O Primeiro Massacre Quaternário escrita por AnaCarol


Capítulo 29
Minha volta pra casa


Notas iniciais do capítulo

Ou quase isso.



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  Quando o chão finalmente começa a tremer eu estou exausta. Com ainda quatro competidores contra mim, essa não é a melhor tática para uma mudança de arena. Espero o chão me engolir, mas ele não o faz. Espero mais três longos minutos e o chão continua tremendo, mas não me engole. A cada minuto ele treme com mais intensidade, como se tivesse pressa.

  Temendo que o prédio desabe devido ao “terremoto”, eu saio do gabinete. Antes que meus pés toquem o chão eu caio de joelhos no vidro navegando mais rápido do que o “normal”. Meus joelhos doem e esfrego meus olhos embaçados.

  Quando ele para, não ouço as contagens regressivas e me assusto. Já estou completamente desperta, sobre minhas duas pernas trêmulas, quando meu prato sobre e vejo que os outros três tributos me encaram. Para minha surpresa, lágrimas brotam dos olhos vermelhos e cansados de John.

  Contenho um suspiro assim que minhas narinas são atingidas pelo cheiro inesquecível de uma praia. Nada mal. Pisco algumas vezes até descobrir a verdade.

  A mesma areia, as mesmas pedras, a mesma água, o mesmo mar.

  É a minha praia.

  A sirene soa assim que meu prato acaba sua subida e percebo que, de alguma forma, eu estava atrasada para a mudança de arena. Não tenho tempo de me recuperar do choque, e começo a correr tarde demais.

  Estou tonta. Os Idealizadores querem que eu vença me dando essa vantagem? Ou querem me matar do jeito mais cruel possível: tão longe, e tão perto de casa? É por isso que essa edição dos Jogos foi tão fácil para mim? Estão apostando em tortura mental, com certeza. Que outra coisa que estaria fazendo aqui, senão enlouquecendo de pouco em pouco?

  A vontade de estar logo em casa me atinge e eu saio de meu prato a toda velocidade pela areia. Só faltam três tributos. Eu posso vencer. Estou “em casa”. Este é o meu lugar. Nada pode me impedir. Vou sair daqui e voltar para casa.

  Voltar para Jason.

  Antes que meus pés saiam da areia fofa e eu possa ver qualquer coisa, sinto braços passando por mim e um corpo vindo cada vez mais perto de minhas costas. Eu me viro para trás com os punhos preparados e minha cabeça para a apenas três centímetros de distância da cabeça de John. Eu arregalo os olhos, mas ele não parece notar (ou se importar) e me abraça, esmagando minhas costelas e tirando de meus pulmões fragilizados o ar de dentro deles.

  Eu poderia matá-lo se quisesse. É a hora. Posso fazer isso antes que só sobremos nós dois aqui, quando eu realmente não teria coragem de vencer. Eu posso ganhar vantagem agora que ele está abraçado a mim, com uma mira perfeita do ponto onde enfiaria a faca em suas costas.

  Por que não? Isso são os Jogos, não é?! Não é?

  -Achei que você tivesse morrido. – Ele murmura. - Achei que estivesse morta.

  Eu fico parada e trêmula, os braços grudados à cintura, olhando inconsoladamente para o menino choroso me abraçando. Esquece. Esquece tudo o que eu disse.

  Eu tomo consciência de que ele está falando comigo e toco levemente seus cabelos. Os dois outros tributos ainda brigam, e nenhum dos dois parece cansado ou disposto a parar de lutar. Mesmo assim eu arrasto a versão alterada de John para fora da areia, conduzindo-o cegamente até uma construção de um andar, totalmente branca.

  É isso. Agora não existem mais amigos ou inimigos. Fora John, os outros não perderiam a chance de me matar. Eles querem voltar para casa, com certeza. Eles têm famílias esperando por eles.

  Fico com raiva, pois, se não fosse a Capital e seus estúpidos Jogos, todos nós estaríamos em casa agora. Todos nós estaríamos com nossas famílias.

  E eu teria uma família.

  Dentro da construção, eu o puxo até um cômodo vazio. Ele está tremendo.

  -Shh! Shh! – Eu tento lhe acalmar. – Eu estou aqui. Eu estou aqui.

  Sinto a necessidade de repetir as coisas, pois só assim ele aparenta me escutar.

  Quando vejo que estou tentando em vão, apenas o abraço e nos encosto à parede. Então finalmente eu olho em volta.

  Paredes brancas descascadas, uma mancha de umidade no telhado, pontos afundados na parede, chão marrom e frio.

  Eu me afasto de John e me levanto. Meus olhos vão de um lado para o outro reconhecendo os detalhes que decorei por tantas noites olhando para o teto sem conseguir dormir. Estou com medo de olhar para a janela, porque sei o que tem ali. Quando finalmente tomo coragem, descubro que estou certa.

  Redes. Redes cortadas com uma coisa que só poderia ser uma tesoura sem ponta. 


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