Running Away From Hell escrita por GabanaF


Capítulo 6
Cap. VI — Normality


Notas iniciais do capítulo

Oi gente, como vocês estão? Primeiramente, queria agradecer vocês pelo reviews, vocês sabem, isso é o que mais me anima a continuar escrevendo - além do fato de que eu também não sei aonde essa história vai dar. Muito obrigada mesmo, o carinho de vocês para com a história é demais.
E... acho que vou decepcionar vocês um pouco com Faberry, mas não importa muito, por que eu prometo que nos próximos capítulos as coisas vão melhorar para nosso casal favorito.
Agora, sem mais delongas, o capítulo, e espero que gostem!



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02 de Fevereiro de 2012

Lima Hospital, Lima, OH

02:34 PM

Rachel estava cantando alegremente uma música com Finn na sala do coral quando as coisas mudaram. De repente, estava num rio de lava fervente, sem ter ideia de como havia chegado lá. A lava não a queimava, nem ao menos o pequeno bote em que se encontrava. Tentava nadar até a borda para se salvar, mas não conseguia.

O ar começou a ficar rarefeito. Quando deu por si, estava no topo da montanha mais alta que já tinha visto na vida (não que ela tivesse visto muitas). As coisas rodavam dentro de sua cabeça, ela queria respostas para o que estava acontecendo, porém sempre que chegava perto de alguém que conhecia, ela se transformava em neve, ou no Jedi.

A neve caía em seus ombros formando uma camada pesada sobre si. Mais uma vez, tudo agiu rapidamente e ela desabava montanha abaixo sem nenhum esqui ou snowboard. Tentou gritar, porém parecia que tinha perdido sua voz. Nem o desespero foi inovador: ela passava por aquilo tantas vezes que estava ficando chato.

E no meio de toda a brancura do desabamento, ela notou os loiros conhecidos seu. Agora sem rosto, apenas os cabelos balançando contra a neve como se não houvesse nada além de uma pequena garoa. Sabia quem era, e toda vez que ela aparecia ficava se perguntando o que fazia ali, invadindo seus sonhos e pesadelos constantes.

...

— Ei — disse Finn ao entrar no quarto, conturbado. — Nenhum sinal?

— Não — Quinn respondeu num suspiro, aceitando o outro copo de café que o garoto carregava. — Como isso foi acontecer?

Finn preferiu não responder. Quinn enterrou o rosto nas mãos, tentando controlar as lágrimas que sempre apareciam nos últimos dias. Ver Rachel deitada naquela cama de hospital, carregada de aparelhos ao redor dela era torturante.

Na primeira semana após o acidente, achou que tudo daria certo. Que Rachel acordaria numa das suas noites de acompanhante ali e perguntaria com sua expressão confusa se tinham prendido o pôster da campanha de Kurt corretamente. Ela sairia do hospital no dia seguinte e as duas poderiam fazer o segundo dueto que tanto queriam no Glee.

Entretanto, em algum lugar da terceira semana, suas esperanças foram diminuindo. Finn e os pais de Rachel voltaram a seus trabalhos e à escola, mas Quinn não conseguia se levantar da cadeira ao lado da maca de Rachel. Não tinha forças para sair do lado dela, seguir uma vida normal e simplesmente não estar lá quando ela acordasse.

Agora, pouco mais de três meses depois do acidente, suas visitas à Rachel eram restritas a apenas três por semana, durante pouco mais de uma hora. Sua mãe interferira para que voltasse ao colégio, ajudasse o Glee a ganhar as Regionais, ter uma chance de sorrir, e os pais de Rachel concordaram.

E, por um momento, achou que seria bom. Não por ela, jamais por ela. Rachel não iria querer que sua melhor amiga perdesse boas oportunidades, matrículas em faculdades e outras amizades para que ficasse ao lado dela, se lamentando não ter falado que lhe amava antes.

— Essa coisa tá ficando maluca — comentou Finn com olhos na televisão. — Digo, esses walkers.

Quinn concordou, desviando sua atenção da pacífica expressão de Rachel para o noticiário. Mais uma vez, comentavam sobre a grande infecção que atingira metade dos Estados Unidos e do planeta Terra. Havia duas ou três semanas que só se falava naquilo. Pessoas estavam começando a se esconder em porões, sótãos e qualquer coisa que as afastavam dos mortos-vivos.

