Born To Be Together escrita por Julia A R da Cunha


Capítulo 16
Amber e Jodelle




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Amber

{15 de fevereiro de 2006}

Ele me olhava incrédulo. Não acreditava que a própria filha estava fazendo isso com ele. A menina de doze anos que mesmo sempre sendo um trabalho para ele, nunca imaginou chegar ao ponto do que fazia no momento. Aproximei-me dele, já ensanguentado e não aguentando mais nada.

- P-Por que? – perguntou.

Dei um sorrisinho e dei de ombros.

- Não precisamos mais de você. Já fez o que tinha que ser feito. Nos alimentou, nos colocou em escolas e não ficamos burras. Isso já é o bastante. Não precisamos de mais nada.

- Por favor, por favor...

- Amber! – chamou a pirralha ao meu lado, com horror no olhar e na expressão. – Por que está fazendo isso? Deixe ele ir! Por favor! Deixa ele ir!

- Já era, Sorciére! – olhei-o. – Adeus.

E enfiei o punhal que antes ficava em uma prateleira como um troféu na base de seu pescoço. Meu pai deu-me um último olhar de terror e se foi. Sorciére começou a gritar do meu lado como uma louca. Fui até ela e lhe dei um tapa forte no rosto.

- Cale a boca! Vai chamar atenção! – cruzei os braços e respirei fundo, olhando-a. – Agora se decida. Vai vir comigo ou deixar o serviço social pegar você?

Ela continuou chorando sem me responder. Dei-lhe um empurrão, o que a fez cair para trás.

- Hein?! Responda, imprestável! – ela chorou ainda mais e revirei os olhos. – Ah quer saber, venha comigo. Se ficar aqui vai me entregar e só vai ferrar com ainda mais coisas. É só isso que sabe fazer mesmo!

Olhei então para o corpo de meu pai ali. Não podia deixar aquela coisa ali, para ser descoberta. E além de tudo, não poderíamos simplesmente sumir. Apertei os olhos e criei todo um plano em minha mente. Eu precisaria de mais dois corpos, e uma explosão.

Jodelle

{31 de dezembro de 2007}

Acordei assustada, em um salto, ficando sentada e olhando para os lados. Minha respiração estava ofegante e meu corpo todo suado. Só então minha consciência foi percebendo que eu ainda estava no chalé 11, com todos dormindo profundamente. Peguei um relógio de pulso que sempre deixava embaixo do travesseiro e olhei: 5 da manhã.

Suspirei e passei a mão pelos cabelos. Nem percebi que havia dormido com eles soltos, sendo que geralmente prendo em um rabo de cavalo ou uma trança. Estes estavam molhados e grudentos. Não imaginei que tivesse suado tanto.

Percebi um movimento a frente e me alertei. Com a luz precária que a lua trazia, percebi que era apenas na cama de Gale, que começou a se remexer e levantou a cabeça, completamente descabelado e com os olhos ainda apertados para enxergar o melhor que pudesse. Meu modo de acordar nada discreto acabou acordando-o.

Ele deu um gemido, ainda completamente sonolento e se ajeitou, espreguiçando-se.

- Aconteceu algo? – perguntou em sussurro.

- Não, nada. Só um pesadelo. Pode dormir.

- Não tem nenhum problema mesmo?

- Não, tudo bem. Pode voltar a dormir.

- Dorme logo! – disse alguém de um canto do chalé, já incomodado com a nossa conversa.

Virei a cabeça para o lado, seguindo o som da voz e olhei em Gale novamente. Começamos a rir baixinho. Ele se levantou e veio até mim na ponta dos pés, tomando cuidado para não acabar pisando em algo de alguém ou em alguém mesmo, pois do modo que o chalé 11 era, nunca se sabe. Parou ao lado da minha cama e começou a sussurrar em meu ouvido. Não sei porque, mas o sopro que saía de sua boca ao falar e a proximidade me fizeram arrepiar até os pelos da nuca.

- Se quiser, eu posso ficar de guarda agora. Ninguém ficou, é uma sorte estarmos vivos ainda. Porque depois daquela ameaça, sabe que nem dormimos direito.

