Pov. off

Tigresa arfou pesadamente enquanto perseguia a misteriosa figura que havia se mostrado há algum tempo atrás. Jin estava logo atrás de si, tentando alcançar ambos, e ficando incontáveis metros para trás.

Durante a perseguição ela não pôde deixar de pensar se esse seria o mesmo agressor que aparentemente desejava matá-la um pouco antes de seu encontro com Jin e Quiong.

Ela corria o mais rápido que podia, se aproximando cada vez mais do vulto. Conforme se aproximava o embaraço de sua visão parecia ceder, e o corredor a sua frente era cada vez mais visível.

Ela forçou suas pernas e braços a se movimentarem mais rápido, usando seu próprio poder espiritual para impulsionar sua velocidade, mais ainda assim... ele era rápido.

Enquanto o perseguia, ela tentava imaginar por onde o caminho que tomava os levaria, e assim ela lembrou.

Era um fato do qual ela não pensara que pudesse ser útil, um fato que nunca a agradara muito, mas era algo que provaria ter utilidade.

Vale da paz estava cheio de terminações rochosas, de cavernas... e de penhascos também.E era exatamente para onde o guerreiro se encaminhava.

Então era isso... ele ficaria encurralado.

Ele mesmo se asseguraria de sua própria captura.

Não demorou para sua teoria se mostrar concreta, e o cenário terminou exatamente como ela imaginara:

O fugitivo na ponta do penhasco, ela bem e sua frente, enquanto Jin se encarregava de cobrir o maior espaço que podia, evitando uma possível fuga.

A figura andou em direção a ela, provando mais uma vez que sua teoria era certa.

Esse era... bem... qual era mesmo seu nome? Lien Kong? Sim... era isso.

O leopardo desembainhou sua espada, pronto para o combate, e assim fez Tigresa. Mas no final... as coisas não saíram como ambos esperavam.

Um figura de estatura média se interpôs entre os dois, erguendo os braços em sinal de rendição, mas permanecendo ao centro dos olhares. Da pouca distância em que se encontrava, Tigresa podia identificá-lo como um gato montanhês, como olhos de um verde desbotado e músculos quase inexistentes.

– Hum... er... desculpe atrapalhar... - o estranho se mostrou nervoso, mas ainda assim determinado a terminar a sentença

– O que você quer? - A guerreira não se preocupou em demonstrar educação, afinal, era provável que esse também fosse um inimigo

– Er... me desculpe... eu vim pegar o Lien... hehe - o misterioso riu nervosamente, agarrando a mão de Kong e tentando puxá-lo para longe

– Ei... moleque, saia daqui! Essa luta é minha - Lien disse furioso

–Mas Lien... não... vamos voltar... - o menor disse, tentando puxá-lo a força

– Estou ocupado... vou matá-la, então saia da frente - o leopardo disse sem paciência

–Não...não... Lien, ela parece boa pessoa! Isso é errado... se você perder... - o gato das montanhas se contorcia, tentando arrastá-lo para longe de qualquer forma

–Ei moleque... essas são minhas ordens. Não sei se ela é do bem ou não. Simplesmente não me interessa - o outro disse em um rugido, retirando-se do aperto de seu companheiro.

–Lien.. você não é assim... - menor caiu de joelhos, fechando suas mãos com força, e continuou seu balbucio - Eu te conheço, você não precisa seguir as ordens desse cara, você não é escravo dele! - O gato gritou angustiado

–Droga Kuo ... levante-se! - o leopardo gritou, sendo ignorado completamente

–Lien... pare com isso... por favor - o gato sussurrou - Já chega - disse em um murmuro

–Você sempre me causa problemas... ah...tudo bem- o maior finalmente pareceu ceder

– O que você vai fazer Lien? - o menor perguntou, esfregando o rosto

– Ei, você! - Kong apontou para Tigresa, com um tom de aço em sua voz

Ela arqueou a sobrancelha

– O que você quer? -perguntou simplesmente

– Me diga o motivo pelo qual querem te matar!

– Como eu vou saber? Você deveria... já que foi você aquele que veio fazer o trabalho - ela provocou

– Ora, sua... - ele começou, sendo parado por uma mão em seu ombro

O gato, aparentemente nomeado Kuo, olhou para a guerreira com olhos suplicantes.

–Por favor... - disse baixinho

Ela suspirou

–Eu não sei exatamente... minha família há cerca de vinte anos governava o vale, e a família daquele príncipe tomou posso se aliando a aldeias vizinhas... e meus pais fugiram comigo e me trouxeram pra um orfanato por aqui. Aparentemente ele queria matar a todos da família... mas eu acredito que seja algo mais.

