O Cristal escrita por azul


Capítulo 1
Cena 1 - Recuperando os arquivos


Notas iniciais do capítulo

Uma hábil tecnocrata do sindicato conseguiu roubar informações importantes dos arquivos dos adeptos. Agora a Damasco, uma cabala de guerra das tradições, esta em seu encalço. O estranho passado dessa mulher sacudirá a vida de muitos despertos.



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- Já os vi.

Comunicou ao avistar os homens de preto por debaixo de um velho Chevrolet. Os dois tinham acabado de sair de uma BMW negra como aquela noite. Se não fossem pelos olhos felinos Lucas não teria conseguido definir seus alvos sob a fraca luminosidade da Candido Mendes.

Um dos homens percebeu o pequeno animal de olhos fixos sob o carro e, atrás de seus óculos escuros, retribuiu um olhar desconfiado. Lucas não se preocupou e ficou apenas quieto esperando seu inimigo desistir dessa estranha idéia.

- É só um gato.

Falou o outro que percebeu a paralisia do companheiro.

- Desconfie de tudo.

Foi à resposta do primeiro antes de se virar e seguir para o pequeno prédio.

- Eles entraram no prédio. Fiquem a postos.

Avisou a um grupo que esperava o sinal para agir. Os três estavam parados a alguns metros. Entre eles uma mulher fumava um cigarro com algo além de nicotina, o mais jovem estava apreensivo, era sua primeira missão, e foi muito inesperada, o mais velho, no qual já se viam cabelos grisalhos, também não estava muito seguro, mas já tinha experiência o suficiente para manter o controle.

 

Há menos de 30 minutos atrás Pedro estava dando uma conferida de rotina nos programas de proteção de uma das inúmeras bases de dados virtuais que sua Tradição mantinha na rede. Avaliava os padrões randômicos assim como seu mentor havia ensinado aproveitando a oportunidade para pegar algumas idéias para o próprio centro que pretendia criar quando percebeu algo estranho.

Entre os números que se alternavam havia uma “matriz” que seguia uma ordem muito padronizada. Uma alteração fixa entre apenas três códigos durante 15 segundos indicava, no mínimo, um problema no sistema. O padrão e o local em que se localizava indicava uma possível invasão. O programa não havia localizado nada, mas máquinas erram.

Com dois rápidos cliques de seu mouse Pedro mandou um chamado para o celular de Razor, o nickname do seu mentor, e abriu uma tela de chat para conversar com Anabelle, o nome do seu computador, escreveu:

QQ vc axa do padrom no tgy112345?

Pela linguagem “informal” que Pedro usara Anabelle entendeu que era uma situação de perigo e sem se incomodar respondeu:

Mais de 85% de chance de uma invasão. Quer que eu rastreie a linha de acesso?

Pedro respondeu que sim apenas por uma questão de costume, pois sabia que sua companheira era inteligente o suficiente para iniciar as buscas imediatamente. Quando abriu a pasta de dados para ver que arquivos haviam sido copiados mais recentemente já sabia que estava lidando com um profissional usando um computador tecnomágico, afinal, se naqueles segundos Anabelle ainda não o havia localizado tinha de ser um expert.

5% dos dados haviam sido copiados nos últimos segundos conferiu Pedro assustado. Não ia dar tempo para remover os arquivos para um novo endereço, ia demorar muito tempo. Sem opções resolveu apagar alguns arquivos do banco de dados para evitar o avanço do invasor. O comando não deu certo, aquela área estava sob o controle do inimigo. Tinha de tirá-lo pelo próprio programa de defesa.

Se mudasse o padrão que havia sido inserido nas barreiras dominadas podia derrubar a conexão do adversário. Para sua surpresa conseguiu inserir novos códigos através de geradores randômicos do seu próprio computador com muita facilidade.

- Adeus otário!

Exclamou exaltando suas habilidades antes de perceber que o número de arquivos copiados havia crescido para 13% e continuava aumentando. Isso o deixou confuso. Agora o inimigo não mantinha mais a ordem que estabelecera para ter acesso. Como podia continuar tendo acesso à base de dados? Teria outra porta?

Um pequeno barulho indicou que Razor estava on. Pedro explicou a situação o mais rápido que pode. Seu mentor perguntou se ele havia conferido a lista de acesso ao NUTT, nome do programa de defesa.

ñ o I jah dev te mudado os horarios

Razor não perdeu a calma. Por precaução ele tinha uma cópia da última lista de acessos, nela podiam pegar o host de qualquer um que tivesse acesso ao programa. O problema é que o invasor provavelmente tinha usado um nome conhecido da lista e alterado o seu horário de forma que fosse dificílimo achar a sua linha. Olhos humanos levariam horas para comparar as listas, mas o computador de Razor levou menos de um segundo. Por essas e outras que se orgulhava de ser um adepto da virtualidade.

Peguei o host dele. Avisou ao discípulo que estava preste a arrancar os cabelos. Traduzindo da linguagem dos internautas foi essa a conversa que se deu:

Pinga ele para atrasar a conexão! – Digitou Pedro

Não isso pode fazê-lo cair.

Não é esta a idéia?

