The Monster Inside Me... escrita por Lolli Anne


Capítulo 2
Entendendo um pouco...


Notas iniciais do capítulo

Mais um capítuloo! Obrigada a todos que deixaram review!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/229676/chapter/2

Chegamos ao térreo e naquele mesmo instante gritos começaram pela sala. As pessoas afastavam-se de nós e tentavam desesperadamente sair do local. Um grupo militar entrou no lugar e ergueu suas armas contra nós.

- Ai meus deus...- sussurrei.

- Cuide da garota...- sussurrou o loiro para o moreno.

- Por que precisam de mim?!- perguntei assustada. O loiro me lançou um olhar mortal e obriguei minha boca a fechar.

- Mais tarde eu cuido de você...- ele sussurrou maldoso.- Agora precisamos sair daqui.

Os olhos do garoto passaram para um tom amarelo. Ele rasgou a parte superior do macacão revelando músculos definidos e riscos negros  que subiram por seu pescoço e rosto. Eram desenhos iguais a tatuagens, mas estavam se movendo por todo o abdômen. O loiro sorriu e virou-se para os homens armados.

Segurei um grito quando ele alongou o pescoço enquanto duas de suas unhas alongavam-se.

- Lembre-se do objetivo...- o loiro disse para o garoto de cabelos vermelhos.

O garoto de cabelos vermelhos como sangue virou sua cabeça na minha direção. Os olhos cor de sangue tinham chamas dançando no interior, riscos como os do loiro começaram a surgir e ele ficou com um desenho no olho esquerdo. Um sorriso cruel estava fixo em seus lábios.

Junto com o loiro o garoto de cabelos vermelhos correu na direção dos homens armados. Ouvi o som de disparos e gritei, mas fui protegida pelo moreno. Os olhos dele brilhavam em violeta e riscos finos dançavam por sua face. Perturbador e encantador.

- Não saia de perto de mim.- ele disse. Vi as balas que o atingiram caídas no chão.- Balas comuns não fazem efeito conosco.

- O que são vocês...?- perguntei num sussurro. Ele riu.

- Como dizer... Predadores? Monstros? Nascemos humanos e não tivemos sorte?- ele falava mais para si que para mim.- Quando eu mandar corra comigo...

- Mas...- comecei a tentar argumentar.

- Agora!- ele gritou e me puxou pelo pulso. Corremos juntos por entre a briga e tive um vislumbre de dois raios passando por nós.- Melhor sairmos logo...

Houve uma grande explosão e vi pedaços da base voando pela área aberta. Todos pegavam fogo e atingiam diferentes pontos espalhando caos pelo lugar. Tiros foram disparados na nossa direção, acabei me abaixando e gritando achando que meu fim tinha chegado, mas o garoto de olhos violeta me protegeu como antes e só consegui ouvir gritos de outras pessoas.

- Continue correndo ou Daesung hyung vai acabar com você mais cedo!- gritou o garoto e comecei a correr. Ele passou por mim como uma fecha e começou a chutar um tipo de porta, talvez estivesse adiantando para que não demorássemos muito por minha culpa.

A base explodiu novamente em fogo e um dos pedaço caiu na minha frente. Joguei-me no chão e cobri a cabeça. Senti agarrarem meus braços e vi dois militares segurando-me enquanto outro apontava uma arma diferente na minha direção.

Ele preparou e estava prestes a puxar o gatilho. Gritei e esperneei sem esperanças, porém as chances eram baixas para mim e me rendi fechando os olhos. Esperei por uma dor que não veio e só senti meus joelhos batendo no chão.

- Não pare ou eles vão matar você...- disse alguém e abri meus olhos relutante. O garoto de cabelos vermelhos estava parado na minha frente. Seus olhos estavam castanhos escuro, bonitos e normais.

- Por que?- perguntei com lágrimas nos olhos. Eu queria poder encontrar meu pai, eu queria que ele me salvasse.- Por que isso está acontecendo comigo...?

A garota estava à beira das lágrimas e por alguma razão aquilo estava partindo não somente o meu coração, mas os outros também estavam sentindo aquele sentimento. Nós cinco sentíamos a mesma sensação e vontade de tirar a menina daquele lugar, nada ali era culpa dela e muito menos envolvia ela.

