Signal Fire escrita por Fernanda Redfield


Capítulo 9
Cura


Notas iniciais do capítulo

Olá pessoas!
Queria agradecer, mais uma vez, os comentários e as recomendações que recebi em minhas fanfics. Como eu sempre digo, os reviews funcionam como combustível para quem escreve.
Bem, quanto a esse capítulo... Acho que ele vai surpreender muita gente. Eu procuro estabelecer alguns temas enquanto escrevo e o desse se chama, consolo.
Eu indicaria Please Don't Stop The Rain (James Morrisson) e All You Gotta Change (Alain Clark) para a leitura.
Espero que gostem, boa leitura!



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            Quinn Fabray caminhava pelas ruas de Lima com um sorriso no rosto, nem mesmo o tempo nublado podia apagar a luz de seus olhos. A loira sentia-se mais leve, mais calma e mais feliz... Nem mesmo as constantes piadinhas de Santana Lopez a respeito de seu estado emocional podiam abalá-la. Ela simplesmente parecia flutuar em outra galáxia.

            Aliás, de fato, ela realmente estava flutuando em outra galáxia onde a gravidade lhe puxava para uma estrela extremamente brilhante. Rachel Berry entrara em sua vida e principalmente, deixara que Quinn Fabray entrasse na própria. Aos poucos, as coisas estavam se resolvendo. As duas estavam construindo uma solidez depois de todo o turbilhão que as atingira no curto tempo entre o Natal e o Ano Novo.

            Pequenos gestos, curtas conversas e olhares estavam fazendo aquela relação ganhar consistência. E mesmo diante do pouco tempo de relacionamento, afinal, pouco mais de duas semanas tinham se passado... Quinn sentia que aquilo era muito mais intenso e real do que qualquer outro relacionamento que tivera.

            Talvez fosse essa loucura toda que não fazia o sorriso desaparecer de seus lábios, talvez fosse o sorriso de Rachel afastava qualquer tempo ruim da mente de Quinn ou talvez... Fosse apenas o brilho que voltara aos olhos da morena. Quinn não sabia o que era, só que alguma coisa mudara. De repente, o mundo parecia menos assustador.

            Quinn balançou a cabeça de um lado para o outro enquanto ria dos próprios pensamentos. Ela virou a esquina e apressou o passo, já estava atrasada e daria sorte se conseguisse pegar Rachel na livraria. Quinn praticamente correu pela calçada e alguns andantes riram da alegria da jovem, a loira sorria em resposta. Explodindo em felicidade.

            Alguns minutos depois, ela aterrissou ofegante na porta da livraria de Charlie. A “Letters, Love and Dreams” estava pouco movimentada naquele dia, apenas algumas senhoras e alguns jovens que estavam em férias na cidade. Pela vitrine, Quinn observou Rachel sorrir para duas senhoras e acompanhá-las até os fundos da loja. Involuntariamente, um sorriso de mesma intensidade surgiu em seus lábios bem desenhados. Quinn se ajeitou enquanto olhava para seu reflexo no vidro e entrou.

            A tradicional sineta tocou e o Sr. Thomas ergueu os olhos azuis para Quinn e sorriu quando viu a garota se aproximar. Quinn encolheu os ombros e fez uma carinha de quem tinha feito bagunça, Charlie se aproximou dela e Quinn pediu para que ele ficasse em silêncio com um sinal do dedo indicador. O velho senhor sorriu cúmplice e se aproximou a passos silenciosos, ele envolveu Quinn nos braços e murmurou no ouvido da loira:

            - Devo me acostumar com a ideia da senhorita vir aqui para ver Rachel e não eu?

            - Está com ciúmes, Charlie? – Quinn pergunta brincalhona antes de bagunçar os ralos cabelos grisalhos do senhor. O homem a empurra levemente antes de fazer uma cara feia, que logo desaparece diante do sorriso iluminado de Quinn. Talvez a ex-cheerio nunca soubesse o tanto que seu ex-patrão a admirava. Charlie beliscou os braços descobertos de Quinn e disse:

            - Não sinto ciúmes, bem sei que o que você sente por ela tem um lugarzinho especial dentro desse coração tão maltratado.

            - Como...? – Quinn tentou questionar, mas as palavras não saíam de sua boca. Ela estava assustada demais, com medo e surpresa com a capacidade de percepção de Charlie. O senhor, por outro lado, se divertia. O sorriso de Charlie aumentou e ele segurou-se para não rir, mas ficou rapidamente sério quando notou a expressão atordoada de Quinn. O senhor se apressou e afagou os braços de Quinn desajeitado, enquanto dizia apressado:

            - Calma, Q... Uma hora você vai ter que se preocupar, mas não é agora. Você sabe muito bem que seu segredo está a salvo comigo.

            - Mas... – Quinn tentou argumentar, mas Charlie sorriu bondoso para ela e fez alguns sinais de negação que fizeram a ex-cheerio se calar. Quinn abaixou a cabeça, ligeiramente envergonhada e mordeu o lábio inferior. Charlie continuou a sorrir e beijou o topo da cabeça de Quinn, a loira levantou os olhos esverdeados ligeiramente vazios e o senhor sugeriu:

            - Agora, que tal você fazer uma surpresa para certa morena ali no corredor? Eu vou dar um jeito nas senhoras que estão com ela...

            Quinn abriu um sorriso imediatamente, a loira caminhou para trás de uma estante enquanto ouvia a voz de Charlie sussurrar algo para Rachel e depois, falar em voz alta para as senhoras que o acompanharam imediatamente. Quinn contornou as estantes e foi parar do lado oposto onde estava. Seus olhos encontraram a figura de Rachel Berry.

            A morena estava concentrada, arrumando a ordem de alguns livros. Tinha os olhos atentos e semicerrados, o nariz estava franzido (graças a poeira, provavelmente) e as mãos pequenas corriam pelas lombadas antes que Rachel pudesse ler os títulos. Quinn aproximou-se dela com cuidado, sem fazer nenhum barulho. Posicionou-se atrás da morena e ergueu o braço, deslizando a mão pelos cabelos castanhos. Rachel suspirou e abriu um sorriso antes de perguntar:

            - O que está fazendo aqui, Fabray?

            - Vim te ver, tem algum problema? – Quinn perguntou com um sorriso e apoiando ambas as mãos na estante. Rachel guardou o livro que segurava e tentou se virar, mas Quinn pressionou o próprio corpo de encontro as costas da morena que soltou um pequeno gemido. Quinn afastou alguns cabelos do pescoço de Rachel e beijou ali antes de morder. – Estava com saudades.

            - Você nunca vai se cansar de mim, Q? – Rachel perguntou risonha e apanhando uma das mãos de Quinn, dessa vez, a loira não fez objeção e deixou a morena girar em seus braços. As duas ficaram frente a frente e Quinn apoiou uma mão na estante enquanto a outra brincava com as mechas castanhas do cabelo de Rachel. A morena corou e fechou os olhos antes de receber um beijo na bochecha. – Nós nos vimos ontem.

