Snowflake escrita por PSaiko


Capítulo 6
Capítulo 6


Notas iniciais do capítulo

Demorando, mas vindo!



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Snowflake

Kaline Bogard

Capítulo 06

– O Setor Dois precisa de pelo menos metade – gritos angustiados seguiram a voz autoritária que não se abalou ao continuar – Mande três fêmeas para a área de miscigenação.  Tem alguma criança? Não?  Mas que merda de operação foi essa?  Peguem dois dos mais jovens.  Precisamos de novos testes de regeneração...

Os comandos eram imediatamente seguidos.  Soldados de expressão indiferente e fortemente protegidos por uma escolta armada separavam as pessoas de acordo com o que era dito.  Metade do grupo foi levada embora, depois as três jovens assustadas e, por fim, um casal de adolescentes.

Nessa confusão a única coisa que Shibuya e Jack tinham em mente era não se separar.  Se fossem afastados um do outro então tudo estaria terrivelmente perdido.  Por isso o mais velho se agarrava no amante e o mantinha muito próximo a si.

Um Jään tentou escapar invisível.  Mas sensores adaptados denunciaram a movimentação.  O mesmo tipo de tecnologia que regia os GPS desenvolvidos a pouco tempo.  Ele foi pego, espancado e abandonado inconsciente no chão, para servir de exemplo.

– Levem o resto para as celas – O comandante parecia satisfeito.  Depois da última confusão o governo não hesitaria em atender os pedidos de verba.  A população ficara em pânico diante do suposto ataque inimigo.  Mais dinheiro significava novas armas, novos testes... mais cobaias...

Os soldados empurraram os Jään restantes para fora da sala.  Mirados pelas terríveis armas de compressão quente foram colocados em caminhões que, tão logo se enchiam, seguiam rumo a um diferente prédio onde ficavam as celas e o laboratório.

– Você está bem? – Shibuya sussurrou tentando observar o curativo improvisado que fizera no pulso do namorado – Parou de sangrar?

– Hn. Mas ainda arde um pouco – Jack respondeu no mesmo tom.

– Juro que vou tirar a gente daqui – o mais velho afirmou com a certeza de que cumpriria aquela promessa.  Jack apenas meneou a cabeça.  Estava assustado, cansado, com fome e com dor.  Qualquer coisa que o outro dissesse serviria com consolo mínimo na escuridão para o qual tinham sido arrastados.

Ao redor deles o quadro era uma pintura sombria.  Dezenas de Jään, todos desconhecidos, partilhando as mesmas sensações de medo e incerteza.  Alguns ainda em pior situação: separados dos entes queridos, sem a menor esperança de reencontrá-los algum dia.

Foi então que ouviram um estouro e o caminhão rateou na pista, saindo da estrada.  O movimento jogou uns prisioneiros sobre os outros, deixando-os ainda mais confusos.

– Jack! – Shibuya olhou ao redor encontrando o namorado atordoado logo a frente, arrastando-se até ele – Jack!

– Estou bem...

A frase foi cortada quando a porta do caminhão se abriu e a luz cálida da lua invadiu o interior do veículo.

– Rápido! – uma voz desconhecida gritou – Todo mundo pra fora!

Os dois se entreolharam confusos, mas a dúvida logo passou quando os primeiros Jään obedeceram a ordem e saíram.

A cena externa era extremamente inusitada.  Os três caminhões estavam parados, com pelo menos um pneu estourado.  Mas algumas pessoas trocavam por um em boas condições.  Todos os soldados da Agência estavam fora, com os olhos sem foco, como hipnotizados.  Um pouco mais afastado uma jovem mantinha as mãos na cabeça e os olhos fechados em concentração.

– Jään – Shibuya sussurrou apontando pra ela.

– Controladora de mentes – Jack compreendeu que acontecera com os guardas.

– Rápido! – a voz voltou a gritar e era de um rapaz que acenava apressadamente coordenando a ação.  Parecia ser o líder da investida.

Outro rapaz se aproximou do casal, enfiou algo nas mãos de Jack e começou a empurrá-los em direção a mata que crescera ao redor da rodovia.

– Vão por ali.  Não juntem grupos grandes.  Saiam no porto e vão embora para as Terras Ermas.  Estarão seguros lá!  Depressa – assim que fizeram menção de obedecer o mesmo homem segurou no braço de Shibuya – Vocês têm que ser muito rápidos.  A Agência já é capaz de diferenciar um Jään de um humano.  Vão usar os GPS para localizá-los, a menos que consigam chegar as Terras Ermas.

