Cap. 09: Verdades e mentiras

Mutilação.

Bulimia.

Dislexia.

Bullying.

Somados à “Estupro”, fizeram a minha cabeça rodar e o meu coração se contrair.

E eu senti que não havia chão sob meus pés quando a história de Summer foi contada por Christofer.

Eu senti que todas as barreiras que eu havia derrubado até agora, e as que eu ainda tentava derrubar, não eram nada comparadas às muralhas que Summer vinha enfrentando a vida toda. Todos os dias.

Começou aos seus 9 anos...

Summer teve baixo rendimento escolar e foi diagnosticada com dislexia. Ela entrou em um processo de tratamento, mas não conseguiu se curar completamente pois começou a ficar depressiva. Pelo o que Christofer disse, uma das paixões de Summer era a leitura, e não conseguir fazer isso direito acabava com ela.

E ao passar dos anos, sua situação piorou. Aos 14 anos Summer entrou na fase “preciso emagrecer!”, e não saiu dessa. Ela começou a ficar paranoica, algumas garotas que estudavam com ela a chamavam de gorda e isso a afetou muito, apesar de todos sempre lhe falarem que ela era tudo, menos gorda. Mas ela enlouqueceu com isso e acabou ficando bulímica. Segundo Christofer, ela continua cismando com o peso, mas têm procurado parar com isso de uns tempos para cá.

Summer já foi internada duas vezes devido à bulimia, e costuma ir à terapias, devido à depressão que lhe atinge às vezes. Christofer disse que, às vezes, ela começa a chorar do nada, e há dias em que ela não quer nem levantar da cama. Apenas fica lá, deitada, olhando para o nada. A família fala com ela e Summer parece estar em outro mundo, sem ouvir ninguém. Não come, não fala, mal se mexe.

Parece que quando ela começou com essa loucura de querer emagrecer, cada um de seus amigos foram deixando-a de lado, e por diversas vezes a maltratavam, chamando-a de “gorda”, “obesa”, dizendo que ela continuaria daquele jeito para sempre. Laura foi a única que permaneceu ao seu lado, desse a descoberta da dislexia.

Por causa disso tudo, Summer passou a cortar os pulsos para aplacar a dor.

E foi aí que eu percebi: naquele dia em que ela passou mal no ensaio da peça, eu apertei seu pulso. E ele sangrou. Sangrou porque na noite anterior ela o cortou.

E seu grito de dor ecoa até hoje em minha mente.

E eu achando que era eu o problemático da história. Que eu era quem mais sofria devido às barreiras, que eu era o único sofrendo e me esforçando para passar por cima dos problemas.

Havia alguém bem ao meu lado, sorrindo, que sabia mais de como era lidar com problemas do que eu. Que sabia o que era sofrer.

Palmas para Mark Campbell, por sua imensa burrice e ignorância!

Eu sou mesmo um idiota...

E se passou 1 semana...

Senti mãos me sacudindo e uma voz gritando ao fundo. Gemi, sonolento. Eu mal conseguia dormir nos últimos dias, e quando finalmente conseguia ter uma boa noite de sono, alguém me acordava.

– Acorda logo, seu vagabundo!

Ou algum animal me acordava.

– O que é, merda...- murmurei, colocando o travesseiro sobre o rosto.

Eu definitivamente não estava a fim de nem ao menos ouvir a voz de Christofer McLean hoje.

– A Summer!- abri os olhos, agora atento.- Ela acordou ontem a noite!

Pulei da cama e olhei para Christofer, que me observava, sorridente. Seus olhos brilhavam, felizes.

– Por que não me ligou quando ela acordou?- gritei, correndo para o banheiro para escovar os dentes.

Christofer me seguiu, sorrindo feito um idiota.

– Eu liguei para o seu celular, mas ele estava desligado. E quando eu liguei para a sua casa, a Elena me disse que você estava dormindo!- ele disse.