            As duas tinham se encontrado brevemente no apartamento de Quinn, Santana estava se mudando e organizando o escritório, estava tão ocupada que acabou recrutando todo mundo para a operação. Quinn permaneceu próxima a Rachel e exalou o ar quente que expirara no pescoço da morena, Rachel riu e se arrepiou, colocando os braços em volta da cintura da loira. Quinn a olhou com carinho e respondeu:

            - Tínhamos Santana e Sam nos enchendo o saco, além de Kurt querendo saber dos detalhes. O único que nos respeitou foi Dave... Portanto, eu não matei minhas saudades ainda.

            - Você é muito carente, Fabray. – Rachel respondeu com um sorriso antes de morder o lábio inferior de Quinn e puxá-la para um beijo leve. Quinn sorriu quando sentiu os lábios carnudos sobre os seus, a mão que estava apoiada na estante adentrou nos cabelos castanhos, puxando-os levemente e recebeu um aperto na base das costas. Quinn não deixou Rachel aprofundar o beijo e sorriu antes de dizer:

            - Talvez seja você que me deixe carente demais.

            - Bom saber que estou agradando, Quinn. – Rachel disse de olhos fechados e esperando um beijo que veio logo em seguida, assim que se separaram, a morena abriu os olhos e arranhou a cintura de Quinn levemente. As duas se olharam com intensidade e Quinn afagou a face de Rachel com intenso carinho, depois, a loira pincelou seu nariz na bochecha de Rachel e perguntou dengosa:

            - Almoça comigo, por favor?

            - Ah Quinn... Eu já almocei. – Rachel murmurou verdadeiramente magoada enquanto beijava a bochecha de uma Quinn triste. A morena riu da careta de Quinn e a puxou para um abraço, apertando os braços magros enquanto afundava a cabeça no peito da loira. Quinn afagou seus cabelos e riu da reação exagerada da morena antes de murmurar desgostosa no ouvido dela:

            - Droga, acho que vou ter que almoçar com Santana. De novo.

            - Eu sinto muito, de verdade. – Rachel disse sincera antes de se afastar e brincar com os botões da camisa de Quinn. A loira sorriu para ela e inclinou a cabeça, indicando que estava tudo bem. Um sorriso satisfeito irrompeu nos lábios de Rachel. – E se você se comportar direitinho e sobreviver a um almoço com Santana Lopez pode vir me pegar mais tarde para sairmos.

            - Tudo bem, mas que fique claro que eu estou fazendo isso por causa da minha recompensa, ok? – Quinn disse entre risadas e recebendo alguns tapinhas de leve de Rachel. A loira despediu-se com um beijo leve enquanto entrelaçava seus dedos com os da morena... Rachel sorriu e corou, levando Quinn até a saída. Na porta, apertou a mão da loira e disse:

            - Eu estarei esperando, ok?

            Quinn sorriu e acenou, dando-lhe um beijo na bochecha e caminhando pela rua em direção ao edifício onde Santana tinha se instalado. Quinn não se virou, senão, tinha visto o enorme sorriso de 1000 watts voltar a brincar nos lábios de Rachel Berry.

***

            Santana Lopez terminava de arrumar seu escritório. O pequeno cômodo com escritório localizava-se em um dos mais altos e mais badalos edifícios comerciais de Lima. A latina organizava seus livros de Direito por ordem alfabética. A mesa de vidro com uma poltrona confortável de couro já estava organizada.

            O escritório tinha as paredes pintadas de branco e uma imensa janela do lado direito. No lado esquerdo, onde Santana estava, havia uma prateleira de alumínio na qual os milhares de códigos e livros de Direito estavam sendo organizados. No centro da sala, a mesa de vidro com a poltrona acolchoada negra e duas cadeiras pretas confortáveis do lado oposto. Um belo tapete adornava o chão, refletindo o extremo bom gosto da latina.

            Santana tirou mais um imenso livro de dentro da caixa de papelão apoiada na mesa. Era um tratado sobre as leis do direito penal, quando foi colocá-lo na estante, uma foto caiu, com a imagem virada para baixo. A latina abaixou o corpo e olhou para as costas da foto, onde poucas palavras definiam a imagem.

“Sant e Britt, Nacionais 2012 (Los Angeles).”

            Santana teve que se sentar, seu corpo foi atingido por aquelas palavras e ela desabou. As mãos tremiam e os olhos começavam a ficar embaçados por causa das lágrimas que a latina tentava segurar a muito custo. Lentamente, ela virou a foto para si e antes que a saudade pudesse preenchê-la, um sorriso tomou seus lábios.

            Ela e Brittany estavam na foto tirada por Mercedes antes da final que consagrou o New Directions campeão das Nacionais de 2012. Santana não se lembrava muito bem do momento, mas ela estava rindo enquanto Brittany beijava sua bochecha. A latina sorriu sôfrega e algumas lágrimas escorreram pelo seu rosto, ela respirou fundo e passou as pontas dos dedos pela foto.

            Era impressionante, mesmo depois de tudo, ela ainda conseguia sorrir com as recordações de Brittany. Não sabia se aquilo indicava que o amor permanecia imaculado depois das traições e das brigas, não sabia se aquilo indicava que ainda não a superava... Mas de uma forma estranha e confortável, Santana se sentia feliz tendo aquilo dentro do peito, mesmo que se sentisse fraca depois.

            Ela queria que a sua mente guardasse aquela imagem de Brittany: sorridente, alegre e inocente. E não a Brittany irreconhecível que colocou um fim na história das duas. Aliás, um fim que Santana ainda não conseguia aceitar, não aceitara depois de 4 anos e não seria agora que aceitaria. A latina continuou com a foto em mãos, sorrindo enquanto as lembranças a tomavam até que o som de batidas na madeira da porta chegou aos seus ouvidos. Santana levantou-se abruptamente e limpou os olhos, ainda de costas para o recém-chegado.

            - Pode parar de disfarçar, Santana. Eu vi que você chorava. – Quinn Fabray tinha a voz doce e preocupada. Ela se aproximou da amiga e tocou o ombro de Santana receosa, para sua surpresa, a latina colocou a mão sobre a sua e sorriu. Santana se virou e ainda limpando as lágrimas, respondeu:

            - Eu não tenho problemas em admitir meus sentimentos, Fabray. Essa parte eu deixo para você, com muito prazer.

            - Pare de desviar o foco da conversa, Santana! – Quinn pediu um pouco fora de si e nesse momento, Santana levantou os olhos para a amiga. Uma coisa que a latina passara a admirar nessa “nova” Quinn era aquele ar protetor e maternal, tão diferente da Quinn egoísta e fechada do colegial, a latina só lamentava o fato de que sua amiga teve que aprender, assim como ela, das piores formas. Santana deu um sorrisinho de lado e disparou irônica:

            - Eu não estou desviando o foco, você tem direito de não querer falar sobre você e Rachel. Portanto, eu posso ficar quieta quando se trata dos meus sentimentos. Já que, como eu disse, eles são meus e não importam a mais ninguém.

