Almas Prometidas escrita por ChatterBox


Capítulo 5
Capítulo 5


Notas iniciais do capítulo

E para quem estava esperando ansiosamente o beijo... *-*



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         As batidas da porta me obrigaram a atende-la. A abri e lá estava ele, recostado na porta de cabeça baixa, exatamente como na noite em que veio buscar seu carro.

Eu não me mexi, não demonstrei qualquer sentimento, estava ainda mais fria aquela manhã. Ainda tinha a lembrança nítida do que tinha feito e de que fui recordada no meu pesadelo na noite passada.

Sorriu com o mesmo ar de antes, querendo me provocar.

 - Te ofereci carona, lembra?

 - Lembro.

Respondi, dura como pedra.

  - E você aceitou.

 - Vamos logo com isso.

Adiantei-o, saí de casa e fechei a porta atrás de mim. Eric franziu o rosto, sua expressão era uma mistura de intrigado e impressionado. Era mesmo a minha intenção de que ele percebesse como eu tinha mudado de atitude aquela manhã. Percebi que estava me preocupando de mais com ele, com o que ele fazia ou o que ele pensava. Eu não podia mostrar pra ele que estava conseguindo o que queria, não podia mostrar o quanto aquilo me provocava.

 - Tudo bem.

Eric pôs as palmas da mão pra cima, rendendo-se. Não olhei pra ele, apenas segui em frente em direção ao seu carro, como se fosse meu único interesse. O que de fato era.

Entrei no carro sem rodeios, fechei a porta e fiquei completamente virada pra frente, com os braços cruzados, não olharia pra ele, não falaria com ele, seria só uma carona. Fiquei esperando que andasse com o carro. Colocou a chave na ignição, mas parou.

 - Ta legal. – Disse em tom de rendição. Ali, só nossa voz ecoava dentro do carro, senti que seríamos eu e ele, com a chance de resolver tudo sem interrupções. – O que aconteceu?

 - Como assim?

Fingi não entender.

 - Você.

 - Eu o quê?

 - Escuta, não é possível que tenha ficado tão chateada só pelas brincadeiras que eu fiz.

 - Ah, não? – Virei-me pra ele, irada. – Pois é exatamente por isso que eu estou chateada.

Discuti com ele, estava na hora de acabar de uma vez com aquele jogo. Seria ali, naquele momento, ou nunca mais.

 - Não foi a minha intenção te fazer mal.

 - E qual foi sua intenção?

Ele falava em seu tom normal, mas eu não conseguia sair do meu tom de grito. Ele me irritava, muito, fazendo qualquer coisa. E parecia que não era só pelo que tinha feito comigo no passado, mas ultimamente não tenho conseguido tolerar sua presença, mesmo quando não faz nada, me tira do sério.

 - Só queria te mostrar que eu não sou um cara ruim.

Quando disse isso, eu praticamente quis explodir. Não sou um cara ruim? Parecia que ele tinha se esquecido do que tinha feito comigo. Não podia ousar dizer que não era uma cara ruim depois do que fez.

 - Você é um canalha.

Decretei, e virei-me pra frente a fim de dar minha opinião final, nada mudaria o que eu pensava dele, era isso que queria que soubesse.

 - Um canalha? Você nem me dá uma chance!

 - Não preciso dar, sei bem quem você é.

 - Quer saber... – Irritou-se, girando a chave na ignição, começou a manobrar para fora da garagem. – Vou deixar você logo na escola, não adianta falar com você.

 - E até parece que adianta falar com você!

 - Não me interessa mais.

 - Ótimo, aproveite sua vida longe de mim a partir de hoje.

 - Lara... – Ia falar mais alguma coisa, mas pausou para respirar, algo fazia com que ele não quisesse brigar. – Não é possível que me odeie tanto assim.

 - Pois eu odeio. – Afirmei, convicta. – Muito.

 - Mas você tem que me aturar.

 - Por que eu faria isso?

 - Porque eu salvei você.

Abri a boca, incrédula. Estava me chantageando.

 - Não me diga...!

Pronunciei com ironia.

 - Pode tentar fugir, mas você me deve essa.

 De uma certa forma, ele estava certo. Se pôs em perigo por minha causa e largou Jessica no meio de um tiroteio para me salvar, mas ainda não tinha um motivo. Seria esse o motivo? Queria ter um motivo para me chantagear depois?

 - Então por isso me salvou? – Indaguei. Parece que eu estava virando o jogo agora. – Queria ter um motivo pra me obrigar a fazer o que você quer?

 - Não. Não foi isso.

 - Então o quê?

Minha voz aumentou. Estava sem paciência.

 - Foi porque eu quis. Eu quis te salvar, não a Jessica.

 - Como pode fazer isso? Ela é sua namorada. Eu não sou nada.

 - Você não sabe o quanto está errada.

 - Ah, é mesmo? – Naquele momento. Eu me lembrei da quinta série. Não sabia se tinha forças para falar sobre isso, mesmo que fosse para coloca-lo contra a parede. Mas não podia fugir, precisava saber. – Então por que me deixou?

Eric parou o carro, que antes se movia pela rua, seu rosto esbanjava a expressão de ter acabado de tocar no assunto que temia, olhou durante segundos pro nada, como se a lembrança lhe apavorasse.

 - Não vamos falar sobre isso. – Sua voz soou como um apelo quebrando o silêncio. – Vai machucar á nós dois.

 Não conseguia entender o porquê de não gostar de falar sobre isso, já que ele tinha me abandonado, por vontade própria. Também não sabia bem porque, mas acabei deixando que fugisse do assunto. Eu não estava pronta para aquele assunto, ainda estava frágil sobre isso, á ponto de entrar aos prantos á qualquer momento.

 De alguma maneira, o jeito que ele pediu para não falar nesse assunto, como se também fosse difícil pra ele, me fez perdoá-lo, mesmo que não totalmente, mas me sentir um pouco melhor, mesmo que fosse mentira, queria acreditar que era verdade, ou me feriria ainda mais.

 - Não me deixe na porta da escola.

O silêncio se quebrou quando pedi. Ele olhou pra mim brevemente, como se estivesse comprimindo a mágoa por ter pedido isso, eu sabia bem que estava parecendo que nada que falava funcionaria, depois deu de ombros.