Estudei o rosto pálido e cabelos castanhos lisos que antes estavam presos em uma trança, mas agora com toda a correria estavam livres caindo por seus ombros. As lágrimas trancadas nos olhos castanhos profundos. Notei algo além do medo por sua vida, ali naqueles olhos havia uma tristeza que eu não tinha visto antes. Havia culpa, dor e arrependimento.

- Qual seu nome?- perguntei no mesmo momento que houve outra explosão. A menina se encolheu.- Qual seu nome?- insisti.

- Anne...- ela sussurrou fitando meus olhos. Ela estava assustada, não só com as armas, mas comigo também.

Me aproximei da menina abaixando-me perto dela. Anne tremeu e eu pude sentir com meus sentidos aguçados.

- Anne, confie em mim para que eu possa cuidar de você.- falei e novamente houve uma explosão. Ela cobriu os ouvidos, tirei suas mãos e olhei nos olhos da garota.- Preciso ir e você precisa decidir se vai confiar em mim...

- Eu não o conheço e agora mesmo quase fui morta por você!- ela exclamou. Dois homens chegaram mais perto e apontaram suas armas. No topo das paredes vários se preparavam para atirar.

- Mãos para cima!- gritou um dos homens. Ele chegou mais perto e me puxou para cima, enquanto o outro puxava Anne.

Dei um soco naquele que me segurava e chutei com força a barriga do homem que agarrou Anne. Ela parecia fraca e indefesa naquele momento, ouvia SeungRi anunciando a passagem aberta, mas não podia deixar aquela menina morrer ali.

- Parados!- gritou outro grupo aproximando-se.

" Ji Yong saia agora...", interrompi Daesung enquanto ele tentava comunicar-se comigo. Um dos homens disparou contra Anne e me coloquei na sua frente sabendo que aquelas balas não iriam me ferir. Tamanho foi meu susto quando ela acertou e feriou meu braço esquerdo.

Daesung devia ter tentado me avisar sobre isso. As balas eram feitas de um material único feito apenas para nos matar.

- Anne...- chamei por sobre o ombro. A menina olhava apavorada para meu braço e a provável cor estranha de sangue.- Tem uma porta para aquele lado, quero que no três corra até lá...

- Mas e você?- ela perguntou ainda olhando o sangue pingar no chão.

- Vejo você depois.- sorri com o canto da boca formando um leve meio sorriso.

Olhei para os homens armados prontos para outro disparo.

- Um...- comecei e senti algo queimar no estomago. Sabia que a cor dos olhos mudava lentamente, pois os soldados começaram a recuar levemente.- Dois...

- Atirem antes que ele ataque!- gritou alguém do topo.

- Três!- gritei empurrando Anne para o meio da fumaça.- Corra!

SeungRi ajudaria a menina e eu lutaria até os outros chegarem ali, eles também estavam ocupados. Até os outros virem eu precisava aguentar ou escapar.

Ji Yong era muito burro colocando tudo em risco para ajudar uma menina. Ele estava colocando sua vida em risco, tudo o que estávamos fazendo era para salvar nossas vidas e ele decidiu fazer uma besteira como essa?!

Me livrei dos últimos homens que tentavam me deter e corri com toda minha velocidade para ajudar meu amigo. Ji Yong estava lutando sozinho e eu podia sentir o cheiro daquela garota estúpida.  Senti uma vontade descontrolada de ir matá-la, mas sabia quem dizia e pensava aquilo. Não era eu, mas a fera.

Respirando fundo ataquei os homens e em poucos segundos só havia sangue em minhas garras.

- Poderia parar de ignorar o que eu digo?!- perguntei e corremos escapando das balas vindas de cima.

- Estão atirando com balas normais?- perguntou Ji Yong.

- Sim, só os que desceram tinham aquele tipo.- respondi e farejei o ar torcendo o nariz.- A garota ainda está por aqui, ela não sabe nem mesmo seguir reto...

- Vamos pegar ela e sair daqui.- disse o garoto virando um risco devido a super velocidade. Desapareci logo depois.

Encontrei Ji Yong ajudando a menina, ela parecia enjoada e tonta. A pele estava pálida demais para qualquer pessoa comum.