            - Não, você tem que falar quando essas coisas passam a te machucar e eu sei que está machucando! – Quinn contra-argumentou um pouco frustrada, afinal, ela sabia que a Santana tinha um bom ponto na discussão. A latina abriu a boca para responder, provavelmente falaria sobre o fato de Quinn ainda não ter se aberto para ela. – E nem venha me citar, você bem sabe quão fechada eu sou com as coisas que eu sinto, mas se precisar, eu falo. Só não acho que seja a hora.

            - Então, eu te deixo quieta e você me deixa na minha, assim podemos almoçar em paz. – Santana disse entediada, apanhando a bolsa sobre a poltrona de couro e desfilando até a porta, Quinn revirou os olhos e bufou antes de seguir a amiga. Antes de trancar a sala, Santana deu um sorrisinho maldoso. – Pelo seu humor e pelo horário, a anã não te quis hoje.

            - Para a sua informação, ela já tinha almoçado e nós duas ficamos de nos encontrar mais tarde. E pare de chamá-la com esses apelidos, já saímos do ensino médio. – Quinn respondeu fria e caminhando a frente da amiga, a latina teve que apressar o passo para alcançar o elevador já que Quinn fizera questão de não segurá-lo, por pura pirraça. Assim que as portas se fecharam, Santana cutucou Quinn que olhou irritada para ela, em seguida, esquecendo de todas as suas lembranças e escondendo toda a emoção que transbordava em si na sala, Santana atacou sarcástica:

            - Ah... Então você assume que você está comendo o hobbit?

            - Eu me recuso a responder isso, Santana. Ainda mais diante do vocabulário que você está usando. – Quinn disse friamente, a loira batia o pé impaciente enquanto observava os números que correspondiam aos andares passarem vagarosamente. Santana a olhou de esguelha com um sorriso vitorioso enquanto replicava:

            - É disso que eu falo, como quer que eu conte para você como me sinto se você se mantém em um pacto de silêncio quando tocamos no assunto “Rachel Berry”?

            - Você sabe a resposta para sua pergunta, Lopez. E eu só não falo com você porque estou cansada das suas piadinhas e apelidos contra ela. – Quinn respondeu frustrada e um pouco tristonha, Santana abriu a boca para falar, mas estava impressionada pelas palavras tão verdadeiras e desgostosas da amiga. A latina sentiu-se ligeiramente mal enquanto ambas saíam do elevador e atravessavam o estacionamento em silêncio.

            Santana ajeitou a jaqueta leve sobre o corpo e remexeu a bolsa, apanhou as chaves da Mercedes preta e acionou o alarme. Quinn abriu a porta sem sequer olhar em seus olhos e entrou no carro, emburrada. A latina mordeu o lábio e engatou a marcha ré, saíram do estacionamento e dirigiram lentamente até um pequeno restaurante de comida caseira próximo. Quinn continuava calada, olhando pela janela enquanto Santana dividia sua atenção entre o trânsito e amiga.

            Quinn não sabia a verdade, mas Santana tinha medo de não estar pronta para falar com alguém sobre tudo que acontecera entre ela e Brittany após o McKinley High. Talvez, porque nunca se arriscara a falar com alguém sobre aquele período. Fora por isso que se afastara de todos de Lima, porque, dolorosamente, Lima lhe lembrava “lar” e “lar” sempre trazia os braços de Brittany em sua mente...

            Alguns minutos depois, as duas chegaram ao restaurante. Ainda caladas, ambas desceram e entraram no pequeno estabelecimento. A maioria dos clientes eram trabalhadores do centro da cidade ou forasteiros que estavam hospedados em hotéis próximos. Santana observou a decoração simples e agradável. Seguiu Quinn entre as mesas e ambas chegaram a uma mesa mais reservada no fundo do estabelecimento. Nem mesmo quando se sentaram de frente uma para a outra, se encararam. Santana viu uma sombra de mágoa passar nos olhos esverdeados de Quinn. Sua amiga ficara bastante aborrecida.

            - Me desculpe, Quinn. – Santana disse um pouco insegura e apanhando a mão da amiga entre as suas. Quinn ergueu os olhos e estes estavam frios, como gelo, uma senhora deixou o cardápio entre as duas e saiu sem dizer nada, Quinn recolheu a mão e continuou a encarar uma Santana que agora, estava amedrontada. – Eu não gosto de falar sobre ela, aliás, nunca tentei. Por isso prefiro guardar as coisas que eu sinto só para mim.

            - Nunca ouviu falar que desabafar ajuda, S? Eu não estaria com Rachel hoje se Sam não tivesse ficado do meu lado nesse tempo todo, me ajudando e me fazendo falar. – Quinn estava sendo dura em suas palavras e Santana as levou como uma indireta, não questionou e muito menos, reclamou. Ela merecia, afinal. Fora egoísta ao achar que o sofrimento era só seu. – Eu não sei, mas me ajudou a me acostumar com a ausência dela e talvez, tenha me levado a perdoá-la depois de sete anos... Não estou dizendo que você vai ficar magicamente curada do que quer que tenha acontecido, mas talvez, você lide com as coisas mais facilmente.

            As palavras de Quinn ficaram na cabeça de Santana, a latina desviou os olhos escuros e fixou-os na parede. A dor em seu peito estava silenciosa nos últimos quatro anos, os casos de fim de semana preenchiam a ausência física, mas a emocional continuava ali em forma de dor. Uma dor silenciosa, mas que ardia nos momentos em que as recordações vinham à tona. Momentos como aquele no escritório.

            Quinn observava a amiga preocupada. Nunca vira Santana Lopez fragilizada, mas agora, depois de quatro anos sumida, a latina reaparecida em sua vida, mais machucada do que nunca. Quinn não sabia o que Brittany tinha feito, mas ela podia ver as conseqüências em cada pedaço do corpo de Santana. As piadas e os insultos continuavam... Mas só quem conhecia a Santana Lopez de verdade podia ver os pequenos sinais. Santana estava mais centrada, mais séria e aquilo não era fruto da maturidade. Quinn sabia, porque ela mesma estava daquela forma antes de Rachel chegar, ela também se escondia atrás de um personagem para enfrentar os dias.

            Quinn pediu um bife bem passado para as duas, acompanhado de alguns vegetais, purê de batata e salada, também pediu dois refrigerantes. Santana sequer escutou o pedido, estava perdida demais em seus pensamentos. Assim que a mesma senhora que trouxera os cardápios saiu, Santana finalmente ergueu os olhos. Quinn olhou gentil para ela e deu um sorriso encorajador, Santana sentiu-se subitamente melhor, a latina respirou e começou:

            - Tudo ainda é muito difícil para mim. Você me conhece melhor do que ninguém e sabe o quanto eu gostava dela.

            - Sim, eu sei... E isso só torna ainda mais difícil acreditar que vocês terminaram. – Quinn disse com um ar bondoso, ela apanhou a mão da amiga de novo e Santana fez uma careta, odiava demonstrar sua fraqueza. – Mas eu sempre soube também que você era o elo mais fraco ali.

