Uma Estranha No Meu Quarto escrita por Damn Girl


Capítulo 46
Capitulo 40 - O final (parte 01)


Notas iniciais do capítulo

FELIZ ANO NOVO!!
Não pude postar ontem por que não estava concluído mas cá estou eu, escrevendo ao invés de estar me arrumando para trazer para vocês o final antes de virar o ano, e cumprir com a minha promessa. E eu consegui UHUL o/

Finalmente concluí, estou tão animada. Eu quero MUITO conhecer vocês que leram, e saber o que vocês acharam do final. Fora que é a última oportunidade para se manifestarem né fantasminhas. Então se apresentem agora ou calem-se para sempre kkkkkkk To brincando, mas é serio, falem ao menos um "oi to aqui no final', eu vou amar, ok?



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/226324/chapter/46

         A dor de perder os meninos me consome. Não quero pensar nisso enquanto dirijo, mas não consigo conter as lágrimas que rolam por meu rosto. E principalmente a culpa que assola meu coração. Tento disfarçar, mas um soluço involuntário escapou entre meus lábios enquanto percorria a trilha de terra que leva de volta a casa.

            Relembro todos os anos que passamos juntos. O tempo em que brincávamos no parquinho, nosso primeiro ano na escola. Nossa primeira expulsão. Os primeiros amores e decepções. Estávamos sempre ali uns para os outros. Todos os natais que passamos juntos, nossas famílias unidas como uma só. Eles era mais que amigos, eram meus irmãos e eu os pus em perigo.

— Eu devia ter ido sozinho.

            Sussurro mais para mim, do que para qualquer um que possa ouvir. Ser mediador é minha função e de mais ninguém. Mesmo assim os envolvi no meu trabalho mais perigoso.

A essa altura nem sinto mais a dor em meu braço. A dor emocional se sobrepõe a qualquer outra que possa existir. Perdi as contas de quantas vezes perdi o controle da direção no resto do trajeto, no entanto enfim estávamos chegando de um caminho do qual não havia mais volta.

Jaynet toca a parte externa da minha coxa com sutileza. Ela não chora, pois não pode, no entanto vejo seu rosto e seu semblante também não é dos melhores.

— Não é culpa sua. — A voz dela saí fraca e desanimada. — A culpa é minha.  Eu deveria ter alertado mais sobre os perigos de invadir o instituto...

— Não diga isso, Jaynet. Você alertou, diversas vezes. — Suspiro sem remover os olhos da estrada. — Eu quis ir na empresa do seu pai. Eu pedi ajuda aos meninos. Eu insisti. A culpa é toda minha.

— Por que você queria me ver bem!

— Queria e ainda quero. — Afirmo tentando passar o máximo de convicção. — Os meninos eram meus amigos, minha família. Mas você também é Jay. Passamos por tanta coisa juntos esse ano... E independente do sentimento que obviamente existe entre a gente, você é minha amiga e eu me preocupo com você, e sempre vou querer seu bem estar.

— Christian...

— Não se culpe por nada que aconteceu. — A interrompo já avistando a propriedade e Ana parada no batente da porta. — Os meninos se sacrificaram para te salvar, vamos honrá-los e continuar. Eu sei que é difícil, mas vamos evitar de pensar nisso no momento. Eu nem sei o que acontecerá agora precisamos nos concentrar no ritual.

— Eu nem sei se eu mereço mais estar viva...

            Estacionei o carro em frente à entrada da casa e segurei seu queijo, exigindo sua plena atenção. Não há qualquer traço de esperança ou mesmo de alegria em seus olhos antes tão zombeteiros. Suas íris exibem uma aflição tão grande que praticamente transbordam dela para mim. Os sol recém erguido é absorvido e misturado em seu espectro pálido, emprestando um pouco do brilho dourado. Pelo meu campo de visão consigo avistar Ana descendo ansiosamente os degraus da escadas da varanda.

— Nunca mais diga isso, Jaynet. Você é uma pessoa boa e merece sim uma segunda chance.

            Jaynet assente cabisbaixa, mas mesmo relutante sai do carro e vai falar com Ana. Envolvo seu corpo com um lençol e a pego em meu colo, indo em direção a elas. Seus braços despendem no ar e balançam conforme me movo e a temperatura de seu corpo agora pode ser assemelhada com alguém que esteja em um ambiente frio. O vento movimenta seus cabelos conforme o rosto repousa em meu peito.

Ana encara o corpo de Jaynet com os olhos arregalados e boquiaberta. Ao contrário do corpo em meus braços, seus cabelos se movem minimamente, quase que estáticos. Concluo que devem ter outros fatores que influenciam nos movimentos de fantasma. Algo como gravidade, vento devem ser para eles como o queimar de um fogo, o a sensação de molhado. Imperceptíveis.

Me pergunto como Jaynet irá reagir quando sentir os primeiros pingos de chuva e desejo secretamente que eu esteja com ela.

— Achei que as unhas de alguém morto ainda cresciam, mas as suas estão impecáveis.

— Só até certo ponto, Ana. Eles devem ter cuidado... de mim.

— Cadê os meninos?

