Amanhecer Com Os Volturi escrita por bella cullen


Capítulo 16
recontando


Notas iniciais do capítulo

desculpem a demora!!!!



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Eu observei Jasper balançar a cabeça mais uma vez, meus sentimentos de determinação misturando-se com a apreensão e exasperação dele.

- Edward. – ele quase implorou, o tom de sua voz combinando com aquele de seus pensamentos.

- Não, Jasper. – eu respondi antes mesmo que ele pudesse tentar apelar à minha razão – Bella ficará bem aqui. Ela não precisa caçar por agora, eu tenho certeza que...

- Você está tirando dela a única coisa boa de ser um recém-nascido. – Emmett observou de seu lugar junto a Rosalie, ainda emburrado por ter visto sua perfeita oportunidade de diversão desaparecer por conta daquilo que ele considerava ser minha "teimosia" – Bella ficaria bem conosco. Não é como se fôssemos levá-la para caçar no meio da cidade ou algo do tipo.

Eu podia ouvir os passos de minha esposa no terceiro andar, e os pensamentos ansiosos de Alice, concentrados na conversa que se desenvolvia ali na sala. Carlisle estava com ela, e ele também se preocupava com as repercussões que minha decisão poderia causar.

- Isso nunca foi feito antes. – Jasper continuou – Não sabemos o que esperar dela num ambiente tão fechado.

- Exatamente. – finalmente algo em que eu e meu irmão concordávamos – Nunca foi feito antes. Nunca houve uma situação como Bella em nosso mundo. Mantendo-a aqui, eu posso protegê-la melhor. Essa fase pode ser mais fácil para ela se não a expusermos demais.

'Edward, você não é o único que deseja protegê-la. Ela pode ser sua companheira, mas também é nossa irmã',os pensamentos de Emmett assumiram um tom quase gentil dentro de minha mente, enquanto ele me encarava com uma seriedade incomum em suas feições.

- Bella está confusa. – Jasper continuou – Há momentos em que ela se sente acossada, sufocada. Não é apenas a sede, mas a falta de liberdade, Edward. Bella se sente presa.

Eu suspirei, sabendo que aquela era uma discussão que ainda se estenderia por um longo tempo e eu não tinha paciência ou vontade de continuar sabendo que meu anjo me esperava. Alice estava conversando com ela e, não fosse pelo clima de contínua inquietação, eu teria rido da oferta que minha irmã acabara de fazer.

Apenas Alice poderia pensar em roupas ou no "design perfeito" para botas de caçada.

Nesse momento, contudo, minha mente foi invadida com imagens de Bella correndo pela floresta, preparando-se para pular sobre um grupo de humanos completamente alheios ao predador que os espreitava.

Eu podia sentir as ondas de pavor flutuarem ao meu redor, refletidas inconscientemente por Jasper. Ele me observava com surpresa e algo próximo à ansiedade e me forcei a me acalmar.

A visão de Alice durou apenas o segundo necessário para que ela distraísse a mente de Bella de tal decisão. Eu me voltei para a cozinha, onde Esme já terminava de preparar uma nova garrafa térmica de sangue para Bella. Foi quase com alívio que deixei meus irmãos e seus questionamentos para trás, pronto para voltar para minha esposa.

Havia algo de repulsivo em ver o líquido rubro preenchendo até quase a borda da garrafa prateada. Aquilo não era natural e eu podia sentir o cheiro metálico de inox misturado ao ferruginoso do sangue, sabendo que aquilo alteraria o gosto e que nem de longe poderia se igualar a beber de um corpo ainda quente, após a adrenalina de uma caçada – ou, pelo menos, o que havia de mais próximo de adrenalina em nossos corpos inumanos.

Mesmo assim, eu insistiria naquela dieta e, se servia de algum consolo, como eu me recusava a deixar o lado de Bella, estava sujeito também a beber da caça que Emmett trazia diariamente – herbívoros apenas, cervos trazidos dos arredores da casa.

Esme deu um meio sorriso para mim quando parei ao lado dela, todos os seus pensamentos gentis e maternais, entremeados por uma preocupação diferente daquela que meus irmãos cultivavam.

Ela ainda não vira Bella desde a transformação. Ansiava por abraçá-la e por falar com a filha que considerava desde muito antes da mudança. Esme concordava comigo em fazer o possível para que aquela fase de recém-nascida fosse o mais suave possível para minha jovem esposa.