E deu as costas indo ajudar outro grupo desorientado de Jään.  Tudo tinha que ser muito rápido.  Os caminhões monitorados pela Agência não podiam se atrasar demais ou levantaria suspeitas.

Enquanto seguiam na direção indicada Jack sentia o coração acelerar de tanta emoção.  Uma das mãos estava firmemente entrelaçada à de Shibuya que corria dois passos a frente, sem diminuir a velocidade.  Rapidamente baixou o olhar e fitou aquilo que o desconhecido colocara em sua mão.  Dois tickets de navio.  Uma das embarcações que seguia uma rota de comércio paralela às Terras Ermas.  Escapar por completo e seguir para o santuário Jään tornou-se mais do que uma ilusão.

Tornou-se esperança.

oOo

Estava cansado de andar.

Mas cada passo dado trazia a certeza de que estava mais perto.  E isso era o incentivo que precisava.

Por que sentia a energia do namorado esmaecer.  Se tornar mais fraca, não por que estivessem distantes.  Justamente pelo vinculo que os unia Jack podia sentir que a distancia diminuía, assim como a energia de vida de Shibuya.

Por isso quando visualizou o campo de milho que rodeava a fazenda saltou a cerca, não se preocupando com qualquer precaução.  Apenas seguiu o coração e o instinto.

Logo encontrou a entrada da fazenda e seguiu o comando que a empatia lhe enviava.  Sequer olhou a grande casa ou os arredores.  Apressou-se direto para a pequena construção de cimento e arame, uma espécie de canil.

Sabia o que ia encontrar.  E mesmo assim foi um choque observar as roupas preferidas banhadas de sangue seco.  Mal podia ver o Smile da blusa absurdamente colorida, pois a estampa fora coberta de vermelho escuro.  Mas, apesar da visão assustadora, Jack sentiu vida frágil do namorado ainda pulsar.  Ele estava sem sentidos, mas vivo.  Vivo.

– Seu idiota... – sussurrou para o Jään preso dentro do canil – Eu avisei, não avisei?

Aproximou-se e tocou o cadeado.  Talvez se usasse o seu poder pudesse congelar aquilo e torná-lo frágil como cristal.  Não.  Não podia desperdiçar energia assim!  Caiu de joelhos no chão e conseguiu passar um braço pela grade, esticando a mão em direção ao namorado.  Fechou os olhos concentrando-se.  Uma energia prateada muito fraca iluminou o corpo pequeno e lentamente fluiu em direção a Shibuya, sem sentidos no chão.

Assim que a energia tocou o corpo do mais velho ambos gemeram.  Jack foi tomando por uma dor tão profunda que o fez arquear-se e ofegar.  Lágrimas embaçaram-lhe a visão e ele abaixou a cabeça deixando que rolassem para o chão de terra batida.

Um ferimento de compressão quente...

Se não fossem imediatamente para um lugar frio não conseguiria reverter o quadro e salvar o mais velho.

– Seu idiota...

Mesmo sabendo ser inútil, Jack não conseguiu parar o vínculo empático e encerrar a troca de energia.  Chegara no último instante possível.  Se não alimentasse Shibuya daquela forma não sabia quanto tempo o mais velho agüentaria.

Chegar naquele exato segundo podia ser um verdadeiro milagre.  Ou obra do destino, mais uma vez.

Jack só queria saber o que fazer para manter aquele milagre.

E a esperança se desfez de novo quando uma voz firme e autoritária cortou o silêncio angustiado.

– Levante-se, Jään.  E afaste-se lentamente.

oOo

Hayato andava de um lado para o outro no quarto.  Era uma providência divina que o prisioneiro morresse sem que precisassem fazer alguma coisa.  Depois disso estariam livres e...

O moreninho balançou a cabeça angustiado.

Queria se convencer de que estava tudo bem que as coisas terminassem assim.  Porém não estava.  Não podia se enganar.

Takeo seguia o amante com os olhos preocupados.  Sabia o quão sensível ele era.  Mas muito mais do que isso, sabia que as mãos de ambos estavam atadas.

– Não podemos chamar um médico.  E não entendemos nada de cuidados Jään.

– Mas... mas...

– Nós não causamos esse ferimento.  Não é nossa culpa, Hayato.

– Sei disso.

– Mas sente que temos que fazer alguma coisa, não é?

– Claro – o moreninho parou de andar e fitou o mais velho – Você acha que está bem assim, apenas não fazer nada?

– Ora... e quem de nós resistiu mais a fazer algo? – o ruivo perguntou com uma sobrancelha erguida.

