A Leoa Da Montanha escrita por LadyJackie


Capítulo 4
Capítulo 4




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Capítulo 4

   A semana passou com uma lentidão impressionante. Lyona continuou com suas atividades de sempre: aulas de música, costura, cavalgadas e treinos secretos. Fez tudo de forma apática, como se tivesse se resignado com seu destino, até porque ninguém no castelo poderia desconfiar de suas intenções. Não era como se, depois do ataque de fúria de seu pai e sua declaração sobre ela ir à Koning, ela pudesse agir como se nada tivesse acontecido.

   Estava montada em Amazon, cavalgando pelo bosque e refletindo sobre quando e como iria se alistar no treinamento. Nos últimos dias, havia se dedicado ferozmente às suas atividades para terminá-las mais cedo e sair com frequência da Torre Sul, em parte para ficar o mais longe possível de seu pai e em parte para ouvir os rumores que se espalhavam cada vez mais. Tentava frequentar os bares e rodas de luta, onde os homens se apinhavam para se divertir e fofocar. As chances de descobrir novidades eram muito maiores.

   Conseguiu descobrir que o grupo de homens que recrutavam os jovens estariam no bar “O Oleiro” no centro da vila por dois dias. Fazia sentido ser esse bar, pois era considerado território neutro. Pelo menos ela não teria que se preocupar em ser vista em território de outra família.

   Já havia pensado em como se tornar um homem. Com seu tamanho, ela poderia se passar por um garoto baixinho, porém, não poderia simplesmente aparecer no bar com seus seios e seu cabelo. Sobre o cabelo ruivo, ela já havia se decidido, teria que cortá-lo. Seu cabelo era a única coisa feminina sobre ela que Lyona adorava, porém, não via solução para isso. Também deixaria uma franja em frente aos olhos para não perceberam seus cílios mais longos. Os seios ela tentaria esconder sob uma faixa bem apertada. Seria doloroso e ela teria que ficar extremamente atenta quando fosse se banhar, mas poderia ser feito.

   Pensou que se sentiria culpada quando a hora chegasse, porém, quando pensava sobre as palavras de seu pai, qualquer sentimento de culpa a abandonava. Seguiria seu plano até o fim.

**********

   Lyona mais uma vez andava pelas ruas de Cnoc, com a diferença de que agora era dia. As pessoas andavam de um lado para o outro coversando, gritando sobre suas mercadorias, comprando, brincando, e algumas simplesmente se apoiavam no parapeito das janelas observando a movimentação.

   Normalmente, a ruiva preferia andar pela vila durante a noite, pois conseguia sumir nas sombras, e durante o dia a probabilidade de alguém esbarrar com ela e seu capuz cair era grande. Porém, era mais fácil passar despercebida carregando uma espada de dia do que de noite. Ela carregaria a espada sob a capa, mas, se fosse pega, conseguiria facilmente se misturar com a multidão e desaparecer.

   Andando rapidamente e sentido o peso da bolsa de couro cheia de moedas presa no cinto, Lyona fez mais uma vez o percurso até a ferraria na área da Torre Leste. Quase corria. Foi durante todo o percurso repetindo em sua cabeça que queria chegar rápido para pegar sua espada, e não para ver o aprendiz de ferreiro insolente da última vez.

   Parou na frente da grande porta aberta e de lá ela conseguia ouvir sons de um martelo batendo em ferro. Lyona respirou fundo e, com passos controladamente vagarosos, ela entrou.

   Um enorme homem com o tórax nu estava martelando metal incandescente sobre a bigorna. Ela ficou decepcionada.

   Ele não percebeu sua presença de imediato.

- Ca-ham. – Ela tentou. Ele não se virou para olhá-la.

- CA-HAM. – Mais forte. O homem ainda não virou.

   Bateu com o punho no balcão e o ferreiro virou a cabeça para ela bruscamente. Ela olhou para seu rosto grande e moreno cheio de cicatrizes. Seus olhos negros eram impressionantemente calorosos.

- Vim aqui buscar minha encomenda.

- E você seria? – Ele se endireitou e começou a limpar as mãos num pano sujo.

