O Coração de um Caçador escrita por Joanna


Capítulo 27
O fim da aliança.




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O símbolo da Capital aparece e sinto-me cada vez mais preso a uma tela de televisão. Eu que, antes me recusaria assistir aos Jogos estou implorando pelo amanhã, para ver o rosto de Katniss e saber se ela está bem. O seu ouvido sangrava e a sua surdez apavora tanto a mim quanto deveria apavorá-la. Os resquícios de sangue deixados facilitarão a sua caçada e só não a condenam porque ela amarrou o capuz em hora de disfarçar o sangue, que não deixa de sair.

Sentado no sofá, minha cabeça vaga por situações terríveis pelas quais Katniss pode passar agora: O frio, por não estar no saco de dormir. O pavor de ter ferido o ouvido. O medo de ser torturada e morta pelos carreiristas. A angústia por estar tão perto daqueles que querem matá-la. Fugir não vai adiantar agora. Não para mim. Ter que encarar que Katniss está encurralada novamente não é fácil, a raiva dos carreiristas cresce a cada dia e caso um deles encontre-a, uma morte rápida não será uma possibilidade.

Abro os olhos e estou na floresta. Tento situar-me, meu corpo está enlameado e coberto de raízes assim como Peeta e estou me soltando quando avisto Katniss correndo desesperada. Ela grita por um nome.

“Peeta!” Onde está Peeta? Do que Katniss foge? Peeta não aparece e tento arduamente me soltar das raízes que me consomem, e puxam meu corpo para a terra e que se tornam grossas assim como galhos que se enroscam em mim e não querem soltar. Cada movimento provoca dor e as raízes cobrem o meu pescoço. “Peeta!”

“Katniss!” Quero salvá-la do que quer que seja, quero me salvar e voltar para casa mas as raízes cobrem meu rosto, fica impossível de puxar o ar e lágrimas correm de meu rosto. Gale Hawthorne, o homem que não salvou a si mesmo. Gale Hawthorne, que não salvou a mulher que ama e amparou na hora do medo. Preso por raízes e o rosto coberto por lágrimas que nunca pensou que choraria. Substituído pelo padeiro que com certeza avistou Katniss e a salvou. O forte abraço da terra não permite que avistem minha fraqueza. A falta de ar não angustia tanto quanto a vergonha. O abrigo das raízes não é mais tão ruim agora. Talvez fosse melhor acolher a morte como um covarde. O covarde que eu sou.

Com um suspiro pesado e rosto molhado, acordo no sofá, coberto por uma manta. Ainda é de madrugada, torço para que não tenha acordado ninguém. Vagando pela casa, cerco cada centímetro seu sem qualquer rumo. Limpo o rosto e deito na cama, temo fechar os olhos com medo dos pesadelos voltarem. Olho para o teto e limpo minha mente de cada pensamento, a dor nos olhos que pedem por descanso ocupa minha cabeça, que lateja.

Quando abro os olhos, estou no quarto com a luz da manhã nomeu rosto. Levanto e pego água fria para tomar um banho. No pequeno espelho empoeirado as olheiras escuras chamam a atenção no meu rosto e não há nada que posso fazer, apenas deixar que todos vejam.

Ao caminhar pelos corredores, abaixo a cabeça; não quero encarar ninguém e o medo de assistir a morte de Katniss no intervalo me invade. E se a Capital mostrava cenas sem importância para depois nos surpreender com a tortura e morte de Katniss? Sentado no refeitório, o símbolo da Capital aparece e Katniss também. Com folhas no cabelo, no rosto e arranhões causados pelos galhos, as unhas sendo roídas. Mas o que me assusta é o capuz que a cobre, manchado pelo sangue que ocupa seu rosto. Cato chuta os contêineres tentando transferir sua raiva, mas é inútil. Meia-noite. O hino da Capital toca e o rosto de Canward aparece, os carreiristas observam vidrados na esperança de saber aquele que acabou com os suprimentos. E então, o rosto de Wade aparece e os carreiristas percebem que o destruidor dos suprimentos está vivo. Cato, sem demora, pega os óculos e dá um dos pares a Clove. Marvel acende um archote e todos saem á procura do ladrão. Katniss pega seus óculos também, o que deve compensar o ouvido e sua garrafa de água. Lava o rosto e o ouvido, para livrar-se do cheiro de sangue fresco, por poder atrair predadores indesejáveis. Prepara uma refeição com verduras, raízes e amoras de Rue.