- Parem! Minha filha, eu não encontrei ela em lugar nenhum!- ouvi um homem gritando no topo dos grandes muros. Aquela voz era do doutor Kim, a menina na nossa frente era filha dele!

- Ji Yong...- sussurrei com raiva e empurrei a garota. Ela caiu no chão sentada.- Lembra que ameaçou a filha do Doutor Kim? Queríamos acabar com ela...

- Do que está falando?- perguntou o garoto olhando de mim para a menina.

- Essa garota é a filha dele.- olhei nos olhos do garoto com cabelos vermelhos como fogo. Os olhos do mesmo se arregalaram, mas sua expressão acalmou-se logo depois.

- Isso não vem ao caso agora.- disse sério.

- Ela merece morrer...- falei aproximando-me da menina e erguendo as duas garras.- Doutor Kim queria nossa morte...

Ji Yong colocou-se na frente da garota e abaixou minha mão.

- Ela não tem nada haver com isso.- disse ele.- Não vamos matar alguém inocente que estava aqui por acaso.

- Você enlouqueceu apenas com o cheiro dela.- falei me afastando e sorri.- Vamos ver quanto tempo vai aguentar segurar, Ji Yong.

- Vamos sair logo daqui...- ele sussurrou passando o braço da menina por cima de seu pescoço.

Juntos saímos de lá correndo. SeungRi estava esperando e havia lutado também.

Aquele garoto estava me ajudando. Eu achei estranho ele mudar tão drasticamente de uma hora para a outra, chegava a ser perturbador ver sua dupla personalidade. O loiro observou-me o tempo todo e seu ódio estava claro nos olhos, entretanto o moreno estava me ajudando também e sendo um pouco mais gentil.

Os três possuíam personalidades diferentes, mas apenas aquele com cabelos rubros mudava constantemente. Parecia alguém diferente toda vez que falava e tal mudança era vista através de seus olhos.

- Ji Yong, você está bem?- perguntou alguém na escuridão. Duas luzes brilhavam e revelaram-se como os olhos de um garoto de voz sedutora. Ele me deu um sorriso destruidor de corações e voltou-se novamente para o amigo.- Foi ela quem abalou nosso plano?

Senti alguém tocando meus cabelos e virei ficando cara a cara com outro garoto descamisado. Ele tinha o cabelo cortado como moicano e seus olhos estavam como os de um gato.

- Sinto um cheiro estranho...- sussurrou e afastou-se rapidamente. Os olhos dele estavam alternando de castanho para um amarelo felino, algumas vezes ele acabava com um olho de cada cor.- Ah!

- Taeyang hyung!- gritou o outro que parecia ser mais novo e que havia me ajudado inicialmente. Aquele que ele havia chamado de Taeyang ergueu a cabeça olhando com os olhos brilhantes para mim. Presas cresceram.

- Isso não é bom...- sussurrou o loiro.- Ela está causando uma reação estranha em todos.

- Anne...- sussurrou o garoto com cabelos rubros.- Não corra, ele é como um felino e vai caçá-la. Seung Hyun não deixe ele tocar nela...

Aquele pedido veio muito atrasado. Eu dei um passo tentando me afastar e o garoto, Taeyang, veio na minha direção.

O garoto loiro me protegeu empurrando seu amigo para longe. Ele bateu contra a parede e ficou ali tonto por alguns segundos. Enquanto isso o loiro alongava novamente o pescoço.

- Controle é uma coisa fácil de perder...- sussurrou e voltou-se para mim. Seu olhar era de nojo.- Reze para que Ji Yong não perca o controle completamente...

- O que são vocês?- perguntei engolindo em seco. O loiro riu.

- Pessoas sem sorte que foram amaldiçoadas.- disse olhando para o amigo que tinha lançado longe ainda à pouco.- Pessoas que não conhecem a liberdade.

Um alarme soou e todos olharam para o teto. Localizei uma câmera, mas logo ela foi destruída.

- Vamos sair desse lugar e conversar depois.- disse o garoto moreno sedutor.- Explicamos tudo, mas por hora confie que vamos cuidar de você.

- E rápido...- disse o outro menino, aquele que parecia ser o mais novo.- Ji Yong hyung está me enjoando com tantos pensamentos dramáticos.