— Deveríamos nos armar — disse Quinn seriamente. — Chamar a galera, nos organizar. Isso não vai melhorar tão cedo.

Lentamente, Finn concordou. Tomou o último gole de seu café e levantou-se da outra poltrona, mais longe de Rachel. Seu olhar caiu na mão de Quinn, brincando gentilmente com os dedos imóveis da garota desacordada.

— Acho que está na hora de irmos — anunciou, sentindo-se como um intruso naquele momento terno de Quinn. — Já é quase três horas.

Quinn demorou a retirar sua mão de perto da de Rachel. Ao sair, ela se aproximou da outra garota e se inclinou, próximo suficiente para lhe dar um beijo em sua testa. Finn não reclamou: era como um ritual para Quinn fazer aquilo.

Antes de bater a porta do quarto, ouviu a mulher do noticiário em um tom de total desespero:

Estamos numa emergência mundial. Zumbis, walkers, errantes, seja lá qual for o nome para essas aberrações, estão nos dominando. Cuidem de seus parentes, amigos, leve-os para as cidades. É onde o governo admite estar fazendo alguma coisa. Uma proteção concreta. Espero estar viva amanhã para repassar as últimas notícias.

O silêncio caiu no quarto de Rachel enquanto Quinn levantava os olhos para Finn, um plano inteiro armado em sua cabeça.

***

15 de Março de 2012

Galen Road, Fountain Run, TN

01:06 PM

— E... Estamos no Tennessee! — exclamou Brittany, querendo buzinar para comemorar suas habilidades em geografia. — Cerca de duas horas para chegarmos ao Sam!

Santana lhe deu um beijo na bochecha em comemoração. Ela viu pelo retrovisor Quinn se aproximar de Rachel, indo de encontro a seus lábios, mas no último segundo percebeu o que faria e apenas a abraçou.

Brittany franziu a testa para a namorada, pedindo explicações. Percebia o jeito que Quinn agia nas últimas horas perto de Rachel, e a declaração de amor que a garota tinha feito (não importava o quanto Rachel dissera quando estavam sozinhas no vilarejo que não tinha sido e jamais seria uma declaração de amor) era uma das mais lindas que já ouvira, superando qualquer desenho da Disney que vira.

Ela só não entendia por que as duas não conseguiam se arranjar logo. Quer dizer, elas pertenciam uma a outra, tal qual ela e Santana. Fazia dois dias que Quinn havia tirado Rachel em coma do hospital, além dos olhares e dos constantes segurar de mãos, alguma coisa a mais deveria ter acontecido. Brittany se recordava de não ter demorado menos de três dias — ou horas — para se apaixonar por Santana, mesmo não sabendo à época o que era amor.

— Eu te conto mais tarde — disse Santana num sussurro. Depois, girou o dedo ao lado da cabeça e apontou para Quinn, e Brittany sorriu quando leu os lábios da garota, que dizia maluca.

— Eu vi isso — comentou Quinn em voz alta; Santana a encarou como se nada tivesse acontecido.

Santana virou-se para o banco de trás e levantou a mão para a amiga, mas ao ver Brittany lhe observando seriamente desistiu de seu gesto obsceno. Ela deu uma risadinha que fez Santana se enfiar mais no banco, emburrada.

Whipped — tossiu Quinn. Rachel, e até Brittany, riu.

— Jamais — retrucou Santana, voltando atrás e dando o dedo do meio para Quinn. Brittany abriu a boca chocada, e se não fosse por um carro perdido no meio da estrada que precisava desviar, teria socado a namorada no ombro.

Ela sentiu algo estranho, algo que não sentia há muito tempo. Um sentimento curioso, que passava por suas veias e lhe dava uma energia única. Brittany sentiu as pontas dos dedos formigando, e um pouco de orgulho que ela não sabia de onde vinha. Ela só gostava. Lembrava-lhe do passado, de seus pais e de Lord Tubbington, seu gato.

Era bom, e ela sabia que demoraria a acontecer outra vez. Talvez seja por isso que ela memorizou o rosto das outras três dentro do carro. Quinn e seu olhar apaixonado para Rachel, recostada no banco e dando um sorriso singelo a cada vez que a outra garota percebia que ela lhe encarava. Rachel e seus murmúrios cantantes junto com o cassete dos Beatles, vendo a paisagem na janela e ocasionalmente lançando olhares culpados na direção de Quinn.