Oito tributos.

As entrevistas começarão logo e, caso esteja certo, serei um dos entrevistados. Qualquer pessoa do distrito 12 nos conhece. Alguns dos pouquíssimos com armas e conhecimentos da floresta. Os caçadores. Talvez eu deva me preparar para agradar a Capital.

Na floresta, checo minhas armadilhas e consigo dois coelhos. Caçando, ainda pego um peru selvagem e resolvo buscar verduras no grande vale que segue a montanha. Ao encher minha bolsa, busco também raízes e frutas. Ansioso, e com sentimento de repugnância ao saber que as pessoas da Capital pisarão aqui atrás de diversão, volto ao distrito. No Prego, vendo os dois coelhos a Greasy Sae e a um morador da Costura em busca de carne mais barata. E encontro alguém a minha procura.

- Gale. Já sabe porque eu vim atrás de você.

- Darius. As entrevistas?

- Pois é. Amanhã virá uma equipe da Capital que irá filmar amigos e familiares dos tributos. A Capital possui olhos e ouvidos por todo lugar, Gale, saiba que eles virão atrás de você.

- Ok. Que horas eles vem?

- Cedo. No horário da escola, virá uma equipe de gravação para preparar vocês. Esteja pronto. Qualquer um que mora no 12 sabe que você e Katniss são muito próximos, portanto você será o único entrevistado da sua família. Eles te encontrarão na sua casa e dirão o que fazer, como fazer e escolher o melhor ângulo do distrito 12.

- Supondo que exista um bom ângulo.

- Essas entrevistas trazem muito patrocínio. É a chance de dobrar as chances de Katniss, ou de cortar pela metade. A escolha é sua, apenas tente não ser hostil. Até mais.

- Até mais.

Passo na casa de Prim, que já recebeu a notícia. Eu não preciso ser simpático, nós temos Prim. A irmãzinha bonitinha, graciosa e delicada de Katniss. Um sorriso e patrocinadores cairão do céu assim como seus paraquedas. Entrego metade do que consegui á ela e volto para casa.

Uma notícia boa. A entrevista indica que Katniss está viva. Amanhã Primrose será a salvação de Katniss e consequentemente, a minha. Pergunto-me quem mais participará das entrevistas. Katniss não possui muitos amigos. Madge. Prim. A sra. Everdeen. Eu. Geralmente é bem menos do que o costume. Abro a porta de minha casa e encontro com Rory e Vick na sala. Posy está no quarto dormindo e minha mãe, nos fundos da casa lavando roupas. Preparo os legumes e as raízes para todos e comemos em silêncio. Não há muita conversa em casa. Ligo a televisão e espero que hoje, as chances estejam ao meu favor.

Está de noite. Katniss ainda escondida em seu arbusto, subir em uma árvore não é sensato. Ela cava um buraco no chão e entra nele, com os dentes cerrados. Deve estar frio. Ao entrar, seus olhos se fecham quase sozinhos, nem mesmo toda a adrenalina é o bastante para mantê-la acordada. Katniss se encolhe em posição fetal, com um plástico cobrindo seu corpo e a mochila contra o vento.

Os três carreiristas percorrem o mato atrás de vítimas. Qualquer vestígio de sangue, qualquer sinal de vida é o bastante. Ao invés das provocações e piadas de costume, estão todos quietos. Marvel, com o rosto iluminado pelo archote parece ainda mais perigoso e sombrio. Cato e Clove parecem estar cada vez mais unidos, com estratégias discutidas entre sussurros e hoje apenas o silêncio de vergonha entre eles. Vergonha por terem sido enganados.

