A Casa De Klaus escrita por Bellah102


Capítulo 45
Capítulo 44 - Em perigo


Notas iniciais do capítulo

Preparem os lencinhos.



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Nessie

            Levantei automaticamente um pouco antes do nascer do Sol. Era minha rotina, acordar cedo, tomar um banho, ajeitar minhas coisas e as de Lizzie para a escola e acordá-la. Mas naquele dia, quando acordei tudo o que eu não queria era levantar da cama. Ao meu redor, um par de braços fortes e quentes me envolviam, um proteção que eu podia imaginar inquebrável. E embora eu me sentisse segura ali, eu não estava. Atrasar-me para a escola seria desafiar Klaus ainda mais do que eu deveria.

            Então cuidadosamente desenrosquei os braços de Jake ao meu redor e sentei na cama. Meu sangue havia coagulado sobre o travesseiro e eu podia senti-lo por todo o cabelo. Deitei-me uma ultima vez, de frente para Jake. Fechei os olhos, e imaginei que tudo isso tinha acabado. Que Klaus estava morto e que todos estávamos livres. Nós estávamos casados e tínhamos uma linda casa nas montanhas e dois filhos. Abri meus olhos, vendo seu rosto, imaginando que já o tinha visto ao acordar por milhares de outros dias. Suspirei. Como era fácil imaginar um futuro para nós dois...

            Perigosamente fácil.

            Sentei-me e fiz o possível para descer da cama sem acordá-lo. Observei Lizzie por um segundo para ver se estava bem, e fui para o banheiro. Uma pessoa cansada e psicologicamente exaurida me encarou de volta no espelho, de olhos murchos, olheiras e cabelos sujos de sangue coagulado. Abri o chuveiro para esquentar a água e voltei ao quarto para separar minha roupa e a de Lizzie para a escola. Voltei para o banheiro, pegando uma das toalhas do armário e pendurando-as no Box. Esfreguei meus cabelos o máximo de pude com o xampu, por duas vezes, e observei a água rosada escorrer pelo ralo abaixo. Certa de que havia limpado todo e qualquer resquício de sangue da minha cabeça, fechei o registro e pisei sobre o tapete ao lado do Box, secando-me.

            Sequei superficialmente o cabelo com a toalha, que manchou-se de vermelho. Vesti minha roupa e tornei a secar o cabelo, agora com mais afinco. Embora meu couro cabeludo estivesse intacto, pequenos fios de sangue coagulado haviam se prendido principalmente nos cachos das pontas. Suspirei. Arrumar aquilo demoraria uma eternidade que eu não desejava gastar na frente daquele espelho. Um brilho metálico chamou a atenção ao lado da pia.

            A tesoura que Lizzie estivera procurando a semana toda se revelou para mim, quase como se sorrisse. Eu olhei para ela, e ela olhou para mim, desafiando-me a ter coragem.

            -Eu sou corajosa.

            Respondi-lhe, alcançando-a.

           

            Saí do banheiro, pronta e suspirei, jogando a roupa suja em um cesto de roupas. Não podia me esquecer de ir ao quarto de Jake buscar o pijama manchado que deixara lá. Segurei-me à cômoda quando uma tontura incômoda abalou a minha estrutura. Pisquei duas vezes, e meu olhar fixou-se na janela. Não olhe pela janela, ele dissera quando perguntei onde estava Scott. Mas não tinha me permitido pensar nisso até aquele momento.

            Vagarosamente me aproximei da janela, com as mãos trêmulas pousando sobre o parapeito. Estiquei meu pescoço para ver o chão lá embaixo.

            Estirado na grama verde da Casa, estava Scott, irreconhecível. E o motivo pelo qual ele estava irreconhecível, era porque sua cabeça estava a um metro e meio do corpo, encarando-me com uma expressão acusadora, e seus membros estavam torcidos em posições não naturais. Eu fiquei petrificada, observando aquela cena, enquanto seus ossos lentamente se reconstituíam e voltavam para o lugar. Soltei o ar com força, afastando-me da janela, tapando a boca com a mão. Klaus vai ficar furioso. E não será comigo e nem com Jake. Será com Elijah.

            -Nessie?

            Jake chamou baixinho, passando as mãos pelo espaço vazio onde eu dormira. Sentei-me no canto da cama, acariciando-lhe os cabelos escuros. Ele sorriu de leve, ainda de olhos fechados, meio adormecido.

            -Bom dia.       

            Sussurrei, encostando minha testa à dele.

            -Bom dia.       