– Eu. Pode jogar na minha cara.  Só que agora não quero simplesmente fechar os olhos e virar as costas para alguém que está morrendo no meu quintal!

– E sugere que façamos o quê...?

– Não sei! – frustrado Hayato sentou-se na cama ao lado do amante e se deixou abraçar.  Quando deu por si estava chorando no ombro do outro – Não podemos mesmo fazer nada, Takeo?

O mais velho tocou os fios de cabelo moreno e deslizou numa caricia muito suave.

– Podemos fazer muitas coisas. Mas todas têm um preço.  Um preço alto.

Confuso Hayato ergueu a cabeça e fitou o outro com os olhos marejados.  As lágrimas já tinham feito um rastro úmido pela face pálida.

– O que sugere?

– Você fica aqui e me deixa dar um fim digno ao sofrimento do Jään... – Takeo insinuou.  Hayato gemeu e meneou cabeça.  Jamais permitiria aquilo – Tentar entrar em contato com alguém que entenda disso, ou com a Agência.  Chamar um médico ou...

O ruivo parou depois daquela frase, a próxima sugestão era grave demais para fazer de forma despretensiosa.

– Ou...? – o moreninho incentivou.

– Podemos levar o Jään até as Terras Ermas – lançou de uma vez – Estamos no extremo norte, eu sei.  Mas há uma rota de acesso há alguns quilômetros daqui.  Leva ao ponto limite entre os territórios. Vi no mapa que é de difícil acesso e pouco utilizada.

– Takeo...

– Não sei quais as chances.  Mas se eles são seres do frio e se recuperam bem lá... correremos um risco muito...

– Eu pego as chaves da caminhonete e mantimentos – Hayato levantou-se decidido – Você pega o mapa e agasalhos.

O mais velho ergueu ambas as sobrancelhas diante da atitude do amante que secava as lágrimas enquanto ia por o plano em prática.  Levantou-se também, cruzando as mãos atrás da cabeça.  No fundo já imaginava qual seria a escolha daquele emotivo com quem se envolvera e a quem dera seu coração.

– Eu sabia... – aproximou-se da janela do quarto para ver como estava o tempo.  Apesar do outono se aproximar o clima ainda era muito quente.  Foi então que flagrou algo que o surpreendeu – Hayato! Rápido! Temos visitas!

– O que...?

– Tem alguém no canil.  Pegue o ancinho, eu busco o machado no celeiro.  Vamos pegar quem quer que seja de surpresa.

oOo

Teruo guiou o carro calmamente.

O sinal no GPS mostrava algo surpreendente: o primeiro Jään continuava fraco, apesar de estar quase chegando às coordenadas indicadas.  Mas um segundo ponto brilhava forte na tela.  Dois Jään no extremo norte do país.  Que maravilha!

Contornou o campo de milho e desceu do carro apenas para abrir a porteira, que deixou escancarada antes de voltar ao carro e seguir pelo caminho de terra.  Desligou o veículo e o estacionou embaixo de uma árvore quase sem folhas.

Desceu do veículo e checou as armas.  Tudo certo.

Não precisou avançar muito.  Ouviu uma voz autoritária gritando uma ordem.

– Levante-se, Jään.  E afaste-se lentamente.

Teruo ergueu uma sobrancelha e avançou.  Precisavam de sua ajuda ali.  Que timming perfeito!  Seria o destino?

Com uma arma em punho avançou pelo terreno e seguiu um pouco mais para a esquerda em direção ao som da voz.

A cena era no mínimo inusitada.

Um Jään permanecia ajoelhado, grudado em uma estrutura de cimento e arame, que parecia uma espécie de canil.  Um tanto afastados dele dois homens, um moreninho segurando um ancinho e um ruivo com um machado, se mantinham em posição ameaçadora.

O pequeno Jään não deu mostras de registrar a chegada de Teruo.  Já os humanos notaram a presença do rapaz e se surpreenderam.

– Agência! – o ruivo exclamou olhando primeiro para o amante e depois para o Jään, sem saber o que fazer.

Para esclarecer qualquer eventual duvida Teruo tinha seu estilo próprio e agia sem rodeios.  Engatilhou a arma calibre vinte e dois e apontou para os dois humanos.

– Larguem isso imediatamente, – falou bem calmo – ou vão se arrepender, garotos.

Continua...


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Notas finais do capítulo

Tenho mais um pronto para ser postado, rsrsrsrs, mas quero digitar mais um pra ter sempre um a mais XD
.
Enjoy



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