- Quem?- perguntei.

- Ela nem ao menos nos conhece...- disse o loiro começando a andar.

- Bom, você é Anne.- disse o mais novo.- Eu sou SeungRi, obviamente o mais novo. Aquele loiro irritado é o Daesung hyung, ele pode ser gentil, mas parece que acordou de mal humor.

- SeungRi, nós precisamos sair daqui!- gritou o loiro, Daesung.- Faça as apresentações depois ou no caminho! Eu não pretendo voltar para aquela prisão!

Olhei para o garoto de cabelos vermelhos, ele tinha erguido a cabeça e parecia ouvir atentamente.

- Daesung está certo, vamos sair daqui...- disse e com ajuda todos corremos pelo corredor.

Eu não sabia mais por quê estava indo com eles, afinal eu poderia ter esperado meu pai ou me escondido no meio da fumaça. Ok, talvez não fosse a melhor ideia considerando tudo o que eu vi hoje, mas eu não queria meu aniversário desse jeito.

- Você não pode correr mais rápido?- perguntou o garoto loiro. Eu estava cansada, assustada, minha mãe tinha desaparecido e agora eu ainda estava sendo levado por fugitivos de uma base militar para sabe-se lá onde! Escutar alguém reclamando o tempo todo não estava na minha lista.

- Olha aqui...- comecei parando.- Não me interessa quem ou o que você é, mas pare de me incomodar! Eu não tenho culpa de você estar preso aqui, na verdade eu nem deveria estar nesse lugar! Eu queria estar em casa com a minha mãe no Japão, mas nem sempre conseguimos o que queremos, não é? Escutar um estranho me xingar ou ameaçar não é necessário para completar meu dia! Meu aniversário já está uma droga sem a sua ajuda, então cale a boca!

Passei andando por ele batendo contra seu ombro. Os garotos me seguiram com os olhos e logo começaram a andar também, mas em silêncio. Achei que o loiro estava junto, mas fui surpreendida por algo grande de metal passando de raspão por mim.

- Repita...- sussurrou uma voz perturbadora. Virei dando de cara com olhos amarelos brilhando no escuro.

- Melhor você correr...- disse um dos outros garotos. Vi as unhas dos loiro crescendo lentamente e ele virando a cabeça de um lado para o outro.

- Não vou correr.- falei firme mesmo morrendo de medo por dentro.- Que me mate, vamos ver se ele não sabe só falar!

- Está provocando o demônio, ele é muito pior com raiva...- sussurrou o mais novo, SeungRi.

Desenhos surgiram novamente na barriga do loiro. Ele sorriu cruelmente para mim.

- Se ajoelhe e implore...- ele disse com uma voz estranha.  Ele andou lenta e ameaçadoramente na minha direção erguendo as garras.- AGORA!

Reunindo o pouco de coragem que eu tinha e misturando com a raiva, andei até o garoto e dei-lhe um soco com toda minha força. Ouvi um som estranho e meu pulso ardeu como nunca, uma dor horrível naquele lugar me fez gritar.

Segurei meu pulso apertando os lábios. O loiro começou a rir e SeungRi correu até mim.

- Sua burra!- gritou Daesung rindo, mas sua risada durou pouco. O garoto caiu no chão deitado quando levou um soco no rosto. Um borrão vermelho moveu-se rápido e depois do soco parou na minha frente.

- Nunca iria nos machucar com a sua força...- disse o garoto com cabelos rubros.- Não somos normais.

Eu teria respondido, mas um grito saiu dos meus lábios antes de qualquer palavra.

- Ah!- gritei.

- Ela quebrou o pulso.- disse o mais novo mexendo na minha mão.- Não foi nada grave, mas melhor cuidarmos disso rápido.

- Dói...- sussurrei apertando os lábios.

- Precisamos ir...- disse o garoto da voz sedutora.

- Eu dou um jeito...- disse o loiro e aproximou-se. Ele sorriu pra mim fingindo que iria mexer no pulso, mas bateu no meu pescoço.

Minha visão começou a ficar turva até que apaguei.

- Ficou louco!- gritei empurrando Daesung contra a parede.

- Ji Yong calma!- gritou SeungRi.- Ele tocou no ponto certo, ela só desmaiou.