            - Eu demorei a entender isso, na verdade, eu ainda não entendo. – Santana estava com dificuldades para falar, Quinn podia perceber pela hesitação dela em pronunciar as palavras, nunca dando um nome para o que sentia e Quinn sabia como fora difícil para a latina assumir que amava Brittany. Santana apertou a mão de Quinn levemente e a loira continuou a prestar atenção. – Eu ainda não entendo como Brittany pode me machucar da forma como ela fez. Não consigo entender depois de tudo que eu passei para ficar com ela.

            - O que aconteceu, S? – Quinn perguntou curiosa e incisiva, ela não agüentava mais ver a amiga sofrendo da forma que estava. Santana deu um sorriso cruel e as lágrimas tornaram a escorrer pelo rosto, Quinn se esticou e limpou-as com delicadeza. Santana fez menção de se fechar de novo. – Vamos falar sobre isso, eu prometo que vai ficar melhor no fim dessa conversa. Senão ficar, você pode continuar a me perturbar com suas piadinhas infames.

            Santana ergueu os olhos, surpresa com as palavras da amiga. Foi recepcionada com uma risada gostosa de Quinn e ela mesma acabou acompanhando a deixa. O coração ficou mais leve de súbito, Santana não sabia o que era ter amigos de verdade há quatro anos e só ela sabia o quanto era grata a Quinn naquele momento. A latina limpou as lágrimas e recolheu a mão, depois, juntou as próprias mãos sobre a mesa e respirou fundo antes de despejar a dolorida verdade:

            - Como eu te disse quando cheguei, eu acabei desaparecendo depois de um telefonema de Brittany. Na realidade, ela começou a mudar comigo depois do fim do meu primeiro ano na faculdade. Eu a deixei aqui e ela fez a promessa de me encontrar no ano seguinte, só que ela não foi e as coisas começaram a sair de controle.

            Quinn permaneceu calada, ela sabia a hora de falar e o momento não era aquele. Se interrompesse Santana agora, talvez a latina nunca mais conseguisse falar tão abertamente como falava agora. Mas ela observava as ações da amiga com preocupação e se Brittany fora capaz de destruí-la daquela forma, Quinn estava começando a odiá-la a partir daquele momento. Santana deu mais um suspiro e continuou sôfrega:

            - Eu juro que tentei, Quinn. Eu vinha para cá sempre que podia, passávamos feriados e férias juntas. Eu fui fiel como nunca fui, eu a amava... Na verdade, eu ainda a amo. Por isso me submeti à fidelidade, por isso decidi me jogar de cabeça nos estudos, por isso eu prometi que vinha buscá-la assim que terminasse meu curso. Só que Brittany não parecia mais tão animada quanto eu, na verdade... Ela começou a se fechar.

            Quinn engoliu em seco, ela sabia que o clímax da história de Santana estava chegando. A latina chorava mais agora e as lágrimas caindo rapidamente, Quinn esticava-se toda vez que uma gota escapava dos dedos trêmulos de Santana. A latina sorria triste e inclinava a cabeça, agradecendo, mais um suspiro e mais palavras:

            - Eu estranhei, mas não a pressionei. Até que um dia, no meio do meu terceiro ano, Brittany me ligou. Eu atendi animada, fazia alguns dias que eu não falava com ela por causa das provas. Ela me pediu para ficar calada porque ela precisava dizer tudo rápido e sem medo, ela sequer chorava. E ela disse que...

            A voz de Santana falhou e ela rendeu-se as lágrimas. Quinn apertou as mãos dela entre as suas e sufocou as próprias lágrimas que queriam cair. Santana e Sam eram o mais próximo que Quinn tinha de família desde que abandonara a mansão dos Fabray. Ela ergueu a face de Santana com um toque delicado do queixo e perguntou gentilmente:

            - O que ela disse, Sant?

            - Ela disse que não podia mais me enganar. – Santana disse tudo rapidamente, como se a velocidade das palavras fosse diminuir a dor. A latina olhou fundo nos olhos de Quinn e pareceu encontrar forças ali, pois seu tom de voz ficou ainda mais firme. – Aparentemente, nosso relacionamento esfriou com a distância e eu não percebi. Ela me contou que desde o final do meu primeiro ano, estava se encontrando com Artie e que em algum momento, os dois acabaram ficando. Desde então, ela não fazia objeções a ele quando se sentia carente.

            - Mas que filha da m...! – Quinn sufocou o palavrão furioso que sairia de sua boca porque, nesse momento, as bebidas chegaram à mesa. Santana tomou um gole de seu refrigerante, sufocando uma gargalhada sádica diante da amiga. Os olhos verdes de Quinn voltaram a ficar escuros e frios e Santana continuou:

            - Eu voltei a Lima na semana seguinte, querendo consertar as coisas... Estava disposta a perdoá-la e recomeçar. Mas assim que cheguei a casa dela, eu vi, pela janela que ela apresentava Artie para os pais. Ela nunca tinha me apresentado, Quinn. Foi ali que eu entendi que... Era o fim.

            Santana terminou sua narrativa com alguns suspiros pesados e algumas olhadas nervosas por cima do ombro, ela só não queria olhar para Quinn no momento. A loira pigarreou, chamando sua atenção e Santana viu a mesma expressão de HBIC na face da amiga, quase sorriu diante das lembranças. Quinn respirou fundo e disse severa:

            - Mas eu vi você no escritório, eu vi a foto que você segurava... Eu sei que você ainda não superou isso.

            - Não superei mesmo, Quinn. Minha situação com Brittany é quase a mesma existente entre você e a Rachel. Eu nunca vou superar, talvez pare de doer um dia, mas eu nunca vou esquecê-la. – Santana disse tudo com um sorriso inexplicável e Quinn percebeu que não era a única que tinha mudado ali. A latina deu uma piscadela e gargalhou. – Porém, eu sei que você não vai cometer os mesmos erros que eu. Eu sei que você vai proteger a Rachel, eu sei que você nunca vai deixá-la... A diferença está nas pessoas e você é muito diferente de mim. Eu sei que você demora a admitir seus sentimentos, mas quando tem certeza sobre eles, os carrega até o fim.

            - Bem é... Obrigada. – Quinn respondeu sem jeito enquanto corava, Santana continuou a sorrir para ela. A comida de ambas chegou e Santana sorriu diante do prato enorme diante de si. A latina apanhou o garfo e a faca e ergueu os olhos para Quinn que ainda detinha a mesma elegância para manusear os talheres. As duas se olharam e sorriram, restabelecendo a fina linha que as ligava desde sempre, Santana suspirou e disse:

            - E antes que você me pergunte... Eu não vim a Lima para procurar Brittany, eu voltei porque eu precisava me reencontrar e eu sabia que ao chegar aqui, eu teria você e os outros para me apoiar e olha que eu incluí até a Berry nessa equação.

            - E desde quando você a chama pelo sobrenome? O que aconteceu com os apelidos? – Quinn perguntou entre risadas entre uma garfada e outra, Santana terminou de mastigar o pedaço de bife e com o velho humor Lopez de volta, disse:

            - Você me fez falar, Fabray. Acho que posso fazer um esforço e chamar seu chaveirinho pelo sobrenome.

