Subi as escadas lentamente, reparei que no longo corredor havia quatro portas, uma delas estava aberta, era o quarto de Sed. Eu não iria olhar, mas não resisti. Ele estava lá deitado na cama de olhos fechados, parecia tão tranqüilo. Segui pelo corredor até a última porta.

— Meu pai ia adorar ver isso!

O quarto estava totalmente pronto, era como observar uma obra de arte, havia tapeçaria no chão, uma cômoda com um espelho e a cama na parede era simplesmente linda coberta com colchas em tons de azul e com véus que desciam do teto até cobrir a cama. O teto era como ver uma noite estrelada, a pintura em azul escuro, era cravejado de pequenos cristais brilhantes. Na janela grandes cortinas tocavam o chão num azul bem escuro. Da janela eu podia observar o movimento da cidade.

— Realmente é incrível, sem dúvida um belo delírio.

— Por que acha que está delirando? — A voz era de Sed, ele estava parado na entrada do quarto, sem camisa, o braço apoiado no batente da porta, me encarando com seus grandes olhos verdes.

— Você tem alguma explicação melhor?

— É tudo tão real, não sei como você pode duvidar.

— Você nasceu aqui não é, Sed? O que você acharia de viver em Londres?

— Não importa se é Londres ou qualquer lugar do seu querido mundo moderno, se você não pode ir embora, então devia aproveitar.

— Talvez eu faça isso quando não estiver planejando um jeito de fugir.

— Faça o que achar melhor.

— Pode deixar. Agora tem um banheiro nessa casa? Eu preciso urgente me refrescar.

— É aqui ao lado. — ele indicou.

— Obrigada, sabe seu pai parece uma boa pessoa, mas você é extremamente grosseiro.

— Ele não é meu pai.

— É mesmo? Realmente vocês não se parecem em nada. O que houve com seu pai e sua mãe?

— Garota metida. Cuide da sua vida. — Ele disse isso e me deu as costas descendo as escadas.

Eu ouvi murmúrios no andar de baixo, mas não me sentia a vontade para descer. Decidi tomar banho primeiro. Eu observei o quarto, eu não trouxera roupas e não podia vestir jeans e camiseta como estava acostumada. Eu andei até a cômoda e abri a primeira gaveta. Ela estava cheia de roupas, túnicas todas brancas tecidas com linho macio, adornadas com fivelas de ouro. Na segunda gaveta havia mais túnicas desta vez de várias cores. Na outra gaveta havia uma caixa de jóias grande perfeitamente quadrada, com uma fechadura diferente, como se abrisse com determinada combinação, na tampa havia uma representação da deusa Bastet, ainda estava vazia, mas que poderia encher depois. Num canto havia um saquinho de pele comprido que guardava pincéis bem finos e um pote de tinta preta.

— O antepassado do lápis delineador. — Eu escolhi uma das túnicas e voltei para o banheiro. Não demorei muito na banheira de mármore, ela não combinava com o restante do ambiente da casa. Eu voltei para meu quarto, vesti a túnica longa e na frente do espelho comecei a reproduzir a maquiagem egípcia que conhecia muito bem, a sombra escura nos olhos alongada e curvada nas laterais.

— Com essas roupas ninguém ousaria dizer que eu não sou egípcia, talvez, é claro, pela pele mais clara, mas seria por pouco tempo, logo eu terei um bronzeado típico. — Agora eu devia encarar as visitas. Falar com as pessoas. — Será que devo chamá-lo de tio ou apenas Derek, e Sed, somos primos?

Eu desci as escadas lentamente, observando as duas mulheres sentadas na sala. Uma tinha em torno de vinte e cinco anos era alta, bem magra e tinha os cabelos curtos na altura do ombro. E havia aquela garota de uns dezesseis anos que não parava de fitar Sed, ela era igualmente alta e magra, porém seus olhos eram dourados, seus cabelos longos até a cintura.

— Kira que bom que decidiu se juntar a nós.

— Sim Derek, eu estava descansando no quarto.

— Temos visitas. Estas são Iaret e Anath.

— Olá, eu sou Kira Mad... Ahnn, apenas Kira... — A garota mais nova chamada Iaret olhou-me forma especulativa, quase curiosa. Imaginei se sabia de alguma coisa, talvez ela tivesse ciúme de Sed. Por eu estar aqui na casa deles.

— Kira eu sinto que te conheço, Derek falou tanto de você. Nós estávamos discutindo sobre você participar das cerimônias do templo de Bastet. — Anath sorriu alegremente, parecia sincera. Será que Derek mentiu para todo mundo dizendo que eu era sua sobrinha?