- Vamos sair desse lugar, já demoramos demais e posso ouvir soldados.- disse Daesung passando por nós e colocando a garota sobre seu ombro.- Eu levo a garota e você cuida desse seubraço, Ji Yong. Eu poderia derrotá-lo, mas seria perda de tempo.

O loiro saiu andando rápido como um fecha pelo corredor e todos seguimos o garoto. Eu odiava as atitudes dele, mas dessa vez precisava aguentar. O braço ferido diminuiu minhas chances e minha preocupação com aquela garota me deixou distraído. Daesung podia estar sendo rude, mas nossa conexão me permitia vasculhar um pouco melhor seus sentimentos e achar algo interessante. A palavra aniversário girava na mente dele e lembrei de Anne falando sobre isso quando gritou com ele.

- Por isso não matou ela...- sussurrei rindo enquanto corria. Daesung foi levado de casa no seu aniversário, ele estava esperando o bolo ficar pronto e os militares arrastaram-no para longe.

" Ele sabe o que é ter um aniversário assustador.", pensei rindo. Ainda restava um pouco de humanidade nele.                  

Finalmente depois de muitos minutos indo rápido para despistar os soldados, encontramos nossa saída. Daesung chutou a porta e ela caiu no chão produzindo um barulho alto.

- Isso é...- começou SeungRi saindo para fora e congelando. Meus olhos se arregalaram e o queixo caiu.

Estávamos livres, finalmente depois de tantos anos. O céu podia estar sujo com fumaça causado pelo incêndio da base, mas ainda assim era bonito.

- Vamos...- sussurrei sorrindo verdadeiramente.

Juntos saímos andando e roubamos um carro para chegar rápido até uma cidade próxima.

Abri meus olhos lentamente e assustei-me ao notar que estava em um quarto. Me perguntei onde estava a escuridão daquele corredor cheio de fios e outras coisas, fora a estranha umidade.

Senti uma mão pousar levemente na minha testa.

- Você está bem?- perguntou uma voz estranha e sentei rápido na cama. Como resultado fiquei tonta novamente.

- Onde estou?- perguntei olhando em volta e parei fixando os olhos no garoto de cabelos vermelhos. Naquele momento levantei da cama e me afastei.- Você...

- Não vou machucar você.- ele disse firme e sério. Eu teria acreditado, mas aquele garoto já havia tentado me sufocar e atacar! Isso me levou a uma pergunta que, mesmo não importando muito mais do que estar sozinha com ele, ainda era importante.

- O que você é?- perguntei num sussurro. Ele sorriu olhando para o chão e quando ergueu a cabeça seus olhos estavam vermelhos como sangue. Obviamente recuei e ele riu mudando seus olhos para castanhos diante de mim.

- Não sei como explicar...- ele disse jogando-se na cama desocupada.- É uma longa história, acho que já se passaram seis anos...

- Eu não entendi...- sussurrei. O garoto sorriu e sentou.

- Primeiro deveria perguntar meu nome, não o que eu sou.- ele tinha um sorriso gentil e quase sorri para ele também. Quase. Vendo que eu não iria perguntar ou dizer nada ele continuou:- Sou Ji Yong, Kwon Ji Yong. Tenho vinte anos e cresci desde os nove anos em uma base militar.

Fiquei em silêncio.

- Sua vez.- ele insistiu.- Apresentação básica antes que eu conte toda a história.

- Muito bem.- falei rendendo-me.- Sou Kim Anne, fiz dezoito anos hoje. Meus pais se divorciaram e eu cresci com minha mãe no Japão.

- Deve ter sido difícil...- ele sussurrou compreensivo. Bufei e sentei na cama cruzando os braços.

- Não foi difícil. Eu nunca senti falta dele!- exclamei irritada.

- Mentira.- disse o garoto com um meio sorriso.

- Está me chamando de mentirosa?!- perguntei com a boca aberta. Ele deu de ombros e sentou ao meu lado.

- Eu passei pela mesma coisa e também sempre disse não sentir falta, mas isso é uma das piores mentiras que já contei...- ele sussurrou triste.

- Seu pai?- perguntei baixinho e ele negou.