Por fim, Santana. A sua Santana, que também observava a vista das montanhas quilômetros à frente do Tennessee. Seu semblante era maravilhado. Como, mesmo depois do inferno inteiro que haviam vivido ainda sobrasse tempo para ficar admirada com as belezas da natureza, a única coisa intacta naquele mundo por agora. A paz que seu rosto transpassava acalmava Brittany mais do que qualquer coisa. Por que, claro, algum dia os papéis tinham que se inverter.

Ela queria memorizar tudo àquilo por que foi o primeiro momento em que se sentia realmente feliz depois de muito tempo. Tanto que não conseguia tirar o sorriso bobo de seu rosto enquanto aumentava um pouco a velocidade do Cadillac.

Brittany só esperava que quando chegasse à fazenda de Sam, o companheirismo que tinham compartilhado nos últimos dias não fosse embora.


15 de Março de 2012

Cave Hollow Road, Lafayette, TN

01:32 PM

Quinn estava olhando para ela da mesma forma outra vez.

Na verdade, nunca tinha parado de olhar. Rachel baixou a cabeça, sem acreditar. Como Quinn Fabray mudara tanto para ela? Como a menina de dois anos atrás que desenhava desenhos pornográficos dela no banheiro feminino havia se transformado naquele mulherão? Os meses de coma não lhe fazia muito bem se pensava no quanto tinha perdido por aí.

Ela queria retribuir o olhar de Quinn, mas não dava conta. Ou sorria encarando a janela do Cadillac ou começava a achar os furos no estofado do banco mais interessantes que os hipnotizantes olhos verdes e profundos de Quinn.

Desejava saber por que não conseguia. Porque era tão difícil olhar diretamente nos olhos da pessoa que havia lhe salvado da morte tantas vezes nos últimos dias? Era tão fácil com as outras pessoas antes desse inferno todo começar... Finn, Puck, Jesse... Estava em igualdade com os garotos. Mas Quinn... Ela era outro nível, um lugar onde Rachel ainda não alcançara.

Ela só queria saber por que.

Rachel se esqueceu dos olhares de Quinn por um momento para ter sua atenção totalmente voltada à adaga que um dia pertencera à mãe de Quinn. Desde a manhã, não tirava os olhos dela. A faca brilhava tanto que Rachel pensava que ela tinha brilho próprio. Os inscritos em latim em relevo só a fazia ter certeza de onde Quinn tirara seu dom para aquelas coisas. Sr. Fabray poderia ser mal, mas tinha bom gosto.

Não conseguira tirar da mente que Quinn lhe ensinava latim. Não conseguia entender que razão a faria querer fazer algo dessa forma. Mas, apesar disso tudo, gostara. Sentia-se importante na vida de Quinn. E, por algum motivo, aquilo era de suma importância para si.

— Está escrito... — começou Quinn ao ver que Rachel mexia na adaga pela milésima vez. Seu tom de voz era contido, envergonhado.

— “My Lady, My Beautiful” — completou a outra, ainda com os olhos cravados na faca. — Isso não presta.

— Desculpe? — indagou Quinn, visivelmente ofendida.

— Não, não a adaga — retrucou Rachel impaciente. — Eu. Eu não presto. Não deveria estar aqui, sou um grande saco de nada.

As lágrimas coçavam para que pudessem sair, porém Rachel as conteve. Quem dera fazer os mesmos com as palavras, pensou irritada. Seu problema maior era que falava demais, mesmo o momento pedindo toda a descrição possível.

Além disso, precisava desabafar. Sentia-se mesmo inútil, qual era o problema? Ah claro, você não tinha tempo para sentir-se um lixo no meio de um apocalipse zumbi. Você não poderia sentir nada no meio de um apocalipse zumbi, e isso chateava muito Rachel. Qual era a parte engraçada daquele inferno se não poderia expressar seus sentimentos ou ter um ataque de diva?

Quinn poderia ter provado que ela estava errada algumas horas antes, enquanto admitia seus sentimentos secretos por Rachel, mas ela não queria se apegar àquilo. O fato de que Quinn tivesse sido forçada para jogar tudo para fora não ajudava muito.