            Ele respondeu, beijando-me de leve, um selinho casto.

            -Como se sente?

            Perguntei, ainda baixinho, com o cuidado de não acordar Lizzie. Ele deu de ombros.

            -Estou bem. Só cansado.

            Beijei sua testa carinhosamente.

            -Vá tomar um banho para despertar. Vou encontrar roupas para você lá embaixo. Aula em 40 minutos. – Ele gemeu ruidosamente. – Vamos, Jake...

            Disse, cutucando-o.

            -Só se me der um beijo.

            Respondeu, sorrindo, e enrugando levemente o canto dos olhos de um jeito que só ele sabia fazer.

            -Jake, nós...

            -Ah Néss... Eu mereço, não mereço?

            Soltei o ar, assentindo e aproximando-me. Beijei-o como se nunca o tivesse beijado antes e como se nunca mais fosse ter a chance de fazê-lo, o que, na noite passada parecia tão provável quanto o nascer do Sol no Leste. Sem palavras, eu o agradeci. Através da minha mão em seu rosto, mostrei-lhe o meu medo na noite anterior, de como ele parecia um anjo, apenas de pijama e cabelos desgrenhados na porta do meu quarto. Meu desespero quando ouvira algo se quebrar dentro dele.

            -Eu não sei o que eu faria sem você.

            Sussurrei, afastando-me o mínimo que pude para falar. Ele não teve resposta além de abrir os olhos e fitar-me com tanto amor que me fazia doer o peito. Dei-lhe um ultimo selinho, sorrindo-lhe, apesar dos olhos ardendo de lágrimas.

            -Tome um banho. Eu... Eu volto já.

            Quando voltei, o chuveiro estava desligado, mas luz e vapor escapava pelas frestas da porta. Boi pulou sobre mim, animado por eu ter retornado. Deixei a roupa sobre a cômoda e me ajoelhei ao seu lado para acariciá-lo e beijar o pelo entre suas orelhas retas.

            -Bom dia, Boi.

            Saudei, rindo baixinho. Reavi a muda de roupas que eu imaginava que caberia em Jake – uma bermuda cargo e uma camiseta camuflada com o símbolo do exército americano – e bati na porta do banheiro.

            -Jake, trouxe suas coisas.

            Ele entreabriu a porta, apenas o bastante para alcançar as roupas e dar-me um selinho. Ele fechou-a com um estalo.

            -Obrigada, amor.       

            Disse, do outro lado. O apelido fez-me arrepiar por inteira e sorrir de forma boba. Balancei a cabeça, afastando a névoa que só Jake podia criar na minha cabeça. Sorrindo, fui até a cama de Lizzie, balançando de leve o seu ombro para que ela acordasse.

            -Lizzie... Acorde, meu amor. Hora de acordar.

            Ela piscou, exausta. Ela parecia se esforçar apenas para manter as pálpebras abertas. As partes brancas ao redor de suas íris azuis estavam completamente vermelhas, como se tivesse um caso extremo de conjuntivite. Eu subestimara o efeito que curar exercia sobre ela. Ela ajudava, mas se prejudicava ao fazê-lo.

            -Estou cansada...

            Resmungou. Mal conseguia mexer os lábios. Uni as sobrancelhas, preocupada e tirei seus cachos loiros da frente de seus olhos.

            -Está com dor?

            Perguntei, procurando por sinais de desconforto em seu rosto. Ela tentou negar com a cabeça, mas parecia não ter controle sobre o próprio corpo, soltando um bocejo involuntário.

            -Muito cansadinha.

            Murmurou baixinho, voltando a dormir. Fiquei em silêncio por alguns segundos, observando-a. Atrás de mim, Jake abriu a porta, espalhando luz pelo quarto. Liz gemeu, baixinho.

            -Apague a luz.           

            Pedi a ele, observando-a, com o coração na mão. Ele apagou a luz e fechou a porta do banheiro, vindo até nós.            

            -Você vai ficar bem, Liz? Nós precisamos ir a escola.

            Ela assentiu devagar, como se cada movimento tivesse que ser planejado.

            -Tranque... Tranque a porta.

            Pediu. Assenti, sentindo meu coração se apertar. Jake passou o braço ao redor do meu ombro e apertou-o, sorrindo de leve para me incentivar. Assenti e peguei minha mochila e entreguei a mochila surrada com as coisas que encontrara lá embaixo.          