- Creio que seu aprendiz falou sobre mim. Eu encomendei uma espada leve semana passada. Com um ornamento de leão no cabo.

   Ele deu um sorriso simpático que fez seu rosto parecer alguns anos mais jovem.

- Ah, sim. Ele me falou sobre uma... pessoa de braços finos e língua ferina que passou por aqui de noite.

   Sob o capuz, suas bochechas ficaram coradas.

- E então? Minha espada está pronta? Preciso dela com urgência.

- Sim, está. Irei buscá-la.

   O ferreiro saiu pela porta dos fundos. Lyona olhou distraidamente pela ferraria.

   Logo ouviu passos pesados voltando e o homem apareceu segurando um objeto longo envolto por panos. Ele depositou-o no balcão de madeira e abriu o pano.

   Lyona arregalou os olhos. A espada era linda. Sua lâmina era prata com alguns detalhes em dourado. Esses detalhes eram como fios que rodeavam a lâmina em ziguezague e que tinham origem no cabo. Este era vermelho com partes douradas e, próximo à junção com a lâmina, havia a cabeça de um leão rugindo. O nível de detalhamento era impressionante, desde os dentes até os olhos. Quando segurou-a, Lyona a sentiu como uma extensão do próprio braço, como se a espada tivesse sido feita para ela. Bom, ela foi, mas era como se a pessoa que a fizera a conhecesse. A bainha seguia o mesmo estilo da lâmina, com os fios ziquezagueando, porém, era negra. Tudo era tão detalhado e fino que passava a impressão de algo quase feminino.

- Gostou?

   A ruiva foi puxada para a realidade e viu que o homem estava encarando-a com um olhar divertido. Ela olhou-o de volta, achando quase engraçado como alguém com tantos músculos e tão grande fosse mais simpático do que um homem magro e pequeno como seu pai.

- Muito. Foi o seu aprendiz quem a fez? Gostaria de parabenizá-lo.

- Ethan? Não, não. Quando são encomendas especiais como esta, sou eu mesmo quem as faço.

   Então o nome era Ethan...

- Neste caso, eu agradeço. Seu trabalho foi excepcional. Não é por acaso que dizem que você é o melhor ferreiro de Cnoc, senhor...

- Connor. Me chamo Connor. Muito obrigado. Afinal, Ethan estava certo quando descreveu sua personalidade para mim.

- Perdão? – Ela olhou-o surpreendida. Não que ele tivesse visto, pois o capuz ainda estava sobre sua cabeça.

- Eu sempre tento compreender a personalidade de um comprador para passar um pouco dele para a espada. Ele me disse que você pareceu alguém teimoso, mas com um coração gentil.

   Ela corou mais uma vez. Já estava cansada de corar sempre que o aprendiz, ou melhor, Ethan, era mencionado.

- Ele estava enganado. Não sou gentil.

- Bom, ele acertou sobre a teimosia. – Ele riu.

   Ela deu um pequeno sorriso.

- É uma pena que ele tenha se alistado para o treinamento em Sheehan. Ele teria gostado de ver como a espada ficou.

   Ela prendeu sua respiração. Ethan havia se alistado? Seu coração começou a bater descompassadamente. E agora, o que faria? Não estava preocupada em ser reconhecida, afinal ele não havia conseguido vê-la por causa da capa, porém ela não sabia se poderia confiar nela mesma para agir como se nunca o tivesse visto. Teria que tentar agir friamente.

   Percebendo sua inquietação, Connor perguntou:

- Você está bem?

- Sim, sim estou bem. Bom... Mais uma vez agradeço pelo trabalho. Recomendarei a ferraria a todos que precisarem de uma espada. – Ela desamarrou a bolsa de couro do cinto preso à cintura e entregou ao homem. – Aqui está o pagamento prometido.

   Ela esperou Connor abrir a bolsa e olhar o conteúdo.

- Preciso ir.

- Espero vê-lo de novo algum dia. – O ferreiro respondeu.

- Eu também. – Ela acenou e saiu.

   Ela pôde jurar, antes de começar a caminhar, ouvir a voz do homem rindo e falando sozinho:

- Com certeza... braços finos.

