Tudo o que aconteceu após Muramasa me tirar daquele local, era algo que eu pretendia esquecer. Havia começado a chover, eu estava jogada sobre a minha cama chorando. Meu pai pediu permissão para entrar, seu rosto parecia muito abatido e o cansaço dele era evidente. Ele meneou a cabeça negativamente quando eu o olhei, então, sentou-se na beira da cama. Há muito tempo eu não o via daquele jeito, nada conseguia fazer Kuchiki Ginrei chorar e mesmo assim, vi uma única lágrima cair em seu rosto. Papai usou palavras duras para me contar o que aconteceu, disse que Kouga matou muitos homens para poder se defender e por isto, ele e o Soutaichou tomaram uma decisão. Ambos enfrentaram meu marido, mas não com o intuito de matá-lo, sabiam que não era possível, sobretudo quando ele estava descontrolado. A única opção era criar um ritual de selamento complexo e só conseguiram, porque, pelo que entendi, Muramasa não ouviu o chamado de Kouga. Assim, eles aprisionaram meu marido e meu pai deve ter tirado um fardo pesado das costas, havia limpado o nome da família. Para ele era tudo o que importava. Para mim, teria sido menos doloroso saber que Kouga estava morto.

– Que tipo de lei impõe o sofrimento eterno a um ser vivo? Sem alimento... Sem luz. Isto é cruel! – Eu me levantei, contornei a cama e me ajoelhei diante do meu pai. – Por favor, me diga onde meu marido foi selado...

– Não posso, Yuki – lamentou ele. – Para a sua segurança e a segurança de todos nós, esqueça Kouga.

– Vocês não podem... Ele está vivo, otou-sama! Libertem-no... Eu sei que o senhor pode levá-lo a um julgamento justo. Ele teve um colapso mental... Por culpa de vocês.

– A culpa foi dele! – Kuchiki Ginrei colocou-se em pé e me olhou severamente. – Kouga era um homem de coração fraco... E um homem assim não é digno da família Kuchiki. Graças aos deuses que ele não deixou herdeiros, teria sido vergonhoso para nós alguém com o sangue de Kouga.

– O senhor não pode estar falando isto com sinceridade... Não acredito que o meu pai tenha o coração tão duro assim – eu disse com raiva, então me levantei e o encarei. – Meu marido ainda está vivo... Ele continua sendo parte da família.

– As coisas são esquecidas muito facilmente neste mundo, Yuki, mas acredite, eu nunca vou esquecer desta história. Me dói no âmago pensar assim, mas é a verdade.

– A sua verdade – retruquei. – Eu só tenho um único motivo para ter forças e viver com esta dor aqui dentro... O senhor não sabe o que estou sentido.

– Yuki, minha filha, descanse. Compreendo você, respeito a sua dor e não vou mais tocar no nome de Kouga diante de você. O problema nunca foi Kouga e sim, Muramasa...

– Eu custo a acreditar que não havia outro jeito... Mas basta.

– Não havia, amada filha.

Foi a última coisa que ouvi meu pai dizer. Eu era a única pessoa que compreendia Kouga. Ele havia sido traído até mesmo pelos homens nos quais depositou a sua confiança. Deve ter visto aqueles homens pérfidos comemorando a sua prisão. Eu jamais seria capaz de culpar Kouga por nada. Eu o amarei para sempre.
Não fui capaz de deixar meu filho nascer em uma sociedade tão vil, então, reuni tudo o que possuía de riquezas e finalmente fui para o Mundo Real. A partir daquele dia, me tornei Hisawa Yuki.
Me adaptei ao tempo, vendo-o passar lentamente. Respeitei o pedido do meu amado Kouga e meu filho jamais soube quem foi o seu pai. Como muito precisou ser explicado, apenas contei que fui forçada a fugir para este mundo e somente o necessário sobre a família Kuchiki e os shinigamis.
Kai cresceu e depois de tantos anos, esta é a primeira vez que resolvi escrever um diário. Achei que ajudaria a acalmar o meu coração... Cada palavra, cada rosto... Tudo continua vivo em minha memória.
Um sábio amigo me disse para enterrar o passado, mas, basta olhar para Kai que eu vejo Kouga vivo.