 - Ta bom. – Um minuto de silêncio. – Mas talvez essa vontade toda de fugir de mim seja amor, Cambrige.

Soltou aquilo em tom de zoação. Me irritei no mesmo momento. Não podia sequer mencionar isso. Eu estava completamente livre da paixão que sentia por ele. Certo...?

 - Não seja ridículo. – Fiz uma careta. – Só não quero que os outros pensem que tenho alguma coisa com você. E não quero confusão com sua namorada.

 - Se estiver com ciúmes dela posso dar um jeito nisso.

Bufei.

 - Ficarei bem feliz se fizer o favor de contar pra ela a verdade, mas não tenho ciúmes.

Lhe disse.

Vi a escola se aproximando. Parou o carro á alguns metros longe da entrada pra que eu pudesse saltar.

 - Está bom aqui?

Me perguntou.

Eu não sabia muito bem como isso aconteceu, mas tinha conseguido me entender com ele. Á ponto de ter um diálogo que não envolvesse nenhum berro ou grito estridente. Eric estava calmo agora, parecia sutil e familiar, como o antigo Eric, o Eric do ensino fundamental um.

 - Está. – Respondi. – Obrigada.

Agradeci a carona, sorrindo pra ele. Pus a mão na porta com a intenção de abri-la, mas parei quando senti ele tocando meu braço.

 - Espere.

Pediu. Depois ergueu um aparelho celular, parecia que estava nas mãos dele á muito tempo, mas só tinha percebido ali, começou a teclar rápido os botões, mas algo me parecia familiar. Só depois vim reconhecer, era o meu celular, não sabia quando ele o pegou, mas não tinha sequer dado falta até ali. Eu cheguei a pensar em ficar chateada de novo, mas consegui fazer meu sangue esfriar, não valeria a pena brigar, já era comum dele fazer essas coisas. Esperei para entender o que ele estava pretendendo fazer.

Quando terminou de teclar, esticou o braço e o enfiou no meu bolso de trás, pelo menos não pretendia roubá-lo. Me controlei para não mostrar como fiquei nervosa com aquele contato. Quando tirou a mão do meu bolso, achei que fosse voltar para sentar no seu banco, mas ele continuou pendurado no meu ombro, me olhando de perto. Eu pisquei várias vezes com a intenção de me distrair, não podia deixar que meu corpo percebesse que estava tão perto dele, ou acabaria fazendo alguma coisa que eu não queria.

 - Salvei meu número no seu celular. Se precisar de qualquer coisa, ligue.

Aquilo soou como uma ordem, mas resolvi ignorar. Eu também não queria o telefone dele, mas não tinha tempo pra reclamar, percebi que debater o que ele fazia lhe servia de incentivo, então estava começando a agir de acordo, ser solúvel. Nada de irritações.

 - Ta legal.

Me afastei agoniada com o contato, pensava coisas de mais quando ele estava tão perto. Abri a porta do carro e me joguei pra fora, me dei o trabalho de caminhar pela calçada indo para a escola. Seguiram-se três minutos antes que ele me passasse com o carro, devagar, como se quisesse marcar sua presença. Fiquei ali assistindo o seu FIAT Freemont preto seguir e estacionar á alguns metros no estacionamento do Road Castle High.

A caminhada não durou mais que cinco minutos até o colégio. Continuava tendo visões de Eric. Ainda não era possível acreditar que, três dias atrás, era um estranho e agora, já tinha jantado na minha casa e andado no seu carro duas vezes. Não deveria gostar de como as coisas estavam acontecendo, mas de algum jeito, eu estava.

Não conseguia negar que tinha gostado disso. Não das brigas, mas da nossa última conversa, sozinhos, num carro e finalmente começando a nos entender depois de quatro anos sem nos falar.

Eu sentia que estava começando a me render. Vi que na verdade, sentia falta dele em minha vida. Eric fazia parte dela assiduamente antes e de repente, começava a não existir mais. Era isso que tinha me magoado profundamente quando me deixou. Eu queria ele comigo, e não conseguia suportar a ideia de que tinha me rejeitado quando eu á anos lutava para esconder que era louca por ele. Não conseguia aceitar que ele tinha sido tão injusto comigo.

Mas a verdade era outra agora. Por mais que ele fosse um canalha, e que ficasse com milhares de garotas ao mesmo tempo, eu precisava dele. Precisava dele em minha vida e sentia uma ansiedade desesperadora de tê-lo comigo de novo. Não como namorado, mas como amigo, mesmo que não fosse possível restaurar a nossa amizade, queria ter a sensação de que ele ao menos fazia parte da minha vida, o mínimo que fosse.

E não conseguia descrever o que era. O que era isso, essa vontade incontrolável de ficar perto dele, a fome de ter sua presença e que agora eu via com clareza. Precisava de Eric. E era esse o motivo de tudo o que tinha acontecido. A quinta série. Quatro anos depois, ainda parecia ter sido ontem. Como a mágoa continuava vívida em mim, mesmo depois de tanto tempo. Mesmo que fôssemos muito amigos, qualquer pessoa teria esquecido até mesmo uma perda de um ente da família em quatro anos, mas eu não. Continuava sabendo que ele tinha me rejeitado. E o motivo? Era óbvio. Eu precisava dele. Não importava quantos anos se passassem, ainda continuaria te querendo, loucamente e com a mesma intensidade de antes. E agora eu via, quando vi a sensação de segurança quando entrei no seu carro aquela noite e aspirei o cheiro dele de novo. Só estava tentando fugir, mas não iria conseguir. Precisava de Eric e não sabia o porquê, mas precisava. E não podia continuar mentindo.

Talvez devesse esquecer de uma vez o passado, não iria adiantar tentar entender isso, quanto mais quando sabia que no final não conseguiria fugir dele. Já que não podia tirá-lo de minha vida, a única maneira de ser feliz era deixar com panos mornos. Esqueceria o que houve e voltaria a tê-lo em minha vida, exatamente como nunca devia ter saído.

