–Digory?

–Como vai, querida? - sorriu ele, descendo as escadas e, percebendo minha confusão, tratou logo de explicar. - Desculpe, mas eu tinha que falar com você sem que ninguém soubesse, então achei que me passando por Caspian haveria segredo e eficiência. Temos letras muito parecidas. Acho que isso é uma das poucas coisas que temos em comum. - sorriu, chegando ao pé da escada. - Ele puxou à mãe.

–Da mesma forma que Dash puxou ao senhor. - comentei.

–Sim, sim.

–Por que me trouxe aqui? - perguntei, curiosa.

–Preciso conversar com você sobre Caspian. - disse, um pouco mais sério. - Bem, sente-se, por favor. - acompanhou-me até a sala, sentando-se à minha frente.

–Diga, Duque. - falei. Ele hesitou.

–Caspian e Dash tiveram outra briga ontem. - soltou com o ar.

–Se machucaram? - perguntei preocupada.

–Bri e eu conseguimos separá-los. Mas creio que sabe o motivo da briga. - disse ele, calmo. Baixei a cabeça, envergonhada.

–Foi por minha causa, não foi? - sussurrei.

–Sim, foi. - ele não estava zangado, nem nada parecido. Envergonhada, encarei minhas mãos.

–Me sinto tão mal por isso. - sussurrei.

–Eu também, minha querida. - disse ele.

–Há alguma coisa que possamos fazer para resolver esse problema? - perguntei, mesmo já sabendo o que ele diria.

–Você tem que decidir definitivamente por um dos dois. - ele foi direto. Encarei-o por breves segundos.

–O senhor sabe que...

–Antes que decida. - interrompeu ele. - Deixe-me falar uma coisa. - fez uma breve pausa, puxando ar. - Eu vejo todo o sentimento que nutre por Caspian, mas você tem que saber que escolhendo a ele, estará mergulhando num universo sombrio, misterioso. E talvez descubra coisas sobre Caspian com as quais você não suportaria conviver.

–É Caspian quem eu amo. - assegurei como se essa simples frase fosse capaz de resolver tudo. Uni as sobrancelhas como uma criança teimosa e irritante.

–Como falei, eu vejo. Mas independente de qual seja a decisão, não há como beneficiar a todos. Um acabará perdendo.

–Nesse caso, que seja eu. - protestei sem pensar.

Ele balançou a cabeça negativamente.

–Nem Dash e muito menos Caspian permitiriam que você se afastasse. Ter você longe não resolveria o problema, só aumentaria o atrito entre eles. - ele fez uma pausa. - Eu entendo seu lado perfeitamente, Susana, mas não aguento mais ver meus filhos em guerra. – disse ele, pedindo ajuda. Estaquei. Guerra. Não, não pode ser.

–Está acontecendo... - acabei por falar. Ele uniu as sobrancelhas.

–Como?

–Aquela mulher, a bruxa. - arfei. Digory arregalou os olhos, pálido. - Ela disse que haveria guerra na sua casa, não disse?

–Como soube disse?

–Espere... - eu estava andando de um lado para outro, pensando. - Ela também disse que aquele não era o primeiro filho que meu pai perderia e realmente ele não perdeu só aquele primeiro, então...

–Susana! - chamou ele, quase gritando. Parei abruptamente. Digory se aproximou de mim, pondo as mãos em meus ombros e olhando intensamente nos olhos. - Não é bom que leia o diário do seu pai, se é o que está fazendo. Você não vai gostar do que vai encontrar. Mas esqueça isso por um momento, não foi esse o motivo que me fez trazê-la aqui. - falou mais baixo. - Ontem, durante a briga, Dash desmaiou. Ele está enfraquecido por estar sem você. Não só no sentido romântico. Ele é o Immunis e está sem sua Intentum. Isso não pode acontecer. Um casamento precisa ser realizado. Você deve se casar com Dash.

–Mas Harold disse que sou uma Sanitas, sou a cura do Herdeiro. - argumentei.

–É esse tipo de mutação que ocorre quando um Herdeiro tem um filho. Por isso todos os Herdeiros são destinados a ficar sozinhos, entende? Segundo a ordem, Raphael nunca poderia ter tido filhos. Quando você nasceu, perfeita, achamos que não havia mais nada errado, nenhum problema, até por que Raphael era uma exceção, então, isso poderia refletir em outros aspectos além da herança, de alguma forma. Mas estávamos errados. A união de Raphael e Helena trouxe consequências graves. Você é uma Sanitas e uma Intentum.

–Não compreendo...

–Todos nós carregamos a Herança, Susana, está em nosso sangue há gerações. A diferença está em como se manifesta em nós. Em alguns, como Lúcia e eu, por exemplo, não se manifesta. Caspian é o Herdeiro, nele, a herança se manifesta “para fora”, transformando-o. Em Dash, o Immunis, ela se manifesta “para dentro”, enfraquecendo-o, alimentando-se de suas forças. No seu caso, por ser filha de um herdeiro, nasceu com algo inesperado: é uma Sanitas e uma Intentum. Neste último caso, você é uma espécie de cura para o Imune. É a Intentum que o mantem forte. - ele respirou. - Entende agora por que sou contra sua união à Caspian? Com ou sem você, Caspian vai sobreviver. Mas sem você, Dash morre.