Minha esposa... eu jamais me cansaria de chamá-la dessa forma, ainda que apenas em meus pensamentos, apenas para meu próprio deleite. Eu não tinha certeza se Bella tinha completa consciência da dádiva com que ela me presenteara no dia em que aceitara ser minha esposa. Ela sabia o quanto significava para minha criação de início do século passado, contudo, conhecer as circunstâncias era diferente de compreender.

Bella não fora criada de forma religiosa – Renée nunca fora uma pessoa constante e, ainda que tivesse, algum dia, se interessado por religião, certamente investira em algo mais exótico que qualquer tipo de cristianismo.

Eu, contudo, fui criado no seio de uma família protestante, típica na sociedade americana, o modelo próprio da ética de Max Weber. Minha educação foi muito mais rígida que a de Emmett, por exemplo, que vinha de uma criação católica, numa família de muitos filhos e pais que se preocupavam mais com o numero de bocas que tinham para alimentar que com a salvação de suas almas. Rosalie, embora tendo crescido num ambiente parecido com o meu, nunca teve a mesma preocupação com conceitos como alma ou culpa – o centro de seu mundo esteve sempre nela mesma.

Carlisle era o único além de mim, em nossa família, que atribuía importância à idéia de religião. Afinal, ele fora criado por um pastor anglicano.

Nossas noções de deidade, contudo, eram diferentes. Talvez por sua natureza compassiva, Carlisle acreditava num Deus misericordioso, capaz de perdoar os erros de sua criação, sempre de braços abertos para receber novamente o filho pródigo. Eu cresci sob os olhos de um Deus exigente, cuja salvação era estendida apenas àqueles que trabalhavam duro por ela.

Para mim, eram os nossos atos, e não a indulgência divina que assinalavam aqueles que estavam destinados ao Paraíso.

Na minha longa existência como vampiro, nada eu tinha feito que me assegurasse perdão ou 'vida eterna' – aliás, era até irônico pensar em tal conceito e não creio que a idéia tivesse para mim o mesmo apelo com que eram carregados os discursos para os fiéis. Não sei quais eram meus pensamentos sobre isso quando eu era capaz de morrer, mas, por experiência própria, poderia garantir que imortalidade e juventude eterna não são tão desejáveis depois de algumas décadas de repetições da mesma história.

Ou, pelo menos, era assim que eu me sentia antes de conhecer Bella.

Nós pertencíamos um ao outro pela lei dos homens e de Deus. Estar com Bella, para mim, era estar sob a graça – apesar de todos os revezes que tínhamos sofrido, nosso amor tinha permanecido sem máculas. Aquilo era o mais próximo do céu que eu jamais chegaria; ao lado dela, eu poderia construir meu próprio paraíso.

Apesar de profundamente entretido com minhas conjecturas, minha mente não deixara por um instante o quarto do terceiro andar, onde Alice permanecia com Bella. Eu precisava voltar para ela; já perdera tempo demais em discussões com meus irmãos.

Minha esposa era agora como uma criança, ainda perdida com a profundidade de seus sentidos, confusa pelo nó de memórias que a dor da transformação deixara. Ela precisava de mim, necessitava minha presença tanto quanto eu necessitava a dela. Além do sangue para aliviar sua sede, minha presença era o único outro conforto que ela tinha agora e eu não a privaria disso.

Jasper e Emmett já estavam prontos para subir quando eu e Esme ressurgimos da cozinha. Apenas Rosalie preferiu permanecer em seu lugar, imersa não em sua própria vaidade, mas numa preocupação velada em relação à Bella.

Por um instante eu me senti surpreso, antes que uma pequena onda de gratidão me assaltasse. Bella sempre se preocupara com seu relacionamento com Rose. Aparentemente, aquele não seria um problema tão grande quanto ela pensava.

Carlisle estava no esperando no corredor e ele imediatamente estendeu a mão para Esme tão logo nos aproximamos, seus pensamentos cheios de contentamento e satisfação, eclipsados apenas por uma pequena preocupação.

Ele estava feliz por mim. Por Bella. Porque já tínhamos ultrapassado o pior e agora tudo estava entrando nos eixos. Devagar e um tanto tentativamente, mas, ainda assim, no rumo certo.

O perfume dela me envolveu antes mesmo que eu pudesse abrir a porta – não que em algum momento ele não estivesse onipresente em minhas narinas. Eu senti meus lábios se curvarem num sorriso, um sorriso que só aumentou no momento em que ela esticou os braços em minha direção, a face iluminada de alegria à minha chegada.