Não que não deixasse de acreditar no quanto Quinn sofria ao vê-la machucada. Ela via a dor nos olhos da garota toda vez que possuía coragem suficiente para encará-la. E o momento das duas na estrada cheia de carros também demonstrava o contrário — embora ela tivesse pulado fora no último segundo. Era só... Sinceramente, não sabia o que era. Com o mundo daquela forma, qualquer mudança brusca de emoções era totalmente natural. Rachel só não queria se enganar.

— Não diga isso, você é de grande ajuda — falou Quinn tentando animá-la, dando-lhe um soco amigável no ombro. — Quando chegarmos à fazenda de Sam, eu prometo lhe ensinar a usar uma arma.

Santana, no banco da frente fingindo não prestar atenção na conversa enquanto deitava-se no colo de Brittany, riu.

— Fique quieta, Santana — repreendeu Quinn.

— Às vezes eu me sinto como a Lúcia — desabafou Rachel, cruzando os braços num gesto aborrecido.

Quinn franziu a testa. Rachel a olhou, incrédula.

— As Crônicas de Nárnia, Quinn — disse a garota revirando os olhos. Santana soltou outra gargalhada escandalosa; Brittany pediu a ela para que parasse de interromper a conversa e ela assim o fez. — A mais nova, Lúcia. Todo mundo sem cérebro que assiste ao filme ou lê o livro da primeira vez acha que ela não serve para nada.

— Todo mundo tem cérebro aqui, sabia? Ninguém ainda virou comida de zumbi.

O sorriso surpreso de Quinn pareceu dar uma nova energia a Rachel. Ela sorriu de volta, criando coragem e encarando outra vez o mar verde que era os olhos de Quinn, se arrependendo quase no mesmo instante.

Depois de pouco mais de quatro horas, se esquecera como eram os olhos dela. De como a luz do Sol o deixava tão claro quanto à água do mar. De como eles tinham tantas dores por trás, mas brilhavam somente para as felicidades. O amor que transbordava a cada vez que Quinn piscava em sua direção a deixava cada vez mais hipnotizada.

Ali, teve certeza de que os sentimentos de Quinn não mudariam. Que, na verdade, jamais tinham mudado. Que Quinn Fabray a amara desde a primeira vez em que se viram e que todo o ódio que ela jogava em sua cara era apenas uma forma estranha de chamar sua atenção.

Mas Quinn lhe dissera que eram amigas antes de seu coma. “Do tipo, melhores”, em suas palavras. Talvez Quinn tivesse finalmente tomado coragem para contar-lhe tudo o que sentia, pensou com uma chama quente de esperança em seu peito.

Rachel xingou-se mentalmente por não conseguir se lembrar de nada. A memória de antes deveria voltar, não? Ela se recordava de ter lido algo sobre perda de memória recente após um acidente grave e como ela voltava depois de um tempo. Havia se passado apenas dois dias de que acordara do coma, quando tempo demoraria a ter suas lembranças com Quinn de volta?

— Valeu — ela agradeceu com a cabeça, desviando seu olhar do de Quinn novamente.

— Afinal, ela é bem útil depois, não é? — disse Quinn distraída. — Tipo, acordando o Aslam e tudo mais.

Rachel rolou os olhos, soltando uma gargalhada. Impressionou-se ao perceber que era a primeira risada verdadeira que dera nos dois dias de viagem. Acreditava que o motivo que não rir tanto quanto Quinn ou mesmo Santana era que estava preocupada demais com o que acontecia do lado de fora do Cadillac para curtir pelo menos um minuto que ela passava lá dentro.

— Você nunca viu o filme não? — ela indagou sincera após parar de rir.

Quinn negou com a cabeça, sorrindo como se pedisse desculpas. Rachel fez uma expressão de desapontamento, se perguntando como Quinn, uma apaixonada por filmes de fantasia de acordo com Finn e Puck, não poderia ter assistido As Crônicas de Nárnia. Depois de Funny Girl, era um de seus filmes favoritos.

— Chega de falar disso, por favor — reclamou Santana, saindo do colo de Brittany e interrompendo a contato visual restabelecido por um segundo entre Quinn e Rachel. — Alguém aí quer Coca-Cola?

Brittany e Quinn deram um suspiro aborrecido.