Claro que não ele tem 29% dos dados! Vou mandar uma criaçãozinha minha para ele: O “castelo”.

Ele não deve ter proteção?

Para isso eu confio no Roger.

Disse referindo-se ao seu computador. Nisso Razor tinha razão às proteções do invasor não podiam enganar o seu computador nem por 3 segundos que ainda fazia isso completamente à surdina

Castelo era um vírus inovador, depois de ativado os dados estariam salvos e o computador do adversário estaria na mão dos dois Adeptos para sempre. Infelizmente o download do castelo foi interrompido em 66% só havia uma explicação, o inimigo tinha desconectado e com 31% dos dados dos adeptos. Razor avisou:

Ele saiu.

Põe o host dele no DAT.

DAT era a sigla para Detector of All Things um programa desenvolvido pelos mais experientes Adeptos. O programa fazia uma varredura total e podia descobrir exatamente em qual local do globo terrestre, e em alguns lugares do mundo espiritual, a pessoa havia se conectado. Foi assim que haviam descoberto a localização de alguns dos mais temidos centros de informação da Tecnocracia. O problema é que ainda era muito lento para os padrões da tradição.

Eu botei, mas agora já era.

Por que?

Vai demorar pelo menos três meses até sabermos onde foi parar os dados. Com o pedaço do castelo que eu consegui enviar, esse sujeito, seja lá quem for, não vai poder usar a net. Ou seja, ele vai pedir a alguém que leve os arquivos para outro lugar pela realidade 1.0 mesmo. Se tivéssemos uma puta sorte e descobríssemos a localização dele em poucos minutos podíamos mandar alguém recuperar.

Eu tive uma idéia.

Qual?

Quantos hosts estão sendo buscados pelo DAF?

Pelo menos uns 100.

Apague-os da lista.

Eu não posso fazer isso! Tem que ter um código especial que nem eu tenho acesso e mesmo que tivesse não faria.

Dá para reduzir a área de busca do DAF?

Claro.

Então põe para buscar só no Brasil, ou melhor, só na cidade do Rio.

Porque eu faria isso?

Se o local for fora da cidade nós não conseguiríamos chegar a tempo mesmo. O que é que custa chutar?

Ta bom reduzi para o Rio, mas mesmo assim deve demorar algumas horas. Espera aí...

Achou! Achou!Eu não acredito! Candido Mendes 46!

Razor entrou em contato com Gabriel um membro influente dentro da Damasco, a maior e mais poderosa cabala de guerra do sudeste. Um dos campos de treino da Damasco se localiza em Santa Teresa. Assim menos de meia hora depois de Pedro descobrir a invasão um experiente grupo mantinha o número 46 sob vigília.

 

- Gustavo. Eu e Bete vamos estar do outro lado da rua para resolver este problema. Você deve ficar escondido dentro do carro e só agir em caso de emergência.

Disse o homem de cabelos grisalhos botando a mão dentro do bolso do casaco. Não estava frio, mas usar casaco em qualquer ocasião era a moda de muitos brasileiros e uma excelente maneira de esconder uma arma. Beatriz uma mulata que usava uma saia longa a maneira indiana e uma camisa branca sem manga se aproximou e o seu pingente refletiu a luz do poste.

      - Acima de tudo mantenha a calma Gustavo. Você é novato e tende a ficar afobado. Nós sabemos o que vamos fazer, vai haver tiros, entre só na cena final.

      Gustavo concordou com a cabeça e entrou dentro do carro. Os dois atravessaram a rua enquanto Bete revisava o plano.

      - Você vai furar o pneu como?

      Rogério pegou uma garrafa de cerveja que estava abandonada na calçada e jogou no meio da rua. Os cacos de vidro se espalharam pela pista.

      - E se tiver proteção?

      - Nós desistimos. Muito perigoso.

      Bete concordou com a cabeça. Já sabia a resposta da pergunta, mas queria ouvir novamente da boca dele. Rogério era um grande líder e inspirava confiança quando falava. Agora só faltava a confirmação do Lucas:

      - Eles estão saindo do prédio! São cinco, uma mulher levando uma maleta no banco de trás e quatro homens de preto.

      Logo após ouvirem a voz telepática, lá vinha a BMW negra, quase o carro tecnocrático por definição. Os vidros eram escuros e não dava para ver o que acontecia dentro. Logo que passou pelos cacos de vidro o pneu estourou. O veículo parou no meio da rua enquanto Bete e Rogério passavam mostrando apenas um interesse cotidiano ao acontecido.

      A porta oposta ao do motorista abriu e um dos homens saiu. Ao verificar o pneu estourado comunicou algo dentro do carro que fez outro homem sair da porta de trás e bate-la com alguma irritação. Enquanto Rogério e Bete aproximavam-se.

      Quando Rogério puxou o gatilho o agente estava abaixado verificando o que tinha provocado aquele problema. O tiro não produziu som nenhum enquanto saia da pistola, atravessava o casaco e atingia seu alvo no pescoço. Com aquela precisão anormal a vítima não teve tempo de gritar, mas seus companheiros perceberam o que tinha acontecido. O que saltara chegou a tocar na arma que levava por debaixo do terno, mas foi a ultima coisa que fez antes de uma faca perfurar seu pescoço de maneira igualmente precisa. Fazia algum tempo que Bete não errava uma facada.

