O Clube 5 escrita por marvinkira


Capítulo 17
A Verdade




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O beijo de Lilith não saía da minha cabeça. Ela caminhava tranquilamente ao meu lado, como se nada tivesse acontecido. Eu não sabia ao certo, mas talvez, fosse apenas um beijo e nada mais.

Olhei o horizonte e percebi que logo iria amanhecer. Tínhamos que ser rápidos, pois provavelmente o efeito do creme iria passar e como Lilith disse assistir o nascer do Sol sem isso era morte na certa.

-Vamos indo! – Lilith gritou e começou a correr na minha frente. Eu por puro reflexo comecei a acompanhá-la.

As ruas não estavam tão movimentadas assim, quase não se via pessoas. Mas também fazia sentido, deviam ser quase cinco horas da manhã.

Chegamos à casa de Lilith em quinze minutos. Ela fechou todas as cortinas e caminhou na minha direção sorrindo.

-Essa é uma ótima hora, não acha? – ela perguntou olhando para o relógio.

-Como? – perguntei sem entender.

-Nada. Vou tomar o banho, me espera aqui. – ela disse virando o rosto do relógio e seguindo em direção ao banheiro, parecia frustrada.

Era isso que eu não entendia nela. Tinha momentos que ela parecia um veterano de guerra e outros que parecia uma adolescente comum. Era meio difícil acompanhá-la assim, talvez esse fosse seu jeito, mas de certa forma era estranho.

Fiquei sentado no sofá, tentando imaginar se ela se arrependia do beijo, ou se não ligava para ele, talvez fosse apenas um beijo. Foi então que eu a vi usando um top e uma calça jeans, tendo por cima um casaco. Foi estranho, mas quando eu vi o cabelo molhado dividido na cabeça dela, me lembrei de uma estranha vontade que tinha quando criança, afastar o cabelo de uma garota, prendendo-o atrás da orelhas.

-O que foi? – ela perguntou desconfiada.

-O que foi o que? – perguntei sem entender.

-Você me olhando como uma criança quando vai ao parque. – ela respondeu rindo – Estou estranha?

-Está perfeita. – respondi sorrindo sem graça com o que ela disse.

-Vamos? – ela perguntou.

-Vamos. – respondi. Era meio injusto, mas eu ainda estava com as roupas molhadas, fedendo a esgoto e não tive direito a um banho. Blair adoraria conversar comigo.

Lilith saiu na frente e eu a segui. Fiquei pensando em tomar um banho também, ou o cheiro do esgoto demoraria dias para sair do meu corpo, mas quando me lembrei de tudo o que ocorreu, seria melhor eu fazer o que tinha que fazer antes da higiene.

Minha cabeça estava prestes a explodir, a morte do meu pai, como seria o futuro agora sem ele, que planos Lilith tinha para encobrir esse fato e deixar que minha vida voltasse ao normal. Esse último pensamento era impossível, desde aquela mordida, nada na minha vida voltaria ao normal. E um último pensamento também passava pela minha cabeça, o beijo.

Não sei se é normal um homem pensar tanto em um beijo, mas aquele momento, por mais sujo e nojento que fosse, foi incrível. E cada vez que eu pensava no beijo, também pensava em afastar o cabelo da Lilith prendendo-o atrás da orelha. Era estranho, mas seria romântico.

-Caraminholas na cabeça? – Lilith perguntou rindo.

-Um monte. Meu pai, Blair, eu e você. – tentei não parecer um garotinho que teve seu primeiro beijo quando disse essas últimas palavras e a encarei nos olhos.

-Seu pai deixa comigo, eu sei o que fazer, confie em mim, a Blair eu também estarei lá para te ajudar. – após dizer isso ela desviou o olhar e continuou – Bem, nós dois continuamos sendo o que somos.

-E o que nós somos? – perguntei.

Lilith tentou fingir que não ouviu e seguiu em frente, mas eu queria limpar aqueles pratos ali mesmo e a segurei pelo braço, com leveza. Ela parou e se virou para mim, me encarando nos olhos. Era quase hipnotizador olhá-los, azuis e naquela hora, vivos.

-Por que você me beijou? – eu perguntei.

-Foi um impulso. – ela respondeu sem graça.

-Alguma coisa causou esse impulso. – eu disse – Algum sentimento.

-Vampiros não são abençoados a sentir nenhum sentimento. Principalmente amor. – ela respondeu virando o rosto para a rua, nessa hora vazia. Ela dizia isso parecendo um veterano de guerra, uma vampira centenária.

-Eu sou o vampiro mais estranho da história, porque eu amo. Minha família, meus amigos e principalmente você. – eu confessei tentando manter o olhar nela. Quando disse você, Lilith me olhou sem graça, era uma adolescente comum de novo – Não existe nada de errado em amar. O verdadeiro erro é não amar.

-Você está confuso Tiago. – ela disse tentando voltar a andar, mas eu segurei firme o pulso dela.