**********

  Lyona chegou à torre e subiu rapidamente as escadarias para evitar ser vista. Os guardas estavam, como sempre, jogando cartas e bebendo cerveja. Seu pai os expulsaria se os vissem assim, porém, Lyona nada contaria. Eles desatendos mais ajudavam do que atrapalhavam.

   Ao chegar em seu quarto, ela desamarrou de sua cintura a espada embainhada e guardou-a em seu baú, debaixo de todas as roupas.

   Quando teve certeza de que a arma estava bem escondida, levantou-se e se sentou sobre a cama para pensar.

   Dali a dois dias, seu pai a mandaria para Koning, a cidade real, para ter aulas de etiqueta com professoras que, de acordo com Meredith, já haviam dado aula para princesas. Ela não iria, claro, porém, se deixasse a torre muito cedo, seu pai reviraria Cnoc de cabeça para baixo, a arrastaria de volta para casa e a enfiaria na primeira carruagem para Koning escoltada por sabe-se lá quantos guardas de sua confiança. Mas também não poderia se atrasar, porque o grupo do rei Brandon sairia da vila depois de amanhã logo cedo.

   Certo, então ela se alistaria amanhã, durante a noite, e dormiria no bar junto com os outros que haviam se alistado. Assim, seu pai não perceberia que tinha saído até o dia seguinte e, quando percebesse, já estaria a caminho de Sheehan. Ele perderia muito tempo procurando em Cnoc e até lá ela estaria longe.

   Decidida, ela foi até a câmara de banhos, um dos poucos cômodos de que gostava na casa. Dali a pouco tempo, teria mais uma aula de música e outra de artes e não poderia se atrasar, mas, já que seus dias de luxo estavam chegando ao fim, ela os aproveitaria ao máximo.

**********

- A senhorita está dispensada por hoje. Esteve magnífica. – Liza, a professora de canto, lhe disse com um sorriso.

- Obrigada, senhora. – Lyona fez uma referência. Liza era uma das poucas pessoas de quem sentiria falta. Sempre fora uma ótima professora de canto e, se as circunstâncias fossem outras, elas poderiam ter sido ótimas amigas. Não que ela não quisesse, mas não poderia confiar que ninguém estaria ouvindo suas conversas por trás das portas. Quando era menor, ela perguntara para Liza como era a vida fora dos muros. Alguém ouviu, contou a Peter O’Carrol e a professora foi afastada da Torre Sul. Lyona teve que prometer e implorar para que a professora voltasse. Não cantava frequentemente, mas a energia pacífica de Liza atraía pessoas solitárias como Lyona.

- Nos vemos depois de amanhã para a próxima aula? – Ela perguntou.

- Sim... claro. – Ela não conseguiu olhar nos olhos da professora. – Preciso ir. Obrigada por tudo, Liza.

- O prazer é meu, Lyona.

   Foi a primeira a chegar no salão de jantar. Sentou-se e esperou seu pai e sua mãe chegarem para começarem a refeição. Eram raras as ocasiões em que todos estavam jantando juntos. Era muito comum Lorde O’Carrol estar muito ocupado ou Lyona estar perdida pela Torre, se escondendo. Era quase irônico que seus últimos momentos naquele lugar fossem ali, junto com a sua tão unida e carinhosa família.

   Logo Morgan e Peter chegaram e demonstraram uma leve surpresa ao verem a filha ali. Assim que se sentaram à mesa, vários pratos foram colocados, um parecendo mais saboroso que o outro. A carne de carneiro estalava de tão quente, os temperos coloridos, saladas, tortas de frango, frutas, manteiga, leite. Tudo com uma aparência fantástica e, mesmo assim, Lyona sentiu seu estômago embrulhar. Dali a poucas horas, ela estaria longe de sua casa. Um lugar sufocante onde não havia liberdade, onde fora psicologicamente maltratada por toda a sua vida, mas, mesmo assim, a única vida que ela conheceu.