            - Você não presta, Lopez. – Quinn disse ofendida e com a sobrancelha arqueada, mas minutos depois, começou a rir da careta dramática de Santana. Quinn sentiu seu peito inchar de uma felicidade diferente de tudo que experimentara desde a chegada de Rachel... Era bom ter a Santana de sempre de volta, mesmo que essa fosse uma Santana muito marcada pelo que Brittany fizera.

            Por outro lado, Santana estava sentindo-se mais leve e ao mesmo tempo, mas pesada. Quinn previra o certo: de uma forma estranha, falar sobre Brittany tinha ajudado a afastar a loira de dentro de si aos poucos. Só que Santana tinha medo. Ela temia que, ao separar-se de Brittany e das lembranças, ficasse oca e vazia.

            Porque, para Santana Lopez, era melhor carregar a dor do que o nada dentro do peito.

###

            Santana deixou Quinn em frente ao prédio da amiga antes de voltar ao escritório. Sua cabeça ainda martelava tudo que a amiga tinha lhe dito, mas Santana tentava afastar esses pensamentos... Ocupando-se em se esquecer de Brittany, pelo menos naquele dia. Era muita informação para sua cabeça. Era muita dor depois de tanto tempo calada.

            O caminho até o escritório foi feito em silêncio, Santana detestava ligar o rádio em momentos como aquele. Tinha certeza que a Lei de Murphy conspiraria e ela acabaria caindo em uma estação de rádio com alguma música extremamente triste ao fundo... E tudo que Santana Lopez não gostava, era de se sentir humilhada.

            A latina chegou ao escritório e refez o caminho, subiu de elevador e caminhou distraída pelos corredores. Ouvia os sons de trabalho por trás das portas e aquilo lhe confortava, ao menos ainda tinha a advocacia para distrair-lhe a mente. Mesmo que Santana tivesse começado a faculdade por acaso, ela sentia-se bem com o que fora obrigada a fazer.

            Santana remexeu na bolsa cara de couro negro a procura da chave. O som do salto de seu scarpin ecoava no piso de mármore. Santana tirou o terninho que usava e ajeitou a camisa social durante o trajeto. Encontrou as chaves e respirou fundo, tomando mais um pouco de ar antes de virar o corredor e enfrentar a tarde que se estendia a sua frente. Parou em frente à sala 304 e colocou as chaves na fechadura, girou rapidamente e colocou o corpo para dentro.

            - Dra. Lopez? – A voz soou receosa e tímida, Santana colocou a bolsa dentro do escritório e virou-se em direção a voz. Seus olhos escuros encontraram uma bela mulher. A ruiva trajava calça jeans e camisa, tinha um cachecol escuro em volta do pescoço e trocava o peso do corpo a toda hora, brincando com o par de botas, era um pouco mais baixa que ela. Santana arqueou a sobrancelha e a ruiva corou, imediatamente. – Me desculpe, mas você é a Dra. Lopez... Certo?

            - Sim, me chamo Santana Lopez. – Santana respondeu na defensiva, cruzando os braços na frente do corpo. Aquela mulher estava amedrontando-a. Talvez fosse a beleza ou o ar elegante e refinado que lembrava Quinn. Os olhos verdes tinham um aspecto cinzento, diferente do aspecto dourado dos olhos de Quinn. O rosto era bem desenhado, quadrado e a pele era extremamente branca. Os lábios eram finos e rosados e estavam crispados, em sinal de nervosismo. A mulher estendeu a mão receosa e Santana a apertou, um pouco desconcertada. As duas mulheres trocaram um olhar intenso que provocou calafrios em ambas até que a ruiva disse afobada:

            - Desculpe, sou...

            - Pare de se desculpar, por favor. – Santana disse séria e fazendo sinal para que a mulher entrasse na sala. A ruiva balançou os cabelos que tinham um tom de cobre diferenciado e entrou no escritório rapidamente. Santana fechou a porta e foi sentar-se em sua poltrona. A mulher sentou a sua frente e mordeu o lábio antes de continuar:

            - Eu me chamo Julianne Urie, ouvi falar da sua chegada à cidade.

            - Suponho que precisa de um advogado, certo? – Santana sugeriu um pouco incomodada, aquela mulher estava lhe tirando o juízo e ela sequer sabia por que. A latina apanhou uma pequena agenda na gaveta e começou a passar as páginas, sem erguer os olhos. – Eu posso sugerir alguns muito bons. Não me leve a mal, mas cheguei a pouco na cidade e ainda não tive tempo de me organizar, não posso pegar um processo nesse estado...

            - Me desc...! – Julianne calou-se imediatamente quando viu que se desculparia de novo, Santana ergueu os olhos para ela e arqueou a sobrancelha observando a mulher sorrir envergonhada enquanto colocava a mão sobre a testa. A mão pálida tremia e os olhos que encontraram Santana estavam amedrontados, tirando todo o brilho do sorriso. – Eu percorri todos os escritórios de Lima, Dra. Lopez. Só me restou você.

            - E o que o seu caso tem de tão preocupante a ponto de ser tão ameaçador para a carreira de um advogado? – Santana estava interessada agora e se enganava quem pensava que era por causa da natureza do processo.

            Santana Lopez tinha uma curta carreira na advocacia, pouco mais de dois anos, mas sabia reconhecer certos tipos de clientes. E estava claro que aquela mulher tinha problemas com o marido. Santana podia ler a expressão insegura que ela carregava, assim como o receio e o pavor de ser vista em um escritório de advocacia.

            Santana tornou a erguer os olhos para a mulher e para sua surpresa, Julianne a encarava com uma energia bastante positiva. Parecia que, no meio de todo o medo e apreensão, ela ainda conseguia achar a coragem resguardada em algum ponto dentro de si. Julianne respirou fundo e levantou-se, observou os livros de Santana com interesse e respondeu:

            - Eu quero me divorciar de meu marido.

            - Mas isso é fácil, Srta. Urie. – Santana disse calmamente, a latina se levantou e caminhou até o que prendia a atenção de Julianne, não gostava de conversar com seus clientes sem olhá-los nos olhos, porque era ali que ela conseguia ver a sinceridade de suas palavras. Mas Santana sabia, de alguma forma, que não precisava olhar para Julianne. Só que aqueles olhos verdes acizentados lhe chamavam. – Tem filhos ou contratos conjuntos de posse?

            - Não e antes que a senhorita me pergunte, eu não sei se casamos em comunhão de bens ou se temos uma conta conjunta. Meu marido não me deixa ficar por dentro dos negócios. – Julianne respondeu rapidamente e Santana pode ver o receio passando pelos olhos dela. A latina abrandou a expressão, Julianne precisava de sua ajuda, o desespero estava presente em sua voz, mesmo que ela tentasse escondê-lo a todo tempo. Santana pigarreou e tornou a perguntar:

            - Srta. Urie, você ainda não me respondeu. Por que todos negaram ajuda a você?

            - Bem... – Julianne começou a falar, mas a voz pareceu falhar e ela fechou a boca instantaneamente. Santana observou a mulher ceder a sua frente, Julianne respirou fundo e baixou os olhos, depois suspirou pesadamente e engoliu algumas lágrimas. A ruiva caminhou de volta para a cadeira e Santana correu até o frigobar, para pegar uma garrafa de água. – Meu marido é Michael Urie, já ouviu falar dele?