Entrei na sala de geometria, tinha a impressão de que ela abrigava mais de um milhão de estudantes, estávamos todos conversando e discutindo espalhados sobre suas mesas. Rick estava na sala. O vi sentado numa mesa na última fileira da sala de aula. Não me viu de primeira, escrevia alguma coisa num papel. Soltei-me pela sala indo até ele e sentei na mesa que estava á sua frente.

Abaixou os olhos para o caderno durante mais dois segundos antes de me saudar.

 - Oi...

Ainda concentrava-se no papel. Olhei por cima de seus punhos tentando enxergar o que rabiscava nele. Tinham alguns textos uns abaixo dos outros, muito bem organizados, mas com uma letra tão fina que não conseguia ler.

 - Não fez esse trabalho ainda?

Só reconheci que era o trabalho de história quando li o título, estava escrito numa letra maior no topo da folha de papel.

 - Não... – Não tirou os olhos da folha. – Não mesmo, estou atrasado.

Grunhiu riscando ainda mais forte com a caneta na folha.

  - Escuta, preciso de ajuda.

Lancei o meu assunto, precisava de um ombro amigo, rápido.

 - Precisa é...? – Rick coçou a cabeça, como se já estivesse muito atarefado, mas no fim resolveu me ouvir. – O que aconteceu? Vai, conta.

 - Eric aconteceu.

Bufei revirando os olhos. Ele não se preocupou de mais, será que Stella tinha abrido o bico?

 - Estou sabendo dele. Te emprestou o carro, não foi?

Rick conseguia ser um amigo prestativo sem lhe dirigir o olhar, seu tom era genial com uma pitada de ar sobrecarregado.

 - Foi. Mas não faz pouco caso, vai. Ele é um panaca. O odeio, muito.

 Pedi.

 - Não o odeia, você o ama. E isso não é novidade pra ninguém.

Abri a boca, incrédula. Nunca contei isso pra Rick, só contei isso pra Stella, que com certeza nunca contaria para ele se eu não quisesse, nunca contei isso pra ninguém. Ou Rick tinha me espionado, ou tinha uma visão de melhor amigo super apurada.

Não pareceu chocar-se com minha surpresa, nem olhou pra mim, continuou escrevendo milhares de rabiscos na folha de papel do trabalho.

 - Não quero que saiba disso.

Disse-lhe, sabendo no fundo que já era tarde de mais. Ele me olhou de cima á baixo por cima dos óculos, sua imagem dizia “Jura?”.

  - Fala sério, você fica vermelha como um tomate quando fala dele.

 - Não fico não.

Toquei meu rosto com um muxoxo.

 - Tudo bem, se acha que não...

Deu de ombros, mas eu sabia que ele estava certo. Rick era o tipo de gênio que poucos conheciam, sabia de tudo, via tudo, sacava tudo, era o amigo perfeito pra tudo. Multiuso.

 - Mas não é só isso... – Suspirei com profunda tristeza, lembrando-me de quem agora habita a antiga casa dos Becon. – Ele agora é meu vizinho.

Rick começou a tossir. Acho que foi com o susto, quando a tosse se cessou ele berrou:

 - O quê??

 - Isso mesmo.

Sibilei.

 - Não pode ser, agora ele mora na casa dos Becon??

 - É, e jantou lá em casa ontem.

 - Ah, não, sua mãe convidou?

 - Pode apostar.

 - Acho que você tem que ficar longe dele, se depois de quatro anos você ainda quer ficar perto dele, não vai demorar pra você cair na conversinha dele quando estiverem perto de mais. Você sabe que ele é encrenca.

Rick aconselhou, balançando a cabeça pros lados.

 - É tarde de mais. – Lamentei. – Ele me obrigou a vir pra escola com ele hoje. Nós conversamos e...

 - Não diga mais nada, você beijou ele?

Rick tinha o olhar desesperado, como se já tivesse me dado a sentença de morte quando eu neguei freneticamente:

 - Não! Não, isso não. Isso nunca. Não posso me entregar desse jeito.

Isso estava fora de circunstância. Beijá-lo seria fatal pra mim. Como admitir que não tenho outra saída senão amá-lo.

 - Ainda bem. – Rick soltou um suspiro de alívio. – Não tem problema se tomar cuidado, se tomar muito cuidado, até uma pessoa decidida como você cairia nas enrolações de Eric Burton, não se esqueça de que ele me convenceu a fazer o trabalho dele de química na sétima série.

 - Não esqueço.

Falei. Rick não tinha prova de como Eric era bom com enganações até que ele conseguiu o enganar.

 - Mas mudando de assunto... – Trocou de tema. – Tenho uma solução pro problema da Stella, que talvez também seja a solução pro seu problema.

 - Tem?

O problema de Stella era com garotos e Rick não era o tipo de garoto que sabia como ajudar nisso, mas me surpreendeu naquele dia:

 - Tenho dois amigos. Seriam o que vocês chamam de gatos. – pronunciou com indiferença. - Acabaram de chegar na cidade, conhecia eles do interior da minha tia, e eles quiseram conhecer vocês.

 - Mesmo...? – Deixei não transparecer muito a dúvida. Rick não era do tipo conservador que não nos deixava namorar, mas também nunca nos arranjou partido. – É, seria uma boa.

Lancei. Estava mesmo pensando em me abrir para outros. Seria a oportunidade de ter certeza se podia me libertar de Eric ou não, ainda não estava nada feliz com a ideia de estar quase me rendendo àquela situação.

 - Vamos para o Mega Z essa noite. Lembra? Fliperama, loja de conveniência e boliche.

Mega Z, era o ponto de encontro de quase todos os jovens nas noites de Road Castle. Tinha atração de todos os tipos, por isso era muito interessante.

 - Ótimo. – Sinalizei. – A gente pega carona com a Stella.

 - É. Eu já avisei a ela á propósito, ela está mais do que interessada, se é que me entende.

 - Stella está sempre se sentindo solitária. – Balancei a cabeça numa baforada de reconhecimento. – Mas dessa vez vai ficar com alguém legal, não é Rick...?

Tinha que ter certeza disso, lancei lhe um olhar de confiança para que não conseguisse mentir.

 - Esqueceu quem eu sou?

Fez um sinal apontando pra si mesmo, Rick estava sempre bem organizado.

 - É claro.

Ri, virei pra frente para assistir a aula.

