Sendo Aline escrita por Bruna Carreira


Capítulo 3
Capítulo 3




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Já passavam das 3 horas da manhã daquela sexta feira, e lá estava eu, firme e forte, com uma garrafinha daquelas de plástico de mais ou menos R$1,99 cheia de Coca-Cola. Em frente ao computador. Jogando pôquer.

Bom, pelo menos é isso que dá pra fazer num final de semana que você fica de castigo.

Eu sinceramente ainda acho que minha mãe não foi nada compreensiva quanto ao fato. Eu estava conversando com Débora na sala de aula e ela disse que seria comida pelo garoto. QUAL É O GRANDE PROBLEMA, MEU DEUS?

Não é como se ela fosse fazer.

Bom, eu acho que não.

Enfim, ela disse isso e a professora passou do lado. O que é que eu vou fazer? Ela é que devia ser castigada. Ela se intrometeu na nossa conversa. Não posso ser culpada por ela ter ouvido. Eu não queria que ela tivesse ouvido!

Mas, de uma forma ou de outra, cá estou na internet, fazendo absolutamente nada. Acho que eu estaria melhor se estivesse tomando um drink, mas não dá pra reclamar muito. Pelo menos a minha mãe não me tirou todas as coisas. Só me proibiu de sair, o que é razoável.

Acho que ela tem medo que eu vá fazer essas coisas sem pensar. Dar pra alguém, quer dizer. A parte boa é que meu pai riu pra caramba da situação.

É, ao menos ele está se divertindo.

Olhei para o lado, onde meu celular estava, e vi algo piscar. Marcelo tinha me ligado.

Ah, Marcelo.

Ele se tornou um grande amigo desde a sétima série, creio eu. Era bonitinho, metido a sabe tudo, mas me fazia rir como ninguém. Eu sentia um espírito protetor quanto a ele que ninguém conseguia entender.

Claro, porque quando você diz que tem um espírito protetor, o ouvinte cisma em sair correndo feito uma criança infeliz, perguntando se você gosta dele e se quer que ela a ajude a conquista-lo. E, sinceramente, quando alguém faz isso, eu tenho vontade de mandar um fatality.

Mas, de uma forma ou de outra, eu não gosto dele, e sei disso porque demos o nosso primeiro beijo juntos, naquele mesmo ano.

Claro que não contei isso a ninguém, e também não pretendo. Já fazem mais de dois anos e já passaram garotos pela minha vida e garotas pela dele também. Eu só tenho aquele carinho de olhar pra ele e pensar “é o primeiro beijo”. Todo mundo tem isso. Não quer dizer que sinta algo, porque realmente não sinto. Não é como se os pássaros cantassem quando o vejo. Não é como...

Não é como quando estou com o Bruno. E como, por exemplo, estou puta agora por ter me lembrado dele, e por ter apostado fichas demais no pôquer online.

Não dava pra ficar melhor.

Levantei do computador e fechei as janelas. Havia gatos no telhado do vizinho fazendo sabe-se lá o que, miando mais alto do que a mulher do andar de cima quando conhece um cara novo. O que há de se esperar? Animais seguem seus instintos. Eu queria que a minha vizinha tivesse menos instintos, mas dá pra compreender. Se eu fosse bonita daquele jeito e conhecesse cada cara gato daquele jeito, acho que também não me importaria de...

OMG, estou falando exatamente como a Débora. Preciso parar com isso. Acho que estou tento alucinações depois de tanta Coca-Cola. Com certeza é isso. Só preciso dormir um pouco e parar de rodar essas imagens na minha cabeça.

Fui à cozinha buscar um copo de água, sorrateiramente, para que ninguém acordasse. Minha mãe ficava uma fera quando me via acordada de madrugada, não sei bem por que.

Na verdade eu não entendo a mania dos adultos de acharem que temos que pensar igual a eles. Na época deles, eles talvez não tivessem internet nem as coisas boas da vida, mas eu sou fruto do novo século e tenho acesso a isso tudo. Não tenho culpa se minha geração nasceu pra comer porcaria e ficar na frente do computador muitas horas por dia. É algo que todos fazem e minha mãe acha que sou anormal por fazê-lo também.

Bom, tanto faz.

Voltei para o meu pôquer e vi alguém me chamando para conversar. Era Marcelo. Ele começou a me contar sobre o dia dele e me chamou pra conversarmos em algum lugar amanhã. Expliquei a história para ele, e claro, ele morreu de rir. Tanto quanto meu pai.

Um dia ainda vou entender o que há de engraçado em estar de castigo. Talvez seja só uma daquelas coisas que todos riem agora e você só vai rir no futuro. Que droga.

Meu jogo de pôquer acabou e eu disse a ele que ligaria amanhã pra confirmar ou não se nos veríamos. Provavelmente não, só se ele viesse aqui, já que minha mãe o ama. Porque o Marcelo é bonito. Porque o Marcelo é inteligente. Porque o Marcelo é educado. Tudo que eu, ó vida cruel, não sou.

Até parece que ele é assim mesmo.

Tudo bem, ele é sim.

Mas pelo menos eu admito que sou preguiçosa e não fico tentando agradar todo mundo. O Marcelo tenta agradar todo mundo e as pessoas muitas vezes ficam só pisando nele. Eu não vou ficar aí pra sempre sendo a mulher maravilha dele.

Tudo bem, claro que eu vou ser. Eu adoro aquele idiota.

Me joguei na cama, e fui me espreguiçar, quando, sem querer, joguei meu porta retrato no chão. O barulho do vidro quebrando anunciou o meu pior pesadelo (que com certeza não era aquele cara roxo do “Monstros S.A.” saindo do armário).
– ALINE! – Minha mãe exclamou, entrando no meu quarto.
– Oi, mãe – Respondi.
– O que foi isso?
– Deixei o porta retrato cair, sem querer – Tentei dizer.
– O que você ainda está fazendo acordada? – Ela gritou, enfurecida.
– Eu não estava acordada – Tentei mentir -, eu só despertei agora e fui me esticar, e esbarrei nele sem querer.
– Então o que o seu computador faz ligado? – Ela cruzou os braços – Se você não tivesse mexido nele, ele estaria com a tela preta, ao menos.

Malditas mães High Tec.



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