            Jaynet e eu nos entreolhamos. Abro a boca várias vezes, mas nada saí. Ter que dizer que eles faleceram torna tudo mais real. É minha fantasma quem anuncia a sentença num fio de voz.

— Os meninos morreram...

            Ana ergue as sobrancelhas surpresa, mas não diz nada por um momento. Depois elas se franzem, causando um vinco em sua testa e ela me encara, visivelmente confusa.

— Como assim? Roosevelt disse para mim que eles estão bem. — Seus olhos vão do corpo de Jaynet até o torniquete mal feito em minha blusa. Ana pega a mão da Jaynet fantasma e a arrasta escada acima. — Vamos lá para dentro, e conversaremos melhor. Deve ter sido uma viagem cansativa...

            Sigo-a em direção a porta, anestesiado. Não quero me iludir e achar que os meninos estão vivos, só para depois ter a confirmação de que de fato não estão. Contudo conforme cruzo o batente e avanço pela sala a esperança é tanta que chega a queimar meu peito. Imagino os meninos saindo de um cômodo e avançando sobre mim, Nick e Michael com suas frases horríveis e Kevin com seu jeito mais tímido.

No entanto Roosevelt surge sozinho, o que faz com que a imagem se dissolva em minha mente como um monte de areia em meio a uma ventania.

— Christian disse que os meninos faleceram.

— Onde você ouviu isso? Na TV? — Roosevelt pergunta a mim diretamente e assinto. Ele então abre um enorme sorriso. — Eles estão bem, não se preocupe. Eu mesmo os salvei. Os bombeiros vão procurar até cansar.

— Ai graças a deus! — Jaynet se joga nos braços de Roosevelt, enterrando o rosto em seu ombro com desespero. — Pensei que eles haviam partido por minha causa. Fiquei tão nervosa. Muito obrigada por salvá-los, Roosevelt!!

— Tudo bem, Jaynet. Eles meio que são minha responsabilidade. Afinal, eu quem convenci Christian de que era possível adentrar o prédio. — Roosevelt volta o olhar para mim e para o corpo inerte em meus braços. — Não precisa se preocupar Christian, eles estão todos bem, você tem minha palavra. Em breve entrarão em contato, creio que ainda não fizeram por que seus aparelhos de telefonia móvel ficaram dentro do furgão. — Ele estuda o meu rosto com de forma atenta. Parece preocupado e sua voz saí meia receosa quando pergunta. — Podemos seguir com o ritual agora? Você está se sentindo mal?...

            Eu mal consegui processar parte do que ele dissera. Tudo que eu havia entendido era que os meninos estavam bem e o alívio que eu senti foi tão grande que minhas pernas estremeceram e eu deixei de bancar o forte, caindo de joelhos no chão empoeirado. Meu ombro latejou com força, exigindo toda atenção da qual eu estava renegando-o até então e quis disfarçar, mas não consegui conter um gemido tomado de angustia. A pontada foi tão infernal que o corpo de Jaynet quase despencou de meus braços. Não estava mais conseguindo ignorar, me sentia tonto, fraco e febril; tomado por uma sensação terrível, como se eu suasse de dentro para fora. E nem mesmo o corpo gélido de Jaynet estava me ajudando a melhorar.

            Encontrei os olhos de Roosevelt, esperando que ele entendesse que eu estava no meu limite. Não queria apavorar Jaynet, tampouco Ana. Mas se enrolássemos mais, eu certamente perderia os sentidos e sangraria até a morte.

— Vamos logo com isso. — Supliquei, erguendo meu rosto.

            Ele assentiu e para meu espanto — e imenso alívio —, Roosevelt se abaixou e pegou o corpo de Jaynet nos braços.

Por um lado eu queria carregar ela até o final, mas eu estava cansado demais, sonolento demais. Me levantei e segui o fantasma com dificuldade até a uma segunda sala, menor que a primeira e arfei com a “decoração” feita para a ocasião.

A sala estava plenamente vazia, exceto pelos quadros e pelo chão; Desenhado em seu centro havia um enorme círculo lapidado na madeira e dentro dele um círculo menor com inscrições em um idioma que eu não conhecia, mas que julgava ser do livro. Cada palavra entalhada era separada por uma vela vermelha, e um fio também vermelho que ziguezagueava dentre cada uma delas, unindo-as de certa forma.

Mais velas estavam posicionadas nos batentes fechados da janela. E ainda assim a estranha escuridão envolta em todo cômodo transmitia a errônea impressão de que nós invocaríamos ali o próprio Lúcifer, e não uma fantasma tão inofensiva com a qual eu convivi um ano inteiro em meu quarto.

— Eu imaginava algo mais... alegre. Já que é um ritual para a vida, e não de morte.

            E menos maligno também.

— Também estranhei, mas segui as instruções da folha. — Ana suspirou encarando sua obra macabra no meio do piso. — Tem certeza que transcreveu isso direito, Roosevelt?

— Claro. — Anuiu com o semblante um pouco ofendido.