-Eu estou certo dos meus sentimentos. – eu respondi – Quem está confuso aqui não sou eu, Lilith.

Ela fez muita força e então abaixou a cabeça por alguns segundos, levantando-a finalmente e me encarou com uma mistura de alívio e dúvida.

-Isso pode ser um erro. Eu não deveria ter te beijado e não deveria ter agido daquele jeito. – ela disse finalmente me encarando. Dessa vez fui eu que tentei virar o rosto, mas não consegui. – Eu já tive um relacionamento antes com outro vampiro e não deu muito certo. Ele assassinou um vampiro a sangue frio, o conselho descobriu e eu que tive que matá-lo. Eu não quero ter que perder outra pessoa que amo, na verdade, não quero dar ao luxo de amar para que não me arrependa de novo, mas de um tempo para cá, é quase impossível isso. – ela disse isso virando o rosto – Sim, eu te amo Tiago, mas você é um vampiro jovem, não vai querer passar uma eternidade ao meu lado, sou azarada.

-Eu vou arriscar. – respondi sem fôlego, era tudo que queria ouvir dela, a palavra amor. Passei minha mão pelo seu rosto e prendi finalmente o cabelo dela atrás da orelha. Lilith aproximou o rosto do meu e me deu um selinho me afastando logo em seguida.

-Melhor arranjarmos outro lugar. – ela disse sorrindo – Mas antes, temos que visitar sua prima.

Fiquei frustrado com aquilo, sinceramente, ela tinha estragado meu momento romântico. Continuamos o caminho até minha casa. Olhei o céu e percebi que a luz do Sol começaria a aparecer, mas já estávamos no portão de casa. Entramos e eu abri a porta, deixando que Lilith entrasse primeiro.

O ambiente dentro de casa estava escuro e fúnebre, parecia que a casa previra a morte do meu pai. Enquanto deixei que Lilith se acomodasse na sala, fui fechando todas as cortinas e subi para o segundo andar, pegando o pote de creme e passando no corpo. Desci com o pote e o entreguei a Lilith, que também passou o creme pelo corpo.

-E agora? – ela perguntou.

-Esperamos Blair, ela sempre acorda cedo. Não deve demorar muito a acordar. Quer assistir algo na TV? – perguntei.

-E tem alguma coisa boa na TV agora? – ela perguntou rindo – Podemos passar o tempo com outra coisa não? Tem algum jogo aí?

-Eu estava pensando em matar o tempo com outra atividade. – eu disse olhando para a janela.

-Pervertido. – ela respondeu e quando me virei para encará-la, vi que estava sentada no braço da poltrona que eu estava. Ela aproximou o rosto do meu de novo, quando ouvi um barulho na escada e vi Blair de camisola me encarando com surpresa e um ar de riso.

-Podem continuar, eu vou subir de novo, só ouvi vozes e vim ver quem era. – Blair disse sem graça.

-Não, não, pode ficar. – Lilith disse voltando a se sentar no sofá que estava. Por mais que eu quisesse esse beijo, ela tinha razão. Era hora da verdade, eu tinha que contar para Blair.

-Prima, eu tenho que falar com você. – eu disse sério e olhando diretamente para Blair – Senta aqui. – disse me levantando da poltrona e sentando ao lado de Lilith no sofá.

Blair caminhou insegura até a poltrona e sentou-se. Ela olhava para mim e Lilith curiosa e se ajeitou na poltrona.

-O que foi? – ela perguntou.

-Não tem um jeito fácil de dizer isso, mas... – eu comecei, mas fui logo interrompido por Blair.

-Você não é gay, né? Eu juro que pensei que vocês fossem se beijar se eu não chegasse. – ela falou sorrindo.

Lilith riu ao meu lado e me olhou um pouco mais compreensiva. Parecia que Blair estava tentando aliviar a situação.

-Na verdade não. – eu tentei forçar um sorriso no rosto e então olhei firme para Blair – Na verdade, é a pior coisa que eu posso te contar. – Blair fez uma careta e começou a ficar séria, prestando atenção em mim – Meu, digo, nosso pai, ele está morto.

Blair me olhou arregalando os olhos e depois se virou para Lilith, que nessa hora segurou minha mão.

-É verdade? – Blair perguntou mais para Lilith do que para mim.

-Sim. – ela respondeu, fazendo com que Blair virasse o rosto para mim em choque e tristeza – Eu também perdi meu pai faz pouco tempo e sei como vocês se sentem por isso o Tiago pediu minha ajuda.

Blair começou a chorar baixinho, mirando para o chão, depois ela secou os olhos e me olhou de novo.

-Como ele morreu e como você sabe disso, alguém te contou? Ele não pode ter morrido faz tempo, eu o vi ontem de manhã saindo para o trabalho, estava tão bem. – Blair perguntou, embolando as palavras. Eu fazia muita força para não chorar também, mas minhas lágrimas já haviam se secado no clube, na hora da morte de Bruno.