   Ela sabia que precisaria de toda a energia que pudesse e também não sabia quando seria a próxima vez que teria uma refeição como aquela, portanto se obrigou a comer. Seu pai não a olhava nos olhos, e sua mãe lançava alguns olhares em sua direção. Os dois conversavam baixinho entre eles enquanto a garota observava. Lyona nunca realmente entendeu a relação de seus pais. Era óbvio para ela que Morgan era controlada por Peter, porém, ele a tratava quase com carinho. De sua maneira fria, mas com algum afeto. Era difícil para ela entender como a relação de duas pessoas tão diferentes pudesse funcionar.

   Enquanto comia a deliciosa carne de carneiro com molho de limão ao alho, ouviu seu pai dizer:

- Lyona, ouvi de seus professores que você tem se dedicado muito a suas aulas recentemente.

   Ela congelou. Poderia seu pai estar desconfiando de alguma coisa?

- Estou satisfeito. Quero ver a mesma dedicação quando estiver em Koning.

- Estamos orgulhosos de você, filha. – A mãe disse com um sorriso doce.

   Lyona não sabia se ficava surpresa por ouvir seu pai dizer que estava satisfeito, se ficava com raiva por ele ter mencionado Koning como se ela houvesse consentido em ir ou se ficava com vergonha por sua mãe ter ficado orgulhosa por algo que não deveria.

- Agradeço. – Ela respondeu simplesmente e continuaram a refeição.

   Alguns pratos, frutas e doces mais tarde, os três se levantaram.

- Boa noite, pai e mãe. – A palavra “pai” soou estranha até mesmo para Lyona.

- Partiremos no início da tarde. Tenha uma boa noite. – Lorde ‘Carrol fez um minúsculo aceno com a cabeça.

- Boa noite, filha. – A mãe lhe deu um abraço, o qual a garota retribuiu com fervor.

- Boa noite, mãe.

   Morgan lhe plantou um suave beijo na bochecha e saiu com o marido.

   A ruiva colocou a mãe sobre o lugar onde a mãe tinha beijado e seus olhos lacrimejaram. Por apenas um instante, ela reconsiderou sobre sair da Torre Sul e dar as costas a tudo que conhecia. Que bem faria isso? Ela não sabia como seria a vida dali para frente, então por que sair do conforto...?

   Balançou a cabeça vigorosamente. Não. Ela seria firme. Já havia se decidido e não havia doçura de sua mãe que a fizesse mudar de ideia. Sua liberdade era mais importante que o afeto temeroso que sua mãe lhe dispunha, mesmo que verdadeiro.

   Lyona correu para seu quarto e se fechou nele. Decidiu começar com o mais difícil, cortar seu cabelo. Ela pegou uma pequena faca de cabo dourado que mantinha em sua mesa e foi para a frente do espelho. Deu uma última olhada em seus longos e lustrosos cabelos, segurou uma mecha e passou a faca por ela.

   Fez isso continuamente, por vários minutos, tomando o cuidado de não cortar demais sua franja e nem a própria pele. Quando terminou, ela mal pôde se reconhecer. Seu cabelo agora estava longo o suficiente apenas para cobrir sua orelha, porém, estava rente à sua cabeça. Sua franja fora cortada até o meio dos olhos e fazia um bom trabalho escondendo-os.

   Ela rapidamente juntou o cabelo que caíra no chão e jogou-o em uma pequena bolsa de couro. Se livraria dela em seu caminho para “O Oleiro”. Lyona começou a se despir e puxou de dentro do baú uma faixa de pano branca que havia conseguido com a curandeira da Torre. Começou a enrolá-la em torno dos seios e a apertar. Doeu, mas ela não parou até sentir que, quando colocasse a roupa por cima, eles seriam imperceptíveis. No começo, teve alguma dificuldade para respirar, mas logo se acostumou.

   Em seguida, puxou as roupas do garoto do estábulo que tinha roubado. Em sua defesa, ela poderia dizer que as roubara da casa dele e não quando ele estava se banhando. Elas eram bastante esfarrapadas e com alguns remendos, mas eram perfeitas para não chamar atenção para si. Pôs a camisa, as bermudas e o sapato já quase sem cor de tanto ser usado. Quando olhou novamente para o espelho, Lyona ficou satisfeita. Parecia realmente um garoto pequeno, frágil e esfarrapado, mas um garoto mesmo assim.