- Minha mãe...- ele sorriu fraco e olhou nos meus olhos. Seu olhar era intenso naquele momento e as palavras não iriam sair da minha boca nem mesmo a força.- Meu pai bateu nela muitas vezes e ela sempre fugia dele...

- Ela te deixava sozinho?- perguntei triste por ele, afinal ninguém substitui a mãe.

- Sim.- ele respondeu.- Um dia fiquei com raiva por ela estar tentando fugir novamente e comecei a gritar, então ela pediu que eu fosse com ela e afirmou que me deixava por ser melhor que ficar na rua. Eu não me importava em dormir na rua, eu só queria ficar perto dela...- ele levantou e foi até a janela aberta respirando fundo.- Mandei que ela fosse e nunca mais voltasse.

- Ela voltou?- olhei suas costas com tristeza. Ele negou com a cabeça.- O que aconteceu?

- Foi poucos dias antes de me levarem para o lugar onde me tornei o que sou...- ele começou e notei o quão difícil estava sendo para ele dizer e lembrar tudo aquilo.- Meu pai queria ir atrás dela e trazê-la de volta, mas não deixei. Ele estava ameaçando matá-la e salvar a vida dela foi meu último esforço como filho.

- Você fez algo para impedi-lo, o que foi?- perguntei curiosa, mas me arrependi quando ele virou com uma lágrima quase caindo dos olhos.

- Denunciei os crimes que ele cometeu para a polícia e fugi antes que pudessem querer procurar minha mãe.- contou.- Eu sabia onde ela estava... Eu já havia seguido ela uma vez e decidi dizer adeus naquele dia, pois eu iria partir daquela cidade para qualquer lugar o mais longe possível das lembranças.- ele fez uma pausa e sentou novamente.- Ela estava lá sorrindo para outro menino e outro homem.

- Ah...- sussurrei pressionando os lábios.

- Eu nunca tinha sentido tanta raiva antes.- Ji Yong continuou.- Fui correndo até a casa e comecei a gritar com ela, falei coisas horríveis, mas não chorei. Minha mãe ficou surpresa ao me ver, mas não respondeu as ofensas.

- O que ela fez?- perguntei.

- Ela nada, mas seu outro marido tentou me expulsar e parecia prestes a agredir se preciso.- ele me deu um pequeno sorriso.- Uma van militar parou na frente da casa e passou por nós pegando o garoto que substituiu-me. Minha mãe começou a agir imediatamente gritando para largarem-no e aquilo abriu uma ferida no meu coração que nunca consegui curar.- mais uma pausa e a lágrima caiu pelo rosto dele.- Eu fui no lugar dele...

- Você o que?!- exclamei chocada.

- Ela queria proteger o garoto, então me ofereci para ir no lugar dele esperando que ela se odiasse pelo resto da vida.- explicou e riu.- Ela abraçou o garoto e me agradeceu.

- Eu...- comecei sem saber o que dizer.- Você... Ji Yong, eu sinto muito.

- A última coisa que vi foi minha mãe entrando na sua nova casa.- ele virou o rosto escondendo as lágrimas.

Eu não conhecia aquele garoto, não sabia nada sobre ele, mas ainda assim queria poder ajudar. Abracei Ji Yong colocando sua cabeça em meu ombro, afagando seus cabelos e costas enquanto o garoto chorava. Assim como eu, ele devia ter mantido para si o sofrimento, raiva e tristeza por tudo.

Ergui o rosto dele e limpei suas lágrimas. Tentei forçar um sorriso, mas não consegui.

- Fique calmo...- sussurrei.- Pessoas erram, ela deve ter sofrido muito depois.

- Estou bem...- ele disse.- Se eu fosse contar nossa história eu teria que passar por isso.

- Por que? O que aconteceu depois?- perguntei confusa.

- O garoto que ela protegia foi levado.- ele disse com um meio sorriso. Meus olhos se arregalaram.- No inicio torturei aquele menino tanto quanto pude, mas depois comecei a cuidar dele. Ele estava assustado e ouvi sua história, ele também tinha sido abandonado como eu...

- Ji Yong não precisa contar...- comecei a querer interromper, mas ele não permitiu.

- O governo estava fazendo experimentos com crianças mais pobres ou com conexão criminal, se me entende...- ele riu.- Acabei lá por culpa dos meus pais e o garoto também.