            -Vai servir até encontrarmos alguma coisa que você goste. – Eu disse, dando de ombros e abrindo a porta para que ele e Boi saíssem. Olhei para Lizzie uma ultima vez, sentindo-me pesada – Vou voltar no almoço, está bem? - Ela gemeu baixinho, no que eu interpretei como um sim. – Eu te amo, está bem?

            -Eu também te amo, mamãe.

            Ela sussurrou, virando-se de lado.

            Tranquei a porta e fui até Jake, que encarava a janela de dois andares, pensativo. Ele olhou para mim, e como se estivesse tentando se acostumar à luz, ele olhou algumas vezes para mim.        

            -O que você fez com o seu cabelo?

            Ele perguntou, tocando os cachos, que agora estavam pouco acima do meu queixo.

            -Você não gostou?

            Perguntei, puxando distraidamente um cacho e deixando-o voltar para o lugar sozinho. Ele virou a cabeça de lado, dirigindo-me um sorriso travesso.

            -É diferente. Você parece... Mais feliz. Como você era antes.

            Desviei o olhar, sorrindo de leve. Talvez agora eu tivesse motivos para agir como antes, embora ainda não tivesse motivos para acreditar que tudo pudesse ser como naqueles velhos anos dourados.

            Quando saímos da Casa, uma pequena multidão estava reunida ao lado da porta. Alguns olhavam para a janela quebrada do meu quarto. Não era preciso ser nenhum gênio para saber o que olhavam. Desejei poder pegar a mão de Jake, mas isso seria se arriscar demais, principalmente partindo do princípio que Elijah tinha salvo minha vida na noite passada. Elijah, que encarava a cena, perturbado, percebeu minha presença e veio até mim. Parecia que ia chorar. Abri os braços para envolvê-lo. Ele passou os braços ao redor do meu pescoço em um abraço apertado. Sua respiração pesada mostrava sua dor na consciência.

            -Eu não tinha ideia, me perdoe. Oh, Nessie, por favor, me perdoe.

            -Está tudo bem, pequeno Mikaelson. Já passou. Está tudo bem agora. Você me salvou não foi?

            Eu disse, com um gosto estranho na boca. Ele não pareceu gostar da afirmação também.

            -Klaus...

            -Eu sei. Falamos sobre isso mais tarde. Vai ficar tudo bem.

            -Lizzie?

            -Está muito cansada. Teve que usar o dom ontem.

            Ele assentiu.  

            -Estou dispensado de Sobrenaturalidades, vou tomar conta dela – Ele se afastou um pouco, unindo as sobrancelhas – Seu cabelo?

            Ele perguntou, brincando com um dos cachos.

            -Tinha sangue nele. Preferi cortar.    

            Ele assentiu, sorrindo um sorriso que não lhe chegava aos olhos.

            -É bonito. Você está parecida com Rose.

            Suspirei e sorri, beijando sua bochecha, o mais próximo da boca que me atrevia. Ele me abraçou com força uma ultima vez, e com um aceno de cabeça à Jake que assistia tudo com uma careta, entrou novamente na Casa.

            Klaus já nos aguardava quando chegamos à sala. Jake ficou tenso apenas de vê-lo, mas eu fui direto em sua direção. Eu sou corajosa, repeti a mim mesma o que dissera à tesoura de manhã.

            -Klaus.           

            Eu o saudei, secamente. Ele olhou para mim, sorrindo como se esperasse por mim. Se sabia ou não sobre os acontecimentos da noite passada, era impossível dizer.

            -Bom dia, Renesmee.

            -É... Hum... Bom dia. – Respondi, desconfortável com sua pose educada – Bem... Hum... Lizzie não conseguiu vir à aula hoje.

            Ele fingiu uma expressão preocupada.

            -Oh, não! Ela está bem?

            Assenti, mordendo o lábio por dentro, tensa.

            -Sim. Só... Cansada. Sabe como são crianças... Nunca respeitam o toque de recolher – Ele assentiu devagar, ouvindo atentamente – Elijah está lhe prestando companhia.

            Ele assentiu novamente e juntou as mãos no mesmo instante em que o sinal tocou.

            -Esplêndido.

            Entramos o mais silenciosamente possível no quarto. Nós tínhamos uma hora de almoço antes da aula de geografia. Minha vontade de jamais retornar queimava junto com a terrível sensação de um ferro de marcar sobre o meu coração, tatuando para sempre no músculo que eu era uma péssima mãe por deixar a minha criança em casa sozinha, no estado em que ela se encontrava. Embora Elijah tivesse ficado com ela durante a primeira aula, muito poderia ter acontecido desde então.