   Deu as costas ao espelho e começou a fazer uma pequena trouxa de pertences. Colocou mais três faixas brancas para o caso de algo acontecer com aquela, mais roupas esfarrapadas usadas por outros funcionários da Torre Sul, uma pomada para ferimentos da curandeira, algumas poucas moedas retiradas da sala de tesouros do pai e só. Não achava que seria necessário muito mais que aquilo, afinal, estavam indo a um treinamento. Seriam alimentados lá.

   Pegou sua capa preta, colocou em torno de si e finalmente retirou a espada do baú. Quase com reverência, amarrou-a em torno da cintura. Era hora de ir.

   Respirou fundo, abriu a porta e se esgueirou pelos corredores e escadas até chegar a porta dos fundos que se encontrava na cozinha.

   Abriu a porta e sentiu a brisa fria da noite em seu rosto. Puxou o capuz sobre a cabeça e saiu. Ao chegar ao pequeno vão do muro, ela parou e olhou para trás. Finalmente seria livre daquela vida regrada e infeliz que tinha. Estava com medo, mas iria superar. Ela sempre superava.

    Lyona saiu e não olhou mais para trás.

**********

   A garota parou em frente ao bar. De fora, ela podia ouvir o barulho de pessoas cantando, conversando, batendo os copos de cerveja na mesa. Na escuridão da rua, a luz que saía das janelas do bar parecia como o dia.

   Lyona retirou a capa e olhou para a porta do “O Oleiro”. Era hora de ver se sua fantasia funcionaria.

   Empurrou a pesada porta de madeira e um calor acertou-a em cheio no rosto. Sua franja se espalhou, mas ela rapidamente juntou-a sobre os olhos novamente.

   A imagem dentro do bar era exatamente o que havia imaginado: pessoas bebendo, cantando aos gritos, o som de um violino ao fundo, alguns bêbados segurando as saias das atendentes – que, aliás, de nada reclamavam. Ela olhou atentamente as mesas, procurando alguém que parecia estar recrutando os garotos. Talvez com algum papel e pena sobre a mesa.

   Então, no canto do bar, alguém gritou:

- MAIS CERVEJA! Não posso lidar com tantos pirralhos sem mais cerveja!

   O homem que gritava era um senhor já por volta de seus 60 anos, calvo e magro, porém, forte. Ao seu redor, em uma grande mesa, estavam vários garotos, desde gordos até muito magros. Todos bebendo e conversando entre si. Pela quantidade de rapazes com aparência de maioridade, Lyona adivinhou que o velho eram quem ela estava procurando.

   Havia chegado a hora. Ela se aproximou de queixo erguido e disse para o velho:

- Gostaria de me alistar para o treinamento de Sheehan.

   Todos os que estavam na mesa pararam o que estavam fazendo para olhar para o garoto magricelo que estava em frente à mesa. Ela se recusou a desviar o olhar do homem.

   Ele arqueou as sobrancelhas e perguntou: - E você é?

- Lyo... – Ela parou de repente. Maldição, maldição, maldição! Como no mundo ela pensara em tudo e se esquecera de pensar em um nome de homem?

- Seu nome é Lyo? – O homem velho deu um sorrisinho.

- Lyonel. Meu nome é Lyonel! – Ela respondeu rapidamente.

   O velho se curvou sobre o papel que tinha na sua frente, pegou a pena e escreveu seu nome.

- De onde você vem?

- Da parte Sul de Cnoc. – Ela respondeu firmemente, dando a entender que não daria mais nenhuma informação sobre de onde viera.

- Já tem 20 anos? – Ele a olhou de cima abaixo, como se medisse sua idade pelo seu tamanho.

- Sim, tenho. – Ela nunca havia sido uma boa mentirosa, mas estava inspirada aquela noite.

-... Certo. – Ele anotou mais alguma coisa. – Qual é sua habilidade? O que você faz de melhor?

- Eu sei lutar, senhor.