      O piloto tentou fechar a porta do carona para ficarem protegidos dentro do carro que tinha um sistema de proteção tecnomágico. Quando se esticou para fazê-lo sentiu o segundo disparo de Rogério. A bala atingira seu braço. O ultimo agente que não tinha sido ferido saltou e com os cotovelos apoiados no teto preparou sua mira. Bete saltou para trás de um carro estacionado. Rogério atirou, mas a bala não fez nenhum efeito sobre o ultimo adversário.

      Mesmo pulando para trás de um fusca velho uma bala atravessou toda a lataria e o atingiu no ombro. Rogério sabia que aquele homem não era normal, isso se fosse homem. Fazia tempo que não tomava um tiro, o inimigo era perigoso. Regenerava a sua ferida o mais rápido que podia enquanto via Bete se transformar de uma bonita mulher para um fruto de pesadelos peludo e com grandes garras.

      O homem ferido no braço saltou com uma pistola em uma mão e o braço atingido abaixado.

      - Não se movam transgressores! Temos reforços a caminho! Rendam-se e pouparemos suas vidas!

      Esbravejou, sem saber o que o esperva, enquanto chegava mais perto do local onde Bete se metamorfoseava escondida. Pela maneira de falar foi fácil perceber que era um novato. Rogério quase riu.

      - Entre dentro do carro!

      Ordenou o mais experiente. O novato não teve tempo de realizar o pedido. Bete transpassou o seu pescoço com as novas garras e puxou-o para trás do carro. O agente atirou no monstro inutilmente, armas normais dificilmente fariam efeito. Um tossido engasgado foi o suficiente para saber que só ele era o ultimo agente vivo.

      - Silvia eu quero que você corra para sua casa sem olhar para trás o mais rápido que puder e tranque-se na zona de segurança.

      Falou o homem de preto para a mulher do Sindicato, uma convenção tecnocrata, que estava sentada no banco de trás suando frio. Silvia obedeceu, pegou a maleta em que estava o seu computador com as informações que tão dificilmente adquirira e correu maldizendo o momento que resolveu superar aquele NUTT que encontrara. O agente tecnocrata tinha que fazer uma escolha. Como os inimigos se tornaram magicamente vulgares podia atrair a atenção dos adormecidos e esperar o reforço, mas sua confiança o levou irremediavelmente para segunda opção, sacar a ultima tecnologia do bolso.

      Quando Bete em sua nova forma saltou por cima dos carros em direção ao inimigo não esperava ver o intenso brilho do laser que perfurou sua pele e a jogou para trás. Rogério, um experiente eutanato, sabia o que tinha de fazer. Curado do ultimo tiro sacou a sua adaga ritualística que já tinha os encantamentos apropriados e avançou sobre o inimigo.

      Enquanto chegava perto disparou alguns tiros. Sabia que aquelas balas não iam matar o agente, mas contanto que o impedisse de travar a mira até estar bem perto estava tudo em ordem. Ao rolar por cima do capo da BMW conseguiu transformar a situação em um combate corpo-a-corpo. Com um chute tirou a estranha arma da mão esquerda do tecnocrata e enfiou a faca na barriga deste. Um estranho som de curto espalhou-se pelo ar e uma leve fumaça saiu do “homem” quando seu corpo inerte caiu no chão.

      Gustavo apareceu trazendo Silvia sob a mira de sua pistola. Rogério guardou a faca cujas inscrições de runas antigas ainda brilhavam e falou enquanto ia verificar como estava sua companheira:

      - Bom trabalho Gustavo leve-a para o carro.

      Bete estava de volta a forma humana, de olhos fechados e perdia muito sangue. Rogério atirou nos estranhos painéis da BMW, para dificultar sua perseguição, e depois levantou sua amiga escorada no seu ombro.

      Os três entraram no carro. Gustavo subiu a ladeira e desceu pela Riachuelo. Silvia estava sedada enquanto o balançar do carro sobre os paralelepípedos atrapalhavam o difícil trabalho de cura de Rogério. Ferimentos normais não eram problema, mas a maldita tecnologia podia criar danos realmente sobrenaturais e agravar a situação.

     Gustavo estacionou atrás de um Gol verde. Precisavam trocar de carro. Arrastou Silvia para o novo veículo cujo dono “coincidentemente” tinha esquecido a porta destrancada. Tentaram transportar a ferida para o novo carro sem chamar atenção, mas a rua semi-deserta foi o que realmente os salvou e não a encenação.

     

 


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Notas finais do capítulo

Lista de personagens:

Silvia - Sindicato

Cabala dos "Busters"
Fernando Ramela (Razor) - Adepto - Mentor de Pedro
Pedro Guedes - Adepto

Damasco
Gustavo Guedes- Eutanato - novato
Bete (Beatriz) - Cultista - Mulata
Rogério Colker - Eutanatos - Cabelo Grisalho
Lucas - Verbena - O gato do início



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