- Sei... Mas não precisa...

- Deixa! Deite e durma! Já acabei despertando mesmo.

Ele colocou as mãos em meus ombros e me forçou a deitar. E ficou parado me olhando, certamente esperando para ver se eu tentaria dormir ou se eu ficaria ainda acordada. Por fim, apenas me ajeitei, fazendo antes um rápido e mal feito rabo de cavalo e não demorei a adormecer novamente.

No meu sonho, tudo estava escuro, como a mais profunda e densa noite que se pode imaginar. Era como se eu até mesmo pudesse sentir a escuridão, não sei se ser filha de quem sou influenciava nisso, mas era... estranho.

Respirei fundo e olhei em volta, como se isso fosse mudar algo. De algum modo, porém, eu sabia que estava no fundo. Fundo... Fundo do que? Decidi olhar para cima, ver se havia alguma abertura. A princípio percebi que havia algo, mas depois fiquei indecisa se era minha imaginação.

O estranho é que eu estava “consciente”. Eu pensava, eu prestava atenção, eu me questionava. Não era como qualquer outro sonho. Ouvi falar algo disso, que semideuses geralmente tem espécies de premonições em seus sonhos. E tinha plena certeza de que era algo do tipo.

Pude sentir então a presença de alguém. Alguém poderoso e imponente. Tentei pensar em alguém, sentir mais, mas estava de certo modo difícil. Mas uma coisa eu tinha certeza: Era um deus ou uma deusa, ou simplesmente qualquer coisa próxima demais disso.

Algo começou a se mexer à minha frente e apertei os olhos para poder ver com mais precisão. Logo a imagem foi clareando, mas somente nela. Não exatamente clareando, mas tornando-se visível.

Era uma mulher linda. Alta, corpo escultural, cabelos lisos, longos atingindo até a cintura de uma cor tão negra quando o resto do local. Os olhos eram da mesma tonalidade escura, e suas íris e pupilas mais pareciam buracos sem fundo. As sobrancelhas finas e arqueadas naturalmente, e seu olhar era cheio de obscuridade e sagacidade. Seu vestido era longo e negro, o que contrastava com a pele clara.

Ela pareceu levemente ansiosa, nervosa, impaciente. Até que a maldita apareceu, Amber. Senti uma certa raiva crescendo em mim ao vê-la, mas tentei me focar no sonho.

- Estou aq...

- Ah, finalmente! Nunca vi alguém demorar tanto! Você costumava ser mais pontual antigamente, Amber! O que está acontecendo?

- Perdoe-me. Mas a segurança do maldito acampamento está cada vez mais reforçada. É difícil conseguir uma brecha para podermos entrar em contato. O único local seguro para isso é a floresta.

A mulher apertou os lábios e os olhos, parecendo pensar no que dizia, mas ainda rejeitar o atraso. Ela suspirou e cruzou os braços, passando antes uma das mãos pelos cabelos, arrumando-os.

- E como está a situação?

- Eu estou conseguindo vítimas facilmente, exceto por...

- Por o que? – perguntou já de olhos arregalados.

Amber pareceu hesitar, mas logo tomou a coragem e força de sempre e continuou:

- Por aqueles idiotas que ficam me atrapalhando! A metida de Hades e os insuportáveis de Niké. Estão me pondo nos nervos.

- Pois livre-se deles. Aproveite o sono principalmente.

- Esse é o problema. Eles não se largam agora sozinhos, e andam sempre armados, olhando para todos os lados. Não dormem! Ficam fazendo turnos! Sempre enquanto os outros dormem, um está acordado. Depois ele chama outro e vai dormir enquanto esse outro fica em alerta! Eles dormem segurando as suas armas!

- Você por acaso os avisou ou os ameaçou?

- Sim.

E fiquei surpresa com o tapa repentino que a mulher deu em Amber. Alto e forte. Sua expressão tomou uma característica destrutiva, irritada e amedrontadora.

- Sua imbecil! Você os deixou em alerta! Agora sim apenas vão atrapalhar, pois com certeza devem estar tentando alertar outras pessoas!