— Você não era para tomar todas as Cocas hoje, Santana — disse Brittany, ralhando com a namorada. — Você bebeu quantas?

— Duas latinhas, e pedindo por uma terceira — entregou Quinn com um sorriso zombeteiro.

Santana começou a soltar palavrões em espanhol na direção de Quinn, que ria agora sem constrangimento. Brittany decidiu em não intervir mais na briga; apenas prestava atenção na estrada silenciosa na sua frente.

Rachel, por outro lado, adorava ver Santana e Quinn brigando. Não acreditara quando Brittany lhe dissera que antes as duas lutavam pelo poder em Lima, pois elas eram unidas desde que Rachel se lembrava. Afinal, o primeiro slushie que recebeu no McKinley High nos tempos antigos fora delas.

Quinn e Santana eram tão potencialmente chatas que tudo era uma razão para brigarem. E mesmo assim, uma jamais deixaria a outra sozinha. Era estranho pensar dessa forma, mas Rachel percebeu logo no primeiro minuto em que ela entrou no Cadillac que as duas eram unha e carne, que elas se completavam.

Sentia um pouco de inveja de Santana. Ela e Quinn eram quase como irmãs, tinham uma conexão que ultrapassava qualquer uma que já tinha tido com seus antigos amigos — Kurt e Mercedes.

Rachel podia sentir sua conexão com Quinn, é claro — parecia que seus corações, suas emoções e pensamentos eram um só; tremores passavam dentro dela quando Quinn estava com raiva, seu estômago lhe dava borboletas ao ver Quinn sorrindo e etc. —, mas ainda ficava tímida perto dela. Não conseguia exprimir uma palavra sem evitar seus belos olhos castanho-esverdeados.

Por fim, a compreensão lhe atingiu. A ligação que tinha com a garota ao seu lado superava qualquer uma existente. Por que as duas não tinham nascido para serem amigas.

— Puta merda — ela murmurou para si, petrificada.

Rachel Berry amava Quinn Fabray. E não era de uma forma fraternal.


15 de Março de 2012

Horn Springs, Lebanon, TN

01:50 PM

— Sam! — chamou Rory entrando na sala de estar, ofegando. — Tem um carro chegando...

Sam franziu a testa, mas logo compreendeu o que o garoto havia falado. Ele sentou-se no sofá enquanto Sam corria para a janela. Espiou para fora dela, confirmando o que Rory tinha acabado de dizer. Um Impala ’69 virava a esquina e entrava em seu gramado.

— Quinn? — indagou o garoto esperançoso após ter recuperado o fôlego.

— Não — respondeu Sam, sacudindo a cabeça. Rory tinha uma admiração enorme por Quinn desde que ela o salvara de ser mordido por alguns zumbis, ainda em Lima.

Sam estreitou os olhos, pois não reconhecia aquele carro. Quando o garoto que o dirigia abriu a porta, ele viu o moicano despenteado e um sorriso iluminou seu rosto.

Puck.

Ele correu pela porta de entrada, tropeçando ocasionalmente em alguns cascos de areia, mas feliz por finalmente ver um de seus amigos mais queridos ali, no lugar perfeito que achara, são e salvo.

Puck deu um sorriso triste ao ver Sam e o abraçou com firmeza. Sam olhou por cima do ombro de Puck e viu Beth dormindo tranqüila no banco de trás do Impala numa cadeirinha para bebês que os dois tinham arranjando numa das suas últimas aventuras em Lima. Ele esperou ver Shelby ao lado de Puck ou ainda cuidando de Beth no carro, ou até mesmo tirando as poucas bagagens do porta-malas, mas não havia sinal nenhum da mãe adotiva da garotinha em nenhum lugar.

— Cara... — disse Puck ao dar uma olhada para a casa a poucos metros de distância, onde Mercedes, Rory, Sugar e Harmony esperavam — isso com certeza não é o tipo de fazenda que existia na minha época.

Sam deu de ombros, continuando a procurar por Shelby em todos os lugares, começando a ficar preocupado.

— Onde está Shelby? — perguntou por fim, sem se conter.

Arrependeu-se no mesmo instante. A expressão de Puck, pouco feliz, havia se transformado para nada feliz. Ele soltou um suspiro longo, Sam notando que o garoto queria chorar, mas não queria demonstrar fraqueza. Sam pôs a mão no ombro de Puck, numa forma de apoio que sempre achou meio fraca.