            Enquanto fazíamos nosso caminho até a Casa vazia, Jake pegou minha mãe e a apertou.

            -Ela vai ficar bem, Nessie. Você vai ver.

            -Eu não sei não, Jake. Tenho um mau pressentimento sobre isso.

            Eu disse, aproximando o passo. Jake mal fechou a porta atrás de nós quando Elijah a abriu, com uma expressão tão conturbada quanto a minha.

            -Como ela está?

            Perguntou, enquanto eu jogava a mala em cima da minha cama e me ajoelhava ao lado da cama de Lizzie.

            -Não sabemos. Acabamos de chegar.

            Disse Jake, sabendo que o nó da minha garganta estaria apertado demais para que eu falasse. Toquei o rosto imóvel de Lizzie com as costas da mão, verificando se tinha febre. Sua pele estava levemente mais fria do que o normal.

            -Elijah, pode pegar um cobertor para ela, por favor? – Pedi, unindo as sobrancelhas, preocupada. Sacudi Lizzie de leve para acordá-la. Precisava falar com ela e saber como ela se sentia. Elijah trouxe um cobertor e cobriu Lizzie cuidadosamente - Lizzie... Liz... Acorde, meu amor.

            -Vamos lá, flor-de-liz. Só um pouquinho, já é tarde...

            Mas o rosto gelado de Lizzie entre minhas mãos não esboçou reação, como se não nos escutasse. Uni as sobrancelhas, o coração se acelerando, preocupado.

            -Elijah...

            Sussurrei, aterrorizada. Ele assentiu, estiando a mão na direção do rosto dela, abrindo suas pálpebras. Elas se reviraram nas órbitas, uma visão assustadora que me fez tremer. Mau pressentimento se tornou um amargo eufemismo. Instintivamente, deitei a cabeça sobre seu peito, ouvindo. Por um segundo – e que segundo que foi! – Achei que tinha ouvido os fortes e saudáveis batimentos levemente acelerados característicos dos mestiços como nós. Mas então percebi que aquele era o meu batimento, ecoando, ensurdecedor, em meus ouvidos.

            Respirei fundo, na tentativa de me acalmar e só então pude ouvir o coração de Lizzie. Ele parecia bater sofregamente, devagar, como se doesse fazer qualquer força a mais.

            -Nessie?

            Elijah chamou, querendo saber o que eu ouvia. Toquei sua mão do outro lado da cama, mostrando-o. Ele uniu as sobrancelhas, tão preocupado quanto eu. Afastei-me dele e de Lizzie, tremendo de leve. Jake se ajoelhou ao meu lado, esfregando meus braços arrepiados em uma tentativa de aquecê-los.

            -Qual o problema?

            Ele perguntou, olhando de mim para Lizzie e então para Elijah, esperando que alguém lhe dissesse o que estava acontecendo.

            -Está lento. – Sussurrei, como se minha voz pudesse quebrar o frágil estado de Lizzie. Minhas mãos tremiam. Minha menininha. Minha doce e pobre menininha. Ela só queria ajudar... – Isso não é normal.

            Estou com medo, confessei-lhe, através do contato com minha pele. Jamais em voz alta. Ele apertou meus ombros de leve, em uma promessa silenciosa de que não sairia do meu lado. Ele não era do tipo que prometia que tudo ia ficar bem. Ele não fazia promessas que não podia cumprir. Não para mim.

            -Não há nada que possamos fazer – Disse Elijah, encarando Liz, impotente, os olhos azuis torturados – Só podemos esperar que as coisas melhorem.

            Balancei a cabeça freneticamente.

            -Não vou voltar para aquela escola com a minha filha inconsciente em casa. Não vou!

            Disse, ainda tremendo.

            -Nessie, Klaus vai se zangar, eu posso...

            -ÀS FORRAS COM KLAUS – Gritei, com os olhos ardendo ao observar o rosto tranquilo e inexpressivo de Lizzie. Se parecia demais com o meu sonho em que Elijah a matava - A CULPA DE TUDO ISSO É DELE. SE NÃO FOSSE POR ELE, LIZZIE TERIA SUA MÃE DE VERDADE, NÃO ESTARIA ASSIM, E SCOTT ESTARIA DEBAIXO DA TERRA QUE É O LUGAR DELE!

            Fechei os olhos com força, deixando que as lágrimas escorressem enquanto eu tentava reprimir os soluços que balançavam meu corpo. Porque Lizzie? A dor ecoava a cada batida do meu coração, e desejei trocá-los com os de Lizzie. Jake abraçou meus ombros.