Eram seis da noite quando chegamos no Mega Z no carro de Stella, um Chevrolet Aveo 2007 branco.

O Mega Z era parecido com um posto de gasolina pela entrada e saída constante de carros. Ficava um pouco afastado da cidade, na rodovia que levava para outras metrópoles. Tinha o nome de neon em uma placa alta e um estacionamento iluminado entre várias árvores altas, movimentado por várias pessoas em frente á seus carros conversando e fazendo apostas. O lugar era todo térreo, com portas de vidro levando a cada lugar: boliche, fliperama e loja de conveniência. O som e as luzes dos jogos do fliperama iluminavam as paredes de vidro.

Soltamos do carro, Stella deu um rodopio em cima dos saltos que calçava.

 - Não acredito que vou ter um encontro! – Deu saltos de felicidade. Depois olhou para Rick, que já esperava o que ele iria fazer. – Obrigadaaaa Riiickkk!!!!

Beijou a bochecha de Rick várias vez para agradecê-lo enquanto ele tentava se livrar do abraço de Stella, enojado.

 - Ah, tudo bem. – Disse ao soltar-se. – Pode guardar toda essa gratidão para o seu par, eu deixo.

Demos risada enquanto seguíamos para dentro do fliperama, foi onde Rick tinha marcado de encontrar os misteriosos caras que seriam nossos parceiros aquela noite para um encontro duplo. Eu geralmente não tinha encontro duplos, na verdade, raramente tinha qualquer tipo de encontro. O fato é que era difícil achar algum cara que me interessasse, porque parecia que tudo que me interessava se encontrava em Eric Burton, de quem eu planejava me libertar completamente aquela noite.

O fliperama estava cheio de gente quando entramos, fiquei atenta para encontrar dois caras gatos desacompanhados ali, tinha um barulho alto dos jogos ao nosso redor e algumas pessoas gritavam com a vitória.

Quando vi dois caras se aproximarem. Os dois eram altos e fortes. O da esquerda tinha olhos azuis e um cabelo tão liso que parecia que escorregaria do próprio casco. Abriu um sorriso de derreter ao me ver, vestia um suéter gola v verde-musgo com calça jeans folgada e tênis preto surrado. Percebi naquele mesmo momento que queria que ele fosse o meu par, quem quer que fosse. Olhei para Stella para ter certeza se tinha fincado os olhos no outro garoto e suspirei aliviada. O outro garoto fazia completamente o estilo de Stella, tinha cabelos negros espetados, usava uma camisa preta coberta por uma jaqueta jeans e calça, tinha um sorriso que denominava-o “posso ser domado”, exatamente o que ela precisava.

Então me preocupei em dar atenção no meu gato sarado e com sorriso sedutor que estava só à alguns centímetros á minha frente agora.

 - Raymond, Tyler, essas são Lara e Stella.

Raymond. Esse era o nome do meu par.

 - Muito prazer, Lara. - Ele aproximou-se para beijar meu rosto em gesto de cumprimento. Pude sentir o forte cheiro delicioso de seu perfume. – Mas pode me chamar de Ray.

 Tyler também se apresentou para Stella, mas foi mais informal e brincalhão do que educado como Raymond. Logo depois coçou a cabeça de Rick fazendo brincadeira e dizendo:

 - Finalmente nos apresentou alguém, irmão.

Rick deu risada enquanto arrumava os cabelos.

 - Veja pelo lado bom, demorei, mas quando trouxe, trouxe pessoas de qualidade.

 Rick gabou-se, acabou servindo de elogio para mim e Stella.

 - Com certeza.

Ray afirmou num sorriso avassaladoramente irresistível.

 - Mas olha só. – Tyler pegou um saco marrom do bolso, estava cheio de fichas para o fliperama. – Enquanto esperávamos compramos trinta dólares de fichas para jogar.

 Stela bateu palmas.

 - Adoro pin-ball! - Exclamou, alegre. – A Lara é muito boa nesse jogo, gosto de assistir ela jogar.

Ray olhou pra mim como se acabasse de dá-lo uma ideia.

 - Eu duvido que me ganhe. – Desafiou.

 - Qual o seu recorde?

 Perguntei, não tinha medo em minha voz, estava pronta para o ataque.

 - 3.000 pontos.

 Pronunciou com elegância.

 - Posso abater isso.

 - Vamos agora então.

Via o clima de competição de expandir no local, dava um ar sexy entre nós dois que adorei ter provado. Caminhamos até uma máquina de pin-ball, Raymond estralou os dedos e a clavícula, acho que estava tentando me amedrontar, não funcionou.

 - Apenas jogue.

Disse pra ele enquanto encaixava uma ficha na máquina. Ele sorriu e encostou-se na máquina, pronto para jogar. Quando começou, a torcida foi grande atrás de mim, eu apenas coloquei mais pressão para que não conseguisse. Mas percebi que não adiantou quando ele anunciou orgulhoso:

 - 3.500 dessa vez.

Não mostrei medo, ele se afastou do brinquedo me dando passagem, me recostei sobre ele, fazendo charme.

 - Moleza.

Afrontei-o. Ele encaixou a ficha no pin-ball, a expectativa dos outros aumentou. Não estava nervosa, comecei o jogo, apenas dosei a hora de bater na bolinha que movia-se com agilidade pela máquina. Minutos depois tive o placar de 4.000 pontos.

 - Olha só.

Me gabei de leve. Ouvi Stella arrancar trinta dólares que tinha apostado em mim, de Rick. Ri extasiada.

 - Isso não vale. – Protestou, mas não tinha chateação em sua voz. – Quantas vezes já jogou isso? Não tínhamos tantos fliperamas em Forestland.

 Dei risada enquanto caminhávamos lado a lado, nos afastando sem perceber, acabamos parando no balcão da lanchonete.

 - Mas e aí? Está gostando daqui?

  Perguntei, entonando meu interesse. Já fazia muito tempo desde a última vez que tive um encontro duplo, ainda estava tentando me recordar das dicas de paquera que sabia, por enquanto só estava sendo espontânea.

 - Aqui é demais. – Recostou-se no balcão, relaxando num suspiro. – Mil vezes maior do que de onde eu vim.