- Experimentos? Quem faz essas coisas com crianças?!- eu estava cada vez mais chocada.

- Não nos usaram nos testes, mas muitos morreram. De milhares sobraram apenas trinta, me incluindo.- ele continuou.- Podíamos ouvir os gritos daquele que eram levados e nunca voltavam. Aqueles sons perturbavam nossos sonhos durante a noite e deixavam todos encolhidos esperando que não fosse sua vez.- ele andou um pouco pelo quarto.- Chegou a vez do garoto, mas segui meu instinto e fui no seu lugar. Tínhamos feito amigos e eles também queriam que eu ficasse, mas alguém precisava ir.

- Que horror...- sussurrei. Ji Yong parou na janela e riu.

- Eu não sei se tenho muita sorte ou azar, pois logo na minha vez o soro funcionou e alterou minha genética.- ele virou para mim e seus olhos estavam vermelhos.- Aquilo queimou pelo meu corpo e a dor durou muito mais tempo do que pensavam, mas o sucesso os cegou e deixaram-me sofrendo até finalmente meu organismo aceitar a mudança. Então começaram os testes, eles queriam ver o que eu poderia fazer enquanto criavam outros como eu...

- Eles são loucos?!- exclamei chocada. Ele deu de ombros.

- Quem comandava tudo sim, ele fez isso sem permissão.- Ji Yong parecia sombrio.- Eles acabaram descobrindo que foi um erro nos criar. Nossa força quando estávamos calmos era controlável, mas...

- Mas...?- insisti.

- A mudança foi além do que eles queriam.- ele parou ficando sério. Aquilo estava estranho, algo incontrolável, o que é mais incontrolável que jovens com poderes anormais? Habilidades diferentes, olhos coloridos e vontade assassina?!

- Como isso poderia ir além do que queriam?!- perguntei levantando e indo até ele. Tentei virar Ji Yong na minha direção, mas ele não se moveu e quando o fez sua mão agarrou meu pescoço.

- Por que tínhamos uma vontade assassina, desejo por sangue...- ele sussurrava com uma voz estranha.- E algo pior que um demônio, uma coisa dentro de nós que se assumisse o controle só traria morte e destruição...

- Ji Yong...- sussurrei sufocada. Ele pareceu notar o que fazia e soltou-me.

- Desculpe...- sussurrou ao ver as marcas no meu pescoço.- Por isso eu preferia ter morrido, posso sentir o cheiro do seu sangue e tenho vontade de rasgar sua garganta para chegar nele...

- Yah!- gritei e ele pulou surpreso.- Você não vai rasgar a garganta de ninguém! E eu quebro quantas partes do corpo precisar se eu conseguir dar uma surra em você!

- Calma, eu imploro que não quebre mais nada.- ele disse rindo.- Já me sinto responsável pelo seu pulso.

Mostrei a língua e ri junto dele. Nosso momento descontraído durou pouco, ele precisava continuar a história.

- Começamos sendo comportados e torturados para obedecer ou desenvolver resistência.- ele tocou a nuca franzindo o rosto. Virei o garoto e tirei sua mão, ali encontrei escondida sob o cabelo várias cicatrizes e elas desciam para as costas.

- Foram eles?- perguntei e ele assentiu.

- Foi tudo culpa minha...- Ji Yong sussurrou.- Um dia vi tentarem torturar aquele garoto e ele gritava. Ele era mais fraco que os outros, mais frágil e por isso tinha um "tratamento especial". Ver ele sofrendo maus tratos cada vez piores me enlouqueceu, eu tinha prometido cuidar dele e assim eu faria.- ele fez uma pausa e virou-se de frente para mim.- Foi nesse dia que libertei o demônio e condenei todos aqueles ao meu redor. Eu senti minha pele rasgar e arder, meus dentes mudaram... Eu ainda tinha forma humana, mas meus olhos mostravam que não era eu e sim um demônio ali.

- Você se transformou?!- perguntei rindo.

- Não ria...- ele sussurrou.- Perdi minha consciência, só conseguia pensar em sangue. Virei um predador...

- Eu não quis...- ele me interrompeu.