            -Elijah está certo, Néss. Não faz sentido arriscar a sua vida.

            Suspirei e balancei a cabeça, desolada.

            -Que vida?

            Acordei, piscando sobressaltada. Eu tinha adormecido! Mas como?! Eu estava no meu quarto com Lizzie. Elijah e Jake já tinham partido. Olhei na direção de Lizzie. Por um segundo – novamente glorioso segundo – achei que tudo aquilo tinha sido u sonho cruel. Então vi o quão pálida sua pele se tornara. O quão lívidos e brancos estavam seus lábios e o quão imóvel ela estava, inclusive seu peito, que parara de subir e descer.

            -Lizzie?! – Chamei, gritando, sabendo que aquilo era tudo culpa minha. Eu havia adormecido, e deixado aquilo acontecer. – Lizzie!

            Eu adormecera e agora ela estava morta. Abaixo dela não havia mais uma cama. Era uma mesa de legista, como as que víamos em seriados policiais. Seu peito tinha grandes cortes lacerando-o. Ela abriu os olhos e olhou para mim, sem respirar e movendo-se mecanicamente.

            -Porque, mamãe?

            Sussurrou numa vozinha fraca. Agora ela estava em um caixão, novamente morta. O quarto estava em chamas. E havia sangue. Escorria dos olhos de Lizzie, de sua boca, de debaixo das unhas e dos seus poros. Então outros corpos caíam do céu, também ensopados de sangue caíam sobre ela, com os olhos baços e mortos, e os corpos pesados, enterrando-a, levando-a para longe de mim.            

            -Lizzie!

            Gritei. Senti mãos fortes agarrarem-se à minha garganta, tirando-me o ar.

            -Disse para cuidar da minha garotinha. Disse para cuidar dela!

            Gritava Kate atrás de mim, pressionando meu pescoço até que ele estivesse a ponto de se partir.

            -ME DESCULPE!

            Eu gritava para ela, chorando, embora soubesse que aquilo não consertaria nada.

            -LIZZIE!

            Gritei, sentando-me na cama e debatendo-me na intenção de me livrar da sensação terrível das mãos de Kate ao redor do meu pescoço. Encontrei o peito de Elijah de pronto, apertando meu rosto contra ele, gemendo freneticamente e tremendo de forma involuntária. Antes que ele pudesse perguntar, mostrei-lhe o sonho, tocando em seu rosto. Ainda lutava para respirar quando acabou.

            -Pronto. – Ele disse. – Acabou. Ela está bem. Está tudo bem.

            Virei a cabeça na direção da pequena Lizzie. Seu peito, ao contrário do que dizia meu sonho, continuava corajosamente a subir e descer, embora de maneira precária. Ao lado de sua cama, Jake estava deitado no carpete, na forma de lobo, dormindo. Suspirei, tentando me acalmar.

            -Isso. Respire fundo.

            Inspirei e expirei, calada. Estendi a mão ao buquê que eu fizera com as flores de baunilha que Elijah me trazia todas as noites. Cheirei-a devagar, procurando a calma que o cheiro me trazia. Elijah sorriu de leve, parecendo cansado. Toquei as olheiras ainda rasas dele, sorrindo o máximo que podia – uma leve torção de lábios.

            -Você devia dormir.

            Ele negou com a cabeça, com um bocejo traindo-o.

            -Não vou deixar você sozinha. Ela é minha filha também.

            Beijei sua testa.

            -Durma. Eu te acordo se alguma coisa acontecer.

            Ele suspirou e assentiu, despindo os sapatos, e deitando em minha cama enquanto eu me levantava, espreguiçava e me ajoelhava ao lado de Lizzie. Olhei para Elijah e para Jake, tendo a certeza de que estavam bem antes de tornar a olhar para Lizzie. Peguei sua mão, flácida e mole, massageando-a de leve.

            -Era uma vez... Uma menininha loura dos olhos azuis. Ela era bela como uma deusa, e bondosa como um anjo. Mas estava em perigo. A mãe da garotinha reuniu os mais fiéis e fortes cavaleiros para salvá-la. A feiticeira Nassara, o paladino Elliott e o doppleganger Jonathan – Suspirei – Eu não sei o fim da história ainda. Você podia me contar, não é?

            Mas ela não contou.

            Jake retornou da escola na hora do almoço. Todos concordáramos que não havia sentido nele ficar e precisávamos de alguém para avisar Klaus sobre o estado de Lizzie – não que ele se importasse. Ele jogou a mochila no canto e recebi-o com um abraço apertado em busca de forças.

