As pesadas cortinas foram abertas, deixando que o sol entrasse e sua luz banhasse o jovem encolhido sob os cobertores, que se remexeu na cama, desconfortável.

-jovem mestre, é hora de acordar. Seus pais e suas irmãs o aguardam para o desjejum. – a voz suave da governanta tentava persuadi-lo.

O garoto assentiu, sonolento, levantando e se dirigindo ao amplo banheiro de sua luxuosa suíte. Lavou o rosto rapidamente para espantar o sono que ainda sentia. Em seguida, trocou o pijama listrado por roupas mais apresentáveis.

Nicholas Heagraves era um lindo jovem em seus 14 anos, com cabelos negros lisos e sedosos, olhos escuros frios e indiferentes, pele pálida, um corpo magro, de curvas ainda um tanto infantis. No conjunto, era uma figura extremamente bela, de aparência delicada e frágil, quase etérea.

Desceu sem pressa as escadas de mármore, rumando para o jardim da mansão, onde sua família costumava fazer as refeições durantes os belos dias de verão. Lá, embaixo de uma varanda repleta de trepadeiras, uma grande mesa continha algumas delicias, diversos tipos de pães, sucos, geléias, leite e bolos. Seu pai Edward, sua madrasta Ângela e as gêmeas Melody e Anne já o aguardavam. A nova esposa de Edward era uma mulher ainda jovem, em seus 35 anos, de cabelos loiros claros, olhos azuis gentis e um belo sorriso. As filhas, gêmeas idênticas,  haviam puxado a mãe em seus cabelos loiros e o pai em seus olhos negros. Tinham 5 anos e eram travessas e animadas, adoravam o irmão mais velho.

-Nick querido, como foi sua noite?- Ângela sorriu, trazendo-o para que se sentasse ao seu lado. Ela não era a mãe de Nicholas, esta morrera quando o garoto tinha apenas alguns dias de vida. Mas ela se encantara por aquela criança graciosa, e o amava tanto quando amava suas duas filhas, sendo uma verdadeira mãe para ele.  E estava sempre preocupada pois seu querido menino tinha problemas de insônia e freqüentemente passava as noites em claro. 

-Eu dormir bem, mãe. – Nick respondeu. Não era verdade, mas ele não queria que ela se preocupasse, pois ficava sufocante para si. Sabia que era amado por sua família, mas ele sempre escolhera por nãos e envolver demais com ninguém... Nem mesmo com eles. Não se deixar envolver por nada era garantia que não iria sofrer com perdas. 

Como sempre, o moreno tomou apenas um suco de laranja, e comeu uma maçã, e logo se levantou da mesa, pedindo licença. Apenas isso. Comia menos que um passarinho, aliais.

Estava com tempo livre, pois seu professor particular havia se demitido e seu pai ainda não encontrara um novo para substituí-lo. Não poderia sair de nem dos arredores da mansão, já estava cansado de andar pelo jardim, portanto rumou para a biblioteca e pegou um livro para ler. Passava muito tempo ali dentro, era basicamente o único lugar que o distraia, pois seu pai jamais o deixaria sair de casa.

Embora ele já tivesse questionado essa decisão a exaustão, seu pai sempre lhe respondia da mesma forma. Quando Nicholas nascera, houvera uma sinistra previsão sobre algo terrível que poderia acontecer no seu futuro. Além dos poderes estranhos que o garoto possuía. Por mais que perguntasse, Edward nunca lhe contara, afinal, que previsão era essa, tudo que sabia é que tinha estreita relação com a morte de sua verdadeira mãe, Elisabeth.

XXX

Richard Nichijou terminou de arrumar as malas, não muito animado com a mudança que faria em sua vida. Deixaria sua amada Londres e seguiria para uma mansão no campo, onde conseguira um emprego como  professor particular. Seria excelente se não fosse o quase completo isolamento da casa, e o fato de que teria de morar ali.

O jovem de 23 anos era filho bastardo de um importante aristocrata, e tivera uma excelente educação, com boas escolas e uma vida sem complicações. Mas com a morte de seu pai, ele não tinha direito nenhum à herança por não ser um filho concebido no casamento, precisava conseguir um emprego para manter a si, sua mãe e sua irmã mais nova, Alice.  Um de seus antigos professores lhe falara de um amigo que precisava de um professor qualificado como ele, e graças a isso, começaria com um ótimo salário...

-Vou me sentir tão sozinha...- Sua mãe, Naoko Nichijou, estava desolada com a mudança do filho.

-Mãe...já conversamos sobre isso. Precisamos do dinheiro, não tenho escolha a não ser aceitar esse trabalho.

-Mas viverá tão longe de nós! E como ficará Vitoria? – Vitoria era a noiva de Richard, planejavam se casar no próximo ano, mas agora isso teria de ser adiado.

-Vitoria é uma mulher sensata. Ela sabe que isso é importante para nosso futuro juntos, portanto não se opôs. Eu não ganharia um salário tão bom se procurasse um emprego por aqui em Londres.

-Aqueles imbecis...você é tão filho de Henry quanto eles!

-Eu sou só um bastardo, mãe. Não há nada que mude esse fato.

Naoko era uma jovem de apenas 17 anos quando conhecera o pai de seu filho. Havia fugido do Japão para a Inglaterra e trabalhava como dançarina em um teatro. Seu sonho era ser uma grande atriz, sonho que deve de abandonar após engravidar. Mas não podia reclamar, Henry Dara toda a assistência  ao filho, fazendo questão de que o garoto freqüentasse a sociedade e tivesse a mesma educação que seus outros filhos. Mas seu amado estava morto agora.  

Richard saira a mãe, cabelos negros, olhos puxados cor de mel e uma pele clara.  Era um belo homem e sempre havia mulheres aos seus pés, que ele ignorava, sua personalidade séria e compenetrada,   sempre estudioso, calmo e dedicado a tudo que fazia.

Pegou uma carruagem para a estação. Sua nova vida no campo estava para começar. Ensinaria o único filho homem do Duque Heagraves, um garoto de saúde frágil e que por isso não podia sair de casa. Já imaginava como seria. Com certeza, Nicholas seria mais um nobre arrogante e imbecil, bem ao estilo de seus irmãos...