Dakota Lessons escrita por Nebbia


Capítulo 3
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Tradução das palavras nas notas finais~
Descuuulpem pela demora aqui, eu realmente tô... Atarefada e quando tenho tempo pra mexer aqui não tenho saco de escrever x_x Para os leitores da This Is War, essa semana ainda deve sair o próximo capítulo. Boa leitura~



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 Examinou-o de cima para baixo. De início, pensou que fosse a personificação de algum espírito. Mas era provavelmente apenas um homem branco. Era loiro, os olhos verdes como a pele da iguana que vira. Não deixou de notar o quão estranhas eram as suas sobrancelhas. E lançava-lhe um olhar assustado.

 O índio compartilhava de seus sentimentos, mas procurava não demonstrar. O fato de o outro ter saído do nada de um bando de arbustos no meio do deserto personificava quase todos os seus medos.

 “ ... Hau?”

 O garoto franziu o cenho, parecendo não entender.

 Compreendeu logo que o homem branco tinha a sua própria língua.

 Sabia pouco sobre eles. Tudo da boca de sua tribo, principalmente seu pai. Diziam todos, principalmente ele, que era uma espécie perigosa, traiçoeira. Ouviu histórias das injustiças sofridas pelos índios, as guerras para manter a terra que era cada vez mais rara para eles, seus verdadeiros moradores. E as armas...

 Não respeitam nada nem ninguém.

 E ouvira muito, muito mais. Tudo isso alimentava seu medo daquele invasor que nunca vira. Dava-lhe pesadelos. Ele o imaginava como uma forma deformada do ser humano normal, e literalmente branca.

 Mas... Ele era normal.

 Pálido, quem sabe, mas como ele.

 Levantou-se e se afastou, dando-lhe espaço para sair dali. Ficou a observá-lo tirar o resto de seu corpo dos arbustos com certo esforço, tendo assim chance para examiná-lo melhor.

 Não parecia nem um pouco maligno.

 Deveria ter a sua idade, praticamente. Aparentava ser novo. Mas não sabia direito como ele funcionava, então não deveria tirar conclusões precipitadas.

 O homem levantou-se e ficou imóvel à sua frente, evitando olhá-lo mas examinando-o secretamente enquanto cabisbaixo.

 Também nunca havia visto um índio.

 Sabia de suas roupas, armas, línguas estranhas que mais pareciam que invocavam o Diabo. Dizia seu pai que eram selvagens perigosos, daqueles que matam a sangue-frio. Alguns eram canibais. Seu dever era eliminá-los para que a paz reinasse na região. Para a segurança de todos. Para a vitória do bem sobre o mal.

 Ou algo assim.

 E agora estava ali, diante de um, totalmente perdido e sem armas.

 Seu estômago repentinamente roncou.

 O índio teve um sobressalto, mas deu uma curta risada ao perceber o que era. Isso, por sua vez, assustou ao homem branco. Nunca havia passado por sua cabeça que eles riam.

 Viu-o aproximar-se da fogueira – que antes não havia notado – e fazer-lhe um sinal para que o seguisse. Ele o fez apenas depois de muito hesitar.

 Vendo o garoto aproximar-se, pegou uma pele do búfalo que matara de manhã. Planejava usá-la para colocar debaixo da carne quando pronta. Não que não a segurasse com as próprias mãos; simplesmente permitia-se algumas regalias. Mas agora usaria para servir o homem branco de um pouco de sua comida. Ainda tinha o suficiente para matar sua fome de uma semana.

 Sentou-se no chão e fez um sinal a ele para que se sentasse também. Ele lentamente obedeceu. Tirou então a carne do fogo, já suficientemente assada. Era uma parte grande da coxa, quase do tamanho de seu tórax. Com a própria mão partiu a carne em dois e um dos pedaços deixou no espeto. O outro foi dado ao visitante, que ficou a observar a comida que recebera.

 Cheirava bem, o aspecto também parecia bom. Mas não conseguia tirar da cabeça que ele poderia ser um canibal. Não se sentiria bem comendo carne humana. Mas onde haveriam pessoas ali?

 Deu uma última olhada antes de morder. O índio observava-o, esperando algum sinal de aprovação ou reprovação.

 Deu mais uma mordida. Não reconhecia o gosto daquela carne, não sabia de que animal era, mas algum tempero dava-lhe um sabor levemente adocicado. Era bom. Precisava controlar sua fome para não comer tudo muito rápido.

 O outro suspirou, aliviado, e só então começou a comer o seu pedaço.

 Queria agradá-lo. Estava completamente ciente de que o homem branco mais tarde poderia esquecer tudo isso e matá-lo se quisesse. Pelo menos, fora isso o que ouvira dos outros. Mas seria melhor ser amigável do que agressivo logo no primeiro contato.

 O loiro de olhos verdes observava o índio que concentrava-se em seu jantar. Aproveitava a luz do fogo para olhá-lo de cima para baixo e examinava suas roupas e aparência. Estranhava-a, já que não batia com as descrições feitas em sua cidade.

 Vestia-se como imaginava; suas roupas eram de couro animal e um longo cocar adornava sua cabeça e descia até mais ou menos metade das costas. Ao seu lado notara uma lança, o que o fazia ficar um tanto nervoso. Isso tudo era normal, se não contasse com sua aparência claramente européia.