– Só isso?! Aquele príncipe desgraçado... isso não é motivo para matar alguém! - Kong gritou exaltado

– Eu ouvi sobre uma profecia - o menor disse pensativo

–Uma profecia? Sobre ...

– Sobre você - ele completou por mim

–Então... o que ela disse é mesmo verdade Kuo? - Lien perguntou desconfiado

–É verdade... mas não é só isso... mesmo assim ela não cometeu nenhum crime, certo? Então ela merece viver - o gato concluiu

–É... sim

– Vamos ajudá-la Li?

– Ei! Não me chame disso pirralho... - ele me olhou de canto de olho

– Vamos, Li?

– Por que você quer ajudá-la?

–Ela é do bem, pelo que eu vi é um héroi por aqui, ela ajuda as pessoas! E também... é a nossa chance de liberdade

–Então... você e daquele grupo... Cinco Furiosos?- sua pergunta era direcionada a ela

– Sim - respondeu em tom de tédio

– Que seja... mas... vai ser divertido chutar o traseiro daquele cara - ele disse com um sorriso maldoso, aparentemente se referindo ao príncipe

O menor se virou para mim sorridente, com um leve rubor perceptível através de sua pelagem.

–Vamos te ajudar - disse com voz melodiosa

O maior também parecia animado, o sorriso sádico não abandonara seu rosto, mas agora ele olhava para a guerreira com uma leve expressão de satisfação.

Ela encarou ambos por um breve momento, ates de voltar seu olhar para Jin, que permanecera calado durante toda a discussão. Seu amigo parecia satisfeito.

Mas se o que Kuo dissera fosse verdade... eles deveriam saber mais sobre essa profecia.

Por fim, ela resolveu que o perguntaria depois. Afinal, isso poderia esperar.

* * * * * * * * * * * * * * *

Palácio de Jade

O velho mestre se encontrava sentado abaixo do pessegueiro, ele tentava meditar e esvaziar sua mente, mas ainda haviam algumas questões que assombravam a mesma.

E essas questões podiam ser facilmente resumidas em um único nome.

Tigresa.

O mestre quase não soube como lidar com suas próprias emoções com o retorno da guerreira. Tanto alívio, tanta alegria... mas, no final das contas nada mudara entre eles.

Talvez isso fosse culpa dele. Afinal, ele a ensinara a ser assim, não era isso?

Ele a ensinara a ser tão fechada a todos e a trancar suas emoções dentro de paredes de aço, a chaves e cadeados.

Paredes de aço...

Isso o lembrava de outra coisa: Arvores de pau-ferro

Aquelas que sua filha socara por anos a fio, sem parar até não ser capaz de sentir absolutamente nada nas próprias mãos.

Se ele sabia? Ele descobrira há alguns anos atrás, mas o que ele fez?

Deu um pequeno sermão uma única vez. De que isso adiantou?

Nada.

Ele acreditava que aquilo era culpa de Tai Lung, e que por sua vez era culpa dele ter transformado o leopardo da neve em tal monstro.

Mas era mentira.

A verdade era que...

Era tudo culpa dele.

Mas o olhar que vira no rosto de sua filha assim que a mesma recobrara sua consciência... aquilo partiu seu coração.

Ele foi capaz de enxergar toda a dor mascarada através daqueles olhos escarlates, toda a angustia contida neles... ele viu tudo.

E o que ele fez?

Nada.

Mas a verdade era que ele não sabia o que fazer, não sabia como interagir com ela, com sua própria filha!

Ele a renegara por tanto tempo, escondeu todo seu amor... e a fez crescer acreditando ser uma criança mal-amada.

Depois de tudo isso... depois desse vinte anos.

O que ele poderia fazer agora? Pedir desculpas?

E se ela o rejeitasse?

Talvez isso fora uma das coisas que o fizeram abrir seus próprios olhos.

O olhar dela, aquele olhar gélido sem um traço de reconhecimento, sem um pingo de afeto. Apenas um olhar perdido, desamparado e sofrido.

Era isso. Naquele olhar ele viu sua independência, ele enxergou sua declaração silenciosa.

Sua declaração de que ela não precisava mais dele.

E agora ele tinha medo de não ter mais a chance que ele sempre enxergou em seus olhos, que apesar de rigorosos, eram acolhedores.

Agora aquele olhar estava perdido.

Era isso.

Isso é o que ele havia feito com sua própria filha.

O velho mestre voltou para sua meditação, tentando encontrar algum conforto nela, mesmo sabendo que não o encontraria.