 - Sério? Achei que não existissem lugares menores que esse.

 - Pois é, onde eu morava não era pequeno, era minúsculo. - Ri. – Isso aqui é uma metrópole pra mim.

Abriu os braços mostrando a liberdade.

 - Está morando aqui, mas não te vi no colégio.

Lembrei.

 - Estou estudando numa escola em uma cidade próxima, vinte minutos de viagem todos os dias, coisa da minha família.

Balancei a cabeça, era uma pena. Num piscar de olhos, lembrei que tinha me esquecido dos outros. Stella e Tyler, onde estavam?

 - Onde Stella e Tyler foram mesmo?

Esperei que Raymond me desse a resposta, não era possível que já tivessem ido muito longe. Ray coçou a cabeça e sobrevoou os olhos pelo fliperama á procura dos dois. Em seguida apontou para eles numa mesa do outro lado, numa conversa íntima cheia de risadinhas e olhares.

 - Ali.

 - Parece que ficaram bem sozinhos.

Disse em ar de surpresa. Ele riu, mas na verdade não era novidade pra mim a facilidade de  Stella de se dar bem com os caras do tipo de Tyler. Num pulo lembrei de Rick, mas o encontrei segundos depois, estava jogando entusiasmado á um jogo de tiro.

 - Rick também pareceu melhor sozinho. - Balancei a cabeça com desânimo. – Acho que não é mesmo muito atrativo vir a um encontro de casais sozinho.

 - Devia ter arranjado uma gatinha para ele também.

Pôs as mãos na cabeça com a lembrança.

 - É, ele anda muito solitário ultimamente.

 Concordei. Fazia anos que não o via com uma garota.

 - Posso arranjar uma que combine com ele. Inteligente.

 - Inspirada.

Acrescentei.

 - Curte computadores...?

Pediu minha opinião.

 - Com certeza.

 - Vou achar. – E virou-se para a parte de dentro do balcão. – Mas enquanto isso... Está com fome?

 - Seria muito feio se dissesse que estou morrendo?

 - Não, ficaria feliz em salvar você, o que quer?

 - Milk-shake.

 - Vou pedir, aguente firme.

Dei risada outra vez. Ficamos por ali. Tomamos milk-shake, conversamos. Raymond me fazia rir e me sentia muito á vontade com ele, como se já o conhecesse á anos. Ele me fazia rir, tinha uma senso de humor único, ingênuo. Além de ser lindo e inteligente.

Não tinha por que me preocupar com Eric, mas por algum motivo eu me lembrava dele o tempo todo. Era horrível eu ter de afogar minhas mágoas com outro garoto e parecia que eu e Eric nunca nos entendíamos de verdade. Estava ali com um cara maravilhoso, como Ray, mas será que ele merecia ficar com uma pessoa que pensasse em outro enquanto estivesse com ele?

Não fazia o menor sentido. Tinha certeza de que Raymond era o cara certo pra mim, tudo que sempre achei que seria perfeito num namorado, mas por que ainda pensava em Eric?

Ficamos junto com Stella, Tyler e Rick depois, jogamos boliche e duramos para gastar todas as fichas no fliperama. Eram onze e meia da noite quando saímos.

Ray e eu saímos na frente enquanto Stella e Tyler saíram atrás. Caminhamos sozinhos lado a lado.

 - Então, você veio de carro?

Perguntei.

 - Vim, olha ali ele.

Apontou para um Eco-Sport prateado estacionado em frente. Parei bem em frente para ver num riso.

 - É seu?

 - É.

 - Roubou de quem?

Brinquei.

 - De um cara.

Acompanhou. Gargalhei.

 - Vou te dar o meu número, precisamos sair mais vezes.

Ele disse, se aproximou tanto que tive de me encostar no carro, vi seus olhos verdes bem de perto, cintilavam.

 - E se eu não quiser?

Adorava provoca-lo.

 - Deixe de ser boba. – Me fez cócegas. – Paguei seu milk-shake.

 - Ta tudo bem. Você até que é legal.

Sorri para demonstrar que era bem mais que isso.

 - Muito ou pouco?

 - Não sei.

 - Mereço um beijo...?

Quando disse isso, eu não sei por que hesitei. A visão de Raymond se aproximando prestes á me beijar era ótima, mas algo me fez parar. Meu coração deu um pulo quando do nada a minha visão desfocou. Não via mais seu rosto, ele começou a transformar-se no rosto de outra pessoa, quando de repente, eu vi Eric.

Era ele, tinha certeza, a perfeita imagem projetada no lugar de Raymond. Seus olhos estavam cinzas sombrios me olhavam com admiração e desejo. Sua boca, tentadora, estava bem á minha frente curvada num sorriso torto.

Fui tomada por um desejo incontrolável de beijá-lo e quando menos percebi, tinha agarrado a gola de sua camisa e fixado meus lábios nos dele. Eu sabia que não era ele de verdade, era Raymond quem eu beijava, mas parecia tão real, que eu não quis largar. Não era a boca dele, era a de Ray, o contorno da sua boca não batia com o que eu havia visto. Mas a sensação ainda era renovadora, estonteante. Abracei vorazmente seu pescoço enquanto nossos lábios se tocavam. Não conseguia me controlar em querer mais, parecia completamente fora de mim.

Ele por outro lado parecia um pouco surpreso, ainda estava se adaptando com o jeito que eu estava lhe agarrando, a final, era Ray e eu não era assim com ele. Meu coração dava pulos e minha respiração falhava, queria mais, não conseguia me satisfazer porque não era ele. Era Raymond. E eu queria Eric.

Queria seu desejo, sua pele áspera e quente, seus verdadeiros lábios, queria passar as mãos nos seus cabelos, e deixar que agarrasse meu corpo e me envolvesse naqueles braços enormes com força.

Já não tinha ideia de como parar quando fui bruscamente interrompida por um braço forte e rígido, que se pôs no meio de nós dois e nos afastou de repente.

Num ato, a visão de Ray como Eric se desfez, minha cabeça ainda girava atordoada quando Raymond voltou á ser ele e vi Eric ao seu lado. Ele havia nos apartado. Eu abri a boca, meu coração pulou assustado. Eric não disse nada, mas o seu olhar transparecia fúria e estagnação, mexia os músculos com a respiração densa.

