu disse. Não precisei explicar nada, acusar nada, sequer tentar me defender. Todos compreenderam imediatamente minhas últimas ações, e naquele momento procuraram, cada um do seu lugar, Loivissa pela sala.

O olhar dela era de pânico puro, mas não posso censurá-la. Deve ser esse o único sentimento que eu teria se estivesse entre quatro paredes com mais de trinta pessoas armadas até os dentes e com muita, muita vontade de me matar.

Mas como uma raposa acuada, ela foi rápida e pegou o berço de Phia, que estava ao seu lado, e o jogou bruscamente para frente, a fim de desviar minimamente a atenção. Preocupados com a criança arremessada, acabamos deixando uma brecha na segurança, e Loivissa conseguiu alcançar a porta e sair da sala.

Mais de dez pessoas fizeram menção de segui-la, mas Lyara gritou a ordem que fez todos ficarem estáticos: “Ninguém mais sai da sala!”

Olhei para o rosto de Lyara com uma interrogação subentendida no olhar, e ela me deu um aceno leve de cabeça e apontou para a orelha. Nesse momento entendi imediatamente o que estava prestes a acontecer. Pude vê-la dando um meio sorriso e colocando a mão na arma antes de eu fechar os olhos e aguçar os ouvidos, a fim de acompanhar cada ruído, seguir a cena pelos sons.

toc toc toc toc toc. É o barulho que Loivissa faz ao descer as escadas, apressada, com medo de ser seguida.

Nheeec. O som de Lyara abrindo a porta da varanda do Edifício da Justiça, onde tentaram fazer Katniss discursar.

Arf, ar, arf. Ao longe e com certo custo, é possível ouvir a respiração ofegante de Loivissa, ao sair do Edifício.

Clec Clec. Faz a arma de Lyara ao ser carregada, logo antes do tiro.

Blam. O disparo certeiro, seguido do estampido oco de um corpo caindo no chão.

A sala silencia por um breve instante, mas é possível perceber que não há nenhuma reprovação. Thorment é o único a falar.

"Então, que é que vai avisar Kyelles que a filha dela morreu acidentalmente na guerra?"

Sorrio e abro então os olhos, aliviada por pelo menos uma coisa nesse dia ter terminado cem por cento certo.


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Notas finais do capítulo

Gostaram? Detestaram? Querem estrangular a autora? O próximo vem assim que for confirmado que ainda tem um cado de gente lendo (:
bjs



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