Aquilo não podia ser verdade. Mesmo completando dois dias que Ned havia me contado, eu não podia acreitar. Está certo, segundo a árvore genealógica que eu fiz na terceira série, eu tinha mesmo uma ancestral chamada Constance, que havia se casado com dois caras, mas acreditar que eles eram anjos ou demônios era totalmente impossível. Quer dizer, eu mal aceitava Ned ser um anjo, quanto mais aceitar que existem demônios por aqui também. Alguém já deveria ter descoberto, certo?

E o fato de que eu, entre milhares de pessoas, justo eu sou a única pessoa no momento que pode ver anjos e demônios era muita falta de sorte até para mim. Porque eu sou apenas a filha rebelde de dois astros de cinema. Eu não tenho nada haver com anjos e demônios. Eu não posso ter nada haver com isso.

Depois de tomar meu banho e almoçar com Kayla, levei ela até o jardim, onde Paul esperava, como fora nos outros dois dias que antecederam. Eu não via Ned nem Damen desde que soube que sou uma aberração, e nem sabia se queria vê-los. Tudo bem, eu sabia. Eu não estava aguentando mais de saudade de Ned. Eu mal havia o conseguido de volta e ele já havia partido.

- Hey, gostei o seu casaco, ursinha. - Paul me disse sorrindo.

Olhei para baixo e vi que estava usando o casaco que Kayla havia me dado de natal- no caso, minha tia o havia comprado-, que era um casaco marrom com bolsos no formato de cabeças de ursos e uma touca com orelhinhas. Kayla estava usando um que era igual ao meu e eu nem ao menos havia reparado, o que não era estranho, sendo que eu não reparava em alguma coisa havia dois dias. Desde que tinha descoberto ser uma aberração.

- Oh, obrigada. Kayla que escolheu, não foi, pequena? - falei, pegando Kayla no colo, que se mostrou extremamente pesada para uma menina de cinco anos.

Kayla sorriu e então se balançou nos meus braços.

- Eu sou uma ursinha também, Paul? - ela perguntou, balançando seu cabelo loiro em direção a ele.

O sorriso de Paul aumentou e ele pegou Kayla dos meus braços.

- Você pode ser se quiser, mas eu pensei que fosse uma princesa. - ele disse.

Ela se mexeu até ele a deixar no chão de novo e ela o olhou com uma cara feia, cruzando os braços na frente do peito, enrugando a testa como ela tinah feito no primeiro dia em que tinha me visto. Aquilo parecia ter sido a tanto tempo.

- Não, Paul. Eu era uma princesa ontem, hoje eu sou uma ursa. Igual a Val, não é, Val? Nós somos irmãs ursas, eu sou a pequena e você é a grandona. - ela disse, olhando para mim em seguida e seu rosto se enchendo de brilho.

Eu nunca entendi o porque de Kayla gostar tanto de mim. Eu nunca fui uma prima presente, ou pelo menos uma prima legal. Mas aquela pequena não parecia se importar com meus problemas. Ou que eu era uma aberração.

- Sim, nós somos irmãs ursas. - falei - O que você quer fazer hoje, irmã ursa?

Ela olhou ao redor e então correu até o balanço que eu costumava brincar com Paul e Sammy.

- Me empurrem, eu não consigo. - ela pediu, tentando sem sucesso, balançar sozinha.

Eu e Paul fomos até ela e ele a balançou, enquanto eu fui me sentar do lado direito deles, aonde a neve cobria parte do chão. Me sentei em um lugar que julguei seguro, mas ao apoiar a mão no chão ao meu lado, um pedaço de madeira entrou na minha palma.

- Ai! - exclamei, fazendo Paul e Kayla se virarem para mim.

Me arrependi logo depois de ter falado algo, porque com os dois me olhando, tentando entender o que havia acontecido comigo, esqueceram que o balanço voltaria e ele bateu com tudo em Paul, que caiu para trás.

- Oh meu Deus, Paul, você está bem? - perguntei, indo até ele.

- Tire Kayla de lá, ela pode cair. - ele disse, se sentando na neve e passando a mão nos joelhos, onde o balanço o havia acertado.

Corri até Kayla e a tirei do balanço. Minutos depois, estávamos dentro de casa, Paul sentado numa cadeira enquanto eu tentava fazer seus curativos e Kayla perguntando se ele estava bem.

- Está tudo bem Paul? Porque você pode nunca mais conseguir andar, então tem que nos contar tudo. - Kayla disse pela centésima vez.

- Sim, eu estou bem Kay.

- Isso é bom. Está doendo muito?

- Um pouco. - ele disse.

- Vou buscar algo para enfaixar isso. - falei.

Eles assentiram enquanto eu subia as escadas na direção do banheiro. Abri a porta do banheiro e vi dois homens que nunca havia visto antes ali. Eles me olhavam, como se estivessem me esperando a tarde toda.

- O que vocês estão fazendo no banheiro? - perguntei - Quem são vocês? Como entraram aqui?

Os dois se olharam e então cada um agarrou do braço meu fortemente.

- O que é isso? - perguntei mais alto - O que estão fazendo?

Meu pânico foi aumentando cada vez mais e quano chegamos ao corredor, eu estava gritando. Mas Kayla e Paul não estavam me ouvindo.

Só percebi o porque quando chegamos na sala. Gritei horrorizada ao ver Kayla deitada no chão desacordada com um filete de sangue escorrendo da pequena testa e Paul incosciente relaxado na cadeira como se estivesse dormindo.

- O que fizeram com eles? - gritei.

Tentei me soltar, mas os homens eram mais forte que eu.

- Me soltem! O que fizeram com eles? - berrei.

Os homens me arrastaram para fora de casa, enquanto eu esperniava e tentava me soltar. Assim que chegamos na neve, eles se olharam e tudo ficou desfocado. Isso porque algo havia me atingido em cheio na cabeça.

- Ned... socor... - consegui falar antes a escuridão me consumir.