— Eu sei que Kira adoraria participar, mas nós podemos discutir isso no jantar. Kira, Anath nos trouxe praticamente um banquete quando soube que você havia chegado.

— É mesmo? Que gentil, eu agradeço.

— Ah sim. Todos nós agradecemos, por que eu realmente não sei cozinhar. — Brincou Sed. Ele olhou para mim. — E eu duvido que a princesinha ali saiba.

Iaret parecia gostar dessa situação, divertia-se porque Sed deixava bem claro que não gostava de mim. Derek realmente poderia ser meu tio, já que eu era a sobrinha mimada. Sed o irmão mais velho insuportável. E todos nós formávamos uma linda família feliz. Que bela farsa, eu quero voltar para casa.

Nós comemos e conversamos a noite toda. Anath disse que era sacerdotisa e que Iaret algum dia ia substituí-la. Falaram do faraó, das atividades que as moças da minha idade tinham, das que pretendiam se casar, das que já estavam casadas. Disseram que eu poderia aprender dança do ventre e me apresentar para o Faraó.

— Sed, eu me pergunto quando você vai se casar. — Disse Anath, Iaret parou de comer e observou a reação dele e todos à mesa esperamos por uma resposta. — Vamos, eu sei que os garotos da sua idade querem isso.

— Eu não pretendo me casar. — Ele respondeu com dificuldade.

— Talvez as moças daqui não sejam dignas da soberba de Sed. — ele me encarou raivosamente e eu continuei a provocar. — Ah não, realmente elas não tem culpa de você ser assim tão chato. É um bem que você faz a todas elas.

— Eu acho que Sed seria um bom marido. — Disse Iaret. Todos nós ficamos boquiabertos com esse comentário, até mesmo Sed começou a encará-la.

— Não há necessidade de discutir. Mas eu posso garantir que a mulher ideal para você Sed pode estar perto. Mas você não enxergará esse grande amor até o momento certo. — Advertiu Derek.

— Pare. Você e suas previsões.

— Falando em previsões, eu gostaria de saber... — Derek me interrompeu.

— Falaremos disse antes de você dormir. — E com isso ele encerrou o assunto.

Anath e Iaret foram embora logo depois dizendo que voltariam amanhã, para irmos todos ao templo. Ficamos apenas eu e meus novos parentes na casa. Antes de partir Anath me lançou um olhar cúmplice e depois sorriu de forma tranqüila. Acho que posso dizer que conquistei uma amiga afinal de contas. O que era útil, ela podia me ajudar a voltar para casa.

— Eu sei. — Disse Derek

— Sabe o que? — Eu perguntei confusa.

— Sei que você está cheia de dúvidas e irei respondê-las. — como ele percebeu o que eu estava pensando?

— Antes de tudo, eu gostaria de dizer que meu quarto é encantador. Agradeço por sua hospitalidade.

—   Sabia que você ia gostar. — ele respondeu orgulhoso.

—   Eu me pergunto como você sabia do meu endereço em Londres e sobre o período da Inquisição.

Nada na minha vida me preparou para esse dia, meu pai não pode cogitar que eu fosse fazer parte da história de um modo diferente. Minha mãe nunca sonharia que eu via em primeira mão as peças antigas expostas no museu. Era surreal demais, quase preocupante. Era natural que eu pensasse que tudo não passa de um sonho, era única alternativa lógica.

— Eu simplesmente sei, pode se dizer que é uma espécie de vidência, eu realmente sei de vários acontecimentos históricos do futuro. Sei um pouco sobre você, eu posso ver o futuro de algumas pessoas, desde que eu não me envolva muito.

— Assombroso. — eu exclamei, ele riu.

— Mas é claro que ele pode errar. — Declarou Sed.

— Ah, isso é verdade, porém Sed seu futuro é muito claro para mim. O seu também Kira.

— Eu estou assustada.

— Não fique. — Ironizou Sed.

— Meus pais, eu estou um pouco preocupada. Eles vão perceber meu desaparecimento. Eu não sei como ou quando eu poderei voltar.

— Eu já disse, no segundo em que você voltar estará dentro da pirâmide. Seu pai estará examinando aquela caixa que ele encontrou. Toda a expedição estará procurando artefatos antigos e você voltará como se nada tivesse acontecido.

— Espero que isso seja verdade.

— Mais uma coisa, você não voltará sozinha.

— Isso é possível?

— Tudo é perfeitamente possível.

— Quem? — eu não compreendo isso. Não seria correto tirar alguém desse mundo e leva-la ao meu. Era completamente injusto.

— Você logo vai saber. Agora o que acha de ir dormir?

— Não sei se consigo, mas vou tentar.