            -Como ela está?

            Perguntou, sussurrando contra meu ouvido. De repente, ele não me passava tanta segurança quanto costumava passar. Mas não era culpa dele. Acho que nada me daria a segurança de que Lizzie iria melhorar.

            -Nenhuma mudança, nem para bem, nem para mal.

            Sussurrei em resposta. Queria que algo acontecesse, confessei a ele pela pele, para que não soasse errado. Essa espera é o pior.

            -Suas amigas estão preocupadas – Ele disse, agindo como se eu nunca tivesse dito nada, no que eu lhe agradeci internamente – Consegui fazer com que elas não venham aqui, mas você precisa ir falar com elas.

            Suspirei, olhando para a Lizzie e para Elijah deitado sobre os braços cruzados sobra a cama dela. Estivera chorando pelas ultimas horas e eu o acompanhara. Não havia como consolarmos um ao outro. Ambos estávamos sofrendo imensamente. Assenti. Qualquer coisa para sair daquele quarto.

            -Só... Avise-me se acontecer alguma coisa. Qualquer coisa.

            Frisei. Ele assentiu e beijou minha testa, colocando um cacho acobreado atrás da minha orelha. Suspirei, olhando uma ultima vez na direção da cama de Lizzie. Jake se ajoelhou ao lado da cama e tocou o braço de Elijah. Eles trocaram um olhar e Jake anuiu, dando dois tapinhas no braço do outro. Reprimi as lágrimas e saí do quarto, rumando ao quarto de Elena.

            -Oh, pobre menina...

            Disse Meredith, se apiedando de mim e abraçando-me com força. Suspirei, olhando para as mãos. Descrever os eventos de algum tempo atrás fora dolorido, quase como tocar um hematoma antigo que você não lembrava mais que estava ali. Foi estanho como me senti mal por causa disso. Parecia ter sido éons atrás.

            -Há alguma coisa que possamos fazer? – Elena perguntou, unindo as sobrancelhas e torcendo as mãos nervosamente – Qualquer coisa?

            Fiz que não.

            -Nem sabemos o que há com ela. Mas precisamos alimentá-la logo. Senão...

            Ela assentiu. Bonnie permanecia calada, pensativa. Até Caroline parecia desconfortável em pensar naquela coisinha cheia de vida presa à uma cama. O silêncio durou longos minutos até Bonnie o quebrar.

            -Eu posso ajudá-la.

            Ela disse, decidida, de repente. Levantei os olhos para ela com expectativa, o coração acelerando-se, animado.

            -Diga-me.       

            Exigi, com a voz falhando de excitação. Todas as outras mantiveram o silêncio tenso para ouvir Bonnie. Ela limpou a garganta como se tivesse medo do meu olhar. Eu não duvidava que a estivesse olhando com um olhar faminto, ávida pela resposta ao meu problema.

            -Antes dos transplantes... As bruxas desenvolveram em modo de transferir energia... Acho que é o que houve com Lizzie. Ela cedeu mais energia do que tinha ao curar. Precisamos repor essa energia.

            Engoli em seco. Apesar de ser um modo de salvar Lizzie, não me soava como algo agradável.

            -C-como?

            -Com a energia de outra coisa. Ou alguém.

            Assenti. Devia ter imaginado.

            -É perigoso?

            Ela assentiu.

            -Às vezes é mortal. Não há como saber se você pararia a tempo de não morrer.

            Meu coração bateu forte no feito. Eu faria qualquer coisa para salvar Lizzie. Qualquer coisa. Mas... Isso não implicava só a mim. Havia Jake, Elijah e no futuro, a Lizzie recuperada. Quem impediria Elijah de retornar a sua vida de servidão à Klaus por falta de opção melhor? E se ele fizesse isso, protegeria Lizzie, ou isso sobraria a um Jake despedaçado? Como Lizzie se sentiria ao ter duas mães viajando para nunca mais voltar ao invés de uma? E, se eu ia salvá-la, porque sentia como se estivesse traindo-a?

            Ainda assim, não pude deixar de considerar a ideia.

            -Pode ser o plano B. Se as coisas piorarem.

            Bonnie assentiu.

            -Eu lhe ensino o que fazer. É um processo difícil, mas não demanda o gene mágico. Acha que consegue?

            Assenti. Qualquer coisa por Lizzie. Peguei meu medalhão entre os dedos quando a frase se formou na minha cabeça. Mais do que minha própria vida. 


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