Leis da Noite - Mente sobre Materia escrita por Ryuuzaki


Capítulo 18
Segurança em Primeiro Lugar - Parte 1




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Capitulo 3: Segurança em primeiro lugar.

 

A segunda noite de Michael naquela fria e escura vida vampírica começou conforme ele abria os olhos. Reconheceu de imediato a sala onde havia passado a maior parte de sua vida adulta, o atelier era o único lugar onde se sentia verdadeiramente em casa e não era a primeira vez que dormia naquele chão frio, embora tal sensação de resfriamento não causasse mais estímulos pelo seu corpo.

 

Levantou-se preguiçosamente e olhou para o seu covil. Quadros inacabados, telas destruídas e manchas de tinta no chão e parede faziam parte da zona que era aquela adjacência. Com certeza, teria dificuldade em convencer alguém para arrumar a bagunça que tomava conta do lugar, porém, não pretendia deixar ninguém entrar em seu local de trabalho. Era uma estranha paranóia onde achava que pessoas iriam “infectar” seus quadros e diminuir suas habilidades artísticas, uma superstição deveras supérflua.


Após dar uma rápida olhada em algumas obras inacabadas o pintor foi até o banheiro que ficava em frente ao seu atelier e olhou-se no espelho, com um pouco de medo do que poderia ver... Ou não ver. Suspirou de alívio ao enxergar seu reflexo e perceber que não havia nada de grotesco no rosto à sua frente. Estava mais pálido, é verdade, mas nada que pudesse assustar ou atrair suspeitas sobre ele, não havia crescido nenhum chifre, seus olhos não estavam vermelhos e sua pele não estava azul.

 

Por hora a única coisa com a qual deveria se preocupar era a mancha de sangue seco que tomava grande parte da região que ficava ao redor de sua boca, algo que foi rapidamente resolvido com um pouco de água e uma toalha seca.

 

Michael ficou admirado por conseguir visualizar-se em um espelho, afinal, a maioria das lendas que havia ouvido diziam algo sobre vampiros não se mostrarem em superfícies refletoras. Começou então a suspeitar que teria mais surpresas pela frente. Esperava apenas que, como essa, fossem surpresas agradáveis.


Saiu do banheiro e foi diretamente em direção à janela da sala de estar, apoiou-se no parapeito e pôs-se a observar a encruzilhada entre a “Rua Maclanus” com a “Professor Newton Owen”. Carros iam e vinham, pessoas andavam e desandavam, era uma cena como qualquer outra, a típica esquizofrenia presente nas cidades onde as pessoas apenas dirigiam, voltando de seus trabalhos, esperando que suas vidas mudassem miraculosamente da noite pro dia.

 

Um sorriso amarelado despontou dos lábios de Michael quando este cogitou que mesmo ele querendo que tudo continuasse como estava, fora a história dele que sofrera uma mudança súbita, uma curva vertiginosa no gráfico da normalidade.


O ar noturno entrava por sua narina. Não sabia que não precisa mais respirar, não fazia idéia de que o inspirar era, agora, apenas para sentir cheiros. Ele suspirou, absorvendo toda a essência que a noite carregava. Tal sensação lhe fez perceber o caçador que havia dentro de si.

 

Sentia-se poderoso, achava que tudo poderia fazer, qualquer feito, qualquer ato, coisas que nunca sequer haviam passado por sua cabeça. Uma nova sensação, um novo sentimento, estava se apoderando pouco-a-pouco do jovem pintor, imperceptivelmente, as pessoas lá fora, as mesmas que dirigiam seus carros ou andavam casualmente, não pareciam mais simples transeuntes, mas sim presas, comida, nada mais do que uma fonte de alimento, certamente inferiores ao vampiro que era Michael.


Uma estranha vontade começava a se manifestar no vampiro novato. Ele queria pular de sua janela, que ficava no segundo andar, para a rua e então, acolher um mortal entre seus braços imbuídos de força sobrenatural e sugar-lhe-ia até a última gota... Sim, isso iria satisfazê-lo... Saciaria a fome que já remoia suas entranhas. Inconscientemente passou a língua pelos dentes vampirescos que já apareciam por sobre seus lábios.

 

Ansiava por sangue quente, aquele líquido da vida, descer por sua seca garganta e suprir sua vida com a doce energia alheia, roubada. Estava pronto para agir de acordo com seus desejos. Mas então baixou a cabeça, atordoado.


Estava satisfeito... Sabia disso... Cuidar do seu território, do que era seu.. Ele devia... O apartamento...


Sua cabeça latejava, parecia que a pressão interna havia se elevado à ponto de fazer seus vasos cerebrais se romperem. Michael segurava a cabeça com as duas mãos, como que aquele gesto pudesse evitar que o pior acontecesse. Fazia caretas de dor, escancarava e rangia os dentes, tentando diminuir o que sentia em sua agonia, acabou por derrubar o abajur que ficava na mesinha de madeira ao lado da janela. Uma serie de palavras vinham sucessivamente à sua cabeça.

 

Não tinha idéia de onde haviam surgidos, não sabia se era uma lembrança de algo que lhe haviam dito ou se seus próprios pensamentos conspiravam contra ele. Parecia que já havia ouvido aquelas ordens, em algum tempo, em algum lugar... E sim, eram imperativas, ordenavam, mas ao mesmo tempo aconselhavam. Refreavam a sede de sangue que há alguns segundos havia tomado posse do novato.


Em um instante, tudo acabou. A dor passou, levando com ela a inquietação, indo embora tão gentilmente quanto o voar de um beija-flor, contrastando com a sua vinda. Michael não sabia o que fora aquilo, nada aparecia em seus pensamentos, sobre aquele estranho mal-estar. Percebeu  apenas que se lembrou do auto-intitulado Conde, Claudius Du Coudray, contudo essa lembrança não tomou proporções importantes em sua cabeça. Agora ele sabia o que deveria fazer.

 

Tinha que corrigir cada falha do seu apartamento, agora um covil, um refúgio, do contrário poderia perecer caso alguém invadisse o local durante o dia, seja com intenções boas, de verificar se algo havia acontecido com o rapaz, seja por intenções ruins, como acabar com a vida vampírica do novato.


Esperava apenas que não houvesse muito o que fazer.


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