Sharon abriu os olhos verdes lentamente: O mundo estava borrado... Ela piscou algumas vezes, e algo entrou em foco.
Dois olhos azuis elétrico, com pupilas verticais prateadas.

− WAA!

− MM!

Ele a olhou firmemente, ainda tapando sua boca. Já não sorria mais.

− Não grita. Por acaso eu sou seu inimigo?

Por algum motivo, os olhos dela o perfuraram, se tronando agressivos e irritados. Mesmo assim, ele soltou sua boca.

− Não foi por causa disso que eu gritei. – Disse ela, ruborizando.
Ele inclinou a cabeça para o lado, curioso.

− Eu gritei porque eu me troquei na sua frente e você não tirou os olhos da minha calcinha!! E só agora eu entendi que era safadice! Seu... Tarado... Enganador... De... Uma... Figa!! – Sibilou ela, pontoando cada frase com um tapa ou um soco no peito dele, com toda a força que tinha.
O que, pelo visto, não causou efeito algum no garoto.

Um segundo depois, Sharon percebeu que estava sentada em sua cama.

E que ele estava de joelhos em cima dela...

− Filho da mãe! – Corou ela, puxando as cobertas até o queixo. Isso a fez notar que a coberta estava entre eles, pois isso atirou o garoto longe.

− Não sei por que isso. Já parou pra pensar que eu sou o gato de quem você cuidou a semana inteira?

Sharon entrou em pânico. “O problema é que tive a impressão de que o olhar dele mirava a minha calcinha.” “Mas eu estava agradavelmente encolhida na minha cama, coberta, fazendo a lição de casa. E com um gato roxo listrado de laranja no meu colo.”

“− De nada. – Rosnei, pegando-o no colo e colocando na minha cama.”

Ela havia dormido com ele do seu lado?

Sharon gemeu, pensando no decote do seu pijama.
Como que lendo os seus pensamentos, Cheshire sorriu, ainda mais sarcástico do que antes.

Um segundo depois, seu sorriso sumiu. Perplexo, ele apertou o lado esquerdo do seu tronco.Uma mancha de sangue molhou sua mão...

Com uma careta de dor, ele desabou ao chão, apertando a ferida que se abrira. O sangue manchava sua roupa, drenando suas poucas forças...

Sharon hesitou. O que faria?

Cheshire apertou ainda mais o machucado, tentando estancar o constante fluxo de sangue que ele vertia. Mas pouco a pouco, suas mãos perdiam a força. Seus olhos se fecharam, e sua coluna perdeu a força para mantê-lo...

Um par de braços quentes envolveu seu corpo com delicadeza, apoiando-o, e envolvendo um lençol ao redor da ferida.

Ele sentiu o perfume da garota no corpo que agora era a sua salvação. Não pode deixar de sorrir.

Estava em boas mãos.
~*~

− Ei, onde você pensa que vai?

Joseph estranhou. Sharon não havia nem chiado ao saber que iriam morar juntos por alguns meses; Havia chegado atrasada na aula; E agora saía correndo mal batido o sinal, esquecendo-o completamente. Afinal, o que estava acontecendo?
~*~

Sharon trabalhava silenciosamente. Suas mãos se moviam com cautela, limpando o sangue coagulado. Seu rosto ruborizava levemente sempre que reparava nos traços definidos do abdome do rapaz.

− Hmm... Isso não faz sentido. Você está tocando no corpo do garoto mais cobiçado da minha terra. Deveria estar honrada.

Os olhos verdes da garota se semicerraram.

− Então ... WAA! – ele agonizou, apertando as laterais do colchão da garota. – Você fez de propósito!

Ela nada disse em defesa própria. Apenas sorriu.
~*~

Tudo corria estranhamente bem, tendo em conta que Sharon tinha um menino gato extremamente tarado morando no seu quarto. Certo, ele em tese havia se mudado para o sofá, mas às vezes ela ainda acordava com ele enrolado por cima das suas cobertas, ao seu lado. E ela agora era obrigada a se trocar no banheiro, para sua própria segurança.

Mas Cheshire não deixava de ser meio gato. Ele ainda se sentava ao seu lado (não mais no seu colo) para vê-la fazer a lição, e ainda caçava moscas, e ainda ronronava se ela se aventurasse a acariciar o topo de sua cabeça, entre as orelhas pontudas.

Era estranhamente amável.
~*~

Chovia novamente. E Sharon corria novamente, pela mesma rua em que encontrara Cheshire. Até que o cheiro salgado e pungente de sangue invadiu seus sentidos.

Um gato.

Um gato preto, largado, fraco e cambaleante, sangrando, se arrastava pela rua, sob a chuva torrencial.

Sharon não pensou duas vezes dessa vez.

− Cheshire!

Ele estivera ocupado bagunçando os lençóis da cama dela, mas abriu espaço para o recém-chegado.

Era um lindo gato preto, agonizante.

Não. Era um garoto maravilhoso, com o cabelo preto e comprido escorrendo água e sangue enlameado, e com o corpo mal e mal coberto por uma longa capa escura e rasgada.

− Cheshire... – suspirou ele, tentando se levantar. Com suavidade, Sharon manteve-o deitado, enquanto o gato roxo se aproximou.

− Solebum... O que houve? Quem fez isso a você?

Solebum arquejou, tentando respirar. Sharon já havia despido sua capa e agora desabotoava os botões de sua camisa de couro sem mangas, que comprimia a garganta do garoto.

Assim que conseguiu respirar novamente, ele suspirou, rouco:

− A princesa... Começou a se mover...

Cheshire franziu o cenho, preocupado. Sharon apenas limpou o sangue do rosto do rapaz ferido.

− Estão vindo pra cá... Eu... Tentei detê-los...

− Idiota. – Ralhou Cheshire. Sharon censurou-o com um tapa no ombro machucado, fazendo-o se encolher, irritado.

Os olhos da cor da noite se voltaram para a garota.

− Quem...?

Mas Sharon não estava olhando pra ele. Estava olhando pela janela, com os olhos apertados, tentando enxergar através do vidro embaçado.

− Sharon? – Tentou Cheshire, mas a garota não estava ouvindo.

Estava abrindo a vidraça e metendo a cabeça pra fora, apesar da chuva torrencial.

− Sharon! Mas o que...? – Reclamou o gatuno, puxando a garota de volta pra dentro.

Por debaixo da água e dos cabelos molhados, seu rosto tinha uma estranha expressão de atordoamento.

− Nada... Pensei ter visto...

− Visto o quê?

Havia uma nota de pânico na voz de Cheshire, mas mesmo assim Sharon não lhe respondeu.