Pude ver a raiva e a indignação de ser atingida assim tomar conta do olhar e da expressão de Amber, mas ela apenas cerrou os dentes e apertou os punhos, tentando se controlar, pois sabia com quem estava se metendo.

- E Sorciére? – perguntou ela olhando para outro canto, mais séria do que antes. – Está instruindo sua irmã? Ela deve ser nossa aliada no momento certo. Ou isso... ou que morra com os outros.

- Já lhe avisei superficialmente sobre o que acontecerá em breve. Disse que ela deverá pensar muito bem antes de escolher em qual lado vai ficar, e deixei bem claras as consequências.

- Ótimo. – ela fez uma pausa e respirou fundo. – Os outros já estão cuidando de seus filhos e suas funções. Bem, Eurínome está fazendo isso pelo menos. Calígena tem uma filha que eu saiba, mas não se sabe muito de sua situação... Correm boatos sobre gêmeos de Ofíon, mas como disse, são só boatos e ninguém sabe se é verdadeiro ou não. Qualquer coisa, ficaremos sabendo e eles entrarão na luta, se tudo der certo... É só isso. Pode ir. Vá! Rápido!

E junto com Amber, eu também fui embora, retornando a acordar.

Dei um leve salto quando despertei, mas não como da primeira vez. A primeira coisa que percebi era que uma fina luz de sol entrava pela janela, mas nada muito grande. Era como se fossem apenas seis da manhã ou algo próximo à isso. Depois comecei a ouvir uma coisa, um sussurro. Era algo como “direita, esquerda, direita, esquerda” e assim repetidamente. Olhei para trás, virando o corpo levemente e vi Gale, ainda sentado onde estava quando acordei-o de madrugada. Havia uma cordinha em suas mãos, e os movimentos por onde passava a corda seguiam a voz.

- Direita, esquerda, é?

Gale pareceu despertar de um transe, levemente assustado. Quando me olhou deu uma risadinha e voltou os olhos para a corda, continuando seus nós.

- É... Mania de família.

- Pensei que só repetiam isso mentalmente.

Só um sorriso e o silêncio predominou entre nós. Depois de alguns instantes, decidi ajeitar-me na cama, ficando deitada olhando para cima, com as mãos apoiadas acima da barriga. Foi quando senti de leve o toque em minha pele, e os pelos de meu braço se arrepiaram. Eram os dedos dele, de leve. Percebendo que me arrepiei, ele tirou os dedos timidamente. Olhei-o.

- É... Seu pulso já... melhorou?

Assenti, inconscientemente levando a outra mão acima de meu pulso, ainda engessado. Aquilo me trazia uma lembrança nada boa, e dei por fechar os olhos, tentando afastá-la de minha mente.

- Está melhorando.

E novamente o silêncio dominou. Aquilo me incomodou levemente, mas apenas deixei tudo daquele modo.

Amber

O horário do almoço. Diferente de algumas épocas, uma parte do chalé 11 estava calado. É claro, pois ontem uma menina desse mesmo chalé foi encontrada morta em sua cama, com o corpo aberto do fim do pescoço até o fim de sua parte íntima. Tudo aberto, o sangue saindo.

Culpa minha, obviamente. Eu apenas diria que foi mais do que divertido fazer isso com ela. E um momento de sorte, pois raramente aquele chalé estava vazio.

A menina estava dormindo, e quando percebeu, estava sendo aberta lentamente. Abafei os gritos dela com um travesseiro sobre o rosto, apesar de ainda ouvi-los levemente. Aquilo me dera aquela sensação de prazer que eu tinha ao matar ou torturar alguém.

Suspirei só ao me lembrar disso, sentindo aquela coisa novamente. Respirei fundo e tentei continuar comendo normalmente. Após a primeira garfada, percebi que o quarteto fantástico estava me olhando. Olhei-os de volta, com um pequeno sorriso perverso em meu rosto.

“Vou matar vocês” informei apenas mexendo os lábios. Ficaram ainda mais tensos e viraram os rostos para outro lado e para a comida. Fiz o mesmo, mas com um sorriso no rosto que não tardou a sumir. Eu precisava pensar em algo rápido. Bem rápido.