   Ela ouviu risinhos por toda a mesa e lançou um olhar irritado a eles.

- Isso todos fazem. Quero saber o que mais você sabe fazer. – Ele deu um sorrisinho zombeteiro.

   Por essa ela não esperava. O que mais sabia fazer que poderia ser útil para um treinamento só de homens? Eles não precisariam de alguém que costurasse ou cantasse para eles... Então, ela se arriscou.

- Bom, eu... sei tratar de cavalos. – Lyona passava tanto tempo nos estábulos que havia aprendido como cuidar dos animais apenas observando os trabalhadores.

- Certo, isso é alguma coisa. – Ele fez mais algumas anotações. – Partiremos uma hora após o nascer do sol de amanhã. Esteja pronto. Por agora, pode beber e aproveitar o quanto quiser. Fale com a dona do bar para conseguir um quarto no andar de cima.

   Ela soltou a respiração que não havia percebido que estava segurando. A parte mais difícil estava concluída e parecia que seu disfarce havia dado certo. Ela foi falar com a mulher baixinha e gorducha que estava atrás do balcão e alugou um quarto no andar de cima. Feito isso, sentou-se à mesa com os outros meninos e ficou o mais longe deles possível.

   Não pediu nenhuma bebida, não por não ser maior de idade, mas por não gostar de seu sabor amargo. Nunca realmente entendera o porquê dos adultos beberem tanto aquilo.

- Olá.

   Ela se virou bruscamente e, ao seu lado, um garoto muito alto estava de pé. Reconheceu imediatamente seus cabelos negros e seus olhos âmbar. Ela segurou todas as reações que dariam a entender que o conhecia e acenou levemente com a cabeça.

- Posso me sentar aqui? – Ethan perguntou de forma simpática. Ela tentou ignorá-lo e voltou o olhar para frente.

   Ele arqueou suas sobrancelhas e olhou-a. Lyona se mexeu desconfortavelmente na cadeira e colocou sua franja o mais em cima dos olhos que conseguiu. Ele deu de ombros e se sentou.

- Você também está indo para o treinamento?

- Sim. – Ela continuava olhando para frente.

- Você não parece ter 20 anos. É um garoto pequeno.

- Sim.

- Não é de falar muito, não é?

- Não. – Ela quase riu com aquela resposta.

   Ele se aproximou um pouco e ela enrijeceu.

- Estranho... Parece que já vi você em algum lugar. É como se eu te conhecesse e, ao mesmo tempo, não te conhecesse... Entende?

- Não, e nós nunca nos vimos. – Ela começou a ficar nervosa. Tinha que sair dali.

- Tem certeza? – Ele tocou em seu braço para fazê-la se virar.

   Ela sentiu como se faíscas acertassem sua pele repetidamente. Lyona puxou seu braço bruscamente e se levantou. Mais uma vez os integrantes da mesa pararam e olharam.

   Sem graça e muito nervosa, ela disse:

- Vou dormir. Tenham uma boa noite.

- Não se esqueça, garoto. – O velho disse. - Uma hora após o nascer do sol.

   Ela deu um pequeno aceno e foi em direção às escadas segurando sua trouxa de itens bastante apertado. O caminho todo, sentiu um olhar em suas costas.

**********

   Na manhã seguinte, Lyona estava pronta muito antes da hora. Quase não havia conseguido dormir após a sucessão de acontecimentos do dia anterior.

   Pouco tempo antes do nascer do sol, todos os aprendizes se reuniram na entrada norte de Cnoc. Alguns se despediram dos pais e outros foram tratar de últimos negócios. Lyona pensou apenas em como sua vida seria a partir dali. Recusou-se a pensar nos pais.

   O guarda abriu os portões e, na frente do grupo, três homens adultos gritaram para incitar o início da caminhada.

   Hora de partir. 


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Notas finais do capítulo

Bom, aqui está mais um capítulo =D Espero que gostem.
Não se esqueçam de deixarem uma review por favor *-*
Agradecimentos mais sinceros para Anne L por betar minha fic e ter paciência com meus erros de português XD
Beijos e até o próximo capítulo! o/



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