- Matei muitas pessoas...- sussurrou.- Mas não feri nenhum dos amigos, eu sentia como se fossemos uma família que caçava unida. Foi necessário muito tranquilizante apenas para retardar meus movimentos, mas só conseguiram me parar quando uma garota parte do nosso grupo atirou em mim.

- Ela atirou em você?!- berrei surpresa.- Mesmo sendo como você?!

- Eu não conhecia ela, mas admirei sua coragem em ajudar.- ele disse sério.- Mas eu joguei ela longe e não sei se sobreviveu, mas a bala foi útil. Foi assim que descobriram o material que poderia nos deter, não sei exatamente o que é, mas machuca e só é encontrado naquela região.

- Um tipo de metal?- perguntei curiosa.

- Sim, mas é muito raro e resistente. Os envolvidos no projeto usaram aquele metal para fabricar nossas algemas.- explicou.- A bala foi suficiente para todos procurarem pedaços do metal e começarem a atirar, não demorou para eu finalmente estar caído no chão. Quando acordei estava curado de todos os ferimentos causados por coisas comuns, mas os feitos pelas balas especiais ainda doíam muito.

- Foi o que usaram para acertar você aquela hora...- murmurei lembrando do tiro que ele havia levado no braço.

- Sim.- ele disse e continuou:- Pouco tempo depois a base foi invadida por militares e foi ordenado a eliminação de todos nós, incluindo os que criaram e desenvolveram o projeto.

Cobria boca chocada com todo o sangue e dor que passará pela vida dos cinco garotos.

- Prenderam a mim e meus amigos em um lugar separado. Só depois de vermos todos os que nos criaram e arrancaram a humanidade morrer, finalmente chegou nossa hora.- ele ficou ainda mais sombrio e tentou virar para longe, mas não permiti.- Eles começaram a atirar em todos nós, já sabiam sobre as balas e isso era horrível... Eles acertavam nos pontos principais: coração, cabeça... Ou apenas nos feriam por diversão antes de matar. Fugi com meus amigos e aquele garoto, mas me distrai por um segundo e fui pego por um dos homens. Com ferimentos graves e mais os novos acreditei que fosse meu fim, mas no momento que o militar atirou mirando minha cabeça o garoto que tanto odiei e protegi colocou-se na minha frente.

-Ji Yong pare...- sussurrei com lágrimas nos olhos.

- Ele não teve sorte e para mim foi como se todo o ódio tivesse escolhido aquele momento para agir.- Ji Yong derramou uma lágrima.- Minha mãe ter sido má comigo não foi culpa dele. Eu invejava-o, mas não desejava sua morte depois de tanto tempo juntos. Infelizmente o destino moveu a bala pelo coração do garoto e levou a vida dele em segundos...

Abracei Ji Yong novamente fazendo um suave cafuné na sua cabeça. Ele me envolveu com os braços. Quem nos visse diria que nos conhecíamos muito mais do que na realidade.

- Eu estava pronto para morrer e meus amigos se colocaram ao meu lado compartilhando minha dor.- ele continuou.- Nós teríamos  morrido ainda crianças e sem nunca ter visto o mundo, mas dois homens mudaram nosso rumo. Eles nos ofereceram a vida em troca de estudo...

- Foi assim que acabaram naquela base?- perguntei.

- Sim, Doutor Kim e senhor Han nos levaram.- ele disse e afastei-me bruscamente.

- Meu pai?!- exclamei e ele assentiu. Sentei na cama surpresa com o que havia ouvido.

- Nós cinco somos os sobreviventes do Projeto Gartame.- Ji Yong apoiou-se na parede.- Dois dias atrás anunciaram que iriam nos matar e acabar com tudo, por isso a confusão hoje. Lamento que tenha sido envolvida, mas não passamos por tudo isso para acabar assim sem mais nem menos. Eu e os outros queremos escolher nosso destino.

- Entendo seus motivos e sinto muito por tudo...- sussurrei.- Vocês foram tirados das suas famílias sem poder escolher... Eu realmente não sei o que dizer.

- Não precisa dizer nada.- ele foi até a porta do quarto.- Pode ir embora quando quiser, não vou forçá-la a continuar com isso tudo.

Ele saiu do quarto deixando-me completamente sozinha.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "The Monster Inside Me..." morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.