Minhas habilidades estavam cada vez maiores agora, e eu tiraria proveito desse fato. É, eu já sabia o que aconteceria essa noite.

Jodelle

Acordei novamente em um pulo, mas não apenas pelo sonho que tinha, mas pelo grito que ouvi. Era alto, claro e forte. E era a voz de Jodie. “Calma, Jodelle”, pensei. “É apenas um pesadelo, ela está aqui”. Olhei para o lado, procurando-a, passando a mão no colchão, mas estava realmente vazio.

O pavor começou a tomar conta de mim. Respirei fundo e passei a mão no rosto. O que eu menos precisava agora era pavor. Precisava me mantar calma. Mas foi nessa hora que meus olhos percorreram o chalé. A cama de Sorciére, vazia. A de Gale, vazia. A de Amber... Vazia.

E foi nesse momento que ouvi outro grito. Era voz de menino e isso era óbvio, e eu sabia muito bem de qual menino.

Levantei-me rapidamente e dei uma última olhada no chalé. Todos dormindo, não dando a mínima para os gritos. Será que eu estava ficando louca ou eram eles os surdos?

O grito dele soou novamente. Fui até a porta e abri-a, saindo enfim, olhando por todos os cantos. Precisava saber de onde vinha isso. E então a voz era de Sorciére, e localizei então. Vinha da direção da floresta.

Cheguei lá e nada. Simplesmente nada mesmo. Tudo de repente ficara tão escuro quanto o meu sonho do começo do dia. Era até mais escuro que aquilo. E o grito dele foi ouvido novamente, ainda mais alto, como se estivesse na minha frente e gritando com todo o ar dos pulmões.

- Gale! – gritei. – Cadê você? Jodie? Sorciére!

Virei-me então assustada. Algo havia passado correndo atrás de mim. Segurei mais forte a espada que havia trazido comigo, olhando para todos os lados, procurando por qualquer sinal de movimento. Tomei mais força e coragem e berrei:

- Amber! Eu sei que é você! Mostre-se, covarde! Venha! Vem! Vem!

Mãos encostaram em minhas costas e me empurraram para o chão, e eu ouvi então o som. Um som terrível. Parecia um rosnado, um uivo, tudo misturado. Virei-me para trás. Aquele ponto estava mais claro, e pude ver o que era. Arregalei os olhos e a única coisa em que pensei foi sair correndo.

[...]

Olhei para trás novamente. Aquela coisa ainda estava me perseguindo, e eu sabia que se parasse não teria a mínima chance de conseguir atacar de volta, pois aquele monstro era simplesmente enorme e muito forte.

- Me ajudem! – gritei para que alguém me ouvisse. – Socorro!

Mas não havia ninguém. E aquilo ainda correndo atrás de mim, e eu ainda correndo como se fosse o último momento de minha vida, e talvez fosse.

- Socor...

E caí. Eu havia trombado com alguém que também estava correndo. Ele me empurrou, foi para cima de mim, me prendendo contra o chão e levantou a espada, pronto para qualquer briga. Só então percebi ser Gale e só então ele percebeu ser eu.

- Jodelle! O que está acontecendo?! O que é tudo isso?

Só tive tempo de gritar:

- ABAIXA!

Ele deu uma ligeira olhada para o lado e caiu em cima de mim, com as garras da criatura passando quase por um raspão por sua cabeça. Se fosse um segundo a mais, ele teria sido decepado.

Levantamos, vendo como aquilo era realmente. Parecia um cão, com muitas outras coisas misturadas. Devia medir uns quatro ou cinco metros, ora parecia completamente negro, ora parecia não ter pele.

- Corre – disse ele já segurando em meu pulso esquerdo e me puxando.

Não resisti à ele e fui correndo atrás, com o monstro já vindo junto. Viramos por uma construção que nem mesmo pensei em reconhecer e do outro lado, encontramos Jodie e Sorciére que pareciam completamente perdidas. Tentaram vir até nós, mas corremos até elas e as afastamos, com o ser já chegando ali, louco por nossa carne.