 O garoto – parecia um garoto. Era jovem como ele – tinha cabelos dourados um pouco mais escuros que os dele, curtos. Uma estranha mecha perto de sua testa saía da tira de couro do cocar e praticamente desafiava as leis da gravidade ao virar para cima. Seus olhos eram de um esmeralda claro e sua pele, tão branca quanto a de qualquer colono, ainda que avermelhada por causa do sol.

 Seus olhos se encontraram e ele parou de observá-lo.

 Quando terminaram, o índio deixou que ele se aquecesse um pouco perto da fogueira. Ainda era início de noite e a temperatura iria certamente abaixar mais ainda. Ele se perguntava o que o garoto fazia lá sozinho.

 “ Minha cidade... Você sabe onde fica a minha cidade?”, quebrou o silêncio o de olhos verdes, perguntando mesmo com a certeza de que ele não entenderia nada. Isso confirmou-se com o seu inclinar de cabeça. Revirou os olhos em impaciência.

 “ Cidade...”, desenhou na terra seca algumas casas e torres altas, depois apontou para o desenho, olhando o outro e esperando que entendesse.

 O índio ficou uns segundos olhando o desenho e então sorriu, meneando a cabeça diversas vezes.

 “ Otowa he taka!”, exclamou.

 O branco aliviou-se. Sabia que seus desenhos não eram dos melhores.

 “ Sabe onde fica?”, novamente perguntou sem esperanças de que fosse compreendido, então tentou achar um jeito melhor de se expressar.

 “ É para lá?”, apontou para o norte.

 O outro meneou a cabeça negativamente.

 “ Então onde é?”, abusava das expressões corporais, irritado. O índio ria daquilo tudo, mas logo se esticou para pegar algo que estava atrás da fogueira. Quando puxou, o garoto viu que era uma pele, provavelmente de um bicho grande. O índio jogou isso sobre as costas e levantou-se, indicando ao outro que fizesse o mesmo. Iria guiá-lo até lá.

 O garoto levantou-se e começou a segui-lo. A escuridão envolvia-os aos poucos conforme se afastavam da claridade da fogueira, e junto dela vinha o frio, que logo fê-lo tremer, sem a vantajosa proteção usada por seu guia.

 Não apenas o frio passou a acompanhá-los. Vieram também os barulhos. Barulhos estranhos para ele, que o faziam sobressaltar-se com frequência. Barulhos selvagens. Pareciam não surtir o mesmo efeito no índio, provavelmente já acostumado com aquilo tudo.

 Depois de uns minutos de caminhada, distinguiu um vulto no horizonte. Um vulto com pontas e quadrados saltando para cima, contrastando de leve com o azul marinho do céu. Quieto, parecia uma cidade-fantasma.

 Mas não era.

 Era a SUA cidade, de madrugada.

 O índio parou em certo ponto, fazendo um sinal com a cabeça, indicando a cidade. O outro assentiu em resposta, hesitando um pouco ao voltar a olhar as construções. O próximo desafio era seu pai.

 Sabia que ele estava acordado, esperando que ele voltasse. Sabia também que caso ele nunca mais aparecesse, ele não se empenharia em procurá-lo ou mandar alguém fazê-lo. Não moveria um dedo a favor dele. Deixá-lo-ia morrer, se fosse o caso. Por isso mesmo várias vezes considerou fugir de casa, mas o medo do desconhecido era maior. Mas uma vez mais considerou isso, já que não parecia muito pior do que a surra que receberia daqui a alguns minutos.

 Quando terminou de refletir, notou que o selvagem o observava com uma expressão confusa. Sorriu de leve em resposta.

 “ Thanks...”, acenou com a cabeça de leve e postou-se a correr até a cidade, sob o peso do olhar do índio, que, certificando-se de que o garoto havia adentrado a cidade, voltou para a sua fogueira.

 Deitou-se a uma distância segura dela quando chegou, após assegurar-se de que nada inflamável jazia perto dela. Mas não dormiu de imediato.

 Pensava naquele garoto branco, nas diversas perguntas que se fizera sobre ele desde que o encontrou. Por que estava lá, no meio do nada, quais eram as suas intenções e por que adquiriu aquela expressão tão sombria quando chegaram à cidade. Dentre outros.

 De repente, viu-se tentado a pesquisá-lo, descobrir tudo sobre ele por puro interesse e diversão. Não havia muito o que fazer, de qualquer modo. Sorriu ao pensar naquilo. Mesmo que, ele sabia, a probabilidade de encontrá-lo novamente fosse mínima.

 Encerrou seus pensamentos, preparando-se para dormir. Teria que arrumar tudo para voltar para casa no dia seguinte.

 Os acontecimentos seguintes não muito influenciam nossa história. O homem branco chegou em casa mais pálido que o normal, recebido pelo pai nada feliz. Como pensara, realmente levou uma surra cuja lembrança tardou a sair de seu corpo, e enquanto não saísse foi proibído de sair do quarto, cuja porta fora trancada a chave para que o pai tivesse certeza de que ele não o desobedeceria novamente.

 Ao mesmo tempo, no meio do deserto, o jovem índio retornava para casa como um homem, sendo recebido com a mesma festa e alegria com a qual fora enviado em sua aventura dias atrás.


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Notas finais do capítulo

Fato sobre a história: Eu escrevi tudo de uma vez e AGORA estou começando a repartir os textos e transformar em capítulos, por isso... Começo e final podem ficar um pouco bruscos.
Hau - Oi
Otawa he taka - Cidade
Thanks - Obrigado (dur)