Eu pensei rápido no que dizer, mas antes que eu formulasse a primeira pergunta, fui surpreendida com o movimento rápido do punho de Eric no olho de Raymond. Numa fração de segundo, Ray estava caído no chão, contorcendo-se de dor.

Por impulso, minha boca soltou um berro:

 - Para!

Corri em direção a Eric e o puxei pelo braço tentando fazê-lo retomar a consciência, mas ele não se mexeu, minha força tinha impacto nenhum sobre ele. Raymond levantou-se do chão enfurecido, estava prestes a revidar o soco quando me joguei no meio dos dois em pânico.

 - Qual é o seu problema?

Ray grunhiu para Eric, tentava ataca-lo, fiz força para impedir os dois de começarem uma luta.

 - Parem com isso!

Implorava eu, empurrava Eric om toda a minha força, mas parecia que meus braços iam quebrar com seu peso, parecia pesar uma tonelada. Seu rosto ficava cada vez mais rígido e vermelho enquanto ele fuzilava Ray com os olhos, trincava os dentes, cheio de ódio.

 - Se tocar nela de novo eu quebro todos os seus ossos tão rápido que nem vai sentir...

Ameaçava.

 - Quem é você? Saia daqui!

 - Sou o namorado dela.

Eric gritou na cara de Raymond. Fiquei estarrecida com a mentira de Eric. Ainda não conseguia entender porque mentiu, ou porque estava fazendo isso.

 - Você tem namorado??

Ray me fitou aterrorizado.

 - Não! Ele não é meu namorado.

Lancei o olhar mais ameaçador que pude para Eric, tentando fazer com que entendesse o recado.

 - Vá embora daqui, playboyzinho! Ela não está disponível!

Eric ordenou.

 - Não até que ela me mande fazer isso!

Ray ficava com cada vez mais raiva. Percebi que se não tomasse logo uma atitude séria, uma briga feia aconteceria por minha causa. A multidão já estava se formando ao nosso redor.

Me virei pra Raymond. Sabia que depois disso, com certeza não o veria nunca mais. Nunca me perdoaria por isso.

 - Ray, é melhor você ir embora, eu conheço ele, não quero que se machuque, - olhei seu olho ficando roxo. – cuide do seu olho, eu não vou demorar a entrar. Sinto muito.

O olhar de incerteza de Ray era claro.

 - Tem certeza? E se ele te machucar?

 - Não vai. Chame a Stella quando entrar.

Após um longo suspiro de impotência, ele me obedeceu e entrou no Mega Z de novo. Com direito a um tiro de fuzil com o olhar, para Eric.

Estava pronta para colocar Eric em seu devido lugar. Aquilo foi longe de mais, e não tinha o menor sentido. Estava cheia de suas atitudes sem explicação. Não podia ter feito isso por ciúmes, eu e ele não temos nada, além de que ele não tem nada a ver com os caras que eu saio.

 - Você-ficou-louco?

Questionei, dura como pedra. Eric não amoleceu a expressão de raiva, apertou os dedos contra a palma da mão.

 - Não acredito que você o beijou! – Gritou. – Não acredito que estava aqui com esse desconhecido se agarrando no meio do estacionamento!

 - E o que isso tem a ver com você?? – Debati. – E melhor, o que você está fazendo aqui? Você me seguiu??

 - Não te segui, mas ainda bem que resolvi vir para cá. Sabe que ele podia ser um bandido qualquer? Tem ideia do perigo que correu?

 - Raymond não é como você.

Abaixei o tom de voz. Ele soou calmo e frio. Eric apertou os olhos para mim, incrédulo.

 - Ele me respeita. Eu o beijei.

 - Por que??

Se eu dissesse que foi porque tinha visto ele, iria soar ridículo e o deixar com o ego maior do que já estava.

 - Porque eu quis. Você acha mesmo que é alguma coisa para mim? – Estava sendo difícil ser tão concreta com uma mentira tão nefanda. – Eu posso gostar de outros garotos, sinto muito se te dei falsas esperanças.

Cruzei os braços. Ele estava imóvel, boquiaberto.

 - Você vem para casa comigo.

Me pegou pelo braço com tanta força que achei que fosse quebra-lo. Começou a me levar em direção ao seu carro.

 - Me solte! – Mandei. – Me solte agora! Está me machucando.

Ele parou no meio do caminho.

 - Não vou te machucar se vir comigo até o carro.

 - Mas eu não vou.

 Um grito veio da porta do Mega Z.

 - Ei! – Voltei-me para Stella, ela vinha correndo de lá, Tyler vinha atrás. – O que está fazendo, Eric? – Pela sua voz, como se estivesse fazendo um apelo, estava planejando dribla-lo para me deixar ir embora.  – Qual é? Você bateu no meu amigo, sabia? Ele está de olho roxo.

 - Ótimo, então diga ele que se isso acontecer de novo, vai ter outro.

Eric disse com cinismo. Quando menos esperava, ele se agachou próximo de mim e me pegou pelas pernas. Não consegui me defender quando ele as apoiou sobre seu ombro, com o mínimo de dificuldade e saiu comigo pendurada até a porta do seu carro.

 - Me larga!!!

Me mexi ferozmente no seu ombro para ter certeza de que me deixaria cair, chutei e deu murros no seu corpo, furiosa, mas ele nem sequer se mexia.

 Foi até o carro me jogou no banco do carona, me movi habilmente para sair, mas ele fechou a porta na minha cara.

 - Fique aí.

 - Não pode levar ela assim! Quem você pensa que é?

Tyler veio abordá-lo do lado de fora.

 - Solte-a a-go-ra, Eric!

Stella fez sua pose mais desafiadora.

 - Não se preocupem, vou leva-la pra casa em segurança.

Mexi na fechadura do carro desesperada, estava completamente presa. Eric rodeou o carro e entrou no banco do motorista.

 - Me tire daqui já!

 - Assim que chegarmos em casa.

Numa fração de segundos, trancou o carro e o arrancou dali, fazendo fumaça na estrada. Quando menos esperei, já estava na estrada que levava de volta á Road Castle.

 - Não acredito que fez isso!