Continuamos em linha reta e viramos um outro lugar até que encontramos algo que até eu fiquei surpresa.

Era Amber, sentada sobre caixas de som, nem olhando para nós. Tinha um CD Player em suas mãos, e ficou passando faixa por faixa. Cada uma com o som de nossas vozes como gritos. Eram editados, editados em computador por algum especialista.

- É fácil gravar vozes e transformá-las em outras coisas no computador – falou ainda olhando para o aparelho, dando pause nas faixas. Levantou os olhos. – Gostaram da surpresa?

Foi nessa hora que o monstro chegou, um pouco ao longe, nos alcançando. Viramo-nos para ele, e Jodie acabou soltando um grito quando ele chegou, mas próximo de nós, ele simplesmente parou. Olhamos para Amber, que fazia um sinal para a criatura. Ele a obedecia como se fosse seu servo.

- Ele não vai matar vocês, calma. Isso é serviço meu. A menos é claro que fique mais difícil fazer isso, mas creio que será fácil, isso se colaborarem, é claro.

Ela colocou o aparelho de lado e retirou o punhal de dentro da jaqueta. Todos nós já estávamos armados e apenas nos preparamos para o ataque, atentos a qualquer movimento que ela desse.

Todos parados, um focado no outro. Era claro que essa era para ser como uma luta final, e não deixaria a desejar. Respirei fundo e então, tudo começou repentinamente, todos atacando ao mesmo tempo.

Amber era rápida, eu sabia disso mais do que qualquer um, e era boa. Algo passou por mim e recebi um soco na lateral direita do corpo. Virei-me naquela direção, a ponto de ver as lâminas de Gale e Amber se chocarem. Ela girou o braço, conseguindo espaço e deu-lhe um chute na barriga, logo depois aproximando-se e abrindo um talho também na lateral do corpo.

Rapidamente ela estava na frente de Jodie, que se defendia com seu machado. Esse não era muito grande, mas nada pequeno e possuía lâmina dos dois lados. As duas eram boas, igualmente boas. Ao mesmo tempo que uma atacava, a outra desviava.

Amber tentou passar a lâmina em seu rosto e Jodie jogou a cabeça para trás, desviando-se, e deu uns passos para trás, dando espaço. Investiu com o machado em uma aproximação de Amber, acertando-a um pouco abaixo da barriga, na bacia, o que a fez sair um pouco do chão numa tentativa de pulo para trás.

Gale, que havia se levantado correu em direção as duas e puxou Amber para trás, fazendo-a cair sobre ele de costas. Uma de suas mãos segurava a cabeça pelo queixo e o outro braço estava em volta do pescoço. Ela se debateu e conseguiu dar-lhe uma cotovelada sobre uma costela, o que o fez soltar levemente, mas o bastante para que conseguisse levantar.

Jodie atacaria, mas foi nessa hora que Amber olhou para o monstro e ele avançou contra Sorciére. Jodie involuntariamente correu até ela, tirando-a do caminho da boca dele bem a tempo. E eu fui até Gale.

Amber estava de pé, com um dos pés sobre o peito dele e girando o punhal entre os dedos.

- Adeus, loirinho – disse com a arma virada para ele e já se abaixando com velocidade.

Foi nessa hora que me choquei com ela, empurrando-lhe, fazendo ela cair de lado um pouco longe dele, o bastante para que se levantasse e pegasse novamente a espada. Amber olhou para mim cheia de ódio.

- Acho que você é que vai ser a primeira.

Levantou-se e correu até mim. A centímetros do meu corpo, consegui dar-lhe um forte soco no rosto que a fez jogar a cabeça para trás. Quando abaixou-a, pude ver o sangue saindo do nariz e um pouco da boca. Ela limpou o sangue e me olhou.

- Você me paga.

- Vem.

E se jogou contra mim, levando a nós duas para o chão. Uma troca de socos, chutes, arranhões, puxões de cabelo, tapas e mordidas começou. Acabei com ela sobre mim, me segurando. Ela se aproximou e mordeu-me na base do pescoço, com tanta força que seus dentes perfuraram minha pele e minha carne, fazendo o sangue sair, assim como um grito meu.