- Edward.

Eu estava abraçando-a de volta em menos de um segundo, alheio à nossa companhia, apesar dos vivas e assovios que Emmett direcionava a mim em seus pensamentos.

Com delicadeza, depositei um beijo em sua testa.

- Estou bem aqui, meu amor.

Eu a senti respirar fundo contra meu peito, seus dedos enroscando-se na gola de minha camisa com força suficiente para que eu ouvisse o som das fibras se partindo. Ela não parecia estar consciente desse fato, contudo.

- Eu estou com fome. – ela murmurou numa voz abafada.

- Eu trouxe um lanche. – eu me ouvi responder com uma pontada de hesitação ao perceber o ligeiro tremor de seus ombros.

A sede estava sendo dolorosa para ela. Eu sabia disso; tinha minha própria experiência como um recém-nascido gravada perfeitamente em minha memória de vampiro. Eu não queria que ela sentisse dor, mas isso parecia tudo o que eu era capaz de lhe proporcionar nos últimos dias – a mordida, o fogo do veneno, a tortura da sede.

Ela levantou os olhos para me encarar, os orbes carmim parecendo me implorar por algo – algo que eu não podia dar a eles. Mas logo ela se voltou para a garrafa em minha mão, suas pupilas dilatando-se até se tornarem negras como piche.

Ela bebeu sem um segundo de hesitação, sorvendo o sangue em grandes goles, terminando-o em poucos segundos. Ela olhou com um ar perdido para o fundo vazio, um pouco de sangue escorrendo por seus lábios profundamente vermelhos.

E tirei a garrafa dela, antes de limpar com a ponta do polegar a sujeira que ela fizera, lembrando uma vez mais o quanto ela parecia uma criança pequena aprendendo a dar seus primeiros passos.

- Me desculpe – ela murmurou, algo embaraçada. Como se a sede fosse sua culpa. Como se ela tivesse algo porque se desculpar.

- Não é sua culpa. – consegui responder, tentando não demonstrar o rumo de meus pensamentos. Eu conhecia Bella o suficiente para saber que ela não ficaria feliz com eles.

Ela depositou as mãos sobre minhas bochechas, encostando à testa à minha. Bella também parecia alheia a nossa companhia e não seria eu a lembrá-la.

Eu podia sentir o hálito adocicado do veneno misturado ao ferruginoso do sangue contra meu rosto. Os olhos dela não tinha perdido a profundidade com que eu me deslumbrara quando ela era humana.

- Diga que você ainda me ama agora. – ela pediu.

Como se houvesse alguma chance, algum momento em que eu não fosse amá-la.

- Eu te amo agora. Eu te amo para sempre. – respondi, minhas palavras queimando minha garganta com sua sinceridade.

Ela sorriu e, muito devagar, roçou os lábios nos meus. Foi um beijo mais casto até que os nossos primeiros contatos e, contudo, deixou-me radiante o suficiente para que eu sentisse vontade de tomá-la nos braços e começar a valsar pelo quarto.

O pensamento foi seguido de uma visão. Alice. O riso dela estava impresso na imagem, e ela já planejava como colocar Bella no vestido azul rodado que em muito lembrava aquele que ela usara no baile da escola, enquanto eu girava minha esposa ao longo do salão ao som de Clair de Lune.

Isabella Cullen me transformava num tolo. E eu não me importava minimamente com isso. Pelo contrário, eu seria um tolo feliz por ela.

Ela levantou o rosto depois de alguns minutos, notando, pela primeira vez, o resto da família. Eu podia ouvir o riso de Emmett e algo que se assemelhava a um "finalmente", enquanto Esme quase dava piruetas em sua cabeça de tanto orgulho e alegria.

Uma onda de tranqüilidade inundou o quarto e eu a senti relaxar entre meus braços. Jasper voltou o olhar para mim e eu assenti com a cabeça devagar, em reconhecimento, observando Esme se adiantar para nós.

Soltei-me de Bella, sentando ao lado dela, dando espaço para que Esme pudesse alcançá-la. As duas se abraçaram e eu vi sorrisos surgirem no rosto das duas.

- Seja bem-vinda à família, Bella. – Esme disse, seus pensamentos em perfeita harmonia com suas palavras, as emoções dançando soltas em sua expressão maternal – Seja bem-vinda de novo.