Bati no seu ombro, histérica.

 - Não sabe o que estou fazendo.

Sua voz dessa vez saiu calma, serena como se nada estivesse acontecendo.

 - É melhor me levar para casa. Posso lhe acusar de sequestro, não tenho medo de chamar a polícia.

 - Chama. Posso contar aos seus pais o que eu vi. – Ameaçou. – Acho que posso ganhar mais uns pontos com eles depois de ter salvado você. – enfatizou. – De novo.

 - Você é um panaca.

 - Estou falando sério, Lara. – De repente, pareceu completamente sério. – Tem uma coisa que você não sabe sobre nós. Esse cara, podia ser perigoso.

O que ele queria dizer com isso?

 - O quê? Você é perigoso. Você bateu nele. Aquilo só foi um beijo.

Quando eu pronunciei beijo, ele se movimentou no banco, agoniado. Ficou minutos em silêncio antes de falar de novo:

 - Isso não é possível... – Blefou. – Lara, você não queria fazer aquilo. Não com ele.

 De repente me veio uma leve tensão. Parecia que ele sabia que eu tinha visto ele ao invés do verdadeiro Raymond. Pigarreei.

 - Como...

 - Não responda. – Interrompeu. – Quero acreditar que você não quis.

Mais adiante, encontramos uma ponte quebrada que nos obrigou a entrar em outra rota. Uma estrada de terra, que cortava um matagal alto. O carro tremeu passando pelas deformidades da estrada, quando do nada, parou. Fazendo um longo barulho de algo afundando na lama.

 - Ótimo. – Grunhi. – Estamos presos num buraco.

Não tinha ninguém em volta, nenhum carro, só o nosso.

 - Posso nos tirar daqui.

 Tranquilizou, olhando para o lado de fora.

 - Não acredito. Só estou aqui presa porque você me tirou do Mega Z. – Resmunguei. – Agora estou atolada num lugar que só tem um monte de mato!

Senti uma pontada de ardor e dor no meu pescoço, num reflexo, coloquei a mão em cima da onde algo me picou, abafando o lugar.

 - Aiiii!!!!

Reclamei. Eric olhou-me preocupado.

 - O que foi?

 - Acho que alguma coisa picou meu pescoço.

 - Deve ter sido uma aranha. Deixa eu olhar pra você.

Pediu enquanto soltava-se do cinto de segurança para chegar mais perto de mim. Eu afastei meu cabelo, colocando-o todo em cima do outro ombro para que ele conseguisse ver. Ainda latejava e ardia. Eric aproximou o rosto daquele lado do meu pescoço e quando vi, estava encostado completamente nele. Senti sua bochecha tocar meu queixo, sua pele queimava na minha, uma onda de tranquilidade invadiu meu corpo.

Senti sua respiração afagando meu pescoço.

 - Viu alguma coisa...?

 Minha voz falhou. Ele demorou mais um minuto antes de responder, escorregando o rosto na minha pele.

 - Não... – Sussurrou, sua voz saía quente na minha pele. – Mas o seu perfume é irresistível...

Não consegui me mover, meu braços relaxaram sobre minhas coxas, enquanto eu não conseguia afastá-lo do meu pescoço, seus lábios o tocaram logo depois, ele passou a mão sobre meu ombro, afastando a alça para deixar meu ombro nu. Beijou do meu ombro até o meu queixo, ondas de um prazer incontrolável tomavam conta de mim quando seus lábios estavam á milímetros de distância dos meus, até que se tocaram, se encaixando perfeitamente.

Eu o beijei. Beijei Eric Burton pela primeira vez, depois de anos controlando o meu desejo. Sua boca era quente, seu hálito era fresco e indescritível. Seu beijo era avassalador, podia tomar toda a energia que tinha em um minuto, era quente, cheio de presença e falta de fôlego.

Escorreguei os braços pelo seu peito para chegar em sua nuca, entrelacei meus dedos em seu cabelo, ele apertou minha cintura contra a dele e me pôs contra o banco.

Uma confusão de pensamentos me rondavam, todas as brigas e desentendimento, seriam solúveis até ali. Mas algo não se encaixava, aliás, nada se encaixava corretamente, não quando eu não conseguia entende-lo. Não conseguia entender se aquilo ainda era um jogo ou não. Da forma que me entreguei completamente ao seu beijo, deixando aquele amor me guiar, não podia me sentir completa se eu não soubesse se ele também me amava. Ou se eu era só mais uma da sua lista.

Talvez ele nunca tivesse tido tanto trabalho para me conseguir, talvez ele estivesse aliviado de finalmente poder continuar com sua vida e ficar com outras garotas depois de já ter me conseguido.

Numa fração de milésimos, uma informação caiu como uma rocha no meu estômago. O empurrei com toda força para longe de mim e comecei a bater nele, freneticamente, enquanto lutava para expulsar as lágrimas dos meus olhos.

 - Seu cachorro! – Berrei, bati ainda mais nele. Ele arregalou os olhos enquanto corria atrás das minha mãos para me fazer parar. – Você tem namorada, seu canalha! Como pode me beijar quando...?

Parei quando Eric prendeu meus punhos com firmeza nas mãos dele. Olhou firme para mim depois disso.

 - Para com isso.

Fiquei imóvel. Me sentia a pior pessoa do mundo. Suja, uma vadia. Tinha beijado um cara que tinha namorada, algo que jurei nunca fazer na minha vida. E a namorada era Jessica, alguém completamente gentil e fiel, eu estava acabando com minha dignidade ajudando-o a traí-la.

 - Esquece a Jessica, ela não precisa saber.

Meu corpo aqueceu-se, ondas de raiva tomaram conta dele, minha velocidade cardíaca de mil por hora.

 - Mas eu vou saber. Eu não sou uma qualquer que aceita ser a outra, Eric. Você me raptou agora me tire daqui.

Mandei. Cruzei os braços, estava tentando ser firme, mas não podia negar a tentação que era ficar longe dele depois de ter provado do seu gosto, seu cheiro ainda impregnava minha pele, seu gosto estava grudado na minha boca, tudo ainda presente me tentando a terminar o que comecei.

Mas eu não podia.