            Jaynet permaneceu em silencio enquanto seu corpo era depositado no centro de tudo aquilo. Fitei seus olhos tentando decifrar o que se passava em seu interior, o que ela estava sentindo naquele exato momento e cruzei a sala, buscando ficar próximo a ela. Peguei sua mão e entrelacei com as minhas, escondendo meu próprio nervosismo e tentando transmitir uma confiança que eu mesmo não possuía.

— Estou muito nervosa. — Sussurrou ao pé do meu ouvido como se lesse meus pensamentos. — Mal consigo olhar.. para mim.. você sabe, pro corpo.

— Eu também... — Esfrego suas mãos nas minhas. — Mas vai dar tudo certo amor...

            Sinto os olhos de Hugo queimando em minha direção e retribuo com a mesma intensidade. Xerife também está parado em um canto da sala, um dos pés apoiado na parede enquanto a mão alisa o coldre vazio em sua cintura. Até mesmo Jason sempre tão explosivo fita o corpo em um silêncio carregado de expectativa. Não tenho tempo nem de agradecê-los, pois Roosevelt aparece em meu lado.

— Preciso do sangue de um mediador. — Ele exibe um sorriso fraco, meio que se desculpando. — Sei que está cansado mas corte a mão e deixe pingar no centro do círculo.

            Jaynet me encara preocupada. Dou de ombros, separando-me dela e me aproximo do centro, pegando a faca larga da qual Ana me oferecia. Já havia perdido tanto sangue por toda a noite, que a essa altura derramar um pouco a mais não faria a mínima diferença.

Estendo a ponta da lâmina prateada para minha pele e executo um corte na palma de minha mão direita. O ferimento arde, mas eu o aperto com vontade entre os dedos, fazendo com que o sangue escorra em maior quantidade. Os pingos caem no chão e fico ali parado, esperando algo acontecer feito um trouxa.

— Pode ir pro canto da sala, Christian. Ou você quer falar?

— Em latim? Pode esquecer.

— Tudo bem, então. Melhor se afastar, eu não sei o que vai acontecer...

             Obedeço e vou até Jaynet que não estava mais parada e sim sentada nos primeiros degraus da escada. Me junto a ela sentando no terceiro degrau e abraçando os joelhos. Vejo Ana também tomar certa distância enquanto Roosevelt começa a ler a folha em um latim impecável. Resisto a vontade de revirar os olhos; ele é sempre tão perfeitinho que chega a dar raiva. Mas ao menos Jaynet me escolheu, o estudante desocupado de dezessete anos.

— E sua mão? — Indaga ela numa tentativa de se distrair.

— Foi só um corte. — Exibo o traço mediano em minha palma vermelha pelo sangue ressecado. — Nada demais, não se preocupe.

— Assim que terminarmos aqui, eu vou te levar ao médico. E nem adianta dizer que não, por que eu sei dirigir melhor que você.

— Pode dirigir o quanto quiser, Jay. — Imagino ela entrando no hospital comigo, viva. Os enfermeiros perguntando a ela o que aconteceu, pedindo-a para preencher minha ficha. Coisas tão simples, mas tão significativas para a garota invisível ao meu lado. — Na verdade, eu vou adorar...

            O telefone toca de repente em meu bolso. Quero atender e ouvir a voz dos meninos, mas me contenho e desligo o telefone. Não posso perder nenhum detalhe do ritual ou mesmo atrapalhar a concentração do fantasma à minha frente. Roosevelt continua seu discurso sem sentido, acompanhando o traçado do círculo a passos lentos, dando voltas e voltas, mas ainda de fora dos limites dele. A versão fantasma de Jaynet continua serena ao meu lado.

— Não está sentindo nada? — Questiono ansioso.

— Não. O que eu deveria sentir?

— Não sei. — Sussurro. — Um formigamento, um incômodo... sei lá.

— Não estou sentindo nada. — Reafirma com absoluta certeza.

            Fico apreensivo. Se o ritual não funcionar o corpo de Jaynet irá apodrecer, e será definitivamente o fim. Todas as fichas foram depositadas nele, na aposta mais alta de toda minha vida. Esfrego os dedos um no outro, seco o suor em meu rosto, o tempo todo lutando contra o enquistamento. E quando Roosevelt enfim termina, me levanto num rompante e suspiro, passando as mãos pelos cabelos. Ele tenta disfarçar sua expressão atônita, mas vejo em seus olhos a decepção que eu tanto temia.

            Deu errado... O ritual deu errado.

Um clima pesado preenche a sala e impaciente avanço próximo ao círculo junto dos outros fantasmas que a observavam. Encaro o corpo de Jaynet jazendo no chão, e depois meus olhos voltam para a Jaynet fantasma ao meu lado, com um aperto inexplicável e imenso no peito.

Nós havíamos fracassado. Eu sabia que ela não demonstraria nada, mas que estava arrasada por dentro. Segurei sua mão torcendo que meu toque transmitisse tudo que minha boca não conseguia. Pigarrei e com muito custo as palavras saíram de dentro de mim, acompanhadas de uma voz embargada da qual eu não conseguia esconder.

— Eu sinto muito, Jaynet.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Calma que tem parte dois AGORA MESMO!!! fiquem aí rsrssr