Rue se empoleira em uma árvore e abre o seu saco de dormir. Assiste a contagem dos mortos suspirando, agradecendo por não ver Katniss nessa lista. De acordo com o seu plano, ela deveria acender a terceira fogueira, mas essa não existiu já que ela sentiu a presença dos carreiristas e continuar o plano seria muito arriscado. O que ela poderia fazer, sem luz ou qualquer arma e os carreiristas com seus óculos para noite e sede por sangue? A fogueira foi cuidadosamente arrumada, com galhos de madeira verde preparada, mas não acendida. Não seria seguro o bastante. Deitando-se e aconchegando sua pequena cabeça no capuz, fechou os olhos e dormiu assim como Katniss, escondida em seu buraco e coberta por agulhas de pinheiro.

Finch desce da árvore de manhã. Não manhã de madrugada, manhã nove horas, aquela manhã de Sol que faria um belo dia se não estivesse onde está. Desde que avaliou o que acontecera na Cornucópia, espera a primeira oportunidade de procurar por suprimentos que não foram encontrados. Suprimentos de verdade, não, já que nada sobrou inteiro de lá. Ao encontrar sua fonte de sustento destruída, Finch dá risada. Um riso astucioso, um riso louco. Talvez tenha enlouquecido, igual a tantos tributos que participam da carnificina. Mas ela revira contêineres, arrasta as mãos pelo chão até encontrar uma lâmina de faca que se perdeu. E um pote de metal. Ela achou também alguma coisa queimada que parece comida.

Katniss anda com um pouco de dificuldade, virando a cabeça o tempo todo, a previsão do médico com relação à surdez está certa. No lago, retira os sapatos e meias e anda descalça com a água em seus tornozelos. A lama profundamente marcada mostra pegadas dos carreiristas, que passaram a noite procurando pelo tributo ladrão. Sem sucesso.

A pequena Rue anda em direção ao encontro de Katniss quando avista algumas raízes. Cavando o chão com um galho e retirando as raízes, a menina faz uma refeição enquanto anda e olha o Sol. Onze horas da manhã. A terceira fogueira deveria ser acesa longe do esconderijo das duas, então a caminhada será longa. Ela acompanha o caminho ao longo do rio por entre árvores.

Meio-dia. Katniss chega ao local do encontro mas a sua aliada não. Ela senta e espera, come um peixe e guarda outro para Rue. Mas ela sabe que deve ter algo de errado acontecendo. Cada minuto parada ali torna tudo mais perigoso, caso os Carreiristas voltem, voltarão pelo mesmo cominho que vieram. Ela entra no lago e lava as roupas e o corpo, com medo de uma infecção. Como ela está vulnerável. Com queimaduras, ferroadas e arranhões, além de uma audição deficiente, Katniss escala uma árvore e espera. Um bom lugar para alvejar qualquer tributo que passe.

Seis horas da tarde. Há alguma coisa errada. Rue está entre o lugar da segunda e terceira fogueiras, quando escuta os passos de um tributo solitário. Será que Thresh resolveu sair do esconderijo e procura acelerar sua volta para casa?

Não. Os carreiristas se separaram. Marvel Roxen, o garoto do distrito 1, solitário e agressivo percorre a mata e fita o chão com atenção. Abre a sua mochila e começa um trabalho que conheço bem. Armadilhas.

Uma rede trabalhosa e bem-feita, tecida antes dos Jogos e colocada como suprimento para carreiristas, nas mãos dele. Marvel percorre a floresta escolhendo pontos para fixar a armadilha. Na esperança de prender Katniss, ele arma a arapuca e espera, preparando outras e espalhando por ai, baseado no princípio de que um criminoso sempre volta ao local do crime. Com calma e frieza, pega um pacote de biscoitos que está no final e come pensativo, talvez imaginando quem será sua vítima seguinte.

Quatro notas. A música percorre cada canto da floresta até chegar a um tordo em seu ninho, que se aproxima da pequena e repete a canção. A música passa pela floresta como uma corrente, e Rue vai pegar o primeiro tordo na mão quando outro som toca. Um sino. Marvel pegou a sua vítima. A menina de olhos escuros e pele acetinada, que gosta de cantar para os pássaros e é delicada feito uma princesa.

Ao correr no local, avista Katniss soltando-a da malha e solta a lança. Katniss desvia, e a pequenina sente uma pontada na barriga e cai no chão, enquanto uma flecha atinge o pescoço de seu assassino.


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Notas finais do capítulo

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