— Uma manada veio atrás da gente, cara — disse Puck com a voz embargada. — Tipo, milhões de walkers. Eu não sei de onde eles tinham vindo, mas eles nos cercaram. Peguei meu facão, coloquei Beth no meu colo e fui. Shelby estava atrás de mim e estávamos indo bem, tínhamos um lugar perfeito para nos esconder perto da gente até aqueles merdas passarem quando...

Puck parou de falar, abraçando Sam novamente. O garoto pasmo, pois não sabia que Puck tinha tantos sentimentos para com Shelby. Antes do apocalipse, ninguém além de Quinn sabia que os dois tinham um caso. É claro que segredos era o que mais acontecia na casa em que moravam, mas os dois resolveram se assumir. Shelby era como uma mãe para todos; uma espécie de terceira no comando feminino se por acaso Quinn e Santana morressem. Ela faria falta.

Mas — Sam tinha que se lembrar todos os dias — eles estavam no meio de algo ali, acontecendo a todo o momento. Não podiam entrar em luto toda vez que alguém morria. A melhor forma de honrar o que mais amava era lutar e sobreviver. Assim a alma dele descansaria em paz.

— Vamos para dentro — chamou Sam depois de alguns minutos. — Mercedes vai lhe fazer um café.

Puck concordou, soltando-se de Sam. Ele voltou ao carro e pegou Beth, que continuava dormindo profundamente, em seus braços para levá-la para dentro, sobrando a Sam a tarefa de pôr os pertences de Puck em casa.


15 de Março de 2012

Dickson Chapel Recreation Area, Lebanon, TN

02:41 PM

— Santana falando, seus vadios — disse a garota no comunicador com um sorriso idiota no rosto.

Era melhor quando a Quinn respondia — falou Sam do outro lado da linha emburrado, e Quinn teve certeza de que ele também rolara os olhos. — Onde vocês estão?

— Perto de um parque florestal — respondeu Santana, alheia.

Quinn, ao contrário dela, lembrou do dia anterior e da angústia que sentira ao ver Rachel desmaiar de dor em seus braços, da dor que vinha toda hora deitada em estado vegetativo na cama perto dela no outro parque que tinham encontrado em Ohio. Ela esperava passar por este logo, pois árvores juntas demais e prenúncios de ursos não era uma coisa boa para ela.

Beleza, vocês estão perto — disse Sam. — Puck chegou aqui agora a pouco.

— Fala para ele se quiser lutar eu estarei pronta — disse Santana desafiadora sorrindo maleficamente.

— Estamos no Dickson Chapel — falou Quinn, ignorando a amiga. — Quanto tempo demora a chegarmos aí?

Meia hora no máximo — respondeu Sam. — Vocês precisam pegar a Gillmore Hill Road e depois descer na Hunters Point Pike.

Quinn acenou afirmativamente, porém todas as garotas no carro estavam com a mesma expressão confusa que ela. Rachel estava muito quieta, o que a fez sentir-se meio culpada.

— Sobre isso... — começou Brittany acanhada, o aparelho GPS em suas mãos piscando loucamente — eu não encontro nada aqui, você terá que nos guiar.

Mas como? Vocês vieram de Ohio até aqui e se perdem no final do caminho? E como o GPS de vocês ainda funciona?

Quinn se fez a mesma pergunta. Como, depois de o governo ter cortado todas as redes de comunicações, e isso incluía internet, televisão e rádio, elas continuavam a usar o GPS como se nada tivesse acontecido?

— Eu o configurei — respondeu Brittany simplesmente, dando de ombros. Rachel esqueceu-se de sua tarefa de ignorar Quinn e encarou a motorista impressionada. — Os satélites ainda funcionam, eles não foram desligados totalmente, então o que fiz foi usar o computador da escola e deixar o GPS ligado para, tipo, sempre.

Rachel estava boquiaberta; Santana tinha um sorriso orgulhoso no rosto enquanto Quinn observava as expressões de Rachel com um olhar apaixonado. Pela primeira vez, ela pensou que não estava sendo discreta o bastante. Afinal, depois de seu pequeno surto no vilarejo, não tinha como manter seus sentimentos escondidos.