Gale deu-lhe um chute na barriga, afastando-a de mim levemente. Amber pegou seu punhal e lançou contra ele como se fosse um dardo, e arma cravou-se em sua coxa, fazendo-o cambalear e cair, com uma careta de dor.

Levantei-me, subindo sobre ela, fazendo-nos rolar. Ela tentou afastar meu rosto com a mão, mas acabei colocando seus dedos dentro de minha boca e mordi com a maior força que conseguia no momento. O sabor metálico de seu sangue preencheu minha boca e me deixou enojada, mas não parei de mordê-la.

Ela me deu um chute e rolamos novamente, com ela sobre mim. Gale chegou com o punhal dela em mãos. Amber se virou para ele, ainda ajoelhada sobre mim. Pegou na mão dele e a virou, e foi virando o braço, levando-o até as costas dele, fazendo-o dar um grito.

Ele tentou girar o corpo, o que deve ter feito doer mais ainda, e com a mão livre pegou em seus cabelos e puxou-os para trás com força, levando a cabeça junto. Amber largou sua mão e levou as dela para a cabeça, arranhando os dedos dele, cravando as unhas em sua pele, tentando fazê-lo soltar.

Jogou o corpo para perto do dele e levou as unhas para a nuca dele, segurando-o ali com força, apertando as unhas. Ouvi-o dar um grito enquanto a soltava. Ela voltou as mãos para frente, os dedos e as unhas ensanguentados.

Deu-lhe uma nova cotovelada acima do estômago, derrubando-o e fez um corte em sua barriga.

Encontrei-me partindo para cima dela, mas rápida, virou-se e perfurou meu braço com o punhal, segurou-me nos ombros e me jogou, deitada, ao lado de Gale. Amber se ajeitou, ficando ajoelhada sobre nós dois, um joelho sobre cada um. Ela nos olhou, um a um, com a respiração ofegante. Então deu um sorriso.

- Finalmente. Os dois que mais me atrapalhavam. Aqui, na minha mão, ou melhor, nos meus joelhos.

Ela girou o punhal entre os dedos e passou a alisar nossos rostos com a lâmina. Primeiro em Gale, passando por toda a volta do rosto, pelas sobrancelhas, o nariz e o contornando os lábios. Foi para o meu rosto, fazendo os mesmos caminhos. Enquanto o fazia, falava:

- Sabe, eu sempre soube que esse seria o final. Vocês, fracos, abaixo de mim, e eu enfim acabando com vocês. Desde o primeiro momento que trocamos olhares. Ainda mais você, querida. Na verdade foi sempre com você, mas você é como uma formiga. Nunca vem sozinha. E no caso, veio com os dois.

Não demonstrei fraqueza e muito menos ele. Juntei toda a saliva que pude e também o sangue dela, ainda em minha boca e cuspi em sua cara. Ela fechou os olhos, com nojo, o sangue lhe subindo à cabeça.

- Eu queria aproveitar isso lentamente e um por um. Mas creio que vamos deixar isso mais divertido, sim?

E ela enfiaria o punhal em mim. Eu sabia disso. Bem no meio de minha testa. Mas não foi assim. Ela foi para o lado, para ele, cravando o punhal em seu ombro e girando ele. Levou o joelho um pouco mais para trás, parando acima do corte e jogou o peso para aquela perna.

- Para! – gritei, ouvindo-o gemer de agonia, com os dentes trincados e os olhos fechados, apertados, os punhos fechados. – Maldita! Venha logo em mim! Sou eu quem você quer! Não! Deixe ele!

- Ah! Eu sabia! Você gosta dele, não é? Agora sim está tudo mais perfeito. Você, vendo-o sofrer lentamente até a morte.

Ouvi um grito, de Sorciére. Olhei mais ao longe, vendo ela e Jodie caídas, arrastando-se para trás com o monstro se aproximando. As armas não estavam perto.

