– Está tudo bem se eles estiverem sorrindo, não é? – A voz rouca sussurrou. Um rosto sendo iluminado por uma vela e dando destaque a bochecha manchada de sangue. – Eles estão sorrindo agora, sorrindo para você.

Aos poucos a criança ali calada vai esboçando um pequeno sorriso que logo se alarga mais e se torna uma gargalhada.
- É a primeira vez que o papai e a mamãe sorriram para mim, esse é um sorriso tão grande! Muito obrigado, muito obrigado mesmo...

A criança ria mais enquanto sentava-se no chão, ao lado dos cadáveres de seus pais tão sorridentes com as bocas rasgadas até as orelhas.

Kaito dá um salto da cama com o som do telefone tocando suas ultimas chamadas até parar. Ele ofega bastante pelo pesadelo constante que havia tido...

...Ou quem sabe era uma memória?

Ele apertou o botão da secretária eletrônica, dando inicio ao seu pesadelo.

– Mensagem numero 1...

***
Os dedos compridos dedilhavam as teclas amareladas do velho piano, a melodia era constante, uma introdução á sua musica, a musica que dizia como ela se sentia.
- Com tantos sorrisos eu já deveria ter terminado a minha canção... Mas por que? Por que minha canção não termina?
Os crânios em putrefação pareciam encarar a moça ao piano, todos compenetrados como figuras empalhadas, mesmo que alguns tivessem pedaços a menos, o que tinham em comum eram os olhos arregalados e intactos, assim como bonecas.
- Não... Não me olhem assim! Não me olhem assim!
E estendendo os braços, a garota jogou todos os crânios no chão e começou a pisoteá-los, destruindo-os quase por completo.
- Por que... Por que os olhos não se vão? Por que os olhos não se vão? Parem de me olhar! Parem! Parem!
A moça encosta-se na outra extremidade do quarto, deixando-se deslizar até ficar sentada no piso manchado. Voltando seus olhos á parede igualmente manchada, seus dedos deslizam sobre uma das inúmeras fotos de um mesmo rapaz que cobriam a parede toda.
- Até quando tudo vai ser assim? Seus olhos não me seguem, não tenho seu sorriso para mim... Me ajude á terminar minha canção, meu amor.

***
- Hoje foi a mesma coisa. – Kaito disse de cabeça baixa, afundando o rosto nas mãos em forma de concha. – Fazia tempos que não era assim, mas agora repentinamente voltou.
- Voltou o quê? – O rapaz do outro lado da mesa parecia intrigado enquanto tomava uma xícara de café.
- As mensagens... – Kaito levanta o rosto visivelmente perturbado. – Ás vezes tem gritos... A melodia sempre é a mesma... Ela pede para que eu continue a musica e então desliga...
Kaito estava com um olhar distante enquanto repetia mais e mais vezes as mesmas coisas sobre as mensagens em tom baixo, como se estivesse fora de si.
- Kaito! – O rapaz segura no rosto do amigo, mirando-o na direção do seu.
- Watashi anata ni koi suru...
Os lábios de Kaito balbuciavam devagar enquanto os dedos magros deslizavam sobre á mesa como se procurassem algo. Seus olhos haviam ficado completamente escuros como um buraco negro sem fim.
Escuta-se apenas um baque surdo de um corpo que despenca ao chão, logo após o som engasgado de ter uma faca enfiada na garganta.
- ... tame ni umareta no kashi ran?

Fim do capítulo 1.