Ela tinha que contar a Sam que estavam com Rachel. Não via mais nenhuma razão para manter aquele segredo — que não tinha ideia por que queria manter a principio. Rachel estava bem, não estava? Ela própria sentia isso. A garota não reclamava de dores desde a parte da manhã, o que era um bom sinal: Rachel era intensa demais para fingir que algo não estava acontecendo.

O que fez Quinn se perguntar por que Rachel estava virada para a janela do carro sendo que meia hora antes conversavam normalmente. Ela teria percebido alguma coisa? Estava assustada com a magnitude de seus sentimentos para com ela? Bom, Quinn não podia culpá-la por isso. Primeiro o coma e depois o fato de uma pessoa que costumava te odiar agora estar loucamente apaixonada por você? Não era muito justo.

Uau — assoviou Sam, impressionado. — Brittany, você precisa ser nossa técnica quando chegar aqui. A energia tá falhando.

— Sem problemas — disse ela com um sorriso inocente no rosto. Santana beijou-lhe na bochecha, orgulhosa. — Ok Sam, o GPS parece ter voltado ao normal, não precisamos mais de sua ajuda.

— Ainda bem, por que senão pararíamos em Nevada e ninguém notaria — Quinn disse sarcasticamente, causando risadas em Santana e Brittany.

Sam riu secamente.

Muito hilária você, Quinn — ele falou. — Já que não sou mais útil para vocês acho melhor desligar e...

— Não, espera!

Quinn não tinha ideia de onde tirara forças para impedir Sam de desligar. Um impulso tomou conta de si, e então ela simplesmente gritara para o rádio-comunicador, atraindo os olhares curiosos das outras garotas, inclusive de Rachel.

A reação de surpresa dela fez Quinn querer abrir a porta do carro e se jogar para os walkers no caminho. Seu rosto mostrava um sorriso mínimo — e Quinn detectou um pouco de orgulho nele —, e ela sorriu de volta, dando-lhe uma piscadela.

— Rachel está com a gente — falou num suspiro só.

Ah — fez Sam. O único som vindo do comunicador preocupou Quinn. Sam não era lá muito bom em esconder emoções também. Ele parecia perturbado por um momento. — Que bom que você salvou ela. Mais uma pessoa para o nosso grupo, isso é sempre bom...

— Eu estou acordada, Sam — Rachel interrompeu o garoto, que deu um suspiro aliviado. Quinn entendeu a apreensão dele: uma pessoa desacordada para cuidar no meio de um apocalipse zumbi não era lá uma boa coisa. Se precisassem fugir numa última hora ou até mesmo parada, alguém em coma sempre significava despesas e lerdeza.

Ótimo! — exclamou Sam alegre. — Vejo vocês daqui a pouco. Câmbio e desligo.

O fim da viagem foi excepcionalmente silencioso. Santana ouvia no volume mínimo seus rocks clássicos, cantando-os de olhos fechados e balançando a cabeça no ritmo, o de sempre de acordo com Quinn. Brittany ia dirigindo rapidamente, às vezes atropelando um errante ou outro apenas por diversão, rindo maldosamente em seguida. Quinn não entendia como alguém que antes era apaixonada por unicórnios e acreditava fielmente que Papai Noel existia tinha se transformado na Brittany S. Pearce, a melhor atiradora dentre o grupo e a pessoa mais inteligente entre eles.

E Rachel... Rachel estava distante, como sempre ficava dentro do Cadillac. Sequer lembrava à Quinn a garota barulhenta e irritante de alguns meses antes. Não queria admitir, mas sentia falta dos gritos histéricos e de seus ataques de diva. Sentia falta da Rachel por qual se apaixonara, sentia falta de seus momentos brincalhões no quarto rosa da casa dela.

Sentia falta da normalidade. Não sabia o que era isso há mais de cinco meses. Quinn acreditava que na fazenda de Sam pelo menos um por cento do que tinha antes poderia voltar a ela. E queria que voltasse, queria ter um pouco de felicidade por pelo menos um minuto ao lado de Rachel antes que alguma coisa trágica acontecesse, por que era sempre assim na sua vida: um momento feliz em troca de dez cruéis. Não era justo, jamais fora, porém passar por esse sofrimento todo para ter um dia de glória ao lado de Rachel valia a pena.

— Cara, essas casas não parecem fazendas — comentou Rachel, sua voz rouca assustando Quinn, mas ao mesmo tempo lhe dando borboletas no estômago.