A risada de Amber e Gale, segurando minha mão com tanta força que chegou a doer bastante me trouxeram de volta a minha realidade. Olhei-o, e ele olhou para mim, o olhar cheio de dor. Eu sabia porque ele segurava minha mão. Não era por nada, ele simplesmente queria ter-me como apoio, ter certeza de que ainda estava ali.

Ela retirou o punhal de seu ombro e levou-o em direção ao meio exato de seu rosto. Comecei a balançar a cabeça, e gritar.

- Não! NÃO! NÃO! NÃO!

E então uma flecha passou pelo antebraço de Amber, fazendo todos nós pararmos. Pude ouvir mais sons cortantes no ar e o monstro foi atingido por dezenas de flechas e dissipou-se em até mesmo quilos de pó dourado.

Amber olhou para o lado de onde vieram, assustada assim como todos nós. Lá estava todo o chalé de Apolo com os arcos e flechas em posição. Atrás e aos lados deles, os filhos de Ares, com armas em punho, prontos para atacar. Do meio deles surgiram Quíron e sr. D. Suspirei aliviada, deixando enfim as lágrimas saírem.

- O que está acontecendo aqui?! – gritou Dioniso. Ele olhou para Amber e veio avançando em passos pesados e arrancando Amber de cima de nós. – Você! Eu deveria matar você, isso sim! Assim como fez com todos os outros!

- Não! Não! – ela suplicou.

- Sr. D – chamou Quíron, aproximando-se. – Não vamos matá-la. Mas sim exilá-la do Acampamento Meio-Sangue e de perto de qualquer um. Argos vai levá-la até um sanatório, com os campistas mais fortes junto por segurança. Essa menina é louca.

Ele pegou Amber e levantou-a completamente, com a mão na base de seu pescoço, apenas como um alerta. Olhou para alguns filhos de Ares e outros de vários outros chalés que nem vi que estavam lá.

- Levem-na.

Aproximaram-se com as armas em posição e foram cercando-a, segurando-a pelos braços e levando-a para longe. Amber se virou e me encarou odiosa.

- Eu vou voltar! Guarde o que estou falando, Le France! Eu vou voltar! Cedo ou tarde eu vou voltar!

E então, Amber finalmente foi embora, deixando-nos em paz enfim. Dei um suspiro e fechei os olhos, tentando processar tudo aquilo. Olhei para Gale então, nossas mãos ainda juntas. Ele olhou para mim, tentando disfarçar a careta.

- Está doendo muito, né?

- Não. Não é nada. Dá pra aguentar.

- Sua expressão nega isso.

Levantei-me então, sendo ajudada por um garoto do chalé 5 de uns quatorze ou quinze anos. Ele me olhou por uns momentos, chamando minha atenção.

- Você luta bem – declarou. – Qualquer jogo do acampamento, até que gostaria de ter você do nosso lado.

Dei um pequeno sorriso pelo elogio. Era estranho ver filhos de Ares elogiando, portanto, deveria sentir-me realmente grata por isso. Ele foi então para Gale, segurando em uma das mãos e passando o outro braço em volta dos ombros. Com força e impulso, levantou-o de uma vez, nem dando tempo de sentir dor pelo corte. Até que não era muito feio, mas que dava dor nele, isso dava.

O garoto trouxe Gale até perto de mim, e ele passou o braço sobre meus ombros e passei o meu em volta de seu corpo, segurando-o.

- Obrigada – falei para o menino.

Ele apenas arqueou as sobrancelhas e foi em direção de Jodie e Sorciére.

Olhei em Gale e ele olhou em mim, ofegante, assim como eu estava há alguns momentos.

Ouvi um som, e levei meus olhos para o horizonte em certo ponto. Podia ver os fogos que vinham da cidade mais próxima. Olhei em meu relógio de pulso: meia-noite. Suspirei.

- Feliz Ano Novo.

Gale olhou para mim novamente e levou os olhos em direção aos fogos. Os mortais comemoravam apenas a passagem de ano, mas para nós era mais, era uma comemoração de um pouco mais de paz em nossas vidas.

- Feliz Ano Novo – respondeu.

Fim da parte 1


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