-É sobre isso que quero conversar com você também. Eu... – olhei para Lilith tentando arranjar apoio e virei o rosto para Blair de novo – Eu estava lá. Nosso pai, ele foi capturado por um vampiro e estava sendo controlado por ele, e para me salvar, ele acabou se entregando e foi morto. Ele morreu por mim.

-Espera. – Blair disse, parando o choro leve que saiu dos seus olhos e me encarou com uma mistura de surpresa e interesse – Vampiro?

-Sim. – eu disse encarando-a – Eu também sou um vampiro.

Blair riu e se levantou me olhando.

-Isso é brincadeira, não é? – ela perguntou me olhando rindo – E eu quase caí, o pior é que botou o nome do tio Bruno no meio.

-Não Blair, não é brincadeira. – Lilith disse séria, era a Lilith mais madura – Tiago é um vampiro e eu também sou. Sou uma Vigilante, protejo a sociedade dos vampiros dos olhos humanos. Eu e Tiago estamos entrando em perigo só por te contar isso, mas achamos que você tinha o direito de saber a verdade. A morte de Bruno será escondida de todos, todos acharão que ele ainda está vivo, até mesmo o pessoal do departamento dele, pensarão que ele pediu transferência e outra pessoa se passará por ele, bem longe daqui, mas você e Tiago continuarão morando aqui, como sempre, podem até ir à escola se quiserem, nada mudará. Eu sei disso tudo, porque é o meu trabalho. Por que você acha que nunca deram a existência dos vampiros como real?

-Eu tinha deixado de acreditar na existência deles, eu tinha largado tudo o que pesquisei, achando que era tudo um caso de serial killer, mas agora, tudo era verdade. – Blair disse mais para si do que para eu e Lilith – Vocês são imortais?

-Se não fizermos besteira e nos alimentarmos seremos. – Lilith disse.

-Se alimentam de sangue? São fortes? Resistentes? Velozes? – Blair perguntou – Tudo isso?

-Sim, tudo. – Lilith disse.

-E como o Tiago virou um vampiro? – ela perguntou – Eu sei que ele não era um quando nos conhecemos, ele não tinha jeito.

-Faz algum tempo, no mesmo clube em que seu tio morreu. – Lilith disse. Isso parecia ter trazido Blair para o tema principal da noite, a morte do meu pai.

-Bem, meu tio foi controlado por um vampiro e morreu. – ela me olhou – Você não fez nada?

-Desculpa, eu não pude, estava paralisado. – respondi.

-Uma estaca estava cravada no peito do Tiago e ele não podia se mover. – Lilith me defendeu.

-Isso também é real. – Blair comentou – A culpa não foi sua, primo, me expressei mal.

-Certo. – eu disse – Bem, eu não quero te assustar, mas o seu...

Parei de falar na hora. Um cheiro forte e podre entrou pelas minhas narinas. Era o cheiro da morte, outro vampiro, na frente da minha casa. Mas era um cheiro diferente, mais forte que o da Lilith e do Castiel.

-Um vampiro poderoso, antigo. – Lilith disse para mim, mas não pudemos fazer nada. Duas estacas voaram na nossa direção, atingindo-nos no peito.

Dois vampiros entraram pela porta da frente, arrombando-a. Ouvi Blair gritar e vir na minha direção tentando tirar a estaca do meu peito, quando um dos vampiros a segurou. Outro vampiro entrou também. Era loiro e alto, não forte, mas era dele que vinha o cheiro forte.

-Senhor, eles estão presos, mas o que fazemos com a humana? – o vampiro todo de preto perguntou – Devemos matá-la?

Tentei inutilmente me livrar daquela paralisia. O vampiro loiro me olhou com ar de riso e se virou para os outros dois.

-Nossa ordem é de capturá-los, mas não temos nada contra a humana. Se ela souber de alguma coisa ou tentar fazer algo você a mata. – o loiro disse – Luca venha comigo. Fique aqui Paolo, outro amigo desses dois pode vir aqui, teremos que capturar todos eles, precisam ser julgados pelo Conselho, é o desejo do Conselheiro Green. Vamos.

O outro vampiro de preto, chamado Luca começou a me carregar nos ombros enquanto o homem loiro carregava Lilith. Havia um carro preto parado na frente da minha casa e fomos jogados lá dentro. Lilith estava caída no meu colo e antes da porta fechar, eu pude ver o Sol nascendo no horizonte. O que seria de Blair, sozinha na casa com um vampiro desconhecido e sob ordem de capturar mais alguém, mas quem? E principalmente o que seria de mim e Lilith, eu queria muito me soltar daquela prisão paralítica, mas era impossível. Tudo começou a escurecer e eu apaguei de novo. Mais uma vez, mostrei minha inutilidade para salvar quem eu mais amo.


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