- Obrigada. – Bella respondeu, sua voz tão carregada quanto a de nossa mãe.

Eu imaginei como Jasper estaria se sentindo, mas estava muito mais absorto na cena que se desenrolava diante dos meus olhos para buscar a mente dele.

- Sou eu quem agradeço, Bella. – com os olhos voltados para mim, eu li os sentimentos de Esme, a gratidão pelo fato de eu estar completo agora – Todos os dias, eu agradeço por você ter entrado em nossas vidas.

'Ok, está na hora de alguém interromper isso antes que todo mundo comece a chorar. Sério, nós deveríamos estar comemorando, não agindo como um monte de menininhas. Isso é culpa do Jasper. Será que eu deveria contar uma piada, Edward? Eu conheço uma muito boa sobre o Leão da Montanha e...'

Eu não sabia se ria ou se me exasperava com Emmett, enquanto ele se plantava diante de nós, colocando as mãos na cintura, encarando-nos com um sorriso maroto, cheio de intenções.

- Não se esqueça que você tem uma promessa a cumprir, irmãzinha. Você me deve uma partida de queda-de-braço.

Sem dúvida, aquilo era algo que eu gostaria de ver. Mesmo assim, não pude me impedir de revirar os olhos para Emmett, que agora já planejava todos os jogos em que envolveria Bella e toda a diversão que ele esperava ter ao lado de sua irmã caçula.

'Edward, há algo que eu gostaria de dar a Bella', Carlisle me chamou a atenção e eu vi claramente a jóia que ele mandara fazer já alguns meses, esperando aquele dia, 'Eu ficarei muito feliz em entregá-la para ela'.

Eu sorri para ele. Sabia o quanto aquilo era importante para Carlisle; o quão significativo era aquele presente. Todos nós tínhamos recebido nossas próprias jóias, símbolos da família que éramos.

A noite já caíra do lado de fora quando Jasper e Alice, os últimos a permanecerem conosco, saíram do quarto, deixando-nos a sós. Quase imediatamente, Bella sentou-se em meu colo, descansando a cabeça contra meu peito.

Eu passei os dedos pelos cachos soltos de seus cabelos, sendo quase imediatamente assaltado pela fragrância de frésias misturado ao perfume que era só Bella, tudo isso entremeado pela própria marca que eu deixara nela.

Naquele momento, eu podia acreditar que tudo daria certo. Que o pior já tinha passado. Imerso nos braços dela, eu tinha tudo o que eu precisava. E eu queria que ela sentisse o mesmo senso de completude que eu tinha agora.

- Você está feliz, Bella? – eu perguntei numa voz baixa a qual ela certamente não teria ouvido se ainda fosse humana.

Eu pude sentir a respiração dela sobre meu peito e meu pescoço enquanto ela levantava a cabeça, encarando-me profundamente.

- Eu passaria pelo fogo de novo, Edward, se isso significasse estar com você. Eu só posso ser feliz se você estiver comigo.

Aquela resposta foi o suficiente para me dar alívio e esperança. Eu ainda tinha dúvidas se eu fizera aquilo que era certo. Mas quando ela me encarava com tanta confiança e amor, não havia muito mais que eu pudesse questionar.

Os dias foram se somando no calendário sem que percebêssemos. O tempo era algo de que nem sempre nos dávamos conta – quando se possui a eternidade pela frente, este não é um fator tão importante.

Eu passava a maior parte do tempo com Bella, recontando histórias da vida dela antes de mim – todos os detalhes que ela tinha compartilhado comigo, especialmente naqueles dias que pareciam tão distantes agora, quando eu ainda tentava preservar alguma distância, apesar de impaciente para saber tudo o que se escondia na cabeça dela.

Contei sobre Phoenix e sobre Renée, sobre o amor dela pelo sol e pelo deserto; sobre como a princípio ela detestava o onipresente verde em Forks. Contei da primeira aula de biologia e da primeira noite em que invadi seu quarto e descobri uma pequena brecha para seus pensamentos quando ela começou a falar em seu sono.

Contei, com alguma relutância, de James, do que acontecera em seu aniversário de 18 anos e de nossa subseqüente separação. A tudo ela escutava atentamente, perguntando de vez em quando sobre detalhes que eu deixara de fora, questionando pequenas reações minha a alguns desses contos – reações que seus olhos antes humanos não teriam percebido.

Contei de Jacob e dos lobisomens. De Vitória. Da batalha com os recém-nascidos. Dos Volturi.