Ela olhou para fora da sua janela e ergueu a sobrancelha, também achando a observação de Rachel estranha. Para seu desgosto, uma floresta cobria parte do outro lado da estrada e em um conjunto habitacional começava a crescer um matagal. Quinn esperava que Sam tivesse feito uma busca no local para que não corressem perigo ali mais que o necessário.

O Cadillac foi se desacelerando enquanto passava por mais casas que não tinham nada de fazenda nelas, e Quinn ficava cada vez mais desconfiada. Era o local certo? Sam nunca descrevera realmente Horn Springs, apenas dizia que deveriam ir para lá, que era um local seguro. Quinn confiava no garoto demais para duvidar dele.

— Engraçado por que o GPS diz que esse é o lugar certo — disse Brittany confusa, sacudindo o aparelho, pensando se isso o faria dar a direção certa. — E onde nós estamos...

— Não parece uma fazenda — completou Santana, observando a floresta com os olhos opacos.

— Mas... Eu conheço aquele carro! — exclamou Rachel apontando animada para a casa mais perto.

Quinn franziu a testa e se aproximou da janela ao lado de Rachel, seus rostos tão próximos que se tocaram por um momento. Ela tentou se concentrar com a respiração fraca de Rachel tão perto da sua, e viu a mini-van de Sam estacionada no gramado ao lado de um carro preto que ela não conhecia.

— É o carro do Sam... — confirmou Quinn, voltando ao seu lugar. — Brittany, entre. Se não for ele, a gente corre. Se for walkers, a gente mata. Simples.

Brittany acelerou para dentro da propriedade, parando de forma estratégica ao lado do carro preto. Quinn conferiu suas armas no coldre, contando as balas rapidamente, e pegou o facão no carpete do Cadillac. Ela acenou para Santana, empurrando Rachel para fora do carro. Ela saiu logo após, sua pistola pronta para o disparo na mão esquerda, e a mão direita segurando Rachel atrás dela, usando si mesma como um escudo protetor.

Antes que pudessem fazer alguma coisa, no entanto, Sam apareceu no portal da frente da casa, um sorriso amistoso no rosto. Quinn esqueceu por um segundo a segurança de Rachel para pular nos braços de Sam assim que ele chegou perto o bastante.

Tinham se separado por menos de uma semana, mas Quinn já sentia falta dele. Afinal, Sam era o único que ouvia seus prelúdios sobre como tinha saudades de Rachel ou de como se sentia culpada por ela ter caído da maldita escada há tanto tempo atrás. Ele sempre a fazia sentir-se melhor por todos ao seu redor, e Quinn quase sempre tentava seguir seus conselhos.

— Estava com saudades — murmurou Quinn no ouvido de Sam antes de soltá-lo.

— Eu também — respondeu ele, afagando os cabelos róseos da garota e abrindo outro sorriso. — Rachel!

Rachel gemeu um pouco quando Sam lhe abraçou. Quinn achou o olhar que ela estava dando a Sam, chegava quase a ser... ciumento. Ele também agarrou Santana e Brittany num abraço de três, deixando as garotas sem ar.

— Puta merda Sam, você não poderia ter mentido — comentou Santana séria, lançando um olhar a próxima e, Quinn esperava muito, permanente casa delas. — Isso aí não é uma fazenda.

Sam deu de ombros, convidando todas com um gesto para que entrassem — Rachel ainda o encarando com puro desgosto. Quinn se perdeu nos olhos castanhos da garota quando virou para ela. Em outro impulso desesperado, pegou a mão de Rachel que voava para lá e cá, distraidamente.

Estava onde seus amigos estavam. Esperava estar à salva por um tempo. Sua atenção agora ia ser unicamente para Rachel Berry. Se ela não conseguia se lembrar do que acontecera antes de seu acidente, Quinn sentia-se na responsabilidade de lembrar-lhe a ela.



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Notas finais do capítulo

Gostaram no flash back? Eu quero deixar claro que a parte da Rachel é totalmente imaginativa e que eu não faço ideia do que passa na cabeça de uma pessoa quando ela fica em coma. Matar a Shelby sempre esteve nos meus planos, então por favor não me matem por isso.
Espero reviews de todos e até o próximo capítulo!