Ficamos em silêncio durante toda a viagem de volta para casa. Eu não conseguiria dizer nada que fosse útil naquele momento. Minha cabeça se assemelhava á uma perda de sistema, nada fazia sentido, os pensamentos desgovernados. Estava confusa, imersa em problemas sem solução.

Eric estava ilegível, sua expressão parecia uma mistura de preocupação, incômodo e angústia. Passava as mãos no queixo o tempo todo, com os olhos fixos na estrada, como se não encontrasse a resposta para um enigma.

O carro dele estacionou na minha casa minutos depois. Não tinha movimentação na rua, estava escuro e frio. Minha casa estava fechada e de luzes apagadas, todos já deviam estar dormindo, mas eu tinha a chave.

Não sabia o que dizer, então só abri a porta, mas fui impedida de sair quando Eric me chamou, num apelo sussurrante:

 - Lara...

Suspirei com impaciência, fechando a porta do carro e me pondo para dentro de novo.

 - O que foi?

Minha voz soou calma, na verdade, vulnerável e frágil. Não conseguia enxergar mais que borrões e sombras dentro do carro, já eram por volta de onze da noite e uma escuridão se espalhava pelo carro. A sombra de Eric encostou-se no banco, deixando a cabeça rente na poltrona, olhou para mim com exatidão, por algum motivo, aspirava sofrimento, como se tivesse algo para dizer, mas não podia.

 - Quero que fique com meu número na chamada de emergência.

Ergueu o braço, estava com meu celular de novo. Tinha desistido de entender como o pegava sem que eu percebesse no meu bolso.

 - Caso algo aconteça.

 - Do jeito que você fala parece que eu corro perigo de vida.

Falei para que soasse como uma ironia, mas ele não desfez o ar rígido.

 - Não devia ter beijado você. – Esticou-se o bastante para encaixar o celular de volta no meu bolso. Aquela proximidade estava mil vezes pior de ter encarada depois do nosso beijo. Seu sussurro parecia me chamar lentamente, tentando-me. – Foi um momento estúpido de fraqueza...

Eu não conseguia dizer nada, por não conseguir pensar em nada. Tudo estava vago, só conseguia pensar em beijá-lo outra vez, a reação que Eric provocava em mim era impossível de ser descrita, como uma impotência nos próprios sentimentos. Nos entreolhamos por instantes extensos, seus olhos cinzas percorreram minha boca, umedeceu os lábios como se a desejasse. A sensação de que nós dois nos esforçávamos para controlar isso era implícito, mas claro. Contudo eu sabia que não podia beijá-lo de novo.

 Eric passou o polegar no lábio e virou o rosto rapidamente, espantando a emoção.

 - Agora vá para casa.

 Pediu. Desci do carro num ato, ainda estava atordoada e confusa ao entrar em casa, as lembranças corriam sem rumo em minha memória, fazendo-me querer gritar. Tudo estava acontecendo sem explicação.

Subi as escadas, e liguei a luz do quarto com a porta fechada para não incomodar meus pais. Me esforçava para entender Eric, mas parecia completamente impossível. Ele tinha voltado para a minha vida para fazer com que ela virasse de cabeça para baixo. Como se do nada, o passado resolvesse bater na minha porta e tirar satisfações do porquê de tê-lo abandonado sem ser resolvido.

Não tinha ideia de quais eram sua intenções comigo. Mas a pouco tempo atrás, eu tinha certeza de que Eric Burton era o pesadelo de toda a garota ingênua e romântica. Achava-o um sujeito sem sentimentos, incapaz de sentir qualquer emoção sobre qualquer coisa e a certeza disso vinha do episódio entre nós dois durante a quinta série.

Mas agora ele vinha, me fazendo repensar tudo o que eu acreditava sobre ele. Me confundindo sobre sua real vida. Me fazendo crer de que ele tinha algum sentimento por mim. No tiroteio ao me salvar, e naquele dia, dando um murro em Raymond, por ciúmes? Talvez, agora tudo parecia estranhamente provável.

Tudo o que eu achava impossível que fizesse algum dia, estava se mostrando possível.

Uma parte de mim, estava louca por ele. Acreditando que ele podia ter se apaixonado por mim, que eu significava alguma coisa para ele e que tinha uma chance de ser especial, diferente das outras. Que era possível que tivesse finalmente encontrado a pessoa que lhe apresentaria o amor, eu. Que ele podia mudar se eu lhe desse uma chance, que ele podia ser a pessoa que eu sempre quis.

E a outra parte, estava atordoada de perguntas. Já que não fazia o menor sentido que depois de milhares de garotas ele tivesse se apaixonado justo por mim, alguém que antes era nada para ele, tão insignificante que foi capaz de dar adeus em míseros minutos á vários anos de amizade por um grupo de playboys. Se ele estivesse mesmo apaixonado, não teria se arrependido, como disse no carro, de ter me beijado. Se estivesse apaixonado, abriria mão da Jessica por mim. Mas não, tudo indicava que ele só queria diversão comigo, um passatempo quando enjoasse da Jessica, alguém para preencher seu ego enorme.

E o ciúme, fosse só um truque para me enganar, me fazer acreditar que ele estava mesmo apaixonado por mim. Ter esperanças de que ele tivesse mudado.

O arrependimento por ter me abandonado, outro truque para me fazer crer que tinha algum sentimento por mim, que não teve a intenção de me largar.

Tudo um jogo.

Agora eu não sabia o que fazer. Tudo indicava que ele não desistiria até conseguir me conquistar, era um tipo de desafio para ele, tinha que provar á si mesmo que poderia conseguir qualquer garota e se não me tivesse, isso desmancharia tudo.

 Naquele momento tinha perdido um cara que podia ser o homem da minha vida. Raymond. Talvez fosse só uma questão de tempo até que eu me apaixonasse de verdade por ele e me fizesse esquecer completamente de Eric. Mas agora estava tudo acabado, fragmentado em migalhas. Raymond nunca mais iria querer me ver. Stella deveria ficar com Tyler e eu, sozinha, sendo perseguida por um egocêntrico que mora em frente á minha casa.

Nada seria como era antes. Tinha certeza.


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Notas finais do capítulo

Com certeza não.
O que vai mudar...? Leia e vai saber.