Tão logo Bella pudesse se controlar, eu teria de levá-la à Itália, ainda que a idéia me fosse odiosa. Nossa última passagem por Volterra não deixara lembranças agradáveis e eu não sabia dizer que intenções Aro, principalmente, teria em relação à minha esposa.

Como humana, ela lhe despertara um intenso interesse. Como vampira, eu não tinha certeza do que ele decidiria.

Carlisle estava, sempre que possível, examinando Bella, tentando descobrir se ela possuía algum poder. Contudo, exceto pelo fato de que a mente dela continuava fechada para mim, não parecia haver nada de novo.

Eu não narrava apenas as histórias da vida dela – e minha também, visto que, sem perceber, eu acabava por revelar muito mais do que deveria dos meus pensamentos sobre tudo o que acontecera, em especial meus sentimentos em relação a Jacob Black. Ler as histórias favoritas dela em voz alta fazia com que ela se refamiliarizasse com a Bella de antes da transformação, que gostava de Austen e Brönte.

Logo esse se tornou meu programa favorito. Nós nos revezávamos lendo um para o outro e, às vezes, eu me perdia no tom doce da voz dela.

Entre o soprano agudo de Alice e o grave aveludado de Rosalie, a voz de Bella parecia ter ganho um meio-termo, um mezzo profundo e suave, quase hipnótico, musical mesmo quando no tom sério em que ela declamava algumas das passagens que mais lhe chamavam atenção, estalando de leve a língua no céu da boca, como se a testar a maneira com que soava.

Muitas vezes ela se recolhia em si mesma, voltada para a segurança de sua mente, um lugar em que eu não podia alcançá-la. Os olhos carmim então se tornavam maiores e mais inocentes e, mais que eu qualquer outro momento, ela parecia uma criança perdida.

Quando ela saía desse estado, a sede estava sempre mais forte e eu logo me acostumei a providenciar sangue tão logo ela mergulhava em seus pequenos transes.

Alice também estava quase sempre por perto. Aproveitando-se da quase docilidade infantil de Bella, ela logo tinha completo um novo guarda-roupa para a irmã. Eu não me lembrava de ter visto Alice mais contente que naqueles primeiros dias, a atenção mergulhada em catálogos, lojas on-line e design de roupas.

Embora Jasper continuasse a não confiar totalmente em minha decisão, também ele se fazia presente, testando as emoções ao redor de Bella, contendo a ansiedade que por muitas vezes aflorava nela, especialmente quando ela se concentrava em seus novos sentidos.

Os olhos dela muitas vezes se voltavam desejosos para a floresta do outro lado das grandes janelas de vidro que caracterizavam a decoração de Esme na maioria das nossas casas. Isso acontecia especialmente à noite e então eu a abraçava, murmurando a canção de ninar que eu escrevera para ela.

Aquilo parecia acalmá-la um pouco – e me acalmava também. Até então, eu nunca notara minha necessidade de contato físico: tendo sido sempre o solitário e, depois, me refreando diante da fragilidade humana dela, tal carência ficara para segundo plano.

Antes de Bella, a única outra pessoa que realmente me tocara fora minha mãe e eu me lembrava muito pouco desses momentos. Após Bella – e era interessante notar que eu agora dividia minha existência em antes e depois dela – eu me reacostumara ao contato humano, sendo que quase sempre fora ela a inicia qualquer proximidade.

Isso fazia com que eu não soubesse exatamente como agir agora. Eu desejava – cobiçava, talvez fosse mais exato – o toque dela. Bella, contudo não estava pronta para isso, não no estado fragilizado em que ela se encontrava e se eu cedesse aos meus anseios, estaria me aproveitando dela.

Às vezes eu pegava Jasper me olhando com pena e certo divertimento. 'Você é um tolo, Edward', ele dizia num tom quase de riso em seus pensamentos. Então, antes que eu pudesse partir para a garganta dele, eu me forçava a admitir que podia ser pior.

Podia ter sido Emmett a perceber o que estava acontecendo.

Naquela noite, os outros deixaram a casa para caçar. Por causa de Bella e minha "teimosia", ele tinham descuidado de suas próprias necessidades e, considerando que tínhamos uma recém-nascida conosco, precisávamos de toda a nossa força. Apenas eu, Bella e Jasper ficamos para trás.

Ela tinha entrado em mais um de seus estranhos estados mentais, fechada para o resto do mundo e eu tivera de me restringir para não balançá-la pelos ombros e segurá-la em meus braços até ter certeza de que ela estava comigo.

