Senti ele se afastar de mim repentinamente e algo gelado tocando meu braço. Era uma tonfa . Hibari tinha usado uma para empurrar Mukuro e a outra estava me afastando e me deixando segura atrás dele. Tinha sangue saindo da boca de Mukuro, mas ele ainda estava sorrindo.
- Ku fu fu fu, Então é verdade?
- Claro que não. Eu só não posso deixar esse tipo de coisa acontecer aqui. - Disse Hibari, um pouco mais irritado que o normal.
- Hibari-chan, você podia ter escolhido muitas coisas em comum comigo que não fariam a mínima diferença. Mas a mesma garota que eu não foi uma boa escolha. - Ele disse, ainda rindo e saiu andando, passando a mão na boca que continuava sangrando.
Eu olhei a situação na qual estava: Mukuro me queria por algum motivo e pensava que Hibari também queria. Hibari estava me devendo favores e me ajudaria caso eu precisasse. E eu tinha sido rejeitada pelo cara que gostava e acabara de ter meu primeiro beijo roubado. Como que minha vida podia mudar tanto em tão poucos dias?

- Você está bem mesmo?
- Estou sim, Hibari-san. Não precisa se preocupar... - Respondi, encostada no pequeno muro.
- Aquele herbívoro maldito... Ele teve muita sorte por ter feito isso hoje...
Depois de falar a palavra 'sorte', Hibari desviou o olhar. Algo me dizia que ele não tinha dito aquilo só por ele estar de um jeito que não poderia bater em Mukuro.
Estávamos na frente da casa onde eu ficava, Hibari, como 'prometido', me levou até lá. Desde que saímos do colégio, ele estava morrendo de raiva. Eu não sabia se era por ter que me trazer, por ter sido ajudado por mim ou pelas palavras nada sutis de Mukuro. Passei todo o caminho quieta, também. Ainda estava pensando naquele beijo. De como os lábios de Mukuro eram macios e de como ele era um garoto estranho.
- Hibari-san, você não quer... Entrar? - Falei, vendo que já faziam alguns minutos que estávamos ali na frente, e um vento um pouco frio corria pela rua. Eu havia o chamado por educação, mas não me sentiria incomodada se ele aceitasse, apesar de que fiquei muito surpresa com sua resposta.
- Sim. Talvez aquele herbívoro tenha nos seguido... - Ele disse, desviando o olhar sério dele.
Abri a porta. A casa era bem simples. Tirei logo meus sapatos entrando na sala, onde tinha uma TV que quase nunca era usada, um sofá e uma mesa de centro. Dando alguns passos havia uma mesa baixa de jantar, e logo a cozinha, com um balcão e os utensílios. Um corredor a direita, que dava acesso a duas portas. Uma sendo mais perto da cozinha, que era a lavanderia, e a outra  que era um banheiro. Haviam escadas que davam acesso ao andar de cima, onde tinham dois quartos e uma varanda pequena.
Hibari entrou e eu voltei, para pendurar o blazer dele num gancho próximo a porta, colocando a bolsa em outro gancho, indo me sentar no sofá, vendo ele me seguir até lá.
- Você não parece tão nervosa ou irritada. - Ele disse. Parecia tímido, ou desconfortável por ficar ali, mas na realidade eu achava engraçado. Nunca tinha visto ninguém ali que não fosse Tsuna ou Gokudera, quando vinham juntos ou apenas o Tsuna. Era estranho ver outra pessoa ali. - O que é tão engraçado? - Ele dizia, provavelmente vendo o meu pequeno sorriso.
- Oh, desculpe... É que não são muitas pessoas que vem aqui... E eu não estou irritada porq-
- Você é tão sozinha, não é? Mesmo andando em grupos, ainda parece sozinha. - Ele disse, virando-se para mim, olhando nos meus olhos. A expressão dele não mudará, mas algo naqueles olhos e naquelas palavras estava diferente e me prendia. Não me deixavam pensar direito, não me deixavam saber o que era que havia mudado. Depois de alguns segundos, sorri e respondi virando meu olhar para o chão.
- Você também parece ser solitário, Hibari-san.
- Mas isso é porque eu não gosto de andar em grupos. Pessoas demais juntas só causam problemas. Mas você... - Ele disse, olhando para nossas mãos uma do lado da outra, no sofá e logo voltando o olhar a mim. - Não parece ter problemas com isso. Você não tem ficado com seus amigos...
Aquilo tudo era verdade. Um pouco antes de me declarar, eu já havia me afastado um pouco. Gostava de ter tempo pra mim, para ler um livro na biblioteca. Não ficava o tempo todo com eles. Mas...
- Mas Hibari-san, como você sabe disso? - Meus olhos foram em direção a ele rapidamente, a ponto de ver sua mão se afastar e seu rosto virar.
- Eu percebi quando aquele seu amigo saiu logo lá do telhado. Se fossem muito próximos, ele não a deixaria sozinha comigo. - Ele falou rapidamente, fazendo-me desistir de qualquer outra pergunta. Ele se sentou direito e olhou para mim. - Não está mesmo nervosa ? Ou assustada?
- Não muito...
- Você gostou? Eu fiz errado em tentar lhe defender? - Ele disse, agora sim eu via alguma outra expressão em seus olhos. Ele estava confuso. Hibari só tinha entrado na minha casa pra fazer essa pergunta, provavelmente. Ele parecia inquieto, ele realmente se importava com aquilo. Pelos boatos, ninguém sabia de alguém que se aproximara de Hibari Kyoya, sendo assim, ninguém nunca soube de uma namorada que ele tivera. Talvez ele nunca tivesse tido uma, e não conseguisse entender esses sentimentos. Por isso ele estava tão confuso.
- Ele... Roubou meu primeiro beijo. - Falei, colocando as mãos nos joelhos, e olhando para o chão. Tentei virar para ele e lhe mostrei um pequeno sorriso um pouco forçado. - Isso não deveria ser assim, não é? - Sua expressão estava irritada novamente, mas aquilo ainda pioraria.
Ouvi algo como uma pedrinha batendo na janela da casa e uma voz familiar.
- Chrome-chan, por que esse bastardo está na sua casa? Por que estão demorando tanto?
Assim que encarei os olhos de Hibari novamente, ele estava furioso. Era assustador. Meu sorriso se desfez no mesmo instante, fiquei assustada com aquilo.
- Eu vou morde-lo até a morte. Vou te pagar um dos favores assim. - Ele disse, se levantando. Segurei o braço dele, puxando-o pela manga camisa, tentando fazê-lo sentar.
- Não, Hibari-san! Não faça isso!
- Eu tenho. Ele não pode fazer algo assim! Depois daquilo... Ele ainda te seguiu até aqui! - Ele dizia, extremamente irritado. Soltei seu braço apenas por medo e o vi pegando seu blazer e pegando suas tonfas nele, antes de o vestir. Corri até a porta e quando estávamos lá fora, Mukuro estava no muro baixo que cercava a casa, sentado de lado, comendo uma maçã. Com aquele sorriso dele de sempre. Olhei, na verdade, direto para os lábios dele, que estavam um pouco inchados, e ainda havia sangue ali.
Fiquei pensando numa forma de fazer aquilo acabar bem, sem ninguém machucado, mas era difícil pensar sob pressão.