Com a boca ainda cheia de pasta de dente, olhei para Christofer através do reflexo do espelho.

– Elena? Para você é SENHORA CAMPBELL, entendeu?- eu falei, me engasgando com a pasta de dente em seguida.

Christofer riu.

– Só por enquanto, Mark. Só por enquanto.

Revirei os olhos. Só faltava essa: Christofer virar meu padrasto.

Seria a deixa para eu cometer suicídio.

Logo terminei minha higiene matinal e fui me arrumar. Fiz tudo, praticamente, correndo, porque sabia que Christofer estava no andar de baixo tarando a minha doce e inocente mãe.

Assim que cheguei na cozinha, ainda tentando deixar meus cabelos apresentáveis, vi novamente Christofer jogando seus Raios de Sedução sobre a Sra. Campbell.

– Eu não sei se essa é uma boa ideia, Christofer.- minha mãe dizia, com certeza em resposta a mais um pedido de Christofer para ela sair com ele.

Revirei os olhos, cansado de ver aquela cena novamente. Ele não cansava nunca? Era a QUARTA desfeita da minha mãe só naquela semana!

– Sabe qual ideia seria ótima? Irmos ver Summer AGORA!- falei, puxando Chris para longe da minha mãe. Ele riu diante da minha ação.

– Não vai tomar café antes, filho?- ela perguntou, preocupada.

– Eu compro algo no caminho.- respondi.

– Mas eu estou morrendo de fome!- olhei para o futuro defunto, que sorria todo bobo para a minha mãe.

– Vou acabar com a sua fome dando um soco no meio da sua cara!- falei para Christofer, irritado. Ele fingia que não ouvia.

– Mark! Essa foi a educação que eu lhe dei!?- minha mãe perguntou, dando um tapa forte no meu ombro. Revirei os olhos.

– Até mais, mãe!- falei, dando um beijo na bochecha dela e saindo da cozinha, puxando Christofer.

– Até mais, Elena!- Christofer gritou, mandando beijos para quem não devia. Olhei feio para ele, que apenas me lançou um sorriso amarelo.

Saímos da minha casa e fomos o caminho inteiro em direção ao hospital em silêncio, com Christofer sorrindo de orelha em orelha ao meu lado.

– Bom dia!- a recepcionista disse ao nos ver.- Como vocês estão?

– Estamos ótimos!- Christofer falou animado.

– Que bom. Vocês já sabem o caminho até o quarto, né?- assentimos.- Então podem ir.

Por mais felizes que estivéssemos, toda vez que passávamos pelos corredores daquele hospital ficávamos meio para baixo.

Era frio, triste. Lembrava a morte.

– Chegamos, finalmente.- Chris parecia tão aliviado quanto eu. Ele foi até a porta e vagarosamente a abriu.

Eu sentia o meu coração querer pular do meu peito.

Como ela estaria?

Já havia se recuperado?

Já havia contado à polícia que tudo o que aconteceu foi por culpa de Joshua?

Eu sorria em expectativa, mas o sorriso logo se desfez quando eu vi dois policias e, ao que parecia, um detetive, e ouvi um deles dizer:

– De acordo com seus pais, o principal suspeito é Joshua Sparks. A senhorita tem certeza de que não foi ele?

– Sim, tenho. Acho melhor... deixar essa história para lá. Já passou.

Arregalei os olhos, atônito. Christofer estava parado ao meu lado no mesmo estado que eu.

Summer finalmente pareceu notar nossa presença e ficou pálida quando encontrou meu olhar.

– Ok. Se é o que a senhorita prefere.- um dos policias disse.- Qualquer coisa, não hesitem em nos procurar.

Os 3 passaram por mim saindo do quarto, mas eu nem sequer os olhei.

Assim que a porta atrás de mim se fechou, eu e Christofer falamos ao mesmo tempo:

– Que história é essa, Summer?!