Em vez disso, como eu já sabia que não demoraria muito para que ela estivesse de volta e absolutamente sedenta, desci até a cozinha – era um tanto irônico pensar que, no momento, eu estava realmente usando aquele cômodo da casa para me alimentar – a fim de providenciar nossa próxima refeição.

Esme já tinha deixado garrafas prontas para nós dois. Rapidamente, eu ingeri a que se destinava a mim, sentindo meu rosto se fechar numa careta de desgosto.

- Agora imagine o que ela sente quando bebe isso. – a voz de Jasper soou às minhas costas.

Eu me virei calmamente para ele, tendo-o ouvido se aproximar antes.

- Ela nunca experimentou outra coisa. Não sabe a diferença.

'Ao contrário do que você parece acreditar, Edward, ela não é uma criança. Ela está constantemente lutando contra seus instintos e eu devo dizer que estou impressionado com o controle dela até aqui', os pensamentos dele eram sérios, diretos ao ponto, impossíveis de ignorar.

- Então você talvez devesse concordar comigo que eu estou fazendo alguma coisa certa afinal. – eu respondi em voz alta.

Ele meneou a cabeça.

- Ela não está mantendo o controle por causa dessa sua experiência. – havia um certo desgosto sublinhando essa última palavra em sua mente – Ela só se manteve sã até agora, Edward, porque contra a sede, estão os sentimentos dela por você.

Eu senti meus ombros caírem – não relaxados, mas cansados daquela mesma discussão todos os dias.

- Ela ainda não está pronta, Jasper.

'Ela não estará pronta até que você deixe de agir como um pai superprotetor. Encare os fatos, Edward, quem não está pronto é você'.

Eu não queria ouvir a verdade daquelas palavras e, por isso, voltei-me para recolher uma das garrafas para Bella, seguindo então para as escadas, sentindo a frustração de Jasper somar-se a minha.

Tão logo eu entrei no quarto, ela estava me encarando, sentada com as pernas cruzadas sob o corpo. As pupilas dilataram-se, escuras, focando na garrafa em minha mão.

Ela não esperou que eu me aproximasse dela, levantando-se da cama com velocidade. Ela estava completamente sedenta e, mais uma vez, sorveu o líquido de um único gole, sem sequer respirar.

Não era o suficiente. Eu podia ver isso em cada uma das linhas do rosto dela, na maneira como seus olhos, ainda escuros, comprimiam-se. Eu queria tomá-la nos braços e dizer que tudo ficaria bem, mas eu sabia que não ficaria.

- Não é o bastante. Você sabe que não é...– ela murmurou.

E não havia nada que eu pudesse fazer. Negar algo a Bella era contra minha natureza, mas eu precisava fazer isso. Por ela.


- Logo irá passar, amor. – foi tudo o que pude responder, limpando seu rosto com delicadeza, tentando confortá-la com meu contato.

- Se você me ama, então por que não me deixa ir? – ela implorou mais uma vez, em desespero.

Por que eu amo você.

- Porque eu jurei que a protegeria. Ainda que fosse de você mesma. – eu respondi, sincero, pedindo para que aquilo fosse suficiente para que ela me perdoasse.


Ela se afastou de mim e eu me perguntei, não pela primeira vez, se era possível um coração morto como o meu partir-se.

Foi então que ela disse as exatas palavras que eu estivera esperando às vezes consciente e outras, inconscientemente, desde o primeiro dia – o primeiro dia no laboratório de biologia, o primeiro dia na nossa clareira, o primeiro dia em que ela despertou para essa nossa existência.


- Eu odeio o que você me transformou! – ela gritou, o rosto inumanamente belo contorcido de dor.

O rosto do qual eu roubara a humanidade... A dor com que eu a recompensara por ser amor. O choque fez com que eu me paralisasse e eu só pude assistir, imóvel, à única coisa boa que me acontecera nessa existência desaparecer da minha vida.

O que eu senti nesse momento foi muito pior de quando descobri que era um vampiro... ou decidi que, ao contrário do que tinha acreditado por anos, eu não era um justiceiro, mas um assassino ao perseguir o pior da escória humana por becos e vielas escuras. A queda de meu pedestal para meu inferno pessoal foi muito mais dolorosa.

Eu tivera, afinal, o gosto do Paraíso. E, agora, ele estava perdido para mim.


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