            - Felizmente não, eu acho. – Santana respondeu irônica, entregando um copo de água para Julianne. A ruiva sorriu e ergueu os olhos, com a expressão mais leve. Santana sentiu seu interior revirar-se, uma sensação completamente nova e desconhecida, a expressão da latina se fechou. Julianne tomou um gole do copo de água e as mãos tremiam, ainda. Ela pigarreou e continuou:

            - Meu marido e eu nos mudamos para cá há alguns anos, somos de Nebraska. Michael é dono da maioria dos edifícios comerciais de Lima, inclusive desse.

            - Ah sim, não relacionei o sobrenome a empresa. Seu marido foi responsável pela modernização de boa parte de Lima, não é? – Santana perguntou um pouco interessada, escorando-se na mesa, próxima a Julianne. A ruiva tomou mais um gole de água e acenou com a cabeça. Santana suspirou, sentindo uma enxaqueca começar a incomodar. – Ele é poderoso, Srta. Urie. Tem certeza que quer se separar dele?

            - Por favor, Dra. Lopez... Eu ouvi falar sobre a senhora. E me disseram que você era a única que podia desafiar Michael de igual para igual. Eu tenho plena certeza do que eu quero e isso não envolve Michael ou aquela casa. – Julianne estava firme em suas palavras e os olhos dela pareciam suplicar, Santana suspirou e aproximou-se dela, segurando-se no encosto para braços da cadeira.

            Os olhos da latina pretendiam ser firmes e agressivos, mas ela estava estranhamente calma e confortável. Julianne permanecia obstinada, mesmo com a proximidade das duas. Santana respirou fundo e foi recebida por um cheiro de pêssego que quase a sufocou. A latina chacoalhou a cabeça e fechou os olhos, o calor que emanava de Julianne era quase que embriagante. Santana abriu os e encontrou os olhos verdes ainda mais escuros, observando-a.

            - Eu gosto que meus clientes sejam sinceros comigo, Srta. Urie. – Santana disse ofegante, se afastou bruscamente quando seus olhos procuraram a boca de Julianne. A ruiva agitou a cabeça, ela olhou o relógio e sua expressão ficou assustada bruscamente. Julianne apanhou a bolsa e ajeitou o cachecol, ela correu para porta e deu um sorriso de lado. Santana sentiu como se fosse cair da mesa a qualquer momento. Julianne acenou e ainda sorrindo, disse:

            - Estou sendo sincera, Dra. Lopez.

            Dizendo isso, a ruiva saiu do escritório e Santana ouviu os saltos dela ecoarem pelo corredor. A latina caminhou até a janela e viu os cabelos ruivos atravessarem a rua e sumirem na esquina. Santana bateu a cabeça no vidro, desejando que a bagunça que tinha dentro de si não ficasse ainda maior.

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            Quinn ficou enrolando em casa até receber uma ligação de Rachel dizendo que Charlie a liberara mais cedo naquele dia. A loira apanhou uma pequena cesta que continha algumas frutas e correu até a livraria. Rachel a esperava na porta, com um sorriso imenso no rosto enquanto ajeitava o casaco nos ombros. Quinn sorriu para ela e perguntou animada:

            - Por que Charlie te liberou mais cedo hoje?

            - Ele disse que não podia lidar com meus suspiros pelos corredores... – Rachel respondeu envergonhada e corando levemente, Quinn aproximou e deu um beijo em sua bochecha, atraindo a atenção de alguns pedestres. – Mas e você? Como foi o almoço com Santana?

            - Bem esclarecedor, na verdade. Acho que vamos nos tolerar por um tempo. – Quinn respondeu aliviada e com um quê brincalhão na voz. Seu coração parecia estar batendo normalmente agora, Santana esclarecera as coisas e ela se sentia bem já que a latina ainda confiava nela. Quinn começou a caminhar e Rachel a acompanhou, com um sorriso enorme nos lábios. – E esse sorriso, Berry?

            - Acho que você nunca vai saber a resposta para sua pergunta, Fabray. – Rachel respondeu com um ar teimoso e empurrando Quinn levemente, a melodiosa gargalhada da loira preencheu o espaço entre elas. Rachel olhou para Quinn com admiração, as pessoas olhavam para elas, mas sem estranhamento. Os olhos castanhos caíram na cesta que Quinn carregava, uma careta curiosa se formou na face de Rachel. – Para onde vamos, Quinn?

            - Você já vai saber e espero que não surte quando entender. – Quinn disse com um ar misterioso e apressando o passo enquanto ria, Rachel revirou os olhos e riu em seguida, tendo que correr atrás de Quinn na calçada. A morena respirou fundo e corou levemente quando viu Quinn olhando para ela, estava parecendo uma pobre adolescente apaixonada.

            Mas de certa forma, era aquilo que acontecia. Por mais que a idade e os anos batessem em sua porta, Rachel guardara aquele sentimento por tanto tempo que, de certa forma, sentia-se voltando no tempo quando o vivenciava. Quinn caminhava ao seu lado, na verdade... Parecia deslizar pela calçada, Rachel nunca se acostumaria com a perfeição da ex-cheerio. Mas podia se acostumar com a ideia de que Quinn Fabray começava a ser sua.

            Perdida em seus pensamentos, Rachel não percebeu que Quinn parecia nervosa, a loira temia a reação de Rachel quando visse para onde iriam. O movimento nas ruas diminuiu e Quinn se arriscou, apanhando a mão de Rachel com a sua livre. A morena foi pega de surpresa e sorriu. Quinn se aproximou e transformou o entrelaçar de dedos em um meio abraço. Rachel aconchegou-se ao corpo de Quinn que estava tornando-se familiar ao dela, sentiu a ponta dos dedos da loira percorrem sua nuca e afagarem seus cabelos. Depois, um beijo no topo de sua cabeça. Rachel fechou os olhos, sentindo e memorizando cada movimento.

            - Chegamos, Rach. – A voz de Quinn soou preocupada e angustiada, Rachel abriu os olhos devagar e rapidamente, sua expressão se fechou. Ela olhou do edifício para Quinn, os olhos traíam suas emoções e ela estava visivelmente incomodada por estar ali de novo. Rachel separou-se de Quinn e perguntou ofendida:

            - O que estamos fazendo no McKinley, Quinn?

            - Você confia em mim? – Quinn questionou afoita, mas tentando manter-se firme para apoiar Rachel que parecia estar fora de si. A morena deu as costas ao prédio e fez menção de voltar, mas Quinn a puxou de volta, ficando bem próxima a ela. Quinn afagou os cabelos castanhos e Rachel tentou se desvencilhar, a loira beijou-lhe os lábios delicadamente e permaneceu próxima, olhando para os olhos castanhos. – Você não confia em mim, Rachel?

            - Não é questão de confiar, Quinn. Eu não quero entrar lá. – Rachel resmungou emburrada e afastando-se de Quinn, a loira encolheu-se incomodada e desviou os olhos de Rachel. A morena sentiu-se culpada e se aproximou, ela segurou a mão livre de Quinn e a loira ergueu os olhos para ela. – Eu não posso e nem consigo entrar lá... É muita coisa para mim.

            - Eu vou estar com você, eu não vou te deixar sozinha ali dentro. Só quero que você se lembra de algumas coisas... Coisas boas, eu prometo. – Quinn disse mais tranqüila, com o sorriso gentil voltando aos lábios. Rachel mordeu o lábio, parecendo indecisa e nervosa, Quinn deu uma sonora gargalhada e beijou os lábios dela com carinho. A mão de Rachel afagou o rosto de Quinn e a loira sorriu, ainda próxima a ela. Quinn virou o rosto e beijou-lhe a palma da mão, antes de entrelaçar seus dedos com de Rachel.

            A morena deixou-se ser guiada para dentro do prédio, Quinn fazia tudo devagar, para que ela se acostumasse com a ideia. Rachel sequer notou que as portas estavam trancadas e que Quinn abriu com uma chave que tinha no bolso da calça. Antes de entrar, Quinn olhou de lado para Rachel e acenou para porta, Rachel suspirou e disse:

            - Tudo bem, eu entro. Só que não vamos ficar mais do que o necessário.

            Rachel não se arrependeu, porque nesse instante, Quinn abriu um sorriso e a puxou para dentro, colocando o corpo à frente. As duas caminharam sem pressa e Quinn observava Rachel que se agarrara a sua mão enquanto era invadida pelas lembranças de seu período no McKinley. Rachel sorriu diante da situação, atravessara aqueles corredores agarradas a Finn e agora, estava de volta com Quinn a puxando. Totalmente inesperado e irônico.

            Se Rachel fechasse os olhos, ela ainda podia ouvir os sons daquela época. As batidas nos armários, os passos pesados dos jogadores de futebol, as conversas das cheerios, até mesmo o som do slushie sendo jogado em seu rosto Rachel se lembrava... Querendo ou não, Rachel ainda estava ligada ao McKinley, independente de lembranças boas ou ruins. Lima era parte de sua vida e o McKinley, parte de sua história.

            Rachel riu diante de seus pensamentos e se aconchegou ainda mais em Quinn. A loira gargalhou e recebeu de bom grado o carinho que Rachel fazia em suas costas. As duas pararam em frente a galeria de troféus do McKinley. Rachel se afastou de Quinn e comentou, enquanto observava os troféus:

            - Eu nunca vou me acostumar com o fato de você ter o seu nome em quase todos os troféus desse lugar.

            - A Treinadora Sylvester também tem o nome na maioria deles, Rach. – Quinn respondeu envergonhada, caminhando até onde Rachel estava e fazendo carinho na nuca da morena. Rachel sorriu e balançou a cabeça antes de dizer:

            - Mas não foi ela que levou as Cheerios a três campeonatos seguidos.

            - Claro que não, ela levou a sete campeonatos... Depois decidiu parar por três anos e quando voltou, conseguiu mais quatro campeonatos. – Quinn respondeu sarcástica e provocou ainda mais risos em uma Rachel Berry que parecia ignorar o seu rubor ao ser elogiada. Rachel ergueu os olhos e se aproximou de Quinn, enlaçou a cintura da loira e a puxou para perto, pincelou seu nariz ao dela e disse:

            - Só que a Treinadora Sylvester não era uma loira linda com um corpo incrivelmente perfeito.

            - Ela pode ter sido, nós não a conhecemos antes. – Quinn murmurou corada enquanto abaixava a cabeça, Rachel mordeu a bochecha dela levemente e beijou o local antes de partir para os lábios e dar um beijo rápido. Quinn tentou manter os lábios próximos, mas a morena se afastou e, sorrindo maliciosamente, disse:

            - Tenho certeza que ela não era tão linda e interessante quanto você, Fabray.

            - Ok, Berry. Vamos nos concentrar em você e não em mim. – Quinn continuou a corar e puxou Rachel pela mão através do corredor, Rachel gargalhou e Quinn suspirou enquanto sentia a morena se soltar e abraçar a sua cintura pelas costas. Rachel deu um beijo em seu ombro e mordeu por cima da blusa, depois tornou a apanhar a mão de Quinn enquanto a loira se arrepiava por inteiro.

            As duas continuaram a caminhar enquanto Rachel já olhava mais tranqüila para as salas de aula, relembrando sua época de colégio. Ficou um pouco para trás e Quinn continuou a caminhar, observando a loira, Rachel quase pode ver a postura de HBIC nela... Rachel sorriu, talvez sempre tivesse sido apaixonada por Quinn, afinal. Quinn parou em frente a porta e virou-se para Rachel, a morena rompeu a distância que as separava e as duas entraram na antiga sala do coral.

            Ao contrário dos outros locais da escola, a sala tinha mudado. Quinn deixou a cesta sobre a mesa e colocou as mãos nos bolsos traseiros da calça. Rachel caminhara a sua frente e tocava nos equipamentos musicais recém-adquiridos pela escola e nas cadeiras que estavam posicionadas da mesma forma de sete anos... Rachel sorriu quando tocou no piano e virou-se para Quinn que sorria para ela, a loira respirou fundo e disse emocionada:

            - Eu te trouxe aqui para você se lembrar do que era e do que ainda é, Rachel.

            - Mas Quinn, eu... – Rachel tentou responder, mas as palavras não são saíram porque as lembranças ainda a invadiam. Tantos solos, tantas brigas, tantos ensaios e Rachel ainda não se sentia pronta para voltar a tudo aquilo. A música lhe trazia boas lembranças quando estava em Lima, mas ao deixar a mente lhe levar até Nova York, ela era invadida pelo sofrimento e pelo medo. Quinn se aproximou dela e a envolveu em seus braços, a loira a direcionou para outro extremo da sala e apontou para a parede.

            Imediatamente, as lágrimas chegaram aos olhos castanhos. Rachel colocou a mão sobre a boca e respirou pesadamente, Quinn a puxou para perto de novo e a morena se permitiu curtir o cafuné nos cabelos enquanto ainda olhava para a imensa foto do local. Mr. Schue não colocara aquela foto ali à toa, era o lugar de maior destaque na sala e estava ao lado do troféu das Nacionais de 2012. Na foto, os membros do New Directions acenavam e sorriam. Rachel estava, inexplicavelmente, no colo de uma Quinn Fabray alegre que recebia um abraço sem jeito de Santana Lopez.

            - Lembra-se disso? – A voz de Quinn se fez audível no meio das lembranças e Rachel soluçou, antes de esconder a cabeça no peito da loira. Quinn beijou a cabeça de Rachel e respirou fundo. – Eu quero que você se lembre do que a música foi e do que ainda é na sua vida, Rachel... Você sempre foi uma estrela e eu sempre te vi brilhar. Menos agora.

            - Meu brilho não vai voltar com a música, Quinn. – Rachel disse fria enquanto desviava os olhos da foto e se apertava ainda mais contra o corpo magro e esguio de Quinn. A loira esperou pacientemente até que a respiração dela voltou ao normal, Rachel ergueu os olhos vermelhos e sorriu, sem graça. Quinn tirou algumas mechas do rosto de Rachel e respondeu:

            - Eu não garanto isso, eu não sei o que aconteceu em Nova York para você estar tão machucada, Rachel... Mas eu estou te propondo uma chance, um pequeno recomeço. Será que você ainda é a mesma Rachel que eu conheci e vai se permitir isso?

            Pela sobrancelha arqueada de Quinn, Rachel percebeu que a loira estava desafiando-a e se tinha uma coisa que Rachel Berry adorava, eram desafios. A morena limpou as lágrimas que restavam e deu alguns tapas nos ombros de Quinn, a loira riu e ficou aliviada quando viu um brilho conhecido voltar aos olhos da morena. Rachel apontou o indicador para ela e disse autoritária:

            - Eu vou tentar, mas não te garanto nada, Fabray.

            - Eu fico feliz, Rachel... De verdade! – Quinn respondeu aliviada antes de abraçar o pequeno corpo de Rachel e girá-lo no ar. Rachel riu e deixou-se levar por aquele novo desafio, ela beijou o pescoço de Quinn e agradeceu, sussurrando no ouvido da loira. Quinn corou e a puxou em direção a cesta que, para o alívio de Rachel, continha uma quantidade formidável de frutas e sucos.

###

            Sam estava bebendo uma cerveja tranquilamente em seu apartamento quando a campainha tocou. A careta confusa do rapaz revelou que ele não esperava ninguém naquele dia, sabia que Quinn sairia com Rachel e que o apartamento em frente estaria vazio, na verdade, ele estava se sentindo solitário no momento. O rapaz ligou a TV e foi até a porta.

            - Eu vou querer uma cerveja também, Evans. – Santana Lopez tinha aquele mesmo sorriso de lado e a mesma expressão de desprezo. Sam revirou os olhos, tudo o que ele não precisava era de Santana lhe enchendo o saco naquele dia. O rapaz abriu caminho e Santana entrou olhando tudo com nojo, a latina jogou a bolsa e o blazer em cima do sofá enquanto Sam apanhava uma cerveja e a abria na cozinha. O rapaz entregou a garrafa para ela e perguntou:

            - Sem querer sem mal educado, mas o que você está fazendo aqui?

            - Quinn está com o hobbit e você é o mais próximo que eu tenho de um amigo, não queria ficar sozinha hoje. – Santana respondeu simplista e jogando-se no sofá. Ela olhou de esguelha para o jogo de futebol americano que era transmitido e franziu o cenho quando certo jogador foi focalizado pela câmera. – E eu ainda não acredito que você se humilha vendo o Patriots jogar.

            - Eu não me humilho, só não tinha nada na TV. – Sam respondeu nervoso e remexendo-se incomodado em sua poltrona. Era mentira, a verdade é que ele queria estar no lugar daquele jogador, a verdade era que Sam queria voltar no tempo e ter se dedicado ao futebol. Santana bufou impaciente e contra-atacou:

            - Nós dois sabemos que você queria continuar a ser quaterback, Sam. Caso contrário, não estaria trabalhando numa loja de materiais esportivos.

            - Ok, Santana! – Sam quis gritar, mas a voz dele saiu amargurada e ele tomou um gole de cerveja, procurando retomar a calma. Santana olhou preocupada para ele. – Eu queria ter continuado a jogar e queria ter disputado a posição com Finn no último ano, talvez fosse eu no lugar dele nessa noite!

            Em seguida, o rapaz direcionou seus olhos para a TV. O quaterback do New England Patriots era apresentado e ovacionado, Finn Hudson ainda tinha o mesmo sorriso bobo, mas ele estava sério agora e chamava o time para perto. Santana semicerrou os olhos e olhando decepcionada para a TV, disse:

            - Quem diria que de todos nós, ele seria o que faria mais sucesso.

            - Podemos parar de falar sobre ele? – Sam perguntara um pouco irritado e apertando o descanso para braço da poltrona. Santana deu de ombros e eles mudaram de canal, era hockey dessa vez. – Afinal, o que você está fazendo aqui?

            - Estou me sentindo solitária. Algum problema? – Santana retrucou um pouco mau humorada e dando sua melhor bitch face para Sam. A verdade era que Santana tinha medo de voltar para seu apartamento, sabia que passaria a noite toda pensando em Julianne Urie. A expressão de Sam se suavizou e ele foi até o sofá, sentando-se ao lado de Santana e dando um abraço de lado nela. Santana tentou se afastar, mas Sam a puxou para seu peito e a latina ficou ali, sentindo o amigo afagar seus cabelos e dizer:

            - Somos dois, S.

            - Só não ache que isso é uma indireta, você pode ser lindo... Mas eu continuo sendo lésbica, Sam. – Santana dissera com uma gargalhada e Sam apertou seus braços, a latina gemeu frustrada e esmurrou o peito dele. Foi a vez de Sam rir, ele fez mais cafuné em Santana e disse irônico:

            - Acho que deveria ficar feliz, minhas duas amigas lésbicas me acham lindo.

            - Acredite, isso é muita coisa vinda de mim e da Quinn, considerando que ela já te namorou também. – Santana continuou com um tom brincalhão e os dois amigos se entregaram as risadas. Sam encostou a face na cabeça de Santana e respirou fundo, sentindo todo o conforto que uma boa amizade podia trazer, claro que ele ainda era apaixonado por Mercedes, mas Santana estava lhe dando algo que a outra nunca seria capaz de dar, consolo. Santana remexeu nos botões da camisa dele, um pouco nervosa e Sam perguntou preocupado:

            - Algum problema, S?

            - Ainda não, Sam... – Santana respondeu insegura e ergueu os olhos para o amigo, Sam continuou preocupado e se afastou, dando a ela o espaço necessário para respirar. Santana baixou os olhos e passou a mão sobre a testa, tomando um gole da cerveja em seguida. Tentou dar seu melhor sorriso e Sam correspondeu. – Eu só preciso falar com Puck, ele ainda está trabalhando na delegacia?

            - Sim, por quê? – Sam perguntou curioso e confuso, antes de se levantar e apanhar um cartão que Puck lhe deixara caso precisassem dele. Entregou a Santana que sorriu e tornou a beber de sua garrafa. Ela sorriu agradecida para o amigo e disse animada:

            - Porque eu vou precisar dele para enfrentar Michael Urie.

            Pela expressão de Sam, Santana sabia que enfrentaria um inimigo tão ou mais poderoso que ela.

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Notas finais do capítulo

O que acharam?
Eu decidi explorar mais o drama da Santana e também explorarei mais do do Sam... Espero que vocês tenham gostado de saber o que aconteceu com a latina. E o que acharam da Julianne? Caso queiram uma imagem melhor dela, eu usei a atriz Jessica Chastain como modelo *-*
E Faberry? Sinto que as pessoas vão se apaixonar pela Quinn depois desse capítulo... Mesmo com pouca interação, acho que entenderam o quanto ela está lutando pela Rachel, não é?
Espero que tenham gostado